Que Vergonha



Comecei a me arrepender de ter convidado o Harry para a festa da Gina Weasley quase imediatamente. Não é que eu achasse que não seria divertido ou qualquer coisa assim. Tipo assim, apesar de ficar me enchendo por eu ser uma artista sensível, o Harry até que era um cara bacana.
Não, eu tinha me arrependido por causa da reação que as pessoas tiveram quando eu contei.

Reação número um: Lucy
"Ah, caramba, que beleza! Vocês dois formam o casal mais fofo de todos, porque ele é tão alto e você é tão baixinha, além disso, vocês dois têm cabelo arrepiado demais, e vocês gostam daquele tipo idiota de música que parece antiga. Vai ser tão legal! Que roupa você vai pôr? Acho que você deveria colocar a minha minissaia de couro escuro e a minha caxemira verde com decote V, minha meia arrastão preta e a minha bota que vai até o joelho. Não dá para colocar coturno de minissais, vai parecer que as suas batatas da perna são gordas. Não que as suas sejam gordas, mas sempre parecem gordas se você coloca coturno com minissaia. Mas talvez a meia arrastão seja um pouco demais para uma aluna do primeiro ano. Talvez você deva colocar meias-calças finas normais. Mas acho que a gente pode comprar uma meia-calça canela. Acho que ia ficar bom. Quer se encontrar com o resto da turma de animadoras de torcida para ir fazer compras antes da festa, no sábado?"

Reação número dois: Rebecca
"Ah, estou vendo que a sementinha do frisson que eu plantei germinou e produziu um botãozinho de flor bem frágil."

Reação número três: Luna
"Ah, Mione, que maravilha! Agora o Ron vai ter alguém para conversar na festa, porque ele também não vai conhecer ninguém lá, igualzinho ao Harry. Talvez os dois possam ficar juntos enquanto nós duas damos aquela checada no pessoal. Porque eu ouvi dizer que, em festas assim, é importante se misturar. Fiquei pensando que, se você e eu nos misturarmos, talvez consigamos ser convidadas para outras festas também, tipo que sabe até festas do terceiro ano, apesar de eu achar que isso talvez seja pedir demais.
Mas sabe como é, se fôssemos convidadas para festas do terceito ano, seríamos tão populares quanto a Gina em um piscar de olhos."

Reação número quatro: Molly
"Você convidou o garoto? Quantas vezes você já me ouviu dizer a sua irmã, Dona Hermione, que se você ficar indo atrás dos garotos você vai se dar mal? É só lembrar do que aconteceu com a minha prima Rosa. É melhor que eu não veja você ligando para ele. Espera que ele ligue para você. E também não me venha com esse negócio de mensagens instantâneas pela internet. O melhor é parecer misteriosa e distante. Se a Rosa tivesse sido misteriosa e distante, não estaria na situação que está hoje. E onde é mesmo essa festa? Os pais da garota vão estar lá? Vai ter álcool para beber? Estou avisando, Dona Hermione, se eu descobrir que você e a sua irmã estiveram em uma festa em que tem álcool, vocês duas vão ficar limpando privadas até entrarem na faculdade."

Reação número cinco: Draco
"O filho do presidente? Ele não é agente antidrogas, é?"

Reação número seis: meus pais (deixiei o pior para o fim)
"Ah, filha, que maravilha! Ele é um garoto tão legal! Não dava para a gente inventar um namorado melhor para você. Ah, como seria bom se a Lucy tivesse tanta prudência quanto você para escolher com quem sai... A que horas ele vem buscar você? Ah, e precisamos comprar filme e máquina de fotografia. Só vamos tirar algumas fotos, só isso. Bom, a gente precisa registrar o evento. Nossa filhinha, saindo com um garoto tão gentil. Tão bem-educado. E você sabe que ele estuda na Horizon, isso significa que a inteligência dele está muito acima da média. Do país. Do país inteiro. Ele vai mesmo ser alguém muito importante no futuro, talvez até siga os passos do pai e se torne político. Que garoto bacana, bacana mesmo. Ah, se a Lucy pudesse encontrar um garoto bacana assim, em vez daquele Draco, que rapaz terrível!"

Foi totalmente humilhante. Tipo assim, só eu mesma: na primeira vez que saio com um garoto, é um cara que os meus pais adoram! Além do Harry não ter nenhuma tatuagem (pelo menos, até onde eu sei) nem andar de Harley (mais uma vez, estou chutando, mas parece bem provável), ele é filho do PRESIDENTE DOS ESTADOS UNIDOS.
Tá bom? Poderia SER mais CDF? Eu sei que a gente não pode fazer nada a respeito dos pais que tem, mas dá um tempo. Em vez de o cara ser o filho de mãe solteira que vive de pensão do governo ou de um pai condenado, situações que deixariam os meus pais loucos da vida, acabo saindo com um cara cujos pais não só continuam casados como também são, tipo, o casal mais influente do país.

A vida é mesmo injusta.

Fiz de tudo para irritá-los (estou falando dos meus pais), falando que o Harry vinha me buscar no CARRO dele (mas claro que não era bem assim; o John é que vinha dirigindo já que o Harry, com 17 anos, não tinha idade para ter carteira de motorista no Distrito de Columbia). Daí observei que iríamos comer SOZINHOS em algum lugar antes da festa (de novo, não era totalmente verdade, já que os caras do Serviço Secreto iam nos acompanhar), já que o Harry tinha sugerido, quando saíamos do ateliê da Susan Boone, que fôssemos comer alguma coisa antes da festa.

Mas nem a minha mãe nem o meu pai morderam a isca. O negócio é o seguinte: só porque o cara é o primeiro-filho, ou qualquer coisa assim, eles confiam nele completamente! Nem em um milhão de anos eles teriam deixado a Lucy ir a uma festa com o Draco (não sem uma briga gigante antes). A única razão por que eles cederam dessa vez e a deixaram ir é porque sabiam que eu também ia estar lá... bom, com o Harry e o Serviço Secreto. Mas, mesmo assim, Eu! A irmã menor dela! Eu sou supostamente boazinha! Apesar de tudo que eu tenho feito para convencê-los do contrário (tipo só me vestir de preto durante um ano, ou aquela história toda da minha produtora clandestina de desenhos de celebridades), eles insistem em achar que eu sou uma pessoa responsável!

E vou dizer uma coisa: esse negócio de eu ter salvado a vida do presidente e de ser nomeada como embaixadora teen da ONU também não ajudou em nada.

Estava pensando seriamente em repetir no alemão, só para me vingar deles.

Mas, do jeito que eles andavam agindo ultimamente, acho que eles só iam ficar tipo: "A Mione tirou zero em alemão, que coisa mais adorável!"

De qualquer maneira, na noite da festa, a minha mãe eo meu pai cumpriram a ameaça e já estavam esperando na sala, com a máquina fotográfica em punho, quando o Harry tocou a campainha, às sete horas em ponto. A Luna já tinha chegado e partido, depois de a Lucy transformá-la em uma cópia das garotas que habitavam as páginas da Seventeen. Ela ia se encontrar com o Ron no Fliperama Beltway, e daí os dois iam nos encontrar na casa da Gina, na hora da festa.

-Por favor - cochichei, aflita, para Harry quando abri a porta. - Não ligue para eles. Eles não sabem o que estão fazendo.

O Harry, que estava de jeans e com uma malha preta, ficou um pouco assustado, mas depois que entrou em casa e viu meus pais, relaxou.

-Ah - fes ele, como se os pais das garotas com quem ele sai sempre aparecessem com câmeras compactas nas mãos... bom, talvez aparecessem mesmo. - Oi, Sr. e Sra. Granger.

E se a minha mãe e o meu pai já não fossem o bastante, indo de um lado para o outro com lentes zoom em punho, o Manet, todo animado com a perspectiva de conhecer alguém novo, veio correndo como louco da cozinha (com todos os seus quatro quilos) e imediatamente enfiou o focinho na virilha do Harry. Eu tentei puxar o cachorro para longe, pedindo desculpas pelo comportamento dele.

-Tudo bem - disse Hary, dando alguns tapinhas carinhosos na cabeça desgrenhada do Manet. - Eu gosto de cachorro.

Daí a Lucy tinha que entrar em cena, flutuando escada abaixo toda vestida para a festa, como se achasse que era alguma atriz de novela famosa ou qualquer coisa assim, e daí, mandando:

-Ah, Harry, é você. Achei que era o meu namorado, o Draco. Claro que vocês dois vão se conhecer na festa. Acho que vocês vão se dar superbem. Ele também é artista.

Depois foi a vez de a Rebecca aparecer, olhar para o Harry e para mim e mandar:

-Ah, é. Definitivamente frisson - elogo subiu a escada e foi para o quarto dela, provavelmente para fazer mais uma tentantiva de entrar em contato com a nave-mãe.

Se a minha família tivesse tentando me envergonhar, o máximo possível, de propósito, acho que não teria feito pior.

Quando conseguimos escapar para a segurança da varanda, o Harry olhou para mim e perguntou:

-O que é frisson?

-Ah, hahaha - fiquei rindo igual a uma tonta. - Não sei. Deve ser algo que ela aprendeu na escola.

Harry fez uma careta de leve.

-Eu vou à mesma escola que ela, e nunca ouvi falar disso.

Para distraí-lo, caso ele estivesse pensando em chegar em casa e ir olhar a palavra no dicionário, dei um gritinho quando vi o carro dele. Apesar de eu não ter aceitado os conselhos da Lucy a respeito do meu visual (estava usando minhas roupas mesmo, uma saia preta comprida que ia até onde começavam os meus coturnos com margaridas, combinando com uma malha que, apesar de ter decote V, também era preta), lembrei alguma das observações dela, uma das quais fora: "Aja como se o carro dele fosse o máximo. Os caras têm uma relação esquisita com os carros dele."

Só que eu não tenho bem certeza se isso vale para todos os caras, porque depois de eu ter um ataque dizendo que adorava o sedã de quatro portas dele, o Harry ficou olhando para mim com um ponto de interrogação no olhar.

-Hum... não é meu - disse. - É do Serviço Secreto.

-Ah - respondi. E daí reparei que o John, da aula de arte, estava parado ao lado do carro. E também que outro carro quase idêntico estava parado logo atrás do primeiro, com mais dois agentes do Serviço Secreto dentro.

Como achei que algum tipo de explicação se fazia necessária, afirmei:

-A minha irmã disse que os caras gostam quando a gente elogia o carro deles.

-É mesmo? - Harry disse, sem parecer muito surpreso. - Bom, ela parece ser alguém que sabe dessas coisas.
Foi nesse momento que um repórter que nenhum de nós tinha notado pulou de trás dos arbustos e nos atacou: "Hemione!Harry! Aqui!", e tirou umas mil fotos.

Não deu para ver exatamente o que aconteceu em seguida, já que todos aqueles flashes me deixaram cega durante alguns segundos, mas ouvi uma voz firme dizer: "Isso aqui fica comigo", seguindo por um grunhido, um barulho de coisa quebrada e o fim dos flashes.

Quando voltei a enxergar, percebi que a voz firme pertencia a um agente do Serviço Secreto (não o John, um outro) que voltava para o carro estacionado atrás do do Harry. O repórter estava a poucos metros de distância, na calçada, com ar desolado, segurando uma câmera despedaçada. Ele murmurava alguma coisa a respeito de liberdade de imprensa... mas não muito alto, de modo que o agente do Serviço Secreto não podia ouvi-lo.

John abriu a porta de trás do primeiro sedã e disse, todo arrependido:

-Desculpem-me por esse incidente.

Acomodei-me no banco de trás sem dizer nada, porque, afinal, o que é que eu podia dizer?

O Harry entrou pelo outro lado e fechou a porta. O interior do carro do Serviço Secreto era muito limpo. Tinha cheiro de novo. Eu detesto cheiro de carro novo. Pensei em abrir a janela, mas estava bem frio lá fora.

Daí o John se acomodou atrás da direção e checou:

-Tudo certo aí?

Harry respondeu:

-Comigo, tudo certo - daí, olhou para mim. - E você, tudo bem?

-Hum... - respondi. - Tudo.

-Está tudo certo por aqui - confirmou Harry.

E o John respondeu:

-Então, vamos lá.

E começamos a andar. Fiquei com o rosto afastado da janela, porque percebi que os meus pais tinha saído à varanda da frente e estavam parados lá, acenando para nós. Um repórter, cuja câmera não tinha sido despedaçada, tirou uma foto da cena, já que tirar fotos do Harry e de mim era obviamente proibido. Torci para que minha mãe e meu pai ficassem felizes de ver uma fotona colorida dele no USA Today de amanhã de manhã ou qualquer outro jornal.

Dentro do carro, estava o maior silêncio. Um silêncio excessivo. "Só tem três assuntos que você pode conversar com os caras", a Lucy tinha me instruído anteriormente, naquele mesmo dia, apesar de eu não a ter consultado mesmo a esse respeito. "E essas coisas são:

Um: ele mesmo.

Dois: você e ele.

Três: você mesma.

"Comece falando a respeito dele. Daí, lentamente, introduza o tema relativo a você e ele. Depois, faça com que a conversa se desvie para você. E fique por aí."
Mas, por algum motivo, eu não conseguia falar nada daquelas coisas que a Lucy tinha me aconselhado a dizer. Tipo assim, a primeira coisa, de elogiar o carro dele, não tinha dado nada certo. Eu percebi que, ao sair com o filho do presidente, eu estava penetrando em território desconhecido, do tipo que a Lucy nunca tinha explorado. Eu estava por minha própria conta. Era um pouco assustador, mas achei que conseguiria me virar.

Tipo assim, ele não era exatamente o Draco.

-Hum... - comecei, quando o John virou na rua 34. - Desculpa pelos meus pais.

-Ah - respondeu Harry, rindo. - Sem problemas. Então, para onde a gente vai? O que você está a fim de comer?

Como eu sempre só estou a fim de comer uma coisa (hambúrguer), não tinha muita certeza a respeito de como responder à pergunta dele. Por sorte, o Harry continuou falando:

-Eu fiz reserva em alguns lugares. Tem o Vidalia. Acho que é bem legal. E o Four Seasons. Eu não sabia se você já tinha ido lá. Ou então tem o Kinkead, apesar de eu saber sua opinião sobre peixe.

Enquanto ia ouvindo, meu pânico ia crescendo. Reserva? Ele fez reserva? Eu nunca achava nada que tivesse vontade de comer em cardápios de restaurantes que exigem reserva.

Eu não sei se o Harry foi capaz de perceber o temor no meu rosto, ou se foi o meu silêncio que entregou tudo. De qualquer modo, ele mandou:

-Ou a gente pode esquecer as reservas e ir comer uma pizza ou qualquer coisa assim. Tem um lugar que eu ouvi dizer que todo mundo vai. A pizzaria Luigi's, ou outra qualquer?

A Luigi's era o lugar onde a Lucy e a turma dela estariam antes da festa. Ao mesmo tempo em que eu sabia que iríamos ver toda aquela gente em algumas horas, de qualquer jeito, acho que não dava para encarar ficar sentada em uma mesa com o Harry na frente de todos eles, sabendo o tempo todo que o restaurante inteiro estava de olho em nós, falando de nós. Eu duvidava de que seria capaz de engolir qualquer coisa. Além disso, o Draco estaria lá. Como é que eu iria prestar atenção em qualquer coisa que o Harry dissesse se o Draco estivesse em qualquer lugar nas redondezas?

-Ou então a gente pode simplesmente comer um hambúrguer em algum lugar... - sugeriu Harry, olhando para mim de novo.

-Para mim, parece bom - respondi, esperando soar bem desencanada.

Ele me deu um daqueles sorrisinhos misteriosos.

-Então vamos comer hambúrguer - resolveu. - John, vamos para o Jake's. E você pode colocar um som, por favor?

John respondeu:

-Claro - e apertou um botão no painel.

E aí, a voz da Gwen Stefani encheu o carro.

Do Doubt. O Harry era fã do No Doubt.

Eu deveria saber, claro. Tipo assim, qualquer pessoa que gosta de Reel Big Fish tem que gostar de No Doubt. É tipo uma lei.

Mesmo assim, fiquei em estado de choque quando percebi que o Harry tinha mandado colocar a Gwen no som do carro. Porque, sabe como é, se eu tivesse um carro, é exatamente isso que estaria no som. A Gwen, tipo assim.

E a coisa mais esquisita de todas era que o meu coração tinha feito aquela coisa de novo. Fala sério. Aquele pulinho, assim que ouvi a voz da Gwen. Só que não por causa da Gwen, sabe como é. Não, foi porque eu percebi que o Harry gostava da Gwen. Será que era disso que a Rebecca estava falando? Será que frisso era isso?

Mas como é que eu podia sentir frisson por uma pessoa quando o meu coração pertencia a outra? Não fazia o menor sentido. Para começar, a única razão por que eu tinha convidado o Harry tinha sido para deixar a Luna feliz. E talvez para deixar o Draco com ciúme. Tipo assim, eu era completa e irrevogavelmente apaixonada pelo namorado da minha irmã, que um dia perceberia que eu, e não a Lucy, sou a garota certa para ele.

Então, que história de frisson era essa?

Achei que, se eu ignorasse, aquilo iria embora. Então, foi o que comecei a fazer. E sabe o quê? Por um tempo, fiquei achando que estava dando certo. Tipo assim, não que a gente não tenha se divertido nem nada assim. O Jacke's, o lugar em que fomos jantar, era total o tipo de lugar de que eu gosto. Era no bairro do Foggy Bottom, com mesa de superfície pegajosa e luz fraca. Ninguém lá deu a mínima para o fato de eu ser a garota que tinha salvado o presidente e que o Harry era filho dele. Na verdade, acho que ninguém chegou a olhar para a gente, a não ser a garçonete e, claro, John e os seus agentes do Serviço Secreto, que se sentaram em uma mesa um pouco afastada da nossa.

E apesar de eu estar preocupada com o que dizer, descobri que não preciso prestar a mínima atenção às regras da Lucy. O Harry começou a me contar umas histórias engraçadas a respeito das coisas malucas que as pessoas que visitam a Casa Branca esquecem por lá (tipo aparelhos ortodônticos e, uma vez, uma calça de veludo cotelê) e, depois disso, a conversa simplesmente fluiu. E quando os hambúrgueres chegaram, eram queimadinhos do lado de fora, bem do jeito que eu gosto, e ninguém tinha se atrevido a colocar qualquer verdura ou outra coisa, tipo tomate, cebola e alface, perto da carne. As batatas também eram do tipo crocrante, não daquele tipo oleoso e mole que tem um gosto horrível de batata.

Daí o Harry me contou uma história sobre quando ele era pequeno e a mãe e o pai dele pediam para ele colocar a mesa e, para fazer piada, ele colocava o garfão e a colherona de servir salada em um dos lugares.

E ele disse que os pais dele riam toda vez, apesar de ele fazer aquilo praticamente toda noite.

Inspirada nisso, contei a ele a respeito daquela vez no Marrocos em que tentei jogar os cartões de crédito do meu pai na privada. Que é uma coisa que, para falar a verdade, eu nunca contei a ninguém sem ser a Luna. Não era tão fofa quanto a história do garfão e da colherona, mas era tudo que eu tinha.

E daí o Harry me disse que tinha ficado muito mal de ter que abandonar os amigos e se mudar para Washington D.C. e que detestava a Horizon, onde todo mundo era supercompetitivo e toda a ênfase era dada à ciência, e não à arte, e que as pessoas que gostavam de desenhar, como ele, eram menosprezadas. E eu entendi exatamente o que ele queria dizer com aquilo, a única diferença é que na John Adams só se fala de esportes.

Daí eu contei a ele que tive de ir à fonoaudióloga e que todo mundo achava que eu estava fazendo aula de reforço. E daí, por algum motivo, também contei a ele sobre os desenhos de celebriadades, e como tinha sido por causa deles que tirei uma nota baixa em alemão e fui obrigada a ir à aula da Susan Boone.

Foi a certa altura dessa conversa que o joelho do Harry encostou no meu, por acaso, abaixo da mesa. Ele pediu desculpas e afastou a perna. Daí, uns cinco munutos depois, aconteceu de novo.

Só, que dessa vez, ele deixou a perna lá mesmo. Nem pediu desculpas. Eu não sabia o que fazer. A Lucy não tinha incluído isso na lista de coisas que poderiam acontecer.
Mas percebi que o frisson começava a voltar. Tipo, de repente, eu tomei consciência do fato de que o Harry era um garoto. Tipo assim, claro que eu sempre soube que ele era um garoto, e também que era bem bonito. Mas, de algum modo, quando o joelho dele encostou no meu por debaixo da mesa (e ficou lá, encostado) eu tomei consciência, mesmo, de que ele era um cara.

E, de repente, fiquei envergonhada e não conseguia encontrar nada para dizer... o que foi bem esquisito porque, tipo, dois minutos antes daquilo, eu não estava tendo problema nenhum naquela aspecto. E também não conseguia mais olhar nos olhos dele. Não sei por quê, mas era tipo como se eles fossem verdes demais, ou qualquer coisa assim. Além disso, de repente eu comecei a sentir calor, apesar de a temperatura estar ótima dentro do restaurante.

Eu não conseguia entender o que estava acontecendo comigo. Só sabia que, antes do joelho dele encostar no meu, nada disso estava rolando. Então eu me arrumei na cadeira, achando que se eu desse um basta no, sabe como é, contato, as coisas ficariam melhores.

E meio que ficaram, mas acho que não muito, já que o Harry olhou para mim (sem nenhum sorrisinho secreto no rosto), e mandou:

-Tudo bem com você?

-Claro - respondi com uma voz mais aguda do que o meu normal. - Por quê?

-Sei lá - deu de ombros, aqueles olhos verdes examinando o meu rosto de um jeito que eu achei infinitamente alarmante. - Você está meio... corada.

Foi aí que eu tive a brilhante idéia de olhar para o meu Swatch de sereia e dizer:

-Ah, caramba, olha só que horas são! Precisamos ir, se quisermos chegar à festa a tempo.

Eu meio que fiquei com a sensação de que o Harry gostaria de pular toda a parte da festa. Mas não eu. Eu queria chegar logo lá. Porque, na festa, eu estaria a salvo do frisson.

Porque o Draco estaria na festa.

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