Desengano e Perda



Capítulo 2 – Desengano e Perda

“Indefiníveis músicas supremas,
Harmonias da Cor e do Perfume...
Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,
Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...”
Cruz e Souza

Quando a aula terminou Hermione tratou de sair da sala o mais rápido possível para não ser obrigada a encarar Rony novamente, mas quando já estava do lado de fora Draco apareceu em sua frente e a puxou pelo braço.
- O quê? - Perguntou ela mal humorada. Não estava com muita paciência para aturar mais implicâncias, queria mesmo é se ver sozinha para poder ler logo sua carta.
- 'Tá atacada é?! - Hermione se preparava para dar uma resposta grosseira, mas ele continuou rápido não dando tempo. - Já leu sua carta?
Ela respirou fundo se contendo.
- Não e você?
- Tam...
- Agora vocês vão ficar discutindo a relação no meio do corredor mesmo?! – Disse Rony irritado que ao sair da sala se deparou com os dois conversando encostados na parede e não perdeu a chance de importunar Hermione. Ela já começava a achar que ele estava se saindo melhor do que Malfoy nessa tarefa.
- Se seus pais tivessem conversado mais e se divertido menos quem sabe eu não precisasse chamá-los de coelhos, mas imagino que isso não esteja ao alcance da sua compreensão, Weasley. Quero dizer, Coelho.
- Ora seu...!!!
Rony bufou e ia partir para cima de Draco se Hermione não tivesse se colocado entre os dois e Harry o puxado pelo braço impaciente para saírem dali.
Depois de conseguir se desvencilhar de Draco, Hermione foi direto ao salão comunal da grifinória imaginando se lá conseguiria alguma paz para ler a carta de Dumbledore. Sentou-se em uma das poltronas afastadas que ficavam bem no canto e abriu o envelope. Dentro dele não havia apenas uma carta, mas duas, alem de também conter uma pulseira de bolinhas vermelho sangue, com uma pena pequena e dourada entre as contas, que caiu em seu colo. Ela pegou a pulseira e colocou encima da mesa ao seu lado.
“Cara srta. Granger,
Estou a par do acontecido na noite passada e gostaria de colaborar com sua atual situação dando-lhe esta pulseira e contando-lhe essa breve história.
Há muito tempo atrás um poeta apaixonou-se por uma Leanan-Sidhe que havia sido transformada logo na infância. Por oferecer perigo as pessoas ao seu redor pelo seu temperamento vingativo e sua sede por sangue ela foi trancafiada em uma espécie de quarto, com pouca luz, onde apenas seus parentes diretos tinham permissão para visitá-la. Uma noite ela conseguiu ludibriar seus familiares e fugir de casa. Por viver tanto tempo presa haviam muitas coisas do mundo as quais ela desconhecia, depois de vagar sozinha durante algumas horas encontrou um bar aberto. Sentou-se em um banco de frente para o balcão e ficou observando tudo com curiosidade até perceber que um homem que estava sentado bem próximo a ela a olhava constantemente e abaixava a cabeça para escrever algo. Aproximou-se e usou de toda sua sedução e charme para atraí-lo. Ele encantado com tamanha beleza mal conseguia parar de escrever, até que ela esticando a mão em um gesto delicado puxou o bloco de notas onde ele escrevia e leu. Surpresa pois nunca havia lido poemas tão cheios de sentimento como aqueles desejou aquele poeta só para si e conseguiu. Usou parte dos seus poderes para fazê-lo acompanhá-la até em casa, chegando lá todos ficaram bastante aliviados de ver que ela estava de volta e sem fazer nenhuma vítima, mas logo perceberam o homem que a seguia. Convenceram-na a voltar para o quarto e a trancaram separando os dois. Assim que se viu longe dela o poeta voltou ao normal, mas sem esquecer das sensações que havia sentido ao lado da Leanan-Sidhe por isso desejou voltar e ficar com ela apesar dos parentes o advertiram dos perigos. Ele então se afastou por algum tempo e viajou por muitos lugares ao redor do mundo pesquisando sobre aquele ser mítico e uma forma de se não curar ao menos amenizar a maldição. Ele encontrou essa pulseira que agora está em suas mãos, muito cuidado ao manuseá-la pois as contas são de vidro e se quebrada é impossível dizer o que poderá acontecer. Quanto ao poeta, apesar da pulseira, ele acabou morto.
Peço apenas que a srta. continue a manter-se afastada durante a noite para segurança dos seus colegas e use sempre essa pulseira.
P.S.: Como o sr. Malfoy é um único que sabe sobre sua atual situação será encarregado de ajudá-la.
P.P.S.: Já falei com o professor Snape quanto à detenção e vocês serão dispensados dela por tempo indeterminado.
Atenciosamente,
Alvo Dumbledore.”
Hermione releu a carta tentando digerir o que havia lido. Era pior do que ela imaginava, apesar que a Leanan-Sidhe a qual ele se referia na história era transformada por completo. Passados alguns minutos ela lembrou da outra carta e desdobrou o papel. E como pode ver não era uma carta e sim uma autorização assinada pelo próprio diretor autorizando-a a sair a noite do dormitório. Imaginou quanto Rony e Harry não dariam para ter uma daquelas e sorriu.

~*~
Draco sentou em uma das mesas da biblioteca e tirou o envelope da mochila. Abriu e percebeu que continha três cartas, pegou a mais curta e viu que era uma autorização para sair a noite, sem entender muito bem pegou a mais longa e leu.
“Caro sr. Malfoy,
Estou a par da situação da srta. Granger como Leanan-Sidhe e gostaria que o senhor se dispusesse a ajudá-la a controlar a maldição. O motivo para eu ter feito esse pedido justamente ao senhor é que apenas vocês dois sabem sobre o caso da srta. Granger e assim gostaria que continuasse. Aí está um passe para andar a noite nas dependências do castelo, mas devo declarar que se ele for usado com outras intenções eu saberei e o confiscarei imediatamente. Também falei com o professor Snape sobre a detenção e ela está suspensa por tempo indeterminado.
Como nem eu mesmo sei muito sobre essa maldição então ai está um passe para a parte proibida da biblioteca para que o senhor possa pesquisar mais e ajudar a srta. Granger. Mas apenas o senhor poderá pesquisar, esse passe é restrito a sua pessoa. Por favor faça bom uso dele.
Atenciosamente,
Alvo Dumbledore.”
- Mais que...
- Shhhh!
Draco abaixou a cabeça com raiva, guardou tudo dentro do envelope e seguiu para o salão comunal.
~*~
Hermione saiu da sala comunal da Grifinória direto para a próxima aula do dia em dúvida se queria ou não encontrar Draco. O certo, pensava ela, seria ir atrás dele e os dois conversarem sobre as cartas de Dumbledore, mas não queria parecer que estava precisando de ajuda ou mesmo vulnerável. Já era insuportável demais ser namorada dele e ser forçada a agüentá-lo beijando-a na frente de todos. Não que os beijos dele fossem ruins, na verdade eram até muito bons, mas... Hermione sacudiu a cabeça para afastar seus pensamentos do caminho que estavam tomando. Ele era filho de um comensal da morte e até onde sabia tinha grandes chances de seguir os passos do pai.
No final do dia, depois das aulas, Mione seguia apressada para seu dormitório para poder se trocar, tomar um banho quente antes de jantar e dar um jeito de sumir sem ser notada quando Malfoy surgiu no final de um corredor e a puxou pelo braço fazendo com que a pulseira tilintasse em seu pulso.
- Espera!
- Estou com pressa Malfoy!- Reclamou se soltando, passando os dedos pela pulseira verificando que estava intacta e se preparando para responder a perguntas sobre a carta.
- Nós precisamos nos encontrar para falar das cartas e bem... - Draco apontou para o céu laranja vivo. - Acho bom você se apressar.
- Nos jardins então, em meia hora?
- Certo, perto da oliveira. - Disse vendo-a se afastar a passos largos.

~*~
Só tendo dez minutos para jantar ou menos antes que o sol terminasse de se pôr, Hermione sentou-se apressada na mesa da Grifinória no salão principal. Logo sentiu uma pessoa ao seu lado. Era Harry.
- Hermione, espera. - Disse ele percebendo que ela se apressava para terminar logo o pouco que estava comendo.
- Harry, eu não vou sair correndo. Só que estou com um pouco de pressa então você poderia ser rápido e direto? – Não estava com paciência nem tempo para responder perguntas do amigo e principalmente se ele estivesse tentando reconciliá-la com Rony.
- Por que você está sempre correndo?! Quero falar sobre o que aconteceu hoje de manhã. Que história é essa de você e o Malfoy juntos? Nós sempre odiamos ele e tudo mais. Sonserina, Grifinória, o cara popular, a garota estudiosa, sangue puro, sangue ruim, não que isso importe, é claro, mas pra ele importava. Você até já bateu nele. - Riu com a lembrança - Entende o que quero dizer?
- É só que cansei de ficar esperando pelo Rony sabe? – Ela entendia bem até demais o que ele queria dizer, mas por mais que quisesse lhe contar a verdade não podia, eram ordens de Dumbledore. – E bem o Draco – Fez um esforço para chamá-lo pelo primeiro nome. – apareceu na hora certa e, por mais estranho que isso possa parecer, foi bom pra mim. - Se levantou, depois de deixar o guardanapo ao lado do prato tentando encerrar a conversa. - Agora, se você me dá licença?
Harry se levantou, puxando o braço dela segurou em sua mão olhando em seus olhos. Não soube dizer afinal se a amiga estava mentindo ou não, mas se estivesse ela realmente estava ficando boa nisso. Talvez fosse a convivência com Malfoy, pensou.
- Só me prometa uma coisa. - Disse preocupado enquanto Hermione lhe lançava um olhar impaciente. - Que o que quer que esteja acontecendo, vai tomar cuidado?
Ela não soube dizer se foi o que ele disse ou era apenas a maldição aflorando, mas teve uma imensa vontade de abraçá-lo naquele momento e deixando um sorriso brotar no rosto foi o que fez.

~*~
O último raio de sol se pôs no momento em que Hermione chegou no jardim. Draco já esperava sentado na grama sob a oliveira. Ela parou para admirá-lo por um momento e percebeu que o rosto dele ficava muito mais bonito quando estava relaxado e sua fronte não estava franzida nem seus lábios exibiam um sorriso sarcástico. A palidez de sua pele refletia o alaranjado do céu e se destacava no negrume da noite. De onde ela estava não podia ver seus olhos, mas tinha a certeza de que brilhavam refletindo todo provável vazio de sua alma. Esse último pensamento fez com que ela se punisse mentalmente por estar pensando e reparando tanto nele e se dirigisse até onde estava.
Sentou-se ao lado de Draco silenciosamente e ficou apenas observando o sol se por além dos vales e montanhas, além do lago que refletia seus últimos raios juntamente com toda imensidão da paisagem ao redor.
- Você chorou. - Não era uma pergunta, mas uma afirmação.
Hermione lembrou-se então que sem querer deixara escapar duas lágrimas quando estivera com Harry e também havia esquecido de enxugá-las.
- Ah... - Disse ela levando uma mão ao rosto para limpá-lo. - Não foi nada.
Ele a olhou desconfiado levantando uma das sobrancelhas. Hermione sentiu seu sangue pulsar mais forte nas veias. Por um momento conseguiu ouvir a batida do próprio coração. Fechou os olhos rápido e levou as mãos ao peito apertando o uniforme do lado esquerdo. Draco olhou-a apreensivo.
- Está sentindo alguma coisa?
Ela ofegou.
- Nã-não é nada.
- Vai me dizer que não jantou?!
"Não posso, não posso! Tenho que brigar com ele, ficar com raiva dele!" Pensou desesperada imaginando que fazer isso diminuiria a vontade que sentia de agarrá-lo.
- É claro que jantei, Malfoy! - Disse tentando parecer furiosa e pensar rápido em algo que o provocasse. - Se liga! Isso não tem nada haver com comida, mas se eu quiser ficar obesa o problema é meu e se quiser morrer de fome também!
Draco corou levemente surpreso no que pareceu uma mistura de vergonha e raiva, mas respondeu rápido.
- É esse tipo de tratamento que eu recebo por seguir as ordens daquele velho caduco e tentar ajudar!
- Que e história é essa, Malfoy? - Perguntou, a curiosidade superando a raiva.
- A gente veio aqui pra falar das cartas, ou você já esqueceu?
Ela parou por um momento para pensar e lembrar o que diria sobre sua carta.
- Você primeiro.
- Dumbledore disse para eu vigiar você a noite por causa da maldição. Conseqüentemente a detenção ficou suspensa por tempo indeterminado.
Continuou calada por um momento esperando que ele continuasse, mas vendo que não iria dizer mais nada perguntou:
- E então?
- É só. - Depois de uma pausa. - Sua vez.
- Está bem. - Respondeu percebendo que Draco não contava toda a verdade e por isso resolveu omitir também parte da sua história. - Já sabia sobre você ter de me ajudar e da detenção, além disso Dumbledore diz não conhecer um antídoto e que eu deveria manter-me afastada do castelo durante a noite.
- Ok. - Disse ele se levantando e sacudindo as vestes com classe. - Onde vamos passar a noite?
Sentiu novamente o sangue em suas veias pulsar fortemente e seu rosto corar com violência pelo duplo sentido da pergunta.
- Para sua própria segurança, evite dizer esse tipo de coisa perto de mim. - Falou séria também ficando de pé.
Draco pareceu confuso por um momento.
- Que tipo de... - Então percebeu o que havia dito e corou bem mais levemente que Hermione. - Desculpe. - Tossiu para disfarçar o constrangimento e logo retornou ao seu usual tom sarcástico. - Então quer dizer que a pura e casta Hermione Granger anda tendo pensamentos pecaminosos com uma simples pergunta inocente?
Dessa vez sentiu seu sangue pulsar de raiva.
- Certo. Vamos combinar uma coisa? Não me provoque, em sentido algum.
Ele viu algo quente arder nos olhos dela quando disse isso e repetiu mentalmente que precisava se controlar. Para o seu próprio bem.
- Então, onde nós vamos?
Depois de lhe lançar um último olhar enraivecido ela saiu caminhando pelo jardim dizendo para ele acompanhá-la com um gesto. Draco por precaução resolveu apenas ficar calado e seguí-la.

Hermione guiou-o até a casa dos monstros e sentou-se na cama com a cabeça entre as mãos. Draco sentiu um pouco de dificuldade para pensar numa frase que não fosse provocativa em sentido algum, mas finalmente achou algo que considerasse seguro de dizer.
- Bem... Então, se você precisar de algo é só dizer.
Levantando a cabeça, Hermione olhou para ele tentando forçar um sorriso de agradecimento, mas o máximo que conseguiu foi soltar mais uma exclamação de dor, dessa vez pareceu mais como uma pontada de cólica. Afinal o que era tudo aquilo que estava acontecendo com ela? Draco pareceu preocupado, mas não se atreveu a tocá-la, apenas esperou que ela dissesse algo.
Aos poucos a dor e as sensações estranhas que sentia foram se acalmando e ela achou seguro falar novamente.
- Nós não podemos simplesmente ficar acordados todas as noites, senão de dia não vamos parar em pé. – Essa idéia ocorrera a ela repentinamente. Dumbledore esquecera desse detalhe. – O que vamos fazer quanto a isso?
- Concordo - Respondeu Draco aparentando pouco caso após um bocejo.
- Já sei! – E Hermione contou-lhe sua idéia.
- Minha cama não vai caber aqui e mesmo que coubesse, meus pais iriam enlouquecer ao perceberem que ela desapareceu. As grades do dossel são de ouro maciço e esta na família há anos.
Sem saber se ria ou batia nele, Hermione se decidiu pela primeira opção.
- Qual idiota tem uma cama como relíquia de família?!
Draco tentou um olhar de desprezo, mas sem sucesso.
- Bem, sinto muito por você ser uma sangue-ruim vinda de uma família de trouxas e não saber nada sobre tradição e... AAAAII!!!
- Opa! Desculpa. - Hermione havia conjurado a própria cama que por acidente apareceu com um pé encima do de Draco. Ela o ajudou a levantar a cama para tirar o pé, mas não sem antes rir da cara dele que sentou na borda da cama para massagear o pé.
- Agora é sua vez. - Disse ela recuperando o fôlego.
- Minha vez de quê?
- Arranje correntes... ou cordas.
Ele sorriu malicioso.
- Que tal algemas?
- Não vão servir, são muito curtas.
"Ela deve estar melhorando..." Pensou ele já que Hermione não respondeu com uma cara de dor nem nada parecido. Ergueu a varinha e conjurou uma corrente negra e pesada junto com o cadeado e a chave. Ela ficou um pouco desconfiada quanto à origem daqueles objetos, mas se decidiu por não fazer perguntas. Pegou a corrente e começou a prender uma ponta no pé de cada.
Enquanto ela o fazia ele reparou na cama dela. Era uma cama de solteiro simples, toda feita de madeira escura coberta com um edredom branco cheio de girassóis. Hermione agradeceu mentalmente a sua mãe por não ter coberto sua cama com o conjunto branco cheio de corações vermelhos que ganhara de uma tia no natal.
- Pronto.- Disse ela depois de trancar o cadeado e mostrando a chave a Draco continuou fechando os olhos. - Agora guarde em um lugar seguro.
- Você não acha que está indo longe demais, não?
- Na verdade estou com medo de não funcionar...
Draco colocou uma mão no ombro dela tentando passar confiança, mas não foi tão bem sucedido quanto Harry teria sido se estivesse ali, no lugar dele. Hermione tentou sorrir e convidou:
- Então, vamos dormir?
Ele subiu na cama em que a garota dormira na noite passada pelos pés, pois não havia muito espaço entre as duas camas, e acabou enganchando as correntes. Ela estava de pé atrás dele quando isso aconteceu e caiu na gargalhada com a cena a sua frente. Draco de quatro encima da cama com o traseiro "sorrindo" para ela. Ele percebendo o porque dela estar rindo gritou um "Ei!" que fê-la se virar, mas não parar de rir. Porém ao se virar ela acabou puxando a corrente que já estava enganchada e tropeçando, quando caiu Draco foi parar no chão também, caído com as costas encima dela. Hermione sentiu o bumbum macio de Draco pressionando suas coxas e um arrepio percorrendo cada parte do seu corpo, além de um friozinho no pé da barriga. Ele tentou rolar para o lado para poder sair de cima dela, mas acabou se enrolando ainda mais e apenas conseguindo ficar de frente para ela no chão.
Inspirando profundamente, Hermione fechou os olhos, prendendo o ar e esperando que ele tivesse o bom senso de não beijá-la. Enquanto ela esperava de olhos fechados ele travava uma batalha contra todos os seus sentidos, algo entre o querer e o dever, o certo e o errado. Lutando contra todos os seus instintos Draco colocou uma mão de cada lado dela e se levantou ficando a uma distância segura. Estendeu uma mão para que ela se levantasse tomando o cuidado para que nenhum dos dois caísse novamente.
- Certo. - Disse ele tentando quebrar o clima constrangedor que ainda pairava entre eles. - Vamos os dois juntos, cada um em sua cama.
Ela concordou com um aceno de cabeça e então os dois subiram cada um em sua cama e se deitaram, Draco encarando as costas de Hermione que havia se deitado de lado, olhando para a parede. A cama onde ele estava deitado era totalmente desconfortável, o colchão era fino e por isso podia sentir várias tábuas pressionando suas costas e pernas, mas apesar de tudo isso o que mais o incomodava era a garota na sua frente, as camas estavam quase coladas e ele poderia passar facilmente para o lado dela se quisesse e apesar de saber o quão perigoso isso seria ainda era homem e por isso mesmo mais difícil se conter.
Foi com esses pensamentos que acabou adormecendo.
Já Hermione não teve tanta facilidade assim para adormecer pois os sintomas da maldição ficavam oscilando em seu organismo. Acordou várias vezes no meio da noite sentindo dores de cabeça ou cólicas, mas em nenhuma delas acordou Draco que dormia com o rosto um pouco contraído, provavelmente por causa da cama desconfortável. Sentiu que nada na sua aparência sofreu uma transformação completa como da última vez.

~*~
Era uma tarde ensolarada de sábado e a biblioteca estaria vazia se não fosse por Draco que vasculhava livro por livro na seção restrita. Ele desistira de pedir alguma ajuda a Madame Pince, pois achava que se precisasse usar seu charme mais uma vez com ela, vomitaria. Então decidiu fazer tudo sozinho.
Respirou fundo ao tirar o nariz de dentro de um livro amarelado cheirando a mofo e olhou pela janela a paisagem lá fora. O céu estava nublado do jeito que gostava enquanto cada pedacinho da paisagem parecia estar ficando úmido muito lentamente. A chegada do inverno estava sendo anunciada. E era sua estação favorita.
Decidiu olhar mais um livro antes de ir almoçar. Leu o título do próximo.
- “Poções Muy Potentes”
“Parece interessante”, pensou. “Algumas poções perigosas... poção Polissuco... Essa aqui pode ter algo haver...”. Folheou o livro até uma página que lhe chamou atenção.
- Poção de Charrière. – Leu.
Viu que havia o modo de preparo da poção que seria até bem simples não fosse por alguns ingredientes como lasca de dente de lobisomem e essência de fadas. Leu também a utilidade apesar de já saber seus efeitos por experiência quase própria. Releu o nome da poção, sabia que já tinha ouvido falar de Charrière em algum lugar, provavelmente na aula de história da magia.

~*~ Uma semana depois...
Um livro foi arremessado na parede fazendo as poucas pessoas na biblioteca se assustarem e Madame Pince se levantar furiosa em direção onde o loiro que o arremessara estava.
- Sr. Malfoy!
Se virando para olhar a mulher as suas costas respondeu em um tom grosseiro:
- O que foi?!
- Se o sr. continuar a jogar livros de mais de duzentos anos na parede serei obrigada a confiscar seu passe para a seção restrita.
Sem responder , Draco se levantou e apanhou o livro caído no chão enquanto a bibliotecária se afastava ainda contrariada.
Fazia dias que procurava algo sobre a poção de Charrière e o próprio Charrière, mas tudo que tinha encontrado se referia a um poeta idiota com o mesmo nome que tinha vivido na idade média. Decidiu que já era hora de começar a se acostumar com a idéia de que teria que acabar pedindo ajuda a Hermione.

~*~
O salão principal era preenchido com o burburinho diário da hora do almoço. Talheres batendo em pratos e pessoas conversando ruidosamente. Sentada ao lado de Gina estava Hermione e de frente para elas, do outro lado da mesa, Harry e Rony. Já fazia alguns dias que Rony tinha parado de implicar com ela e parecia até estar aceitando melhor a idéia de Hermione e Draco juntos. Parecia estar voltando a ser o bom amigo de antes e a garota não sabia se ficava feliz ou triste com isso. Por um lado era bom, pois ele não a perturbava mais, mas por outro era sinal de que ele realmente não sentia nada por ela além de amizade e um amor fraternal. Isso deveria deixá-la chateada, mas por algum motivo que desconhecia não fez nenhum efeito algum em seus sentimentos ou seu humor.
- Hermione, olhe! – Era Gina que tirou a amiga de seu devaneio apontando animada para um passarinho negro feito de papel vinha voando em sua direção da mesa da sonserina. O passarinho pousou na mão dela e se desfez abrindo em um bilhete.
“Você sabe algo sobre um tal de Charrière?”
“Draco”
Debruçando-se por cima dela para ler Gina ficou repentinamente muito vermelha e gaguejou levando uma das mãos a boca:
- Eu sabia!
Se virando muito surpresa Hermione perguntou:
- O quê?
Harry também ficou curioso.
- O que tem ai?
Gina não quis dizer, mas Hermione passou o bilhete para que ele lesse, não vendo nada de mais.
“Vou deixar a banheira preparada com pétalas de rosas como você gosta”
“Draco”
Devolvendo o bilhete, Harry também ficou muito vermelho. Foi ai que Hermione percebeu que Draco estava rindo bastante em seu lugar.
- Poxa, Mione! Você não precisava ter me mostrado isso! – Reclamou Harry.
- Gina o que você leu escrito ai? – Perguntou desconfiada. Gina se aproximou e cochichou em seu ouvido.
Depois de explicar o mal entendido aos amigos, Hermione se levantou da mesa da Grifinória e foi em direção a mesa da Sonserina bastante irritada. Parando ao lado de Draco, que automaticamente assumiu uma postura séria ao vê-la, se aproximou o suficiente para que ninguém visse quando apontou a varinha para o peito dele.
- Siga-me, Draco. – Ele abriu a boca para protestar, apesar de um pouco assustado, mas ela não deixou. – E sem um pio.
Draco se levantou contrariado e seguiu-a até os jardins. O céu estava carregado e apesar de ser mais ou menos uma hora da tarde o ambiente estava escuro, úmido e vazio.
- Certo, agora que história foi aquela de enfeitiçar aquele bilhete com aquele negocio de banheira?- Perguntou guardando a varinha já com um pouco menos de raiva.
- O quê? Vai dizer que você não achou divertido? – Disse sentindo-se mais seguro por ela ter guardado a varinha e parado de bufar.
- QUE DROGA MALFOY! – Gritou deixando-o bem assustado. – Por que diabos você imaginou que eu acharia aquilo divertido? Faz uma semana que a Gina me persegue me acusando de dormir com você. O Rony não leu o bilhete, mas provavelmente percebeu do que se tratava a conversa e vai perguntar pro Harry mais tarde e vai parar de falar comigo de novo! Tudo por causa dessa porcaria de maldição e agora você só piora as coisas com esse bilhete! – Concluiu respirando fundo para tentar recuperar o ar, tentando não encarar Draco pois achava que se o fizesse partiria pra cima dele com todo seu ódio.
- Desculpe.
- Como? – Ela não entendeu.
- DES-CUL-PE! – Exclamou Draco corando o máximo que seu rosto pálido permitia.
Hermione parou boquiaberta mal conseguindo acreditar no que ouvia.
- Não acredito...
- Você não vai querer que eu repita denovo, vai?
Ela sorriu.
- Não. Tudo bem, ta desculpado. E já ia sair caminhando em direção a escola quando Draco a deteve segurando em seu braço.
- Como assim? – Perguntou confuso.
- Como assim o quê? Sem problemas, ta desculpado. Pode soltar?
Ele ainda parecia confuso quando soltou o braço dela. Então era só isso? Não precisava dizer mais nada? Olhou-a nos olhos e percebeu que a raiva presente neles há pouco fora substituída por um sentimento divertido, mais... feliz. Nunca imaginou que uma pessoa pudesse ficar contente daquele jeito por causa de uma simples palavra.
Foi mais enquanto pensava nisso que McGonagall apareceu, pedindo que os dois a acompanhassem até sua sala.
- Sentem-se. – Disse ela ao chegarem na sala indicando duas cadeiras a sua frente. – Agora, eu gostaria de dizer que estou muito surpresa com o seu desempenho nas aulas sr. Malfoy... – Draco a olhou enraivecido. Será que aquele dia era o dia de “humilhar um Malfoy”? – Ele tem piorado consideravelmente. Então é por esse motivo que gostaria de pedir a srta. Granger que o auxilia-se nos deveres e estudos em geral.
- Tudo bem. – Respondeu a garota sorrindo consigo mesma. Ela sabia que Draco estava se sentindo no mínimo envergonhado com tudo aquilo e bem, sempre era bom ter uma chance de implicar com ele de vez em quando também, porque apesar de nunca admitir ela achava um pouco divertido as discussões dos dois.
A professora agradeceu Hermione e os dispensou.
- Então o que você tem a me dizer sobre o tal de Charrière? – Perguntou Draco assim que saíram da sala tentando evitar que falassem sobre a conversa tida com a professora.
- Ah é! Ele era um poeta francês que viveu na Idade Média. Mas você não me contou que estava se saindo mal nos estudos...
- Você só conhece esse Charrière? – Interrompeu tentando continuar sem entrar no assunto.
- Sim. Como você quer que eu te ensine? Podemos fazer isso a noite, se você preferir.
- Eu não preciso da sua ajuda, droga! – Disse parando de caminhar e levantando o tom de voz.
- É claro que precisa, caso contrário McGonagall não me pediria para te ajudar. Acho que agora você também é minha responsabilidade. – Disse se referindo a carta de Dumbledore para ele. Se colocou na ponta dos pés com um sorriso que meio estranho e apertou o nariz dele surpreendendo-o. Draco fungou dando dois passos para trás assustado com seu nariz ardendo e uma vontade de espirrar.
- Por-por que?! O que significa isso? – Perguntou confuso fazendo caretas para ver se o nariz parava de coçar e vendo Hermione rir descontroladamente.
- Nada... é-é só que... você é sem-sempre tão sério... só para descontrair. – Disse ainda rindo e recuperando o fôlego aos poucos. – Mas que idéia foi essa de colocar uma frase daquelas no bilhete?
- Ah! Pensei que você ia gostar. – Disse Draco sentindo seu nariz já restabelecido.
- Quem sabe se fosse um jantar a luz de velas... – Hermione falou meio sonhadora. Draco a observou divertido, imaginando como seria jantar a luz de velas com ela. Não lhe pareceu uma idéia tão má, talvez fizesse uma surpresa qualquer dia desses.
Quando ela voltou a olhar para Draco o surpreendeu com um olhar distraído em sua direção. Estalou os dedos na frente do rosto dele, a pulseira tilintou tirando-o do devaneio. Antes que ela pudesse afastar o braço ele o agarrou e perguntou voltando a seu ar arrogante de sempre:
- Que pulseira é essa?
- É só uma pulseira. – Respondeu tentando puxar o braço sem sucesso.
- Não é não. Foi o Weasley?
- Não. Larga meu braço!
Puxando o braço dela mais para cima Draco tirou a pulseira deixando que o pulso dela escorregasse pela sua mão. Hermione sentiu uma rápida vertigem, mas por sorte estava perto da parede e conseguiu se apoiar. Ele olhava a pulseira interessado e não percebeu.
- Não me parece algo que um Weasley possa dar de presente, mas depois que os irmãos dele montaram aquela loja... nunca se sabe.
Já conseguindo ficar de pé sem apoio, Hermione pulou numa tentativa de pegar a pulseira na mão dele. Draco puxou a mão mais pra cima bem na hora.
- Draco, me devolve a pulseira...
Os olhos dela começaram a arder ao ouvir a pulseira tilintar novamente nas mãos dele. Se ele a quebrasse ambos estariam perdidos.
- Por que? Você tem medo que eu quebre o presente do seu precioso namoradinho?
- Idiota! Meu namorado é você! – Sem conseguir mais conter as lágrimas Hermione pediu, mais uma vez, chorando pela pulseira. Ele ficou surpreso com isso, não imaginava que aquele objeto idiota fosse tão importante para ela, mas não deixaria todos verem a sua garota usando algo que outro lhe dera.
- É, mas não parece sabe… as vezes acho que você esquece disso. – Respondeu ainda brincando com a pulseira e sentindo sua garganta ficar estranhamente apertada.
- Você quer mesmo saber o que é essa maldita pulseira? – Começou ela vendo que o único jeito de fazê-lo devolver era contando a verdade. – Ela veio junto com a carta de Dumbledore e é a única coisa que detém a maldição a noite, apesar de como você pôde ver ter seus efeitos colaterais de vez em quando... – Ela se referia as noites que o obrigara a passar em claro fazendo compressas para dor ou para abaixar ou elevar sua temperatura.
Draco parou de brincar com a pulseira ficando sério e boquiaberto por um momento. Hermione se aproveitou dele para pegar de volta o objeto e colocá-lo no pulso. Passou as mãos no rosto limpando as lágrimas e começou a se distanciar dele a passos largos. Ele então lembrou de algo que talvez não a deixasse com tanta raiva.
- Me desculpe! – Gritou para ela que já estava um pouco longe.
Hermione se virou e o encarando, com o rosto ainda manchado pelas lágrimas, respondeu:
- Dessa vez você vai precisar de um pouco mais do que isso para conseguir meu perdão, Malfoy.

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