Capitulo 11
Harry não conseguiu chegar de volta à Fazenda Potter antes de quatro e meia da tarde. Estava cansado. Arthur Weasley, além de oferecer-lhe um almoço farto e demorado, insistira em discutir todos os aspectos e detalhes financeiros e legais sobre a posse da fazenda. Nada ficara de fora na conversa, e a cabeça de Harry estava como que submersa, com tantos fatos e estimativas. O tamanho exato da área, em acres, o valor da produção e das safras, o número de cabeças de gado, o valor dos chalés e das construções utilitárias, o estado de conservação dos galpões e celeiros. Tudo isso era necessário, é claro, mas Harry achou a conversa torturante, e fez o longo caminho de volta para casa, através da tarde que começava a escurecer, em um estado de inevitável depressão. Começava a compreender a verdade; ao vender Potter, mesmo para Arthur, era inegável que estava desistindo de uma parte de si mesmo, e cortando todas as últimas conexões que o levavam de volta aos tempos felizes da juventude.
O conflito interior acabara por drenar-lhe toda a energia. Sua cabeça doía, e ele não conseguia pensar em nada além do santuário representado pela sua casa, o conforto de sua poltrona, a reconfortante lareira e, possivelmente, uma tranqüilizadora xícara de chá.
A casa jamais lhe parecera tão segura antes, tão acolhedora. Contornando o caminho que passava pela entrada principal no Land-Rover e levando-o até a garagem, onde o deixou estacionado, entrou finalmente em casa pela porta da cozinha. Encontrou a Senhora Cooper passando roupas, mas com o olhar pregado na porta. Quando Harry apareceu, ela soltou um suspiro de alívio e colocou o ferro de volta no suporte, com uma pancada grave e pesada.
- Ah, Harry, estava rezando para que fosse você! Ouvi o som do carro e estava ansiosa para que você chegasse.
Algo em seu rosto fez Harry perguntar, com cuidado:
- Aconteceu alguma coisa?
- É a irmã do menino... Saiu para dar uma volta, mas não voltou até agora, e já está quase anoitecendo.
Harry ficou ali de pé, ainda com o sobretudo, digerindo lentamente essa pequena informação pouco bem vinda.
- Quando foi que ela saiu?
- Logo depois do almoço. Não que ela tenha comido alguma coisa, ficou apenas ciscando no prato, aqui e ali. Toda a comida que ela botou para dentro não dá para manter sequer uma formiguinha viva.
- Mas já são... mais de quatro e meia.
- Isso mesmo.
- Onde está Jody?
- No quarto dos brinquedos. Está bem, não parece preocupado. Acabei de levar chá para aquele anjinho.
- Mas para onde é que ela foi? - perguntou Harry, franzindo a testa.
- Não me disse. "Vou dar apenas uma volta por aí", foi tudo o que falou. - O rosto da Senhora Cooper estava marcado pela ansiedade. - Você acha que alguma coisa pode ter acontecido com ela?
- Não me surpreenderia! - disse Harry, com um tom amargo. - É tão tola que seria capaz de conseguir se afogar em uma poça d'água.
- Ah, pobrezinha...
- Pobrezinha nada!... Um tremendo aborrecimento, é isso que ela é - desabafou, de forma brusca.
Foi direto até a escada dos fundos, pensando em falar com Jody, para ver se ele sabia de mais alguma coisa. Nesse momento, porém, o telefone tocou. O primeiro pensamento de Harry foi o de que, finalmente, as linhas telefônicas haviam sido consertadas. A Senhora Cooper, porém, colocou as mãos sobre o coração e falou:
- Talvez seja a polícia!...
- Não, provavelmente não é nada disso - disse Harry, que mesmo assim se movimentou mais rapidamente do que de hábito, saindo da cozinha e indo até a biblioteca para responder ao chamado do telefone.
- Potter! - atendeu ele, quase esbravejando.
- Por favor, é da Fazenda Potter? - A voz era feminina e parecia muito refinada.
- Sim, é daqui, sim. É Harry Potter quem está falando.
- Ahn... Senhor Potter, aqui é a Senhora Henderson. Estou falando do Hotel Strathcorrie.
- Sim?
- Temos uma jovem aqui em nosso hotel. Veio procurar pelo irmão, que trabalhava em nosso estabelecimento...
“Trabalhava?...” pensou Harry.
- Sim.
- Ela nos disse que está como hóspede na Fazenda Potter.
- Sim, é verdade.
- Bem, eu acho que talvez fosse aconselhável o senhor vir buscá-la, Senhor Potter. Ela não parece estar nem um pouco bem de saúde. Desmaiou e depois acabou... passando muito mal do estômago. - Evitou falar “vomitou”, como se considerasse isso muito ofensivo.
- Como foi que ela chegou até Strathcorrie?
- Veio caminhando parte do caminho, conforme explicou, e depois pegou uma carona na máquina de limpar neve.
Isso significava que, pelo menos, a estrada até lá estaria desimpedida.
- Onde é que ela está neste momento?
- Eu a coloquei para repousar um pouco. Parecia que não estava nada bem.
- Ela sabe que a senhora me telefonou?
- Não. Achei melhor não contar a ela.
- Fez bem. Não conte mesmo. Não diga nada. Simplesmente a mantenha aí em seu hotel até eu chegar, por favor.
- Claro, Senhor Potter. Sinto muito.
- Não há por que se sentir desconfortável. A senhora fez muito bem em ter ligado. Estávamos todos preocupados com ela por aqui. Muito obrigado. Estarei aí o mais rápido possível.
Hermione estava dormindo quando ele chegou. Na verdade, não exatamente dormindo, mas suspensa naquele delicioso estado entre estar dormindo e estar acordando; quente e confortável, sob o toque macio dos cobertores. Esse estado durou apenas até o momento em que o som grave da voz de Harry cortou o seu devaneio como uma faca. Em um segundo, se sentiu instantaneamente acordada, totalmente ligada e com a mente alerta. Lembrou-se de ter dito que tinha vindo de Potter e xingou sua língua comprida. A dor, no entanto, desaparecera, e o sono a refrescara, de modo que, quando Harry Potter, sem sequer dar uma batidinha educada na porta, irrompeu no quarto, Hermione já estava preparada para ele, com todas as suas defesas levantadas.
- Ora, que pena!... - disse ela, tentando parecer casual. - Você teve todo esse trabalho de vir até aqui e no entanto não há nada de errado comigo. Veja só! - E se sentou na cama. - Estou perfeitamente bem! - Harry estava usando um terno com o sobretudo cinza e uma gravata preta. Isso a fez lembrar de imediato de seu irmão morto, e a levou, de repente, a começar a falar um pouco mais depressa. - Foi apenas uma caminhada muito longa e cansativa. Quer dizer, não foi assim tão longa, porque peguei uma carona com a máquina limpa-neve no meio do caminho. - Ele bateu a porta do quarto dela, com força, e foi até a grade na beira da cama.
- Você trouxe Jody com você? - perguntou ela, querendo parecer animada. - Porque nós podemos ficar aqui. Há quartos vagos, e seria melhor se esperássemos por Angus aqui, até ele voltar. Ele está fora, sabe?... Mas é só por mais alguns dias. Saiu com uma senhora americana que...
- Cale a boca! - cortou Harry. Ninguém jamais falara nesse tom de voz com Hermione, que se calou imediatamente. - Eu disse a você para ficar sentadinha me esperando em Potter, até eu voltar.
- Mas eu não pude fazer isso.
- E por que não?
- Porque Jody me contou tudo a respeito do seu irmão. Ele soube pela Senhora Cooper. Foi tão terrível que tivéssemos aparecido assim de repente, logo nessa hora... Sinto terrivelmente... Eu não sabia...
- Como poderia saber?
-... mas em um momento assim...
- Não faria diferença, de um jeito ou de outro - disse Harry, bruscamente. - Como é que você está se sentindo agora?
- Perfeitamente bem.
- Mas você desmaiou!... - Isso soava como uma acusação.
- Pois é! Uma coisa tão boba. Eu nunca desmaio...
- Você nunca come, esse é que é o problema. E, se você escolheu ser assim tão tola, merece desmaiar. Agora pegue o casaco, que vou levá-la imediatamente para casa.
- Mas eu já disse que podemos muito bem ficar hospedados neste hotel. Vamos esperar por Angus aqui.
- Vocês vão esperar por Angus em Potter! - E foi até a cadeira para pegar a capa de chuva.
- E se eu não quiser ir? - Hermione franziu a testa. - Não sou obrigada a voltar com você.
- E se você fizer pelo menos uma vez na vida aquilo que lhe mandam, hein?... E se você ao menos esta vez pensar em outras pessoas além de si mesma? A Senhora Cooper estava branca como um papel quando eu cheguei, imaginando toda espécie de desgraças terríveis que poderiam ter acontecido com você.
- E Jody? - perguntou ela, com uma súbita fisgada de culpa.
- Ele está bem. Deixei-o assistindo televisão. E então, você vem ou não?
Não havia nada a fazer. Hermione levantou-se da cama, deixou que Harry a ajudasse a colocar a capa, encaixou os pés dentro das imensas botas de borracha e depois o seguiu documente escada abaixo.
- Senhora Henderson!
Surgindo do escritório, ela permaneceu atrás do balcão de forma profissional e adequada a uma recepcionista.
- Ah, o senhor encontrou a menina, Senhor Potter, que bom! - Levantou a tampa do balcão e saiu para juntar-se a eles. - Como está se sentindo agora, querida?
- Estou bem. - E acrescentou, como se tivesse lembrado depois. - Muito obrigada! - Apesar de ser difícil perdoá-la pelo fato de ter telefonado para chamar Harry.
- Não foi nada. E quando Angus voltar...
- Avise-lhe que a irmã está em Potter - completou Harry. - Por favor.
- É claro. Fico feliz por ver que você está se sentindo melhor.
Hermione foi andando para a porta. Atrás dela, Harry agradeceu à Senhora Henderson mais uma vez, por tudo. Logo depois, eles já estavam juntos do lado de fora do hotel, iluminados pelo crepúsculo frio, na temperatura suave, embora enfrentando um forte vento. Hermione já estava com o pé sobre o apoio da porta, pronta para entrar no Land-Rover e sentindo-se derrotada.
Fizeram todo o caminho de volta em silêncio. O prometido degelo transformara a neve em lama derretida e a estrada acima do morro estava, comparativamente, mais limpa. Acima deles, imensas nuvens cinza iam sendo carregadas para longe por um forte vento oeste que deixava espaços de céu brilhante com cor de safira. Através da janela aberta do Land-Rover entrava o cheiro de mato e de turfa úmida. Pequenos maçaricos levantavam vôo nas margens cheias de juncos de um lago próximo, e de repente começou a parecer possível que as árvores nuas estariam em breve dando brotos, e a tão aguardada primavera chegaria, afinal.
Hermione se lembrou de repente daquela noite em Londres, a caminho do Arabella's no carro de Neville. Lembrou-se das luzes da cidade refletidas no céu, com um tom alaranjado, e de como ela baixara o vidro da janela e deixara o vento soprar pelos seus cabelos, desejando estar no campo. Isso tudo acontecera há apenas três ou quatro dias e, no entanto, parecia que já se passara uma vida inteira. Como se fosse algo que tivesse acontecido com outra pessoa, em outra época completamente diferente.
Uma ilusão. A realidade é que ela era Hermione Granger, com uma centena de problemas pendentes diante de si. Era Hermione Granger e teria que voltar para Londres, antes que acontecesse um escândalo. Era Hermione Granger e estava de casamento marcado com Neville Logbotton. Na próxima terça-feira.
Essa era a realidade dela. Para tornar a imagem ainda mais verdadeira, pensou na casa em Milton Gardens, abarrotada com os presentes de casamento que teriam chegado. O vestido de noiva, pendurado no armário, esperando por ela. Os organizadores do bufê chegando com suas mesas dobráveis e toalhas brancas duras, engomadas, em tecido adamascado. Pensou nas taças de cristal transparentes, empilhadas como bolhas de sabão, nos buquês imensos de gardênias, no espocar das rolhas saindo das garrafas de champanhe e nos clichês dos discursos. E lembrou também de Neville, que tinha tanta consideração por ela, aquele Neville tão organizado, tão correto, que jamais levantara, mesmo de leve, a voz para ela, e muito menos a mandaria calar a boca.
Era isso que ainda doía. Indignada com a lembrança desse momento, ela deixou seus ressentimentos se acumularem. Ressentimento com Angus, por tê-la deixado na mão justamente no momento em que mais precisava dele. Estava circulando por aí em um carro, trabalhando para uma madame americana velha e gorda, sem deixar endereço, sem data de retorno, sem nada definido. Ressentimento com a Senhora Henderson, com seus óculos cheios de strass e seu ar de servil eficiência, ligando para Harry Potter, justamente quando a última coisa que Hermione queria era que ele continuasse interferindo. E, por fim, ressentimento com o próprio Harry, um homem autoritário que resolvera assumir todos os seus problemas, muito mais do que o simples dever de hospitalidade poderia justificar.
O Land-Rover seguia seu caminho, já no alto do monte, e a estrada à frente era agora toda em descida, e os levaria de volta direto a Potter. Harry reduziu o motor para uma marcha mais baixa e os pneus "agarraram" com mais força na neve que derretia. O silêncio entre eles era pesado, impregnado de desaprovação. Seria bom se ele dissesse algo. Qualquer coisa. Toda a mágoa dela se concentrou em um foco de irritação que era dirigido agora unicamente a ele. A sensação foi aumentando, até que não podia mais ser contida, e ela falou afinal, de modo gélido:
- Isso é ridículo!
- O que é ridículo? - A voz fria dele combinava com a dela.
- Toda esta situação. Tudo.
- Eu não sei o suficiente a respeito desta "situação", como um todo, para fazer algum comentário. Na verdade, tirando o fato de saber que você e Jody apareceram de repente lá em Potter, no meio de uma nevasca, continuo completamente no escuro.
- É que não é da sua conta! - disse Hermione, sentindo a frase sair mais rude do que planejara. Por quê diabos aquele homem tinha o poder de tirar-lhe do sério?
- Mas é da minha conta impedir que o seu irmão não seja obrigado a sofrer mais ainda, por outra das suas idiotices.
- Se Angus estivesse em Strathcorrie...
- Isso é hipotético!... - cortou ele, sem a deixar terminar a frase. - Ele não estava lá! E eu estou com a ligeira e estranha impressão de que você não ficou assim tão surpresa com esse fato. Que tipo de sujeito ele é, afinal? - Hermione ficou calada, sem responder, mantendo o que ela imaginava ser um silêncio digno. Harry, então, disse com um tom de voz convencido de quem já compreendera toda a situação:
- Já entendi.
- Não, você não entendeu, não! Você não sabe nada a respeito dele. Você nem ao menos tentaria entender.
- Ora, cale a boca! - disse Harry, de forma imperdoável, pela segunda vez. Hermione virou o rosto para o outro lado e ficou olhando para fora da janela, na tarde que escurecia. Naquela posição, ele não poderia ver nem imaginar as fisgadas brilhantes das lágrimas que começavam a aparecer em seus olhos.
Sob a luz do anoitecer a casa parecia altaneira, com luzes amareladas filtradas pelas cortinas cerradas. Harry parou o Land-Rover na porta e saltou. Devagar e com alguma relutância, Hermione desceu do carro também, seguindo-o pelos degraus acima e passando por ele, que ficou de lado mantendo a porta aberta para que ela entrasse. Sentindo-se como uma criança desobediente que sofrera uma reprimenda, nem sequer olhou para ele. A porta se fechou com um som seco às suas costas e, de repente, como se o barulho tivesse sido um sinal, a voz de Jody surgiu vinda de algum lugar. Uma porta se abriu, seus passos chegando pelo corredor que vinha da cozinha. Apareceu correndo e então parou petrificado quando viu que apenas duas pessoas estavam ali. Seus olhos correram para a porta atrás de Caroline e depois de volta para seu rosto. O menino estava completamente rígido.
- E Angus?... - perguntou o menino, que estivera esperando todo o tempo que Hermione trouxesse Angus para Potter. Ela então explicou, odiando-se por ter que falar isso:
- Angus não estava lá.
- Você não o encontrou na cidade? - perguntou Jody de forma casual, após um pequeno silêncio.
- Bem, ele esteve lá, trabalhando no hotel. Mas teve que viajar por alguns dias. - E continuou, tentando parecer confiante: - Mas ele vai voltar, em um ou dois dias. Não há com o que se preocupar.
- Mas a Senhora Cooper disse que você estava doente.
- Não, não estou - disse Hermione, depressa.
- Mas ela falou...
- O que está errado com a sua irmã... - interrompeu Harry - é que ela nunca faz o que lhe dizem e jamais se alimenta o suficiente. - Parecia profundamente irritado. Jody o observou enquanto desabotoava o sobretudo de tweed e o pendurava na ponta do corrimão da escada. - Onde está a Senhora Cooper?
- Na cozinha.
- Vá até ela e diga que está tudo bem. Trouxe Hermione para casa e ela agora vai direto para a cama. Vai jantar e amanhã estará nova em folha. - Vendo que Jody ainda hesitava, Harry foi até ele, direcionou o seu corpo para a cozinha e deu-lhe um pequeno empurrão de incentivo na direção de volta de onde ele viera. - Pode ir. Não há motivo para preocupação. Eu lhe garanto.
Jody saiu. A porta da cozinha se abriu e fechou, a distância, e eles ouviram sua voz ao longe dando a mensagem à Senhora Cooper. Harry virou-se para Hermione.
- E agora... - disse ele, de uma forma falsamente agradável. - Você vai subir até o seu quarto, se enfiar na cama e esperar pela Senhora Cooper, que vai lhe levar algo para comer em uma bandeja. É muito simples.
O tom em sua voz reacendeu em Hermione uma antiga tendência para ser teimosa. Uma teimosia que fizera, de vez em quando, com que ela conseguisse que as coisas corressem do seu modo, na infância. Foi o que tinha derrubado as objeções de sua madrasta quando ela quis entrar para a escola de teatro. Neville, provavelmente, reconhecera bem cedo essa característica sua, pois sempre mostrara muito tato na sua maneira de lidar com ela, usando a persuasão apenas até chegar a um certo ponto, fazendo sugestões casuais e sempre a levando por um cordão fino, quando ela se recusava a ser obrigada a fazer algo que não desejava.
Agora, ela estava pensando seriamente na possibilidade de fazer uma terrível cena final desse tipo, ali. Como Harry, porém, continuava parado, esperando, implacavelmente educado, sua decisão começou a enfraquecer. Tentando achar desculpas para a sua rendição, disse para si mesma que estava cansada, cansada demais para mais brigas. Além disso, a imagem da cama, o calor e a privacidade do quarto lhe pareceram, de repente, extremamente convidativos. Sem dizer uma palavra, afastou-se dele e subiu as escadas, um degrau de cada vez, lentamente, com a mão se arrastando inerte por toda a extensão do corrimão comprido e bem-polido da escadaria.
Após ela subir, Harry voltou à cozinha, onde encontrou a Senhora Cooper preparando a janta para Hermione e Jody, sentado à mesa limpa e bem-escovada, tentando montar um quebra-cabeça antigo que, quando pronto, formaria a figura de uma antiga locomotiva a vapor. Harry, olhando para o brinquedo, lembrou-se de quando o montara, com sua mãe e Charles ajudando, tantos anos atrás. Matando o tempo através de tardes de temporal, esperando a chuva passar para que eles pudessem sair e brincar lá fora novamente. Debruçando-se sobre o ombro de Jody, disse:
- Está fazendo um grande trabalho!
- É... Só que não consigo encontrar aquela peça ali, com o azul do céu e um pedacinho na ponta, com galhos. Se eu conseguisse encontrá-la, poderia juntar estes dois pedaços grandes.
Harry se curvou e começou a procurar pela peça, que deveria estar escondida bem no meio das outras. Do fogão, a Senhora Cooper perguntou:
- E a jovem, está bem, afinal?
- Sim, está melhor. Já foi para a cama. – Harry não levantou a cabeça.
- O que aconteceu com ela? - Era Jody quem perguntava.
- Ela desmaiou e depois acabou vomitando.
- Eu odeio quando vomito.
- Eu também... - riu Harry.
- Estou coando uma pequena tigela de sopa bem rala para ela - disse a Senhora Cooper. - Quando a gente não está bem do estômago, não deve comer nada muito pesado.
Harry fez que sim com a cabeça, concordando que, de fato, a gente não deve. Fez então aparecer do nada a peça que faltava, e a entregou a Jody.
- Será que é esta? - perguntou.
- É ela mesmo - Jody ficou encantado com a esperteza de Harry. - Puxa, obrigado. Eu já tinha olhado para essa peça um monte de vezes e não percebi que era a certa para juntar aqueles pedaços. - Olhou para cima e sorriu. - Ajuda bastante quando há duas pessoas trabalhando juntas na montagem, não é? Você vai continuar me ajudando?
- Bem, neste instante pretendo tomar um banho e depois preparar um drinque. Mais tarde, jantamos juntos, você e eu. Depois da janta, então, vamos ver se conseguimos terminar o quebra-cabeça.
- Ele era seu?
- Era... Era meu ou do Charles... Não me lembro de quem era.
- É um tipo engraçado de trem.
- Locomotivas a vapor eram esplêndidas. Faziam um barulho magnífico.
- Eu sei. Já vi em filmes.
Harry tomou banho, vestiu-se e já estava a caminho das escadas, indo para a biblioteca em busca do drinque que se prometera, quando se lembrou, sem mais nem menos, de que estava sendo esperado para jantar, naquela mesma noite, em Rossie Hill. O choque da lembrança, entretanto, não foi tão grande quanto o sentimento de surpresa por ter se esquecido do compromisso de forma tão completa. No entanto, apesar do fato de ter visto Arthur Weasley na hora do almoço, e de terem comentado sobre o jantar marcado, os acontecimentos frenéticos do final da tarde e início da noite tinham acabado por levar os planos do compromisso social para longe de seus pensamentos.
E agora já eram sete e meia e ele estava de banho tomado e todo vestido, mas não com uma roupa formal. Usava um suéter velho, de gola pólo, e surradas calças de veludo. Por um momento ele hesitou, mordendo o lábio inferior e pensando no que deveria fazer. Seu pensamento, porém, finalmente pendeu para a imagem de Jody, que tinha passado a tarde toda sozinho, cheio de expectativas, e a quem Harry prometera companhia para a noite e ajuda na montagem do quebra-cabeça. Isso resolvia tudo. Indo até a biblioteca, pegou o telefone e ligou para Rossie Hill. Após um momento, a própria Gina atendeu ao telefone.
- Alô?
- Gina.
- Ah, Harry? Você está ligando para avisar que vai se atrasar um pouco? Olhe, se é por causa disso não se preocupe, porque eu me esqueci de colocar o faisão no forno um pouco mais cedo, e também estou toda atrasada. Além disso...
- Não, eu não liguei para isso - interrompeu ele. - Liguei para cancelar. Não vai dar para eu ir jantar aí.
- Mas... Eu... Papai disse que... - E em seguida numa voz um pouco diferente. - Você está passando bem? - Ela fazia parecer que ele ficara maluco de repente. - Você não está doente, ou algo assim?
- Não, nada disso. Simplesmente eu não vou poder ir. Depois eu explico...
- Por acaso... - começou ela, com a voz subitamente fria... - isso não tem nada a ver com a jovem e o menino que você está hospedando aí em Potter, tem?
Harry ficou surpreso. Ele não comentara nada com Arthur a respeito dos Granger. Não que tivesse a intenção de cancelar o jantar, mas simplesmente porque havia outros assuntos mais importantes a discutir.
- Como é que você soube deles? - perguntou.
- Ah... A velha corrente de boatos que corre pelo vale. Você sabe, a nossa Senhora Douglas é cunhada da Senhora Cooper. Por aqui, não dá para manter nenhum segredo por muito tempo, Harry. Você já devia saber disso depois de tanto tempo.
Ele se sentiu vagamente incomodado, como se ela o estivesse acusando de estar tentando esconder algo.
- Não há segredo algum - respondeu.
- Eles ainda estão aí?
- Sim.
- Hummm... Tenho que ir aí uma hora dessas para investigar tudo isso. É muito estranho.
Ignorando a insinuação em sua voz, ele preferiu encerrar o assunto, dizendo:
- Você me perdoa por ser tão mal-educado esta noite, cancelando tudo assim em cima da hora?
- Não importa. Essas coisinhas sem importância acontecem de vez em quando. Significa apenas que vai sobrar mais faisão para mim e para o papai. Venha outra noite qualquer.
- Se você me convidar.
- Estou convidando agora. - Sua voz ainda estava seca. - Tudo o que você tem a fazer, quando tiver organizado a sua agenda social, é me dar uma ligada avisando o dia.
- Vou fazer isso! - disse Harry.
- Tchau, então.
- Até logo.
Mas antes que o final das palavras de despedida tivessem saído de sua boca, ela já havia desligado. Ficara aborrecida com ele, e com certa razão. Harry pensou, com um pouco de pesar, naquela mesa de jantar cuidadosamente preparada, as velas, o faisão e o vinho.
Um jantar em Rossie Hill não era jamais, em hipótese alguma, algo para ser desperdiçado. Praguejou baixinho, detestando todo o dia que passara, torcendo para que acabasse logo. Serviu-se de um drinque, um pouco mais forte que o usual, adicionou um pouco de soda, entornou um pouco da bebida distraidamente pela garganta e, então, sentindo-se remotamente mais confortado, foi procurar Jody.
Só que não conseguiu chegar até o menino. Em vez disso, encontrou-se no corredor com a Senhora Cooper, que carregava uma bandeja. Havia uma estranha expressão em seu rosto, quase furtiva, e quando ela o viu, seus passos se apressaram tanto, que conseguiu alcançar e passar pela porta da cozinha antes que ele se aproximasse mais.
- O que houve, Senhora Cooper?
Com as costas encostadas na porta de vaivém da cozinha, ela parou, parecendo angustiada.
- A menina não comeu nem uma colherada, Harry.
Ele olhou para a bandeja e levantou a tampa da tigela de sopa. O vapor subiu com um cheiro bom de comida, formando uma nuvem.
- Fiz de tudo, falei o que você tinha dito, mas ela não quis comer nada. Disse que estava com medo de passar mal de novo.
Harry tampou novamente a tigela de sopa, colocou o copo de uísque ao lado e pegou tudo das mãos da Senhora Cooper.
- Vamos resolver esse problema – disse, como o maxilar travado de raiva.
------------------------------------------------------------------------------------------------------
N/A: Agora as coisas começam a esquentar! A Mione tira o Harry do sério, hein? ahuahauhauahua
Vou viajar amanhã e só volto no domingo, portanto, sem atualizações até lá!
Postarei uma nova fic ainda hj, ok? "Algo Maravilhoso"
Bjos e comentem!!
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!