Fato consumado



No abandono do quarto, Gina pensou em sua situação. Vira Harry sair sem pronunciar nenhuma palavra. Tinha pedido que ele fosse embora porque sua presença estava lhe fazendo mal. E como. O dia inteiro ficara na expectativa. Primeiro da chegada de Arlen. Depois na expectativa de rever Harry. Intimamente queria o reencontro, mas ao mesmo tempo o temia. Não sabia qual seria sua reação. No fundo do coração, desejava que ele a procurasse e arranjasse alguma maneira de lhe falar a sós sobre o beijo. Ansiava por ouvir qualquer palavra que lhe desse a idéia de que havia um sentimento. Não um mero jogo de sedução. A razão, no entanto, lhe apontava outro caminho. Após aquele dia não tivera mais contato com o rapaz. O silêncio, portanto, devia ser considerado como resposta. Mas vê-lo aparecer com a namorada tinha sido um duro golpe. De longe, reparara na troca de carinho, nos beijos furtivos, na companhia constante, sem se largarem um instante. Estava clara a resposta. Para piorar, ainda protagonizara uma cena lamentável. “Por que fui desmaiar?”, gemeu.

- Porque você passou o dia inteiro sem comer. E porque faz uma semana que não dorme direito, senhorita! É por isso que desmaiou - bufou a senhora Weasley, que tinha ouvido a filha. - Querida, eu sei que você estava ansiosa pela volta do Arlen, sei que se emocionou muito nesta noite. Foi tudo tão bonito. Mas custava ter comido alguma coisinha? Você não tocou em nada...

Arlen entrou no quarto com o semblante preocupado. Trazia um copo para Gina. Aproximou-se da noiva e pediu que bebesse o líquido. Tinha sido preparado por Ithriel para revigorar a jovem. Ela se sentiu melhor assim que sorveu o último gole. A senhora Weasley pegou o copo e voltou à sala. O elfo segurou as mãos de Gina e as beijou com doçura.

- Depois de ouvir o que sua mãe disse, eu deveria ficar bravo com você. Mas eu também não me alimentei. Não conseguia pensar em comida com tudo isso que aconteceu. Também estava ansioso. Então, conte com a minha compreensão. Mas cuide-se. Ou quer casar numa enfermaria?

Diante de tamanha devoção, Gina se remoeu. Desde o beijo trocado com Harry se enchera de dúvidas quanto ao casamento. Mas não podia voltar atrás. Rony estava certo. Ela tinha sido rápida demais na decisão. Tivesse pedido um tempo para pensar, não estaria tão confusa. Apenas dois dias teriam feito uma grande diferença. Gostava de Arlen, mas o coração pulsava por Harry. O antigo amor, que julgara extinto, voltara com força total. E agora ele tinha de ser sufocado a qualquer custo. Não se iludiria. Além disso, estava comprometida com Arlen, que a fitava com carinho. Ele se debruçou sobre a garota e a beijou suavemente. “Não posso magoar este homem”, pensou Gina, reconfortada com a carícia. O elfo tomou o lábio inferior da ruiva entre os seus, mantendo-o preso por instantes. Era o momento mais íntimo que experimentavam. Ali no quarto estavam protegidos dos olhares alheios. Mas Arlen demonstrava uma certa tristeza.

- Eu não te obrigo a nada, Gina. Se ainda concordar com o meu pedido, sinta-se livre para marcar a data do casamento para quando quiser. Se não quiser mais, vou embora e não te incomodarei. Só te peço para não me torturar por muito tempo e me avisar assim que puder se devo partir ou ficar - disse isso, beijou sua mão e se levantou para deixar o quarto.

Aquilo foi tão surpreendente que Gina teve a impressão de que o chão desaparecia sob seus pés. Arlen lhe oferecia a chance de desfazer o compromisso. Ela sabia que a decisão tinha sido difícil principalmente porque ele tinha acabado de abrir mão da imortalidade. “Não serei injusta”, resolveu, determinada a mudar sua relação com o elfo, dando-lhe todo o amor que pudesse.

- Fique, por favor. Fique aqui, comigo - afirmou, estendendo a mão para ele e fazendo Arlen parar à porta.

Ele voltou e se sentou ao lado dela na cama. Gina jogou os braços ao redor do pescoço do elfo. Aproximou o rosto, oferecendo a boca. Arlen a beijou sofregamente. Trocaram carícias intensas. A ruiva fez com que o noivo se deitasse junto com ela. Ele mergulhou os dedos na cabeleira vermelha. Depois, enlaçou a cintura da garota, erguendo-a enquanto descia os lábios pelo seu pescoço. O casal estava envolvido em carinhos pelo corpo, abraços e beijos tão ardentes que logo o desejo se instalou.

- Talvez seja melhor ir agora antes que seja tarde - disse Arlen, ainda percorrendo o corpo da moça com as mãos.

- Já é tarde - respondeu Gina docemente, retirando a faixa verde que adornava sua cintura.

Os olhos azuis de Arlen brilharam. Ela pegou a varinha e executou um feitiço para trancar a porta do quarto. Com outro movimento, fez as luzes diminuírem. Tremia um pouco ao comunicar para o noivo o que tinha acabado de decidir. Precisava abrir um capítulo novo em sua vida.

- Quero me tornar sua mulher - murmurou. “Se esse é o meu destino, que ele comece agora”, pensou, afastando com todas suas forças a lembrança dos olhos verdes em fogo que vislumbrara naquela mesma Toca tantos dias atrás.



***



Hermione acabava de entrar em sua sala em St. Mungus. A irmã de Rony já estava lá, folheando o Profeta Diário. A ruiva abraçou a futura cunhada com entusiasmo. Mione ficou feliz de vê-la com cara de Gina Weasley. Desde a conversa que tivera com Harry, ela deixou de admirar o estilo élfico que a jovem incorporava. Não porque perdera o interesse por esse povo. Mas porque torcia pela reconciliação dos dois amigos. Soubera do desmaio de Gina por Claire. E pela descrição de como tudo acontecera, suspeitava dos motivos que provocaram o desfalecimento. Por isso, chamara a moça. Estava na hora de entrar em ação.

- O que te aconteceu, menina? Que história é essa de desmaio?

- Não foi nada. Só fiquei sem comer. E você sabe: saco vazio não pára em pé.

- Sem falar da pressão de todo o resto, que também deve ter te abalado. A comitiva, a abdicação de Arlen, um monte de gente te olhando.

- Essas coisas me deixaram nervosa, mas agora está tudo bem.

- Ficou angustiada com a decisão do Arlen de abrir mão da imortalidade?

Gina apertou os lábios. Hermione tinha tocado num ponto sensível.

- Nunca estive certa disso. Parece injusto e até o último momento tentei persuadi-lo, explicando que não achava ruim ter um marido imortal. Brinquei que assim ele seria jovem para sempre. Mas esse é o costume. E eu entendo, mesmo sendo difícil de admitir.

- E existia algo para impedir que ele abdicasse desse dom?

- Se eu rejeitasse o pedido de casamento, ele não teria de renunciá-lo.

- Sei. E você chegou a pensar nisso?

- S-sim. Só que no dia em que isso passou pela minha cabeça, já não tinha como me comunicar com ele. Arlen estava em águas élficas e corujas não iriam conseguir encontrá-lo. É magia muito antiga que protege os domínios deles. Ninguém atravessa essa barreira.

- Por que não procurou Snape ou Dumbledore? Tenho certeza de que eles devem ter meios de entrar em contato com os Altos Elfos.

- Eles têm. São bruxos bem mais poderosos do que eu. Mas eu não queria abrir para ninguém a minha dúvida. Ainda mais porque essa situação foi criada por mim. Na hora em que ele disse que queria casar comigo, parecia tão óbvio que a minha resposta deveria ser sim, que respondi logo. E o Arlen me contou que fazia muito tempo que ele desejava isso. Fiquei tão encantada...

- Gina, a gente se conhece há muito tempo. Sei como você é decidida. E não estranho que tenha respondido de imediato ao pedido já que naquele momento estava convencida que era isso mesmo. Que você iria se casar com um homem que ama e que te ama. O problema é que algo... ou alguém... te mostrou que isso não é verdade. Você não ama o Arlen, não é?

- Eu gosto muito dele - respondeu Gina, depois de um silêncio pesado. - Sinto-me bem ao lado dele, segura, amada, respeitada. Quantas mulheres não sonham com isso?

- Todas sonham. É maravilhoso quando isso acontece com a pessoa que a gente ama. Talvez seja bom também com alguém que não se ama, embora se estime. Mas não deve ser muito consolador se a gente ama outra pessoa.

- O que você quer dizer com isso? - perguntou, enrubecida.

- Que seria legal você se perguntar se ama o Arlen ou se ama outra pessoa.

- Não sei se amo... outra pessoa. Pode ser só uma obsessão por causa de alguém que nunca antes me deu bola e que de repente resolveu... brincar comigo.

- Estamos falando de alguém de quem você sempre gostou? E gostou muito?

- De alguém que em seis anos nunca me perguntou se eu estava bem, se curtia o que fazia, se sentia falta dos amigos, se estava viva.

- Alguém que te redescobriu e que pediu perdão publicamente por causa desse erro?

- Alguém que continua em silêncio - respondeu exasperada. E acrescentou com a voz baixa - Alguém que exibe a “felicidade conjugal” na minha cara para mostrar que realmente não se importa com o que eu possa sentir.

- E se ele não souber o que você sente?

- Mas ele não fala comigo! E o que isso tem a ver? No passado, ele sabia o que eu sentia, mas isso não foi importante. Depois nem a minha existência foi importante. E agora, mais uma vez, o que eu sinto ou penso não parece ser importante.

- É incrível como vocês estão se queixando da mesma coisa! Que gente mais orgulhosa! Escute, vocês precisam conversar urgentemente. Mas primeiro se desarmem. E então abram os corações.

- Do que é que você está falando?

- De que ele gosta de você. Ah, por favor, acabem com esse muro. Se vocês conseguirem se entender, dá-se um jeito para resolver o resto.

Atônita, Gina se levantou. Seu rosto refletia o conflito que se travava dentro dela. Harry, interessado nela? Sentiu o coração agitado ao se imaginar falando com ele e recebendo seus beijos. Mas, atormentada, tratou de varrer as cenas da mente. Não. Não podia fazer isso com Arlen. Não mais. Suspirou.

- Não há mais nada a fazer, Mione. Há três noites Arlen optou pela mortalidade por minha causa. Isso é muito forte e sela um compromisso que eu não posso quebrar. E... bom... há três noites eu já me considero... hum... mulher dele.

- Como? Vocês se casaram? - espantou-se.

- Não. Mas é como se fosse. Não é porque estamos dormindo juntos - emendou, roxa - e sim porque disse que assim seria depois que ele me liberou do compromisso. Entendeu? Ele já era mortal e mesmo assim me deu a opção de recusá-lo. Acho que, portanto, não tenho nada a conversar com... esse alguém de quem falávamos.

Hermione a olhou com pesar. Não tinha palavras. Gina a abraçou emocionada. Enquanto permaneceram unidas, ela murmurou que não ficasse chateada depois de todo aquele esforço. “Agradeço o que fez. Só te peço que acredite em mim. Gosto do Arlen e com o tempo posso gostar ainda mais dele. Você vai ver”, disse, antes de se despedir da amiga.










Obs: se alguém tiver curiosidade de saber como foi a primeira noite de Gina com Arlen, é só pedir. Se muita gente estiver interessada, posso escrever. Só que aí o conteúdo será bem mais restrito. Tipo, nem todo mundo vai poder ler. ;-)

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