Perfeccionismo.
Perfeccionismo.
Eu era perfeccionista. Até demais. Minhas malas eram perfeitamente arrumadas, meus livros eram empilhados por ordem alfabética. Eu mesma fazia a minha cama, para que não tivesse nenhuma dobrinha, nenhum friso nos lençóis. Minha pasta e escova de dentes tinham que ficar alinhadas no estojo do banheiro, e as minhas toalhas eram absolutamente macias, brancas e lisas, limpíssimas. E apesar disso eu as mandava para lavar todo dia. Sabia que aquilo era exageiro, e as minhas amigas ás vezes me mandavam curtir mais a vida e limpar e arrumar menos. Eu concordava com elas, e ás vezes fazia isso. Mas eu sempre tinha muito tempo livre, sem nada para fazer, e acabava indo organizar, empilhar, arrumar e limpar coisas. Foi naquele dia que aconteceu.
Eu entrei no dormitório masculino para fazer sabe-se lá o quê – acho que estava só curiosa para saber o que diabos havia lá dentro de diferente dos nossos, e talvez observar a bagunça – quando fiquei paralisada. Abismada. Eu não acreditava que um dormitório podia ser tão sujo e bagunçado. Sem a presença de ninguém ali, acabei me forçando a organizar aquela bagunça. Só que nesse meio tempo Remo Lupin chegou. Ele nem ao menos percebera a minha presença ali, estava demasiadamente absorto no que quer que estivesse pensando, enquanto ia ao seu malão e procurava algo. Olhou embaixo da cama, nas gavetas de seu criado-mudo, em cima da cama ainda desorganizada, em tudo. Até que ele reparou na minha presença e ficou meio surpreso.
-Dorcas, o que você ta fazendo aqui? Pensei que deveria estar no seu dormitório, organizando coisas – Eu sabia que ele soltava tudo o que pensava quando estava nervoso, mas aquilo era demais. Organizando coisas?. Ele falava como se eu fosse algum tipo de neurótica! Cruzei meus braços e vi-o continuar procurando por algo. Aí que ele viu o bolo de coisas na minha mão, e o lixo ao lado dos meus pés.
-Dorcas, você viu algum pergaminho velho que dizia coisas estranhas, com algo de algum Sr. Pontas e Sr. Aluado? – Ele perguntou e eu dei de ombros.
-Joguei fora. Quem quer um pergaminho velho, sujo e gasto como aquele? Ele nem funciona quando escreve nele, tem algum tipo de feitiço em cima – Eu respondi com naturalidade, jogando mais um punhado de coisas na lixeira ao meu lado. Ele ficou desesperado.
-O que...? – Alguns segundos depois ele estava ajoelhado ao lado da lixeira, espalhando tudo no chão e apanhando o pergaminho velho, sujo e inútil. E eu vi todo o meu trabalho sendo desfeito em segundos.
-Remo! – Minha voz não podia ser mais repreensiva. O que ele pensava que estava fazendo?
-Dorcas, sério, não to falando por mal, mas você devia parar de arrumar as coisas, principalmente as dos outros. Você nunca sabe o que é importante para eles ou não – Ele disse e, beijando o papel nojento, saiu correndo do dormitório, me dando um “até mais” rápido e voando pelas escadas.
Eu me deixei cair sentada, ainda de braços cruzados, em uma cama qualquer. Observei a papelada toda que tinha separado para jogar no lixo e deu um suspiro. Ele tinha razão. Talvez tivesse nomes e datas anotados naquele papel de picolé de Sirius, marcando seus encontros. Fui olhar. Era verdade. Devolvi ao lugar que estava.
Então algo pinicou a minha bunda quando eu voltei a sentar na cama de antes. Apalpei o colchão sob a minha bunda e percebi uma protuberância por baixo da colcha. Uma bolinha de papel. Reconheci a letra de Remo e fiquei curiosa. Era meu segundo pior defeito. Abri o papel e comecei a ler, consciente de que aquilo era invasão de privacidade. Pensei assim até ver que era para mim.
”Dorcas,
Sabe, eu venho há tempos tentando de falar isso. Eu tenho tentado durante as férias inteiras achar as palavras para te dizer isso. Eu... Eu não sei mais o que fazer.
Eu não sei mais o que fazer se quando fecho os olhos, tudo o que eu vejo é o seu rosto, se quando estou no silêncio tudo o que escuto é a sua voz. É impossível tirar você da minha cabeça agora, eu já tentei de tudo. Eu estou... Eu estou perdidamente apaixonado por você, Dorcas. Faz tempo. Mas essa sua mania de arrumação também está me matando! Você está deixando de aproveitar a vida para ficar arrumando as coisas! Você era mais alegre e espontânea, loirinha, e agora está introvertida, o contrário do que era antes! Eu não sei mais o que fazer. Venho tentado falar com você, te dar toques, te entreter para você parar de pensar em arrumação, mas os meus esforços não vem dando resultados satisfatórios. Eu te amo, Dorcas, e não quero ver você assim, quietinha, sempre pensando em arrumar. Quero a menina que pouco se importava, radiante e alegre de volta. Como você sabe que é, só está escondendo por algum motivo. Aliás, pensando bem, foi desde que eu comecei a falar com você. Estranho.
Bem, eu vou acabar nem mandando essa carta, como todas as outras. De um jeito ou de outro, eu repito que eu amo você, Dorcas, e espero que você se dê conta do que está fazendo com você mesma, seus sonhos, seu tempo e suas necessidades pessoais, deixando tudo isso de lado. Se dê conta logo, meu amor.
Carinho,
Remo”
Eu parei para pensar. Era verdade. Eu vinha fazendo aquilo desde que começara a falar com ele. Mas aquilo era muito óbvio. Eu era apaixonada por ele, e como agora comecei a passar mais tempo com ele, fico mais tempo tensa e nervosa perto dele, tentando esconder esse sentimento. Mas agora, agora era diferente. Ele disse três vezes - duas diretas e uma indireta - que me amava em somente uma carta. O que quer que seja que ele faria naquele momento iria esperar. Fui correndo atrás dele com aquele papel na mão, sorridente. Perguntei á Merlin e ao mundo onde estava Remo Lupin, e quando ouvi que ele fora para os jardins com os Marotos, dei um largo sorriso.
Segui até lá e o vi deitado na grama, todo desarrumado e descomposto, com um sorriso que só podia me dizer que tinham aprontado alguma. Sirius cutucou Remo logo que me viu, e este sentou-se rapidamente, corando e se aprumando como pôde. Eu comecei a me aproximar mais rápido, até que cheguei perto deles. Agradeci por estar usando a minha saia de crepe branco estampada com flores avermelhadas e a regata branca simples. Ao menos estava vestindo uma roupa decente para um começo daqueles. Acenei para ele, começando a me preparar para o que viria. Cheguei até ele ofegando pela corridinha que dera.
-Remo, posso falar com você – Olhei para os Marotos, que me olhavam sorridentes – A sós?
Ele limpou a garganta e arrumou o colarinho.
-Claro – Ajudei-o a levantar-se sorrindo e levei-o para um pouco longe deles pela mão, sob as vaias, aplausos e assovios dos marotos. Um “huuuuuuuuuuuuum” sincronizado foi ouvido quando eu já estava um pouco longe, e então eu dei uma risada. Soltei Remo e virei-me para ele, olhando para os cabelos desgrenhados.
-Você fica lindo assim – Eu disse bagunçando mais ainda seus cabelos. Ele corou e passou a mão pelos cabelos, nervoso. – Certo. Eu estava naquela arrumação do dormitório masculino – aliás, eu devolvi tudo para o lugar – e achei esse pergaminho aqui. É seu, Remo. Eu não pude resistir, me desculpa – Eu pedi vendo-o abrir a boca surpreso.
-O que é, Dorcas? – A voz dele estava meio trêmula. Eu alarguei meu sorriso.
-Meio que uma “Declaração” sua sobre a minha pessoa. Eu estou mesmo ficando neurótica, é Remo? Não gostei disso – Eu falei em tom falso de repreensão. Ele passou a mão pelo coralinho da camisa como se ele estivesse apertado e engoliu em seco.
-Bom, não foi bem isso que eu quis dizer, eu... Ninguém te deu o direito de mexer nas minhas coisas! – Ele retrucou mudando de assunto e de postura, bronqueando-me. Eu ri e aproximei meu corpo do dele, colando-os e ficando nas pontas dos pés, colocando meu rosto para cima para que ele o alcançasse. Remo ofegou.
-Se não fosse por essa maldita neurose, eu nunca saberia que você me ama de volta. Eu fiquei assim para descontar a minha ansiedade de ficar perto de você, Remo. Eu te amo. Sou apaixonada por você faz tempo. – Ele então tomou uma atitude que me arrepiou toda. Pegou a minha cintura com firmeza e me pressionou contra seu corpo, me beijando profundamente. Pelo jeito ele queria aquilo fazia tanto tempo quanto eu.
-Ual. – Eu disse com a boca inchada e vermelha por causa do beijo dele. Ele sorriu e foi passando os lábios pelo meu pescoço, me fazendo delirar.
-Quer dizer então que eu devo agradecer á maldição da sua neurose por organização, talvez até dizer que ela se transformou em um presente? - Ele perguntou com a boca na minha orelha, me fazendo ter arrepios pelo corpo todo. Céus, ele era quente. Nunca que eu iria imaginar que Remo Lupin era daquele jeito.
Oh La La :)
-Yeah. Mas, se você começar a me beijar desse jeito de novo, eu não vou me importar nada nada de deitar nessa grama enlameada e me amassar com você atrás desses arbustos – Eu falei e ele deu um sorriso malicioso, pegando os cabelos da minha nuca com delicadeza e fazendo a minha cabeça ficar inclinada para que ele pudesse me beijar.
-Seu pedido é uma ordem, senhorita – E ele me beijou daquele jeito de novo. E agente realmente se amassou atrás daqueles arbustos. E os marotos apareceram ali e me viram com a minha roupa mais fofa suja de barro.
E eu não me importei. Porque eu estava com ele. Então tudo estava bem. Suja ou limpa, ele me queria. E era aquilo que importava daquele momento em diante.
E, se você quer saber, ele fez questão de desarrumar os meus livros. Isso foi quando agente se mudou e ele misturou os meus aos dele, mas isso é uma outra história.
E que se danasse a arrumação. Amém.
FIM!
______________________________________________________________________________________________
anúncio
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!