Duas Mudanças Radicais
Não falaram daquilo por dois meses. Durante as aulas, tratavam-se como aluna e professor, como se nada tivesse acontecido, embora Harry e Rony tenham achado que Mione estava diferente. Mas ela não disse nada a eles; não poderia confessar que estava a fim de Snape.
Mesmo Snape estava agindo de um modo muito diferente: não estava tão ríspido; parecia mais calmo, embora mantivesse o ar de superioridade. Durante as aulas, passou a repreender os sonserinos, e perdia a paciência com qualquer um facilmente. Mesmo os colegas de trabalho notaram a mudança. Ele já não respondia atravessado para todos; procurava manter a paciência. Numa reunião de professores, para decidir se haveria ou não baile de Dia das Bruxas, McGonagall perguntou o que Snape achava, na certeza de que ele diria que era tudo bobagem, mas ele disse um frio “tanto faz”.
- Severo, o que está acontecendo com você? – perguntou Minerva por fim.
- Nada – respondeu ele.
- Ah, Severo, já que você não pode mais espionar as reuniões de Voldemort para nós, tenho que te pedir para fazer algumas poções complicadas. Depois da reunião, fique.
Snape assentiu. Quando a reunião acabou, Snape ficou. Dumbledore disse:
- É uma lista de sete poções diferentes, todas muito complicadas, e preciso delas o mais depressa possível.
Snape olhou a lista que Dumbledore lhe passara e perguntou com indiferença:
- Quando seria essa “mais depressa possível”?
- Uma semana.
Snape arqueou a sobrancelha.
- Nem que eu esquecesse todas as minhas aulas durante essa semana eu conseguiria. A menos que eu passasse a noite inteira acordado e...
- Ah, então, eu pensei que você poderia chamar a srta. Granger para te ajudar – disse o diretor, estudando as reações e Snape, olhando-o por cima de seus oclinhos meia-lua.
Snape, por um momento, nada disse, mas depois procurou ser bem direto:
- Não sei se isso seria adequado, professor Dumbledore.
- E por que não? – perguntou o diretor, olhando-o ainda por cima dos óculos.
- Porque estou sentindo alguma coisa pela Granger; não gostaria de fazer nada impensado – disse Snape. – Sim, sou um monstro, Dumbledore, mas estou sendo sincero com você.
- Você teria feito mal a ela na primeira oportunidade, se fosse assim – retrucou Dumbledore. – Naquela noite no lago.
Snape sacudiu a cabeça.
- Um velho onisciente – comentou o professor. – Sim, mas eu não queria assustá-la. Está tudo mais delicado entre mim e ela depois do que eu fiz. E espero que continue assim. Eu não quero mudar nada. É minha aluna, seria falta de ética.
- Ah, Severo, que ética? – perguntou Dumbledore. – Só não quero que você faça mal a ela, mas isso você não vai fazer. Além do mais, eu realmente preciso dessas poções para logo. Se puder, chame-a na sua sala hoje mesmo e comecem a fazer tudo.
Snape não discutiu. Assentiu.
Durante o almoço, Hermione recebeu uma coruja preta, que ela não conhecia. Pegou o pergaminho e leu-o. Era de Snape. Reconheceria aquela letra mesmo antes de ler a assinatura. Não deixou Harry e Rony lerem, o que os deixou desconfiados.
Eis a carta:
“Srta. Granger,
O professor Dumbledore me pediu uma lista de sete poções para o fim dessa semana, mas é impossível fazê-las sozinho, e o próprio diretor me mandou chamá-la para me ajudar.
Não tive nada a ver com isso, senhorita, e prometo que não vai acontecer nada com você; vai só me ajudar. Te espero na minha sala logo depois do jantar.
S.S”
Hermione rasgou o pergaminho e lançou um breve olhar à mesa dos professores, na direção de Snape, fazendo que sim com a cabeça.
Depois do jantar, Hermione logo bateu à porta daquela sala nas masmorras. Snape veio abri-la pessoalmente. Hermione logo sentiu o calor que vinha de dentro da sala e, ao adentrá-la, logo tirou o casaco. Já estava com uniformes novos, e os mantinha com cuidado.
- Já começou a fazer? – perguntou ela, olhando os caldeirões borbulhando em uma bancada.
- Já; muito a fazer – disse ele. Parecia abatido.
- O que foi? – perguntou ela.
- Nada. Vamos. Você faz a poção do sono com perfeição. Pode fazer três caldeirões.
- Uau, três! – exclamou ela impressionada.
- É, o Dumbledore deve estar com algum plano mirabolante – comentou Snape.
Dessa vez ele não estava à sua mesa, em plano mais alto. Estava entre duas bancadas, mexendo com poções. No mesmo plano que ela, não como um superior, mas como um igual.
Hermione pôs-se e cortar os ingredientes.
- Ahn... até que horas vamos ficar aqui, professor? – perguntou ela, enquanto começava a misturar os ingredientes do primeiro caldeirão.
- Você, só até meia-noite – disse ele. – Dumbledore me disse para não deixar você ficar mais. Já eu... bom, isso é uma outra história. Mas se concentre apenas no seu trabalho.
- Sim, senhor.
Era estranho ainda se tratarem com tanta formalidade depois daquele caloroso beijo à beira do lago, mas era o que acontecia. Quando já tinha posto todos os seus três caldeirões para cozinhar, Hermione decidiu perguntar:
- O que o senhor tem, professor? – perguntou ela. – Está me parecendo tão abatido!
Snape evitou olhá-la. Apenas disse:
- Você não gostou muito da última vez que eu expliquei o que havia comigo, Granger. Deixe as coisas como estão.
Hermione achou melhor não retrucar. Fazia muito tempo que vinha sentindo algo de diferente por seu professor, mas não achava que ele pudesse sentir alguma coisa por uma nascida trouxa que ele gostava tanto de humilhar. Mas, ao vê-lo tão abatido, pensou se ele poderia estar gostando dela de verdade, além daqueles limites da atração física. Sim, porque ela achava que não tinha nenhum atrativo, o que não era nem verdade e nem mentira.
Ele também tinha deixado sua parte de poções no fogo; foi sentar-se a um canto na bancada e começou a escrever em um relatório. Na sala só se ouvia o barulho dos caldeirões borbulhando e a pena dele riscando o pergaminho.
- É tão estranho ver o senhor a uma bancada – comentou Hermione, tentando puxar assunto. – Sempre está em plano mais elevado... Como se fosse muito superior a nós...
Snape limitou-se a olhá-la, e ela se apressou a dizer:
- Ahn... não que não seja, mas é que estar mais alto sugere uma distância dos alunos, como se as relações profissionais fossem mais evidentes do que precisariam ser e...
- Calma, Granger, não precisa se justificar; está se enrolando toda – disse ele, de um modo que fez parecer que ele estava achando engraçado vê-la atrapalhada. – Eu entendi o que você disse; eu também acho isso. E, para seu maior esclarecimento, não estou desempenhando o papel de seu professor no presente momento, por isso não estou usando a minha mesa. Agora, se não se importa, fique calada, que eu preciso terminar esse relatório.
- Ahn... sim, senhor – disse ela.
Passaram-se meia hora: acabava de dar nove e meia no relógio. Ele ainda estava escrevendo; Hermione cansou de verificar como andavam as poções a cada cinco segundos e se levantou. Foi ver os ingredientes que ele tinha no armário.
Snape, sem mudar a posição da cabeça, apenas virou os olhos para olhá-la. Ela estava meio de lado, meio de costas para ele, analisando os ingredientes. Ele assinou o relatório e enrolou o pergaminho. Levantou-se. A aluna virou-se para ele.
- Quanta coisa! Dá pra fazer uma bomba com o que o senhor tem aqui – disse ela, rindo.
- Uma o que? – perguntou ele.
- Ah, é... o senhor só convive com o mundo dos bruxos, mesmo quando está entre trouxas... Bomba, sabe... tipo... explosões enormes, grandes barulhos, deslocamentos de ar...
- Ah... mas é mais fácil usar magia pra fazer isso, não? – questionou ele, guardando o pergaminho em um outro armário, que estivera trancado até ali.
- Na verdade, é – disse Hermione. – Mas os trouxas não conhecem magia, né, têm que fazer tudo sem ela...
- Ah, claro. Eles têm que inventar coisas para suprir a falta de magia.
- E isso não é de todo ruim... Botam o cérebro pra funcionar... Bom, alguns. Mesmo os bruxos fazem isso... Mas é engraçado saber como é a vida sem magia, aprendemos a ter alguma criatividade.
- Ah, inventar feitiços também trás criatividade – retrucou Snape.
- Qualquer coisa que nos faça pensar – concordou Hermione. – Pensar é mais hábito que dom. Não concorda, professor?
- Ah, sim, de fato – disse Snape. – O problema é ver pessoas que não têm dom para usar o cérebro e nem o hábito de fazê-lo.
Hermione deu uma risada espontânea.
- O senhor deve estar falando de alguém da minha casa – comentou ela.
- Mas que mente ágil – disse Snape, extremamente irônico.
Hermione sorriu.
- Um dia eu me acostumo com as suas ironias... Pena que eu só tenha aprendido a conviver com elas quase no fim da minha vida escolar em Hogwarts. Teria sido bom perceber como o senhor realmente é bem antes...
- Todos perdem muito tempo na vida, Granger.
- Eu gostaria de ter visto o verdadeiro Severo Snape antes de achar que o senhor queria roubar a pedra filosofal... – disse ela, com um sorriso sem graça.
- As aparências enganam; é normal me verem como o vilão da história. Eu sou, na verdade.
- Talvez um anti-herói – ponderou Hermione, olhando para os olhos negros dele. – Mas não o vilão. Se bem que devo dizer: os vilões são mais legais.
E deu uma risada divertida.
Snape sussurrou naquele tom letal:
- Acho melhor você parar de me provocar, Granger. Está com fome? Faz algum tempo que estamos aqui. Vou mandar os elfos trazerem algum lanche, você quer alguma coisa?
Hermione fez que sim com a cabeça.
Logo os elfos trouxeram lanches para os dois. Eles se sentaram a uma bancada desocupada e comeram.
- Espero que não seja muito desagradável trabalhar comigo – disse Snape, um pouco sério, com um meio-sorriso amarelo.
- Ah, é bem menos ruim do que imaginei que seria. Ter o cruel professor Snape como “chefe” não foi a perspectiva mais animadora da minha vida, devo dizer, mas tá tudo bem. Ainda não me chamou de “Sabe-Tudo”...
Snape deixou-se ficar em silêncio por algum tempo. Parecia se decidir entre falar sobre algo ou não, quase como alguém que decide se vai ou não tocar num assunto muito delicado.
- Granger... – começou ele devagar, medindo bem as palavras. – Eu... tem umas coisas que eu tenho que te dizer agora. Eu gostaria que você ignorasse tudo o que eu disse depois, que voltasse a ser tudo normal, mas tenho que falar. Seria horrível te ver indo embora sem ter dito nada antes.
Hermione ajeitou-se no banco em que estava sentada. Não tinha muita certeza de que queria ouvir, temia não saber como reagir, mas achou melhor deixá-lo falar. Afinal, ele ainda era Severo Snape.
- Bom... admirei você como aluna desde que vi que você saberia responder a todas as perguntas que fiz ao Potter no primeiro dia de aula do primeiro ano. Não era qualquer aluno que poderia responder àquilo. Mas você tinha um defeito incorrigível: era da Grifinória. Não poderia se tornar minha protegida, minha preferida. Por isso dificultei a sua vida. Fui o mais insuportável que pude, o mais cruel, enfim, o pior de todos os carrascos. Mas não deixava de te admirar. A cada vez que eu a fazia chorar eu achava que isso a deixaria quieta para eu poder admirar algum aluno de minha própria casa, mas você erguia a cabeça e continuava, como que me desafiando. Por muitas vezes eu desejei que você fosse sonserina, para que eu pudesse conceder todos os pontos que você merecia. Mas não, justo você era uma sangue-ruim da Grifinória. No segundo ano, eu soube que você fez a poção polissuco com sucesso. Fiquei admirado. Só eu conseguiria fazer essa poção tão cedo, de todos os bruxos que eu conheço, exceto, talvez, Dumbledore. No terceiro ano, quando vi que você foi a única que descobriu que Lupin era um lobisomem, depois daquela redação que eu mandei todos fazerem, minha admiração aumentou mais. Você era uma aluna brilhante mesmo, como eu nunca tinha visto. No quarto ano, percebi uma coisa diferente: não gostei de ver você com o Krum. Ciúmes era uma experiência nova para mim, mas eu senti. Depois, no quinto ano, quando você voltou do Ministério, fui visitar você na Ala Hospitalar várias vezes, sob o pretexto de ir ver como estavam os alunos que haviam estado com o Lorde das Trevas. No sexto ano... bem, podemos pular essa parte, quando todos acharam que eu era mesmo um traidor e só você acreditou em mim... Sim, eu soube que você ajudou a provar que o plano que envolvia eu e Dumbledore era uma farsa. Se você não tivesse convencido o diretor a aparecer, eu não estaria aqui. Eu infelizmente descobri que sentia mais que mera admiração e gratidão por você. Pronto. Falei. Já podemos voltar às poções.
Ao dizer isso, ele se levantou e foi até uma bancada. Hermione ainda processava tudo que tinha ouvido dele. Seu cérebro trabalhava a mil. Ele tinha mesmo enrolado para dizer que a amava? Ela sentiu um calor em seu peito. Era um misto de remorso por ter pensado tão mal dele e uma vontade de dizer a ele o que achava.
- Ahn... professor – disse ela, desconcertada.
- Eu disse que queria que você ignorasse o que eu disse, Granger – disse ele, sem olhá-la. – Venha aqui, veja como andam as suas poções, que eu não tenho tempo para elas.
- Sente-se – disse Hermione, com um tom imperativo que o fez parar o que estava fazendo para olhá-la. – O senhor já disse o que sentia. Posso falar agora?
- Não, não pode, Granger, não preciso me sentir mal agora. Quem sabe depois que eu terminar de fazer as poções? Preciso de concentração. Não posso ficar me recriminando por ser quem eu sou.
Hermione levantou-se e foi até sua bancada. Estava um pouco receosa em falar. Nem sabia se teria coragem de falar para ele o que ela estava sentindo. Se ele a olhasse daquele jeito, ela não conseguiria falar. Tinha certeza disso.
Ele parou perto dela, olhando os caldeirões dela.
- Já está pronto? – perguntou ele.
- Ahn... quase – hesitou Hermione.
- Vou buscar as garrafas para guardar tudo – disse Snape.
Hermione ficou pensativa. Snape sabia se controlar. Ela sentia que ele a queria, mas a respeitava. Provavelmente estava com medo de assustá-la.
Ele logo voltou e deixou algumas garrafas em cima da bancada dela.
- Professor – chamou ela.
Snape atendeu-a prontamente.
- Sim, Granger?
- É... han... bom... pode me ajudar a engarrafar essas poções?
- Claro – disse ele, aproximando-se.
Ele parou bem ao lado dela e ajudou-a com a tarefa. Ele já havia terminado a dele.
- Cuidado, Granger – disse ele.
Quando terminaram, Snape foi até o armário e guardou tudo num compartimento secreto.
- Vamos limpar esses caldeirões para já adiantar as próximas poções. Levam dois dias para ficar prontas.
Hermione assentiu. Começou a limpar caldeirão por caldeirão com cuidado, mas ainda pensando em como falar com Snape.
- Já acabou? – perguntou ele.
- Han... não – murmurou ela.
Snape aproximou-se.
- Não é assim. Em sete anos de aulas de Poções, você já devia ter aprendido um jeito de limpar isso melhor e mais rápido – disse Snape.
O professor parou em pé atrás dela, que estava sentada num banco, e pegou uma das mãos dela, fazendo-a segurar o caldeirão de um jeito diferente e, segurando a outra mão dela, ensinando-a como passar o pano.
Hermione estremeceu com a proximidade. E ele percebeu.
- Está tudo bem, Granger? – perguntou ele, talvez para provocar.
- Ahn... aham – gaguejou ela.
- Viu só? É assim – disse ele, soltando as mãos dela. Antes que ele se afastasse, porém, ela virou-se e encarou-o de frente.
- Antes de começar outras poções eu quero falar com você – disse ela, finalmente decidindo-se.
Snape arqueou a sobrancelha.
- Você acha que é uma insensível, e acha que também sou assim. Disse tudo o que sentia como se eu o achasse um lixo. Não é bem verdade – disse ela. – Eu... sempre achei o senhor um bom professor. Claro que eu não gostava de ser humilhada, mas eu não precisava ficar me exibindo como a “insuportável srta. Granger”. Entendo que o senhor quisesse que tivesse um aluno da Sonserina que fosse o melhor de todos... e... quando o senhor estava dando a aula, com humilhações e maldades à parte, era um bom professor. Talvez... o melhor de todos. E... não sei... acho que, quando eu estava com o Krum... eu só queria que o senhor reparasse e... e mostrasse algum sinal de ciúmes... Mas depois me senti uma idiota de primeira, sabe, porque o senhor ia querer alguém mais madura que eu...
- Você é mais madura que muita velha por aí – ponderou Snape. – Mas não tem a desvantagem de ser toda preocupada. As preocupações tornam as pessoas mais amargas...
- Tá, mas era a minha vez de falar, então espere – disse Hermione. – Se não eu perco a coragem de falar. Então, e, além disso, achei que fosse só uma ilusão de menina querendo chamar a atenção de seu professor. Mas, quanto mais eu sabia sobre o senhor, mais o admirava... então... de repente, comecei a sentir raiva daquelas vacas do sétimo ano do ano passado... aquelas sonserinas que não saíam de perto do senhor... nem tinham sobre o que falar, não sabiam de nada... e, pelo pouco que eu sei, o senhor gosta de pessoas inteligentes e então tive uma pequena esperança, porque a única qualidade que eu tenho mesmo é a inteligência. Esperança que o senhor destruiu no primeiro dia de aula. Eu tinha passado três meses na França, tentando me distrair, mas pensava em voltar para Hogwarts, em como deixar de ser “a insuportável Sabe-Tudo”... E... bom, acho que depois disso eu quis me afastar... E então, o senhor vem me dizer que sente alguma coisa por mim, embora não tenha especificado se é atração ou amor, ou carinho, ou sei lá que raios, mas enfim, vem me dizer que sente algo e depois quer que eu esqueça. Agora me diga: como?
Snape olhava-a, num misto de espanto e satisfação.
- Eu não pensei... achei que você tinha alguma coisa com o Potter ou com o Weasley – disse Snape lentamente. – Principalmente quando o Potter entrou na Ala Hospital e, sentado ao seu lado na cama, ficou segurando a sua mão enquanto contava o que tinha acontecido na sala de aula.
Hermione olhava para o chão, pensativa. Ainda sem voltar a olhar para ele, disse:
- E o que fazemos agora? Eu já disse, o senhor já disse.
Snape pôs a mão em baixo do queixo dela e o pressionou levemente, para fazê-la encará-lo.
- Me chame de “você”, só isso – disse ele, aproximando-se mais.
E beijou-a. Outro beijo caloroso e cheio de paixão. Ela abraçou-o com força e aceitou o beijo. E novamente sentiu uma das mãos dele passando por suas pernas com ousadia. E novamente afastou o rosto do dele e encarou-o.
- Me desculpe – disse ele. – Eu não pretendia assustá-la e...
Mas Hermione pôs a mão nos lábios dele para fazê-lo se calar. Depois, pegou a mão dele e a pôs em sua cintura, mais para baixo, na verdade. E, levantando-se, beijou-o. Ele abraçou-a com força e deixou o beijo mais ousado, mais... quente. Agora suas mãos percorriam as costas dela por dentro da blusa; ela fazia o mesmo.
Ele afastou-se e olhou-a.
- É isso mesmo o que você quer? – perguntou ele, com a voz meio rouca.
Hermione começou a abrir o sobretudo dele.
- Mas ainda sou uma inexperiente... – murmurou ela.
Depois, começou a abrir a própria camisa de uniforme. Ele, no entanto, tirou as mãos dela e ele mesmo abriu a camisa dela. Hermione nunca pensou o quanto isso era agradável. Ele tirou a camisa dela. E ela a dele. E beijaram-se, trocando carícias cada vez mais ousadas. No fim, amaram-se ali mesmo. Ele levou-a para seu quarto – que era acima da sala, por uma entrada bem secreta. Deitou-a na cama e deixou-a dormir. Arrumou toda a sua sala para que ninguém viesse a perceber o que acontecera ali. Então subiu e, dando um beijo na testa dela, deitou-se ao seu lado na cama e dormiu.
Acordou com uma mão, que ajeitava seu cabelo, tirando-o do rosto.
- Bom dia – disse ela.
Ele sentou-se de um salto.
- Que horas já são? – perguntou ele, um pouco preocupado.
- Calma, ainda são cinco – disse ela. – Se não, eu mesma já teria ido embora. Mas tem um detalhe: Filch.
- Se você encontrá-lo no corredor, diga que eu a segurei até agora para terminar o trabalho que estou fazendo para Dumbledore.
- E o que dizer ao diretor? – perguntou Hermione apreensiva.
- Nada – disse Snape. – Se ele perguntar, se esquive. Não minta para ele, vai parecer algo muito errado.
Hermione deu um sorriso amarelo.
- Qual é o problema? – perguntou ele.
- Ahn... não sei... acho que não quero sair daqui... não quero me levantar, não quero ir embora – disse ela.
- Ah, mas precisa. Você precisa terminar o colégio; ainda faltam alguns meses para isso acontecer – disse Snape, permitindo-se um sorriso leve.
Hermione levantou-se, enrolando-se no lençol.
- Bom... Eu... tenho que me trocar... As minhas roupas ainda estão lá embaixo?
- Não – disse ele, indicando o que ela procurava em cima de uma cômoda.
- Ah... – disse ela, parecendo constrangida.
- Qual é mesmo o problema?
- Nada – murmurou ela.
- Você não gostou, foi isso? – perguntou ele, com cuidado.
- Não, não é isso! – apressou-se ela em dizer. – É que devo ter te decepcionado, né?
- Por que está dizendo isso? – perguntou ele.
- Não sei... o senhor não deve ter tido tempo para muitas amantes e... teve que tomar cuidado comigo, né?
- Ah, não fale bobagens, Hermione – disse ele, puxando-a e abraçando-a em seguida.
Era estranho ouvi-lo dizer seu primeiro nome, mas ela nada disse. Apenas abraçou-o.
- E o que fazemos agora? – perguntou ela. – Sei que não é certo estarmos juntos e...
- Não comece com problemas... Já tenho muitos na minha vida...
- E o que você sugere, então? – perguntou Hermione, desvencilhando-se dele e afastando-se.
- Ah, você pretende ficar irritada – comentou ele, naquele tom debochado bem típico dele. – Está bem; fique.
Hermione pegou suas roupas e trancou-se no banheiro dele; Snape murmurou para si mesmo:
- Mulheres...
Hermione saiu; ele já tinha se vestido também.
- Ah, por favor, não me trate mal – pediu ela.
- Foi você que resolveu ficar irritada comigo – retrucou Snape, cruzando os braços. – Eu só disse que já tinha problemas demais na minha vida. Mas não esperava que você me compreendesse mesmo.
- Me desculpe – sussurrou ela, envergonhada. – Estou sendo egoísta. Bom, então vou fingir que nada aconteceu e podemos esquecer tudo...
Ela falara aquilo como se esperasse ouvi-lo dizer que não, que não aceitaria aquilo, mas ele nada disse; apenas assentiu em silêncio e depois acrescentou:
- Eu não poderia deixar você estragar a sua vida comigo.
Hermione ia retrucar, ia dizer que ele estava errado, mas não encontrou as palavras. Não podia acreditar. Aquela fora a primeira noite da vida dela e ele simplesmente a tratava com indiferença. Ela sentiu raiva dele, mas depois se recriminou por estar sendo tão infantil. Não podia esperar outra atitude de Severo Snape, mesmo depois do que ele dissera. Aliás, ele não dissera que a amava, podia sentir qualquer coisa, mesmo só atração física.
- Han... eu vou para o meu quarto – disse ela, virando o rosto rápido e saindo correndo.
Ela fora tão rápida que Snape não tivera nem tempo de ir atrás dela: a garota já estava longe. Depois ele se perguntou se ela ia chorar. E sentiu uma espécie de peso na consciência. Lembrou-se vagamente de ela ter mencionado que era virgem, mas ele não acreditara, até ver que era verdade.
Mas ele não poderia querer algo mais sério com ela; a menina era sua aluna e muito jovem, certamente iria querer algo melhor que ele. Não que ele não se achasse bom o bastante para ela, mas se julgava muito mais velho; ele sabia que era.
Durante as aulas que se seguiram, não só de Poções, Hermione estava meio aérea. Não respondia quando os professores perguntavam, não dava atenção ao que os amigos diziam. Seus pensamentos estavam muito longe. Mas, ainda assim, foi bem nas primeiras provas. Muito bem. Isso espantou todos, que decidiram que, afinal, ela desistira de ser a grande Sabe-Tudo, como Snape deixara de chamá-la fazia algum tempo.
Aliás, Snape, embora continuasse a ser o mais detestado dos professores, tinha qualquer coisa de novo. Talvez um pouco mais de paciência antes de fazer Neville se sentir um lixo.
Afinal, o Dia das Bruxas chegou. Dumbledore anunciara duas semanas antes que seria uma festa temática, como outras que já haviam tido na escola. Esse ano era Idade Média. Todos deveriam se vestir de acordo com os hábitos daquela época. E o próprio diretor sugerira que os alunos fossem de bruxos mesmo, mas não para serem queimados vivos, como anunciou de muito bom humor.
Era chegada a hora do baile. Hermione não aceitara nenhum convite. Não dissera a ninguém sobre seus trajes especiais. E ainda não havia chegado à festa mesmo duas horas depois que esta havia começado.
Os amigos já ficavam preocupados, e foram falar com Dumbledore, que estava conversando animadamente com Snape e McGonagall.
- Professor, o senhor viu Hermione? – perguntou Harry.
- Ah, a srta. Granger já está a caminho, se não me engano – disse o diretor distraidamente. – Deve ter tido problemas com as fantasias; as meninas sempre têm...
- Ah, mas duas horas? – perguntou Rony. – Ela foi fabricar o vestido? Deve estar costurando à mão; porque com magia é mais rápido!
- Na certa ela está indecisa entre vir de fada ou de princesa – disse Snape num tom de desprezo. – Ela sempre vem com vestidos de santa.
- Ah... – Rony começou a falar, mas sentiu alguém cutucar seu braço. – Que é?
Era Parvati Patil, que parecia muito ansiosa para fazer uma fofoca.
- Que é? – perguntou Rony asperamente.
- Vocês viram Hermione Granger? – perguntou ela, ansiosa. – Está linda!
Mas havia muita gente impedindo a entrada da garota pela porta; nenhum dos cinco conseguiu vê-la. Snape olhou para a garota que ali estava e perguntou com desprezo:
- Na certa sua amiga está de fadinha? Ou de anjinho? Ou de princesa?
- Não, senhor! – exclamou Parvati, como que mais ansiosa ainda para fazer a maior fofoca de todos os tempos. – Ela está de... de...
A menina gaguejou. Hermione acabara de conseguir entrar. Inacreditável para qualquer um que a conhecesse. Estava toda de preto, com um espartilho justo e uma saia livre, sem ser muito apertada e sem ser de bolo. Parecia de crepe. Os cachos estavam definidos dessa vez, e não totalmente em desalinho, como costumavam ser, um pouco presos com uma presilha de brilhantes no alto da cabeça, deixando os mesmos cachos caírem graciosamente por seus ombros.
- Oieee – ela saudou os amigos com um sorriso que só ela dava.
- Mione? – perguntou Rony. – E onde está o seu vestido lilás?
- No lixo – respondeu ela, sacudindo os ombros. E saudou os três professores com a indiferença de uma aluna, naquele gesto distante.
- Professor Dumbledore, se me der licença, posso fazer um feitiçozinho? – perguntou ela.
- Se todos permanecerem vivos e em bom estado de saúde, pode – brincou o diretor, parecendo bem humorado.
Hermione sorriu em resposta e fez uma música muito alta começar a tocar. Era música trouxa; os sonserinos amarraram a cara, mas havia mesmo entre eles alguns mestiços que até gostavam. O som era daqueles de invadir a alma, e a música que tocava era The World is Not Enough, do Garbage.
Snape fez uma careta, mas prestou atenção à letra da música:
I know how to hurt
Eu sei como magoar
I know how to heal
Eu sei como curar
I know what to show
Eu sei o que mostrar
And what to conceal
E eu sei o que esconder
I know when to talk
Eu sei quando falar
And I know when to touch
E eu sei quando tocar
No ever died for wanting to much
Ninguém nunca morreu por querer demais
The world is not enough
O mundo não é o bastante
But it’s such a perfect place to start, my love
Mas é o lugar perfeito para começar, meu amor
And if you’re strong enough
E se você for forte o bastante
Together we can take the world apart, my love
Juntos nós podemos ter o mundo, meu amor
People like us
Pessoas como nós
Know how to survive
Sabem como sobreviver
There’s no point in living
Não há vantagem em viver
If you can’t feel alive
Se não se pode sentir vivo
We know when to kiss
Nós sabemos quando beijar
And we know when to kill
E sabemos quando matar
If we can’t have it all
Se nós não podemos ter tudo
Then nobody will
Então ninguém vai
I feel safe
Eu me sinto segura
I feel scared
Eu me sinto assustada
I feel ready
Eu me sinto pronta
And yet unprepared
E ainda despreparada
The world is not enough...
O mundo não é o bastante...
Quando a música acabou, Snape olhou para Hermione, um pouco desconfiado.
- Acho que nós não conhecíamos o lado negro de Hermione Granger – brincou Dumbledore de bom humor.
- Eu não tinha um – retrucou ela bem humorada. – Bom, na verdade, acho que tinha sim... Um lado meio... sonserina... nunca revelado.
E deu uma risadinha bem humorada.
- Cara, você tá me dando medo, Mione – comentou Rony.
- Vem, vamos dançar – Harry chamou Hermione.
Ela fez uma careta. Começava outra música trouxa, mas dessa vez era mais calma, com uma letra um pouco diferente.
Tale as old as time
Um conto velho como o tempo
True as it can be
Tão verdadeiro quanto pode ser
Barely even friends
Mal são amigos
Then somebody bends
Então alguém se curva
Unexpectdly
Inesperadamente
Just a little change
Apenas uma pequena mudança
Small to say the least
Pequena para dizer o mínimo
Both a little scared
Os dois um pouco assustados
Neither one prepared
Nenhum dos dois preparados
Beauty and the Beast
A Bela e a Fera
Ever just the same
Sempre os mesmo
Ever a surprise
Sempre uma surpresa
Ever as before
Sempre como antes
Ever just as sure
Sempre com a certeza
As the sun will rise
De que o sol irá nascer*
Tale as old as time
Um conto velho como o tempo
Tune as old as song
O tom tão velho quanto a música
Bittersweet and strange
Amarga e estranha
Finding you can change
Descobrindo que você pode mudar
Learning you were wrong
Aprendendo que você estava errado
Certain as the sun
Certo como o sol
Rising in the East
Nascendo no leste
Tale as old as time
Um conto velho como o tempo
Song as old as rhyme
Uma canção velha como a rima
Beauty and the Beast
A Bela e a Fera
(* a tradução não está ao pé da letra; se estivesse, não faria muito sentido)
Quando esta música acabou, Snape meio que acordou do transe em que estivera e olhou em volta. Sim, vários casaizinhos de alunos dançando. Mas ela não. Ela estava parada, sentada sozinha, olhando em volta com um ar ao mesmo tempo triste e insolente. Era o olhar dela. Não havia outra pessoa na Terra capaz de imitá-lo.
Ele estava transtornado. Duas músicas. Quando aquela música da história trouxa acabou, começaram outras, de bruxos. Ela mandara tocar duas músicas. Apenas duas. Qual delas seria o estado de espírito de Hermione? Ele se lembrava de já tê-la ouvido dizer alguma vez que as músicas às vezes traduzem nosso estado de espírito. Mas qual, qual daquelas duas músicas falava o que Hermione sentia por dentro?
Ele cogitou a possibilidade de entrar na mente dela para descobrir, mas logo se lembrou que ela estava tentando aprender oclumência, como Dumbledore comentara com ele duas semanas antes.
Snape decidiu sair do salão, ir para fora, para onde pudesse pensar em paz, sem correr o risco de alguém ver que ele estava pensativo. Mas uma pessoa viu. Alvo Dumbledore, como não poderia deixar de ser. Entretanto, o velho diretor nada disse; decidiu deixar que as coisas acontecessem naturalmente. Sabia que Snape era um ex-comensal e que o arrependimento do mestre de Poções o fazia ter um senso de ética acima do comum.
Dumbledore permitiu-se sorrir quando viu o que queria ver: Hermione saiu do salão casualmente, como se abandonar uma festa daquelas fosse algo normal.
Snape estava sentado à beira do lago, pensando. Lembrando-se do dia em que beijara Hermione. Depois, lembrou-se do dia em que deu a entender que sentia algo por ela. Mas agora ele a tratava como se nada tivesse acontecido entre eles. Como se ele não tivesse sido o primeiro homem da vida dela. Sentiu-se mal por isso.
Seus pensamentos iam e vinham, a ponto de deixá-lo com nojo de si mesmo. Devia se desculpar, explicar-se a ela. Mas seus pensamentos foram interrompidos quando ouviu aquela voz bem atrás dele:
- Fugindo dos problemas e das situações em que se mete, professor? – aquela voz vinha carregada de uma espécie de rancor.
Snape não olhou para trás. Continuou olhando o lago e disse tentando manter indiferença:
- Creio que isso não seja da sua conta, Granger.
Ele ouviu-a respirar profundamente e logo prender a respiração, como se fosse segurar um choro.
- Bittersweet and strange, finding you can change... Learning you were wrong... – cantarolou ela em voz bem baixa.
Snape não esperava por aquilo. Então era assim que ela o via... Amargo e estranho... Certamente ela estava certa. Ele pretendia ignorá-la; Hermione, entretanto, disse:
- Mas parece que você gosta mais da minha versão malvada... – e em seguida recitou em voz bem sussurrada: - I know how to hurt... I know how to heal... I know what to show and what to canceal... Não posso mudar meu jeito por sua causa, professor, mas você mudou o seu por causa de um imbecil louco... Finding you can change... Learning you were wrong...
Snape ainda estava se controlando para não pedir desculpas a ela, para tratá-la com indiferença, quando a ouviu dar um suspiro um pouco mais alto, como aquele que se dá antes de deixar lágrimas insistentes caírem. Ouviu os passos delicados dela preparando-se para se afastar.
Ele decidiu mandar a ética para a ponte que caiu e levantou-se. Viu-a andar devagar para o castelo, de cabeça baixa, e chamou-a:
- Granger!
Mas ela não atendeu. Snape sentiu que, se ela fosse embora dali naquele momento, nunca mais voltaria a ele. Chamou-a outra vez:
- Granger!
Mas, novamente ela não atendeu. Ele apressou-se e deu uma corridinha curta, que foi o suficiente para alcançá-la. Segurou o braço dela com suavidade e a fez virar-se para ele. Mas ela olhou para baixo.
- Hermione... – chamou ele, segurando o rosto dela de modo a fazê-la olhá-lo.
Os olhos dela estavam molhados, mas ela não estava chorando.
- Não me chame assim, professor, poderiam pensar que temos alguma intimidade – disse ela, um pouco mais calma, retornando à sua pose de aluna brilhante.
Snape achou que não saberia falar amavelmente com ela, por isso, apenar puxou-a para si e beijou-a intensamente. Para sua surpresa, ela afastou-o de si e disse:
- Não sou seu brinquedo! Se não sente nada por mim, eu entendo, mas não venha dizer que sente, não minta para mim. Quer mais uma noite comigo? Terá tantas quantas quiser, mas não me trate como um lixo. Não mereço isso.
Hermione saiu correndo dali, deixando Snape um tanto espantado.
GENTE, PLEASE, EU ODEIO PEDIR ISSO, MAS ME DIGAM O QUE ACHARAM, EU PRECISO SABER!!!
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