Pedaços de passado e futuro...






O ar estava pútrido...

As paredes estavam manchadas de sangue, parte do teto ruíra, as portas do salão principal estavam escancaradas e quebradas...

Não havia mais a luz das velas flutuantes, nem o burburinho das conversas dos estudantes... Hogwarts não era mais a Hogwarts que conhecera ao lado de seu pai...



“– Gosta daqui esperança? _ aquele apelido era ridículo, mas sempre que estavam a sós era assim que ele a chamava, mas a forma com que dizia, tornava aquela palavra especial... transbordava saudade.

- Gosto pai, mas porque me trouxe aqui? Falta muito pra que eu entre em Hogwarts..._ respondeu zombeteira, tinha seis anos, segurava a mão do pai e juntos seguiam por um dos inúmeros corredores do castelo em direção a sala do diretor, talvez...

-Porque talvez essa seja a única chance que eu tenha de ver a minha pequenina em Hogwarts._ respondeu com um tom que ela não conseguiu decifrar.

Era uma criança, mas já não agüentava mais, soltou a mão do pai e estacou no corredor com os braços cruzados.

-Sempre me escondendo alguma coisa não é pai?_ disse sem esperar resposta, porém cheia de magoa...”.





Talvez um dia tivesse suas respostas... mas não era hora pra lembranças...

Era noite... e tudo o que havia a sua volta era o vazio da destruição e o mal pressagio do silêncio.

Apesar dos trovões e da chuva torrencial que parecia ser capaz de fazer desabar o céu, tudo o que havia a sua volta era o silêncio... Aquele silêncio era medonho, chegava a enlouquecer... seu cérebro parecia não processar o som das gotas de chuva que pareciam pedras batendo em alguns vidros ainda inteiros ou dos trovões que rasgavam os céus e derrubavam as arvores da floresta proibida...

Fechou os olhos e respirou fundo...

“Nenhuma pessoa morta nem restos de corpos ou cabeças decapitadas... nenhum grito ou espírito agourento.... acho que essa noite a tortura vai ser na minha frente...”... o sarcasmo e a acidez novamente... as únicas armas que tinha pra manter a frieza perante aquele cenário devastador... que a induzia a ver tudo o que mais lhe doía.... induzia a ver pessoas inocentes morrendo e sendo torturadas... aquele silêncio dava asas a sua imaginação, que agora lhe levava a ouvir gritos desesperados.

Tanta coisa poderia ter acontecido ali pra que Hogwarts lhe parecesse tão tenebrosa...

Se não visse aquele tipo de destruição desde que se dera por gente gritaria... Gritaria até que suas cordas vocais estourassem e ficasse surda perante os próprios gritos...

O aperto no coração, o nó na garganta, o suor frio e o tremor já não lhe eram estranhos...

Vagava pelos corredores olhando sempre a frente...Talvez essa noite a tortura e a morte não fossem tão violentas... e assim quando acordasse não desse de cara com rostos curiosos...

Um sorriso vagou pelo seu rosto sem chegar aos olhos...Talvez a chuva não estivesse tão gélida...

Se era pra ver dor e sofrimento que pelo menos se sentisse livre antes do massacre...

Pulou da janela mais próxima, para assombro da única figura que vagava pelos restos dos quadros, com a armadura a tinir e uma espada sendo arrastada...

A mesma chuva que antes só castigava o chão agora a afogava, não era uma chuva normal... Era como gelo penetrando em sua pele, dentro dela...

Era medo, agonia e sofrimento...

Agora ela ouvia...

Claramente, não era somente dentro de si... Vinha de todos os lados e de lugar nenhum ao mesmo tempo...

Vago, vazio e agonizante... Porém, claro, confuso e real...

Um uivo tão alto, tão forte, tão desesperado quanto o grito que ela queria dar se fez presente.

Sombras surgiam na floresta proibida, sombras escarnecidas, vagas, carregadas de ódio, dispostas a matar... A chuva a impedia de ver claramente o que eram.

Flechas surgiam de todos os lados com um único alvo...

Um lobisomem cambaleante, movido somente pelo instinto de sobrevivência, fugindo...

Ele devia ser o único sobrevivente... O único com alguma resposta, aqueles uivos eram só uma sombra do que tinham sido... Ele se esgotava a cada passo... Ia a lugar nenhum...

O horror tomou conta dela quando percebeu que ele ia direto pra morte, sendo que estava fugindo dela...

E ela não podia fazer nada...

Uma, duas, três flechas... Feitas da mais pura prata o atingiram de raspão, não agüentando mais caiu perante uma arvore mais furiosa que os trovões... o numero de flechas só aumentava juntamente com o desespero do lobisomem que agora também era golpeado por galhos e mais galhos que lhe batiam de forma brutal...

Aquilo era uma carnificina... O sangue dele lavava o chão junto com a água da chuva...

Não podia mais, omissão nunca fizera parte dela... Embora soubesse que não faria nada além de atravessá-lo como se fosse um fantasma, confirmando mais uma vez sua inutilidade perante ela mesma... Não ficaria ali vendo mais uma morte dolorosa e sem sentido sem fazer nada... Sem ao menos tentar, novamente.

Tentou voar em direção ao chão, mas logo estava atravessando e sendo cercada por dementadores.

Não chegava a tocá-los, mas apesar de um sonho eles emanavam uma energia sombria, maligna, como na vida real.

A afetando mais do que deveriam...

Sentiu-se cair em um abismo sem fim... Um tipo de labirinto no qual as paredes eram dor, sofrimento, e os gritos de um inocente.

O numero de dementadores só aumentava, cercava-a, atravessava-a e sua mente só anuviava-se... Não chegaria a tempo.

Sentia que ele já não agüentava mais, desistia, não a notava como uma forma definida... uma ajuda, uma esperança, já não via mais nada... a vida dele se esvaia, e sussurrava em sua mente que ela perdera de novo.

Que não era real, mas se tornaria, que se ela não brincasse com as palavras da maneira correta... só lhe restaria uma saída.

Não havia mais nada a fazer.

Permitiu que seus pulmões enfim se esvaziassem naquele canto triste e estridente enquanto caia sem forças e sua tristeza ganhava vida no ultimo uivo de dor do lobisomem.







Tinha acabado de sair de uma das reuniões da Ordem...a primeira entre muitas das quais permitiriam que ele participasse, já devia ter passado da meia-noite...

Estava cansado...e sem ninguém por aquele castelo enorme...já que só lhe permitiram participar se não contasse a ninguém, nem mesmo a Rony e Hermione o que ali fosse dito; resultado uma Ania furiosa indo se trancar no quarto pra dormir mais cedo, por isso ali estava ele...sozinho, por não ter tido paciência de esperar Jade tamanho o sono que sentia.

Jade era legal, gentil, prestativa e atenciosa.... estava um pouco sem graça pela cena que ele presenciara entre ela e a sobrinha...

Estudara com seus pais...

Todo o tempo em que esperou o início da reunião ela se sentou com ele e engatou uma das melhores conversas que já tinha tido com alguém sobre seus pais em Hogwarts...

Mas no momento sua cabeça estourava, pretendia chegar à seu quarto antes que amanhecesse...se aqueles corredores, passagens e infinitos caminhos o ajudassem.

“... como assim escapou?!” gritava uma voz ofídica e furiosa dentro de sua mente.

Uma pontada na cabeça e ele cambaleou....se sentia tonto....Voldemort estava furioso...

Mas um grito em algum ponto à sua frente fez sua dor de cabeça se intensificar... começou a correr naquela direção se estivesse certo sabia de onde vinha e que ela estava sozinha...





-Samantha abre essa porta!_ ele estava esmurrando aquela porta a pelo menos cinco minutos.

-Eu já disse que não aconteceu nada!

-Um grito daqueles não e dado por nada! O que aconteceu?_ disse cruzando os braços, se ela não desse uma resposta decente ele derrubaria aquela porta.

“Eu nunca vou ter paz...” resmungava enquanto se levantava e abria a porta.

A figura que surgiu a sua frente parecia mais um espírito agourento do que uma pessoa: cabelo bagunçado, pálida, com olheiras e um lenço enrolado no pescoço... o lugar onde haviam sido cravados os caninos estava marcado com algumas gotas de sangue... mas tirando isso parecia inteira.

-Tá vendo?! Tô intera, portanto não tem com o que se preocupar. _ sua irritação era visível.

-Parece ter sido atropelada por um bando de hipogrifos desembestados... mas tirando isso, parece inteira mesmo. O que aconteceu?

-Merlin socorro... Por acaso ainda não ouviu que não aconteceu nada!_ repetiu entediada.

-O que eu ouvi foi um grito que mais lembrou um espírito agourento, ou alguém sendo atingido por um cruciatus...Que por acaso deve ter acordado metade do castelo...

Suspirou e começou a falar num tom de quem explica que dois e dois são quatro a uma criança teimosa...

-Olha se é com o castelo que você está preocupado, não se preocupe eu mesma enfeiticei essa torre pra que ninguém acordasse com os meus gritos e se estiver reclamando pelo seu precioso sono...não posso dizer que sinto muito, e pra terminar você não devia estar por aqui...essa torre é isolada dos outros quartos e duvido que minha tia tenha te colocado em um quarto perto daqui...

-Pra falar a verdade eu estava procurando o meu quarto quando ouvi seu grito...

-Já entendi..._ resmungou passando por ele e ficando em frente a um espelho no fim do corredor. Sem entender Harry a seguiu.

- Corredor do terceiro andar na ala sul._ disse claramente fitando sua imagem no espelho.

No mesmo instante a imagem desapareceu dando lugar a uma superfície completamente azulada e enevoada...

-É só atravessar, vai te levar ao corredor do seu quarto..._ explicou ainda desanimada, a voz estava fraca...

-Como sabe onde é o meu quarto?

Ela tinha chegado naquele mesmo dia...

-Conheço a minha tia melhor do que imagina..._ respondeu voltando pro próprio quarto... estava prestes a desmaiar_ esse quarto em que ela te colocou era dos seus pais quando vinham aqui, aliás_ acrescentou como se não tivesse importância_ nada é feito aqui sem a minha permissão..._ e entrou no quarto fechando a porta.






Tinha alguma coisa na sua orelha...

Estava machucando...

Estava bicando...

-Edwiges, eu sei que sentiu saudades de mim, mas se fizer isso mais uma vez eu te prendo na gaiola..._ ameaçou com a voz arrastada de sono, ainda sem abrir os olhos.

Sua cabeça latejava...

A coruja piou...

-Tá certo...O que é?_ resmungou irritado, abrindo os olhos e dando de cara com um olhar de censura da coruja...

Não estava sendo um dono muito gentil...

-Desculpe..._ falou procurando os óculos na mesa ao lado da cama...

Quando tudo entrou em foco, finalmente percebeu o quarto banhado de sol...Devia ter dormido demais...

Mais um pio...

E ele entendeu... uma carta...


“Harry Thiago Potter!
Onde é que você se meteu?!
Fazem semanas que venho escrevendo e não recebo nem uma linha com um simples...”Estou vivo obrigado pela preocupação”.
Rony perguntou ao pai dele onde você se meteu e sabe qual foi a única resposta?!
“Não se preocupe Rony ele está seguro... mas Dumbledore preferiu não nos dizer onde ele está.”.
Vamos passar a última semana de férias no Beco Diagonal, pra falar a verdade ainda tenho esperança de que você tenha tempo e vontade de ler isso aqui e tomando vergonha na cara responda se vai ou não ser possível que se encontre conosco lá....
Hermione Granger

P.S.: Cuide melhor da sua coruja!”



Bagunçou o cabelo ainda mais quando terminou de ler e se voltou pra coruja pousada na estrutura da cama a sua frente...

- Acho que ela não está muito feliz, não é?

Não podia culpá-la...

Levantou-se e agarrou o primeiro pedaço de pergaminho que viu...


“Mione, estou vivo obrigado pela preocupação...
Não falei com Dumbledore ainda... mas se depender de mim... darei um jeito de escapar por pelo menos uma hora para vocês verem que ainda estou inteiro...
Aconteceram muitas coisas...mas juro que não recebi nenhuma carta de vocês o verão inteiro...
Se possível passo a última semana de férias no Beco.... avise Rony que estou vivo...

Até logo,
Harry”.



Deu alguns petiscos que tinha guardado no malão a Edwiges...

Que logo depois voava pela janela com o recado atado à pata...

Harry observou o céu até que ela sumisse no horizonte...

Decidindo tomar cuidado pra não perder os amigos ele voltou-se para o jardim...

Samantha já estava de pé novamente, certamente a tia ainda não sabia disso, dava um passeio com Zairus e conversavam, por suas expressões ele soube que não era uma conversa agradável... Com roupas limpas, o cabelo arrumado e postura elegante, Harry notou que seu rosto não estava mais pálido nem tinha olheiras...

Ela se mostrava atenta à conversa, mas observando um pouco mais... Harry notou... apesar de um vivo brilho se fazer presente nos olhos castanhos o mesmo era superado pelo ar de tristeza e apatia...




Com o longo cabelo preso em um firme coque alto ela podia sentir perfeitamente cada partícula de ar batendo rapidamente em seu rosto... Se sentia como parte do vento... Era o mais perto de paz e tranqüilidade que conseguira chegar...

Era maravilhoso...

-O que acha de voar mais rápido e alto amigão?_ perguntou com a voz alterada dando tapinhas no pescoço de seu companheiro...

Apesar da grossa luva que usava ainda pôde sentir as escamas no pescoço de seu dragão...

Ele não emitiu som nenhum... Sua resposta foi agir...

Fez exatamente o que a dona pedia...

O chão se afastava cada vez mais rápido, conhecendo-o como conhecia se agarrou ainda mais em seu pescoço...

Não deu outra...Logo sentiu todo seu corpo dar uma volta de 360°...

-Andou praticando não é?_ perguntou sentindo o rosto pegar fogo.

Ouviu algo vindo do chão... e lá estavam vários pontinhos...

-Pode passar raspando no chão? Acho que minha tia tem se preocupado demais não concorda?

“Você não é a garota uma de quinze anos tão tranqüila quanto ela gostaria, não é?” Ouviu uma voz grossa e etérea em sua cabeça...

-E você não fala nenhuma novidade..._ estavam agora a menos de dez metros no chão...

Havia pelo menos quinze pessoas perto de sua tia olhando pra ela...

-Samantha Elisabeth d’Loryen Lancart o que pensa que está fazendo? Você devia estar na cama!

-Matando as saudades tia..._ respondeu simplesmente, o dragão voltando a subir.

Mas algo a incomodava... Voltou-se novamente pra trás, o que via ali era admiração?


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