Cap 9



Capítulo 9


 


Harry não deixou de entender o significado da forma deliberada como ela usou o nome de batis­mo dele pela primeira vez. Parecia deslizar pela lín­gua dela, suave como o veludo, provocando o desejo ardente que ele segurava com tanto esforço des­de que ela entrara pela porta do restaurante.


Ele falou mais do que falara em anos, falou sobre coisas que ninguém sabia, falou sobre o passa­do para desviar sua mente dela. Isso não era um ou outro. Era apenas um jantar. Ela se vestira assim para puni-lo por ter se comportado como um homem das cavernas, e ele não oferecia nenhum argumento para a sua defesa. No final da noite ela simplesmente ligaria para um táxi e iria embora, deixando-o com uma última olhada de suas costas largas, suas longas pernas, antes de acenar para ele.


Ele passou os últimos quatro dias com ela na expectativa. Quando isso aconteceu antes?


Todos os seus sentidos trabalhavam a todo va­por. Ele não deu a mínima para o sabor sutil da co­mida; era o sabor da pele dela que ele beijara que o assombrava.


Ele podia fechar os olhos e só de ouvi-la falar da Prior's Lane — o que no momento era seu assunto de menor interesse — ficava excitado. Se ele abrisse os olhos e visse sua boca suave, a tarefa de se con­centrar no que ela dizia ficava ainda mais difícil.


Ele forçou a si mesmo — precisava mesmo saber o que ela estava pensando, planejando —, tanto que conseguiu fazer a pergunta ocasional para que não parecesse um idiota completo, mesmo enquanto a combinação de aromas da pele dela, de suas rou­pas, de seus cabelos, quase o levava à loucura.


Agora, ela estava bem ali, sentada, seus olhos cor de mel o fitavam tão calmamente que só as me­ninas dos olhos disfarçavam o que passava pela cabeça dela.


Mas mesmo quando cada célula de seu corpo gri­tava "Sim!" e "Vá com tudo!", algo na cabeça dele o avisava que isso não era o que ela queria. Que isso não era o que ele queria. Quando ele fosse com tudo para cima da srta. Gerente do ano, seria porque ela havia implorado, dizendo que morreria se ele não viesse. Não porque ela rejeitara friamente o conselho de sua mãe para subir de volta na bicicleta antes que ela perdesse o fio da meada e ele fosse o idiota que ela escolhera para a garupa.


Ele a queria.


Não podia acreditar no quanto a queria. Queria mais do que tudo. Além da razão. Fora de controle. E ele se recusava a ser mais um na lista de jantares de negócio. Ela ditou as regras para a noite — jantar e um encontro — e agora ela queria quebrá-las.


Fácil pensar, difícil viver com isso. Ele precisa­va se acalmar, dar ao seu corpo a chance de acom­panhar sua cabeça, e para isso precisava colocar alguma distância entre eles.


— Já volto — ele disse, ao levantar-se. Na verdade... Ele não podia acreditar. Será que ela ia mesmo olhá-lo nos olhos e dizer que não precisava visitar a máquina no banheiro porque ela já o fizera?


Enquanto ele esperava, ela se ruborizava e ba­lançava a cabeça. O que quer que seja que ela ia dizer, agora a deixara nervosa.


Quando ele voltou, ela ainda estava olhando para a sobremesa, imóvel, cheia de pânico.


— Vamos? — ele disse, sem nem ao menos se sentar.


— Mas eu não terminei.


— Você já é doce o suficiente — ele disse, pegando-a pelo braço sem querer saber se ela estava pronta para se mover. — O táxi que você pediu já chegou.


— Já? Ele não pode esperar? Ela já não estava mais tão vermelha, ele notou. Na verdade, ela perdera quase toda a cor. Sem dú­vida ela estava reconsiderando a idéia.


Ele reconheceu que deveria ter recebido de bom coração a mudança de idéia dela. Assim como de­veria ter se sentido mais seguro quando ela vestiu o casaco. Mas as coisas não eram bem assim.


Vendo as pernas longas e a pele clara escondi­das por trás do longo casaco, a imaginação dele fun­cionava a todo vapor, pois o que agora estava es­condido tornava-se ainda mais desejável.


E a perda repentina de autoconfiança dela fez com que ele ficasse à frente, tomasse a decisão so­bre onde isso iria terminar. Jogá-la sobre seus om­bros e carregá-la até sua caverna, como o brutamontes que ela o considerava. Tudo o que precisava era uma limusine com motorista...


Ao saírem do restaurante ele viu seu carro indo embora, Harry o dispensara discretamente. Ele deu a Hermione o recibo cancelado da conta, pois a pagara.


Abriu a porta do táxi para ela.


— Não quero que haja nenhuma confusão. Quan­do você diz casa, quer dizer a casa da sua mãe ou a livraria?


Ela hesitou por uma fração de segundo e ele achou que ela tomaria a rota de fuga que ele lhe oferecera. Em seguida, disse:


— A livraria. Quero começar cedo amanhã.


Ele deu as instruções para o motorista e sentou-se ao lado dela.


— Ponha o cinto,Hermione — ele disse, abotoando o cinto de segurança que manteria uma distância se­gura entre eles.


Ela pensou que ele partiria para cima dela no momento em que estivessem juntos no banco de trás?


Por mais que ele estivesse tentado a fazer algo, esse era o jogo dela, e ela era quem moveria as peças. Ele não facilitaria nada para ela.


— Obrigado pelo ótimo jantar — ele disse. — O restaurante é muito agradável.


— Fico feliz por você ter gostado.


— Feliz?


Hermione não podia acreditar que dissera isso. Não, ela não podia acreditar que ele dissera isso. Ela era uma massa de desejos e emoções conflitantes e ele dizia calmamente que gostara do jantar.


— Aquele pato estava uma delícia.


Como ele se atreve a falar de comida, pensar em comida, quando ela não conseguia nem se lembrar de uma só palavra que passara por seus lábios? Tudo o que ela lembrava era o sabor de chocolate. A da pele dele.


— Você disse — foi tudo o que ela conseguiu res­ponder.


Num momento impetuoso, de certeza absoluta que não conseguiria lidar com isso, ela disse a palavra, e ao dizer isso, praticamente se ofereceu para ele numa bandeja. Como sobremesa.


— Harry.


Ela estava certa, aquela palavra foi uma delícia em sua boca. Suave como a brisa. Dura como pedra. E, agora, ela estava sentada ao lado dele enquanto o táxi se apressava na direção do centro da cidade. Ela não se importava com o que ele tinha pensado do pato. Apenas queria suas mãos sobre ela, sua boca fazendo coisas impensáveis...


E sem o menor aviso a idéia de que o jantar era apenas um acerto de contas caiu como um castelo de cartas.


Talvez tenha sido o choque repentino de ar frio no caminho do restaurante até o carro, mas aquela primeira dose de adrenalina desapareceu entre o chocolate e o frio do táxi.


Ou talvez tenha sido apenas a aceitação fria dele, quase como se estivesse fazendo um favor a ela. Como se ele não tivesse que fazer o menor esforço para fazê-la se sentir especial. Um frio subiu pela espinha dela. Será que ele pensava que ela fazia isso sempre?


Será que ele não fazia idéia do quanto isso era importante para ela?


Que droga. Ele estava ali sentado, despreocupa­do, olhando pela janela. Toque em mim, ela pedia em silêncio, implorando a ele para que lesse seus pensamentos. Apenas toque em mim. Você é bom com motores. Faça algo para dar a ignição no meu coração. Faça-o funcionar como fez com o carro de minha mãe.


Ele tem flertado com ela sem parar desde que ela ligou para a Duke's Yard e ele atendeu o telefo­ne — e por que ele teria feito aquilo se estivesse apenas comprando uma van? — mas agora ele parecia mais interessado na paisagem do rio. Os velhos armazéns.


Qual era o problema com ele?


Qual era o problema com ela?


Ela deu a luz verde a ele, então, por que ela não estava em seus braços, sendo beijada sem piedade? Não era isso que os homens faziam?


Não Harry Potter, evidentemente, a julgar pela distância entre eles.


O que foi que aconteceu?


Em seus sonhos, esse era o momento em que ele tinha de olhar nos olhos dela e juntos lembrarem do dia em que ele foi seu cavalheiro honrado...


Não, nem mesmo ela era tão boba.


Ela era inteligente o suficiente para saber que era nada mais do que a substituta para a mulher que ele nunca teria. A garota da St. Mary de família privilegiada e a pronúncia perfeita; sua princesa de verdade. Ela era apenas uma versão falsificada, uma princesa cuja mãe moldara-lhe a fala até que ficasse idêntica à original, além de assegurar-lhe que iria a lugares que as meninas que a provocavam nunca seriam capazes de entrar.


E ela estava certa. Uma universidade antiga, uma graduação de primeira classe, uma carreira sólida. Era tudo dela.


Mas aquelas outras meninas tinham algo que ela não tinha: homens que a amavam, filhos, a segurança de uma família. Sonhos que para ela passa­ram a parecer impossíveis, pois nunca confiara em ninguém o suficiente para isso.


Mas esse caso era diferente. Ela não estava à procura, esperando um final feliz, apenas uma noite para preencher o doloroso vazio. Será que ela não merecia pelo menos experimentar um sonho?


Não nessa vida, é o que parecia. Ela disse:


— Então é isso. Todas as dívidas pagas.


Ele olhou para ela.


— Exceto pelo café.


— Café?


— E a decoração. Você vai me convidar para en­trar e tomar uma xícara de café, não vai? E vai me mostrar o bom trabalho de Dave? Deduzi que tenha sido por isso que me apressou a sair do restaurante.


Deus do céu! Ela nem ao menos pensara no apar­tamento quando murmurou o nome dele no restau­rante como uma imitação barata de uma mulher fa­tal de um filme dos anos 1930. O apartamento esta­va pior do que quando ela o viu pela primeira vez, O carpete do corredor fora arrancado. Marcas de gesso por toda parte. A pintura ainda rala...


— Que indelicadeza a minha. Nem ao menos per­guntei se você queria café ou conhaque. Não sei o que estava pensando.


— Não mesmo?


Ela engoliu. Pelo menos estava escuro ali na parta de trás daquele táxi, e dessa vez ele não pôde vê-la ruborizar. E então ela pensou sobre isso.


— Espere ai, não foi você quem estava com pressa, sr. Engraçadinho!


Harry deu de ombros.


O taxímetro estava ligado. Ele ouviu-a suspirar.


— Está com frio?


— Estou bem.


Ela não estava nada bem e ele se segurava com todas as forças para não partir para cima dela e aquecê-la. A única esperança de se comportar, de modo a poder olhar para si mesmo no espelho na manhã seguinte, era mantendo a distância. Deus abençoe a pessoa que tornou o uso do cinto de segurança obrigatório.


— Talvez você deva investir numas roupas tér­micas para vestir com esse vestido.


— Não há espaço para isso por baixo dele — ela disse, num tom suficiente para deixá-lo sabendo que não estava achando graça.


Melhor, ele pensou. Muito melhor.


Era muito pior. Agora ele era incapaz de pensar em outra coisa senão nas roupas de baixo que ela usava com aquele vestido.


Um fio-dental. Só podia ser. Pequenino e preto, de lacinho, colado ao corpo. Bem onde a mão dele deveria estar.


— E praticamente mais nada. Eu notei — ele disse, incapaz de frear suas reações. — Mas como você se embrulhou em lycra, suponho que essa seja a intenção. Creio que você tenha desejado que todos os homens no restaurante olhassem para você com segundas intenções.


— Todos os homens? — ela perguntou.


E ao pas­sar por um poste de luz, ele notou que o rosto dela esboçava um sorriso.


— Quase todos os homens — ele corrigiu. — Eu não seria tão óbvio. E havia um casal gay num can­to que nem notou sua presença.


— Conversa fiada — ela declarou. — Esse vestido é de um estilista famoso. Eles olharam cada passo que dei pelo restaurante quando saímos, e posso lhe assegurar que eles não estavam babando por causa da comida.


Então era o fato que ele lembrava da comida que a incomodava? Assim como ela não sabia que ele só lembrava daquele pato porque lembrava também dos lábios dela em seu garfo.


— Babando? Ah, faça o favor... Mas, também, isso é o que eles chamam de vestido de resultado, não é mesmo?


— Perdão?


— Um vestido que diz: Siga-me até em casa e...


— Isso é sapato, Harry — ela disse, antes que ele pudesse dizer as palavras. — Sapatos de resultado. E se você tem amor à sua vida, sugiro que mantenha esses pensamentos apenas dentro da sua cabeça.


— Eu ia apenas dizer que você estava calçando belos sapatos. E que eles funcionaram. Você teve um resultado. Está em casa. E eu estou bem atrás de você.


Antes que Hermione pudesse pensar em uma resposta, o táxi parou atrás da loja. E qual a razão dela estar tão indignada? Ela se vestiu para deixá-lo excitado. Para fazê-lo olhar. Fazê-lo querer tocá-la.


Então, ela queria deixá-lo no ponto de não conseguir se segurar.


O motorista abriu a porta para ela, e ao descer do carro Hermione abriu a bolsa para pagar a corrida. HArry foi mais rápido e dispensou-o.


— Você pode se arrepender de fazer isso.


Ele riu disso enquanto o carro partia e os deixava ali, em frente da porta.


— Acho que não. — Ele olhou para ela. — A sua chave.


Ela a pegou da bolsa e deu a ele. Se ele apenas a beijasse, tudo seria muito mais simples, mais fácil.


Era como se ele estivesse esperando, quase certo de que ela tomasse a atitude.


Harry destrancou a porta, abriu-a e desligou o alarme antes de se afastar e deixá-la entrar primeiro.


Ele sentiu imediatamente o cheiro de tinta fresca.


No momento em que ia acender a luz, ela virou para trás e disse:


—Harry... tenho uma confissão a fazer.


— Diga-me mais tarde — ele disse, e antes que ela pudesse dizer qualquer coisa sobre Dave, sobre quanto a pintura da loja era mais importante do que a pintura do apartamento, ele a agarrou contra a parede. — Só quero ouvir de você uma palavra.


Ela se enrijeceu de choque.


Não! Não era assim que era para ser...


— Isso não pode esperar...


Suas mãos estavam dentro do casaco dela, em­purrando a bainha do vestido e escorregando-as até a coxa dela.


Oh... Oh...


— É sobre o apartamento... — ela insistiu.


As mãos dele deslizavam sobre a meia-calça dela e ele fez um som gutural com a garganta...


— Oh, sim...


— Sobre Dave...


A boca de Harry traçava o contorno do decote dela, e em vez de empurrá-lo para longe, ela queria mais, mais...


— Sobre aloja...


Ela começava a perder a noção do que estava dizendo, enquanto seu corpo parecia derreter de desejo.


— A pintura...


Ele a levantou pelas nádegas, puxando-a para mais perto de si, fazendo-a sentir sua ereção.


— Você fala demais, princesa — ele disse, com voz áspera.


Nenhum homem com quem ela saíra jamais deixara de passar pelos movimentos iniciais da conquista de maneira tão selvagem e sexy. Sua boca estava cheia e inchada, e sem pensar ela a lambeu numa tentativa de esfriá-la. Ela queria que ele arrancasse seu vestido, ela o queria de joelhos...


— Harry — ela disse, como se implorasse por ele. A única luz vinha da vitrine do outro lado da rua, e mesmo assim, os olhos dele brilhavam como se estivesse em chamas.


— Por favor... Diga-me o que você quer,Hermione.


Harry sabia que era louco. Ela dizia por favor de um jeito que nenhum homem deixaria de entender. Ele podia sentir o corpo dela implorando pelo seu. Tudo o que ele tinha de fazer era beijá-la e ela derreteria.


E mesmo assim ele se segurou, oferecendo a ela a chance de fugir, dando-lhe a chance de pensar.


Em quê?


Ela não era nenhuma virgem nervosa sem saber o que queria. Ele nunca se interessara por esse tipo. Gostava de mulheres que sabiam o que queriam e não tinham medo de mostrar-lhe. Hermione era uma mulher adulta e ambos sabiam onde isso ia parar n o minuto em que começaram a jogar iscas um para o outro. Ele tinha em suas mãos uma mulher quente e ela sabia exatamente como ele se sentia nesse momento e não estava tentando evitá-lo. Isso deveria ser bem simples. Mas não era.


E ela não sabia porquê.


Exceto, exceto...


— Preciso saber que é isso o que você quer.


A resposta dela foi levantar a mão e tocar-lhe o rosto. Ela tremia. Não de medo, mas de desejo. E ter consciência disso o fazia dez vezes, 100 vezes mais forte e mais poderoso do que jamais se sentira. E mesmo assim ele esperou, sem fazer nada para encorajá-la, ou para desencorajá-la.


Ele queria que ela soubesse que, apesar do lapso repentino de machismo que ele detestava, aquilo era um convite para qualquer mulher de respeito botá-lo para fora dali. Queria mostrar que não esta­va tão perdido em suas necessidades que seria in­capaz de recuar se ela não o quisesse.


Como recompensa para sua paciência, ela levan­tou a outra mão e segurou-lhe o rosto com ambas. E em seguida beijou-o levemente.


Foi o beijo mais doce.


Do tipo dado pela namorada em seu primeiro na­morado. Lábios macios e trêmulos. Desejos incer­tos. Do tipo desperdiçado num jovem quente e exci­tado, com apenas uma coisa em mente. Do tipo que podia roubar o coração de um homem. Ela não fazia idéia do quanto custava a ele se segurar daquela maneira. Não sabia como a doçura dela o queimava mais do que o beijo mais quente de toda a sua vida.


E então ele se deu conta de que o rosto dela esta­va molhado, lágrimas brotavam nos seus olhos, tocavam-lhe os lábios. E naquele momento ele soube que era um idiota. Isso não era um jogo. Isso era algo além da imaginação dele, e se ele não pudesse tê-la, ele morreria de desejo.


E ao lembrar-se de sua arrogância de momentos atrás, de sua determinação de não chegar perto dela antes que ela implorasse, sentiu enorme vergonha, ele soube que naquele momento não merecia mais do que a distância dela e um táxi para ir embora, sua noite estava acabada.

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