Blim-Blom No Seu Coração



Harry perdera a conta de quantas vezes Rony e ele trocaram os enfeites de natal de lugar. Vários laços, anjinhos, ramos verdes entrelaçados e sininhos flutuavam no ar, enquanto a senhora Weasley e Fleur tentavam se decidir onde os colocavam.

A Toca estava repleta de Weasleys ajudando nos preparativos para o Natal, que seria dali a dois dias. Na cozinha, Alicia e Hermione se encarregaram das fornadas de biscoitos que tradicionalmente os Weasleys mandavam para os amigos. Cátia e Ana, reconhecendo que seus conhecimentos culinários beiravam à inexistência, preferiram cuidar da arrumação da casa e verificar se havia lençóis, cobertores e travesseiros o suficiente - os Weasleys são o tipo de família que sempre está recebendo mais um, ainda mais em ocasiões como o Natal... Então, tinham que estar preparados! Harry e Rony foram escalados pela senhora Weasley para ajudá-la na decoração, embora eles não fossem consultados para nada e se limitassem a mover os objetos de um lado para o outro quando solicitados.

Ao olhar para o amigo, Harry teve certeza que o braço de Rony estava tão dolorido quanto o dele, de tanto manterem as varinhas erguidas, enquanto Fleur e Molly discutiam se o grande enfeite com ramos, laços e sininhos ficaria melhor sob a lareira ou na parede de frente para a sala.

Era evidente que Rony já estava ficando exasperado com a demora das duas em entrarem em um acordo sobre algo tão simples (ainda mais com o braço doendo daquele jeito). Mas Harry nunca se fartaria de ocasiões tão familiares como aquela. Se o preço era um braço dolorido, então que doesse até cair: valia a pena se isso fosse deixar a senhora Weasley contente.

Voltou a olhar para a sala onde Gina, cercada pelas crianças, ocupava-se em fazer cordões de pipoca (uma tradição americana sugerida por Mel). Iriam dependurar nas árvores lá fora. Assim, ela mantinha as crianças entretidas fabricando um “presente de natal para os passarinhos”.

Esquecido de tudo, demorou-se observando a esposa: o rosto adorável emoldurado pelos cabelos flamejantes, a pele delicada e macia, e o sorriso... Harry não sabia explicar o sorriso de Gina. Era simplesmente maravilhoso, único. Inocente, provocante, inteligente, cheio de vida. Podia descrever mil detalhes diferentes em um único sorriso dela.

Pousou o olhar no ventre dilatado da esposa e sorriu, enchendo-se de orgulho e esperança ao pensar que em pouco tempo os filhos de ambos nasceriam. Ficava espantado como este simples pensamento o fazia sentir-se tão absurdamente feliz. Sentia-se completo, capaz de fazer qualquer coisa, só com a lembrança de que tinha Gina. Que tinha os filhos de ambos.

- Harry! – A senhora Weasley o alertou. – Assim vai deixar o anjo de vidro cair, querido!

Ele rapidamente ergueu a varinha que, em sua distração, fora deixando cair. Murmurou um pedido de desculpas totalmente envergonhado, consciente, pelos sorrisos estampados nos rostos de Fleur, Rony e de Molly que eles sabiam de onde estivera toda a sua atenção até aquele momento.

Harry perguntou-se se algum dia iria parar de agir como um adolescente quando o assunto era Gina.

“Provavelmente, não”, concluiu, seu olhar sendo atraído novamente para ela.

Chantal e Mel estavam sentadas ao lado de Gina, e as três “costuravam” os cordões de pipoca. Harry percebeu que a sobrinha de Ana imitava Gina em tudo o que ela fazia, prestando atenção principalmente nos feitiços que ela praticava. Enquanto isso, Sean e Kenneth iam passando os grãos de pipoca, comendo três a cada um que lhes entregavam. Os meninos tinham três anos, com apenas alguns meses de diferença entre eles, e não havia dúvidas de que tinham herdado o “espírito das Gemialidades Weasley”.

Rony, que agora estava observando o pequeno Sirius fazer festa com uma das tigelas com pipoca, jogando o conteúdo para cima, cochichou, divertido, que provavelmente eles não teriam muitos cordões naquele ritmo.

- Vocês dois querem... - A senhora Weasley começou a ralhar, mas se interrompeu quando um grande barulho vindo do telhado foi ouvido, e viram, pela janela, o senhor Weasley despencar lá fora, parando a meio metro do chão, aparvalhado e um tanto tonto.

- Eu estou bem! – O senhor Weasley finalmente gritou, ofegante, quando percebeu que era o centro das atenções, com um sorriso entre encabulado e vitorioso nos lábios.

Todos correram para o lado de fora, querendo constatar a afirmação com os próprios olhos. Os enfeites tinham sido esquecidos, alguns se espatifando no chão quando Rony e Harry deixaram a sala como raios. Cátia e Ana desceram as escadas depressa, assustadas, querendo saber que barulho tinha sido aquele. Ao verem o sogro ainda flutuando, mas bem, suspiraram aliviadas. Sorriram uma para a outra, sabendo que por aí vinha mais uma das loucuras maravilhosas do senhor Weasley.

- Os meninos me pegaram a tempo - Arthur anunciou, levantando o indicador para Gui e Jorge no telhado, que mantinham as varinhas erguidas na direção do senhor Weasley, sustentando-o. Fred e Carlinhos apareceram em seguida ao lado deles, vindos do outro lado da casa. Os quatro ainda olhavam assustados para baixo. - Podem deixar agora, rapazes! - O senhor Weasley ordenou com um sorriso confiante.

Tão logo viu o marido seguro, no chão, a senhora Weasley foi se recuperando do choque, e lançou a carga, ainda com os lábios trêmulos:

- Arthur, o que é estava fazendo lá em cima? - Olhou para o telhado: - Aliás, o que todos vocês estão fazendo aí em cima, com toda esta neve escorregadia? - Voltou-se novamente para o marido, agora totalmente recuperada: - Arthur, você não tem mais idade...

- Você vai ver, querida. - Ele a interrompeu, abrindo um sorriso maior ainda e passando o braço em torno dos ombros dela. - Liguem, rapazes!

Os quatro obedeceram ao pai após alguns segundos. A forma como olharam apreensivos para a expressão zangada da mãe fazia com que parecessem meninos com medo de levar uma surra por alguma travessura praticada.

Exclamações surpresas foram ouvidas quando centenas de luzes se acenderam por toda a Toca.

- Pisca-piscas? - Hermione perguntou confusa. - Mas, como? A eletricidade...

- Ah, fiz algumas modificações. Funcionam com magia.

Maravilhados com os efeitos das luzes, ninguém notava que estava ficando mais frio lá fora, já que a noite estava caindo. Os olhos da senhora Weasley se encheram de lágrimas entremeadas com um sorriso. Foi quando Ana tirara as palavras da boca de Harry:

- Deus, eu adoro esta família! - Ela murmurou, com um sorriso divertido nos lábios.

Por falar em família... Harry notou que estavam faltando membros dela lá fora. Voltou-se para dentro da casa, pegando Sean e Ken com as bocas cheias de pipoca, e as tigelas no chão, vazias. Quando os outros adultos acompanharam o olhar de Harry, pousado sobre os meninos, os garotinhos se apressaram a dizer:

- Foi ele! - Falaram ao mesmo tempo, apontando para Sirius.

O bebê ria abertamente, batendo palminhas e balbuciando em sua inocência, na ignorância da "acusação" feita.

Os adultos explodiram em uma risada diante da tentativa pobre dos meninos de jogar a culpa no primo menor. Harry ouviu a voz de Ana em sua cabeça, totalmente derretida: "Ai, os três são tão fofinhos!".

Mas as mães dos meninos não estavam rindo. Alícia e Cátia lançavam olhares de reprimenda aos filhos, indicando que iria haver um longo discurso sobre honestidade e, muito provavelmente, um castigo bem merecido, não tanto pela pipoca, mas pela mentira.

- O que houve? - Fred gritou do telhado.

- Houve que vocês estão criando dois tratantes! - Rony respondeu, tentando parecer sério. Afinal estava em "defesa" de seu filho. Mas os cantos dos lábios do ruivo tremiam em um riso mal contido.

- E qual é a novidade nisso? - Fred replicou, dando de ombros. Ele e o irmão gêmeo se olharam, divertidos, entendendo que seus filhos tinham aprontado mais uma das suas.

Hermione entrou para limpar o rosto e as mãos do filho, já todas meladas por causa das pipocas doces nas quais ele estivera mexendo antes. Os outros começaram a entrar também, ainda sorridentes.

- Desçam já daí, meninos, antes que peguem um resfriado! - Foi a última palavra da senhora Weasley antes de entrar também.

Harry e Gina ficaram para trás. Ele se voltou para ela, com um sorriso provocador:

- Acho que não vamos ter cordões de pipoca este ano.

Gina olhou para ele, sorrindo, respondendo com fingida indignação:

- Desde quando eu desisto de alguma coisa, Harry Potter? - Beijou-o levemente nos lábios, antes de entrar em casa novamente, chamando Mel e Chantal: - Vamos fazer mais pipocas, meninas?

Não, Gina não era de desistir, Harry ia pensando, feliz, enquanto entrava na Toca com os outros Weasleys que tinham acabado de descer. E, graças a Merlim, ela nunca tinha desistido dele.

***

Ainda naquela noite, Mel se despediu dos Weasleys. Iria passar o Natal e o Ano Novo com os pais no Brasil. Quando saíra de lá, há quatro meses, sentia a expectativa de estar indo para um lugar em que não existiam pais para ficarem como babás dela, mandando e criticando cada coisa errada que fazia. Sabia que iria ser um aprendizado duro, que teria que ser responsável por ela mesma, mas isso a fazia se sentir livre, feliz.

Só não contava que a saudade da família fosse tão grande, ou que estar longe dos pais pudesse ser tão difícil. Você bate os pés, briga, acha que a vida seria mais fácil sem a tirania deles... Mas quando a coisa aperta, sempre pode recorrer a eles. E Mel sentia falta daquele apoio, embora estivesse se adaptando muito bem em Hogwarts.

- Faça uma boa viagem, querida! – Molly a abraçou tão forte a ponto de ela temer pela integridade de seus ossos – E, aqui – Ela lhe entregou um pacote colorido, cuidadosamente embrulhado – Seu presente de Natal. Oh, se eu não fosse mãe e não soubesse o quanto a sua deve estar sentindo falta de você, diria para que ficasse aqui conosco!

A pequena corvinal já gostava da senhora Weasley quando ela era apenas uma personagem vinda da imaginação fantástica de uma autora inglesa. Mas acabou descobrindo que a realidade era ainda melhor, e Molly, como os demais, eram ainda mais maravilhosos do que os livros podiam descrever.

- Obrigada, senhora Weasley.

- Seu pacote é igual ao meu. – Rony comentou, cúmplice, apontando para os embrulhos debaixo da árvore – O que será que tem neles?

A garota olhou seriamente para o embrulho que ele indicara e, depois de um sorriso que só poderia ser chamado de “maroto”, disse:

- O meu eu não sei... Mas o seu só pode ser um suéter marrom-tijolo.

Os gêmeos e Ana, que estavam perto, reprimiram uma gargalhada. Todos sabiam que a senhora Weasley dava suéteres para todo mundo no Natal, e o de Rony sempre era daquela cor.

Rony fez uma careta, talvez pensando que o mundo todo sabia o quanto ficava horrível de marrom-tijolo, enquanto Ana comentava, divertida:

- A própria Rainha daria todas as jóias da Coroa por um suéter feito pela senhora Weasley.

- Quando você diz todas... – Fred pareceu muito interessado – Quer dizer TODAS?

- Rápido! – Ordenou Jorge - Para o Palácio de Buckingham!

Desta vez riram com vontade, chamando a atenção dos demais.

- O que é tão engraçado, meninos? – O senhor Weasley entrou na sala, parecendo muito bem-humorado.

- Nada... – Fred respondeu – Ana só estava nos contando que temos uma fã... “Real”.

- A Rainha – Ana explicou – E que ela adoraria estar aqui agora, dando qualquer coisa por esse privilégio.

- Ora, não precisaria tanto. Se fosse possível, não nos importaríamos em receber Sua Majestade em nossa casa – O senhor Weasley respondeu abrindo um sorriso. – Não é, Molly?

- Oh, Mérlin, a Rainha na minha casa! – Molly riu, entre nervosa e orgulhosa – Claro. Sempre há lugar para mais um... – Disse muito simplesmente.

- Como, por exemplo, o Snape. – Jorge resmungou.

- Mãe, tinha mesmo que convidar o Snape para passar o Natal conosco? – Reclamou Fred.

- Não sejam ingratos! – Molly pôs as mãos na cintura, empertigando-se, sinal que vinha bronca – Esqueceram-se do quanto ele nos vem ajudando com o assunto de sua irmã?(1) – Ela levantou um dedo, em advertência: - Se se atreverem a serem desagradáveis com ele, juro que me esquecerei que são homens crescidos e lhes darei uma daquelas surras que dava em vocês quando aprontavam, entenderam?

- Molly tem razão. – Ana apoiou – Está na hora de esquecermos as mágoas do passado. O próprio Harry já esqueceu, não é Harry?

- Hã? – O jovem Auror estava perdido em seus pensamentos. – Ah, sim. Claro – Olhou para a sogra, para confirmar - Por mim, sem problemas.

- Ótimo! – Ironizou Fred. – Qual será o próximo que irão convidar para o Natal? O Draco?

- Draco Malfoy está no país? – Mel deu um pulo do sofá – Mas como isso é possível? E ele está solto?

- Acalme-se Mel – Ana disse – Talvez... Ele esteja do nosso lado.

Protestos de dúvidas ressoaram por toda a Toca. Parecia que a família inteira estava concentrada na conversa, até mesmo os bebês ficaram quietinhos, olhando para os adultos, curiosos.

- A doninha quicante albina... Se juntando aos “bonzinhos”? – A menina duvidou.

- Doninha... Albina? – Harry perguntou, segurando o riso.

- E quicante – Mel completou, sorrindo inocentemente.

A sala explodiu em risos, e até mesmo a senhora Weasley não resistira, embora estivesse tentando se recompor e assumir a posição da voz da sensatez. Como não se lembrar do episódio em que o falso Moody transformara Draco Malfoy em uma doninha?

Enxugando as lágrimas do riso, Ana respirou fundo:

- Ora, gente... Vocês têm que confiar mais nas pessoas... Mesmo desconfiando. É época de confraternização. Deixem que a magia do Natal os toque. Ou, como dizemos na minha terra: “Deixe o Natal fazer “Blim-Blom” no seu coração”.

***

Snape comparecera na manhã de Natal na Toca, junto com uma mulher que devia ter uns trinta anos, – se tanto – morena, esguia, pele bronzeada. Ela estava maravilhada e tímida ao mesmo tempo, olhando tudo e a todos com interesse constrangido, que aumentou quando viu Harry. (2)

Alan estava com eles e, embora todos apresentassem certa reprovação pelo menino insistir em se vestir e comportar como o pai adotivo, os Weasleys adoravam Alan e ninguém disse uma palavra ofensiva a Snape. Ana mesmo estava apaixonada por aquele “mini-cavalheiro”. Era uma pena que Mel já tivesse ido embora, porque, pelo que sabia, os dois se davam bem.

- Olha, tia! – Disse o menino, referindo-se a Sarah, a “amiga” de Snape - Que maravilha este telescópio novo! O meu quebrou no semestre passado... Pirraça o derrubou do pedestal... Você sabe quem é o Pirraça, não sabe?

Snape voltou a se aproximar de Sarah, parecendo preocupado. A outra brasileira parecia assustada e deslocada, e Ana resolveu intervir. Após uma troca de olhar com Carlinhos, que entendeu o que ela pretendia, ambos se dirigiram até onde Snape e Sarah estavam:

- Oi, você deve ser Sarah. Sou Ana Weasley. Prazer em conhecê-la. – Apresentou-se, em português.

A mulher pareceu surpresa, mas então sorriu, e respondeu, também em português:

- Oi, muito prazer. Desculpe, mas estou ainda meio perdida por aqui. Tudo é novidade e... Começo a pensar que é melhor o Snape me aplicar um novo obliviate e me deixar voltar sossegada para o Brasil.

- Não diga isso! – Ana falou em tom brincalhão, depois de um olhar rápido para Snape, que parecia ter sido petrificado com o susto da afirmação de Sarah – Você se acostuma logo. Até seu irmão está se acostumando... – André, o marido de Susan Bones, era irmão de Sarah - Venha, vamos caminhar um pouco, deixar essa balbúrdia para trás... E vamos sozinhas, senhores, por favor.

A firmeza com que dissera as últimas palavras fez os homens estacarem o movimento que já faziam para segui-las.

- Isso mesmo. Fiquem aí. Eu e Sarah temos muitas figurinhas pra trocar, e queremos fazer isto sozinhas. Tenho coisas importantes a perguntar, tipo... como terminou a última novela das oito que consegui assistir até a metade... – e virando-se para Sarah – Você já deve saber que aqui não tem tv. Aliás, nem pega sinal de tv. Magia demais.

Ana gostou muito de Sarah e ela parecia mais a vontade à medida que a manhã avançava. No entanto, algo deve ter acontecido, porque Snape pediu para que Ana se despedisse dos Weasleys por eles e, abraçando Sarah, ambos aparataram. Estava preocupada com a palidez que Sarah apresentava pouco antes deles saírem. Talvez devesse mesmo ter uma conversinha com Snape para que fosse mais devagar...

***

Enquanto terminava de se arrumar, Ana tentava a todo custo não dar atenção para o banheiro que estava em desordem ou para a cozinha que precisava de uma geral. Aquela noite ela devia se preocupar somente com vestidos, penteados e.... Torceu o nariz. Que coisa mais frívola de se pensar! Mas, se parasse o que estava fazendo e cedesse ao impulso de pegar a varinha e sair pela casa arrumando tudo... Não iria sair dali tão cedo.

- Ana, já estamos atrasados, amor! – Carlinhos estava impaciente lá em baixo.

Uma sombra de irritação passou pela mente de Ana. Ele que tentasse lidar com poções para penteado e aqueles vestidos bruxos esquisitos, para ver o que era bom! Durante todos aqueles meses, tinha relutado em deixar certos costumes trouxas. E a forma como se arrumava era uma delas. Mas resolvera assumir de vez sua “bruxilidade”: quem sabe isso não facilitaria a sua adaptação?

Foram meses de lições de etiqueta bruxa com Tia Agatha. Lições estas entremeadas com lutas contra feitiços poderosos, busca a Comensais da Morte foragidos e vigilância sobre Draco Malfoy. Lembrar dos acontecimentos envolvendo ex-sonserino a fez se sentir ainda pior. Não poderia dizer que o ano tivesse sido relaxante...

“Ora, ora. Do quê está reclamando, Ana?” pensou consigo mesma. “Pelo menos não teve que encarar nenhum basilisco... Até agora”. E este último pensamento a fez descer as escadas com o semblante novamente “Ana”.

Assim que se deparou com o olhar que o marido lhe lançava, reconheceu que, realmente, não tinha nada a reclamar...

Ana usava um vestido apropriado para o inverno inglês, de veludo azul-celeste, combinando à perfeição com a cor de seus olhos. As mangas compridas se alargavam do cotovelo até as mãos. Dos quadris até os tornozelos, o tecido caía solto, apenas uma fenda frontal deixava entrever o cetim de um azul mais claro por baixo do veludo, o mesmo que se via por baixo do corpete em decote princesa. Os cabelos, presos no alto e seguros por uma presilha de diamantes (ela prendia a respiração toda vez que pensava na pequena fortuna que tia Agatha lhe tinha confiado ao emprestar aquele objeto). Uma faixa do mesmo cetim circundava a cintura dela: era um acessório estratégico onde as bruxas guardavam suas varinhas.

- Esqueça a festa! – Carlinhos ordenou, boquiaberto, como se estivesse sem fôlego – Vamos lá para cima. – Sorriu, de forma matreira – Está tão bonita, que não me deixa a mínima vontade de prestar a atenção em qualquer outra coisa que não seja você.

Ele também não estava nada mau com aquele traje de gala bruxo, a casaca negra, camisa branca, gravata na mesma cor presa por um alfinete elegantíssimo. A capa negra lhe dava um ar de “lord”, que seria quase gótico se não fosse pela pele bronzeada.

- Nada disso! Depois de todo este trabalho? – Ela sorriu, aceitando a mão que ele lhe estendia, mas o puxando para a porta – Eu quero ser vista agora!

- Você pode se mostrar para mim, oras – o sorriso dele se alargou – Só para mim.

- Mais tarde – Ana piscou para ele – Mais tarde.

- Lembre-se que promessa é dívida – Carlinhos finalmente concordou, puxando-a para mais perto antes de aparatarem.

***

Era um grande evento social, feito para todos que compunham a estrutura do governo bruxo que cuidava dos animais mágicos. Uma “confraternização” de fim de ano, onde todos os grandes nomes estavam, os chefes. Vez ou outra alguém era admitido naquele círculo restrito, por seus grandes feitos na área. E Carlinhos era um deles, por seus avanços nas pesquisas com dragões.

Hagrid também estaria ali, se não tivesse preferido passar as festas de fim de ano com Olímpia Maxime em Paris. Sua recusa deixou alguns dos figurões aliviados. Era uma coisa surpreendente pensar que os bruxos haviam conseguido vencer Voldemort, mas não o preconceito. Devia ser uma daquelas coisas que têm a mesma natureza das baratas: nojenta e resistente.

Ana, por sua vez, havia se tornado a grande novidade da festa. Bonita e elegante, tinha sempre algo inteligente para dizer. Seu modo espirituoso de ver as coisas fazia as pessoas quererem se aproximar dela. Dançou muito, especialmente com o marido, embora vários cavalheiros, tomando coragem, tinham pedido a “honra de uma dança”, enfrentando um relutante Carlinhos que a custo cedia a vez.

Depois de ter assimilado o comportamento bruxo, tudo se revelou mais fácil. Aprendera coisas pequenas, que facilitavam a vida: sabia que a varinha presa do lado esquerdo da faixa que circundava a cintura a sua cintura, por exemplo, indicava que segurava a varinha com a mão direita. Que jamais se deveria fazer um cálice ou prato levitar até você de uma distância maior que trinta centímetros – além de deselegante, as pessoas poderiam chocar-se contra eles e, conforme explicara tia Agatha, ninguém é obrigado a prestar atenção na “comida levitante” dos outros. Entendidos detalhes como este, Ana não tivera problemas em adaptar-se.

O comentário geral era que não havia casal mais adorável naquela festa: Carlinhos e seu sorriso charmoso; Ana, com o riso cristalino e agradável. Os dois jovens, belos e inteligentes. E como pareciam apaixonados!

Claro que a novidade não agradou a todos. Felícia Althorp parecia ter ouvido o canto de um agoureiro, tamanho era o semblante depressivo que apresentava. Exceto quando olhava para Ana: nestas ocasiões, seus olhos brilhavam de ódio.

- Você dança tão bem quanto sua mãe, Ana.

- Obrigada, Jeremiah.

Jeremiah Smith era primo distante da mãe de Ana, e também o pai de Zacharias Smith. Um senhor de meia-idade, cabelos loiros penteados impecavelmente, com algumas mechas já grisalhas. Ainda era muito bonito, e alguns o chamariam de “elegante”, mas Ana preferia “esnobe”. E o mérito da escolha desta palavra era devido a J.K. Rowling que, apesar de não gastar mais que uma frase com o empresário bruxo em todos os seus livros lançados até o momento, conseguiu, com este único adjetivo, atingir a essência daquele homem.

Agora mesmo, com aquele jeito jovial e solícito, ele nada mais queria do que dar a impressão de ser alguém de “mente aberta” (coisa muito em moda ultimamente) e, assim, ganhar a simpatia dos colunistas sociais. Ele acreditava que ser citado entre os mais “colunáveis” faria bem para os negócios.

- Papai não é incrivelmente... Artístico? – Zach se aproximara da mesa onde Ana estava, enquanto observava Jeremiah tirar uma matrona para dançar, sorrindo para a velha senhora, como se não doesse nada o fato dela estar pisando em seus pés.

- De fato – Ana concordou, usando o mesmo tom irônico do primo. Então, estreitou os olhos com ares de grande entendida: - Deixe-me adivinhar o que estão fazendo aqui: doações?

- Exatamente – ele respondeu, com evidente reprovação na voz, embora o fizesse soar de maneira divertida – Fizemos doações para algum departamento de estudos de animais mágicos qualquer. Não lembro qual, foi papai tratou disso. É o tipo de publicidade positiva que Jeremiah Smith acha que “faz bem para os negócios”.

- E está aqui porque concorda com ele? – Ana provocou.

- Não – desta vez ele exibiu uma careta de desgosto – Estou aqui para ver desfilar diante de mim o que meu pai chama de “candidatas a futura senhora Zacharias Smith”. Parece que um casamento também seria bom para demonstrar a solidez dos empreendimentos da família.

Ana só reprimiu a gargalhada porque não devia ser nada fácil ter um pai que só pensava em trabalho e em aparências.

- Pobrezinho – tentou não deixar transparecer a pontinha de pena verdadeira que estava sentindo do primo – Já que veio escolher uma noiva... Que tal Felícia Althorp? – Brincou. “Quem sabe assim matamos dois coelhos com uma cajadada só”, acrescentou mentalmente.

- Mérlin me proteja! – Ele exclamou – Aquilo é uma víbora! – E Ana não pode deixar de concordar com a opinião do primo – Além do mais, só concordei em vir porque não quero passar a semana inteira ouvindo meu pai resmungar sobre como sou anti-social.

Ele disse aquilo com tamanho mau humor, que os dois acabaram rindo. Depois, querendo trocar de assunto, Zacharias perguntou:

- Mas onde está o Carlinhos?

- O senhor Althorp o chamou. Parece que tinha que mostrar algo a ele antes de partir. A filha e ele vão embora para a Romênia amanhã – Ana tentou ao máximo não soar tão satisfeita quanto se sentia. Se houvessem fogos do Dr. Filibusteiro ali, era bem capaz de soltá-los agora.

O senhor Smith apareceu segundos depois, trazendo mais uma das “donzelas casadoiras” com ele, e não perdeu tempo ao sugerir que ela e Zach dançassem. Ana achou melhor ir procurar Carlinhos, “para não atrapalhar”. Ah, ela iria pegar no pé do primo durante semanas com aquele assunto de casamento!

Tinha quase certeza que o escritório ficava do outro lado do jardim. Foi para lá se sentindo subitamente cansada. Se eles ainda não tivessem terminado o assunto, iria esperar pacientemente do lado de fora – sabia quanto o trabalho era importante para o marido – mas o convidaria em seguida para irem embora.

Foi quando os viu. Ou melhor, viu Felícia, com o rosto transtornado, atirar-se sobre Carlinhos e o beijar apaixonadamente. Um segundo depois, ele tirava as mãos dela que estavam entrelaçadas em seu pescoço e a afastava com uma expressão contrariada no rosto. Então, ele percebeu que Ana estava no jardim, e que tinha visto tudo.

Percebendo a expressão chocada de Carlinhos, Felícia voltou o olhar em sua direção. O rosto dela exibiu satisfação, os olhos lançando uma mensagem maliciosa de “ele é meu”.

- Ana... – A voz dele saiu quase em um lamento rouco.

- Eu gostaria de ir embora – Ela o interrompeu – Vou buscar meu casaco.

Virou-se o mais rápido que pôde em direção do quarto para onde os elfos tinham levado os casacos dos convidados, rejeitando um simples feitiço convocatório. A caminhada até lá lhe daria tempo para pensar. Ainda estava abalada com algo que tinha se dado conta só naquele instante. Quando entrou naquele pequeno aposento, Felícia aparatou dentro dele em seguida.

- Seu pai nunca lhe ensinou que é falta de educação aparatar dentro de casa?

- Ah, é, esqueci que agora você é uma grande especialista em boas maneiras. – A loira ironizou.

- Bondade sua ter notado – Ana não sabia de onde estava tirando tanta frieza para conseguir responder no mesmo tom irônico. Pegou o seu casaco e estava prestes a sair quando Felícia ordenou, presunçosa:

- Deixe-o livre. Nós nos amamos.

“A gota d água”, Ana pensou. Não queria perder tempo com ela, mas não podia sair e deixar por isso mesmo. Aquela mulher não tinha a mínima noção de limites, de decência... Felícia a deixava cansada. Pacientemente, como se estivesse falando com uma criança, replicou:

- Você não o ama. E muito menos ele a ama.

- É cega, por acaso? – Felícia debochou – Não viu o que aconteceu no jardim?

- O que eu vi foi a última tentativa desesperada de uma menina mimada. – Declarou dignamente, a voz firme e clara, esperando que a outra entendesse a mensagem.

- Não sei do que está falando – A loira empalideceu, ficando visivelmente menos segura.

- Não sabe? – A irritação de Ana era crescente – Então eu vou fazer o favor de te esclarecer. Estou falando de como ficou desesperada quando viu que todos os seus planos de me diminuir diante de meu marido falharam. De como resolveu apelar para uma sedução física, esperando que ele se sentisse atraído o suficiente para ficar tentado a ter um caso. E, é claro, de como cuidou para que eu visse tudo, só para aumentar as probabilidades de que seu plano daria certo. – Felícia arregalou os olhos – Ah, sim, eu notei. Tem que melhorar a sua performance, sabe? Sua expressão de surpresa não é muito convincente.

Saboreou sua vitória por alguns momentos antes de completar:

- O velho plano do “falso flagrante”. Você achava mesmo que eu iria cair nessa? Ou é incapaz que criar algo mais inteligente?

- Ora, sua... – Recuperada e com a expressão carregada de ódio, Felícia pegou a varinha, ameaçando Ana.

Por um átimo de segundo, pensou em pegar a sua varinha para se defender. Mas a intuição a fez ficar parada, esperando que a outra fizesse o primeiro movimento. Como este não veio, sorriu e cruzou os braços:

- Imagino que também espere que eu te lance uma azaração, para que todos a vejam como vítima. – Balançou a cabeça em desdém: - Cresça, Felícia Althorp!

Ana abriu a porta e se dirigiu para a saída do prédio, onde Carlinhos já a esperava. Ele fez menção de dizer algo, mas Ana o cortou:

- Por favor, em casa – pediu, cansada – Aqui não é o lugar.

Em instantes, estavam no apartamento deles. A escuridão e o silêncio nos quais o lugar estava mergulhado adiavam o momento em que teriam que conversar, e Ana se sentia feliz com isso, pois não tinha certeza que poderia pôr em palavras o que estava pensando ou sentindo. Na realidade, nem mesmo sabia se o que estava se passando em sua mente fazia algum sentido, e desconfiava que toda e qualquer argumentação que pudesse chamar em sua defesa estava presa por um fio de racionalidade que poderia se romper a qualquer momento.

Carlinhos não se sentia do mesmo modo, pois se apressou a acender a luz, ansioso para colocar tudo em pratos limpos, ter certeza de que nada mais estaria entre eles, afastando-a dele. Estava aflito por ver o rosto da esposa, tentar de alguma forma captar o que ela estaria pensando.

Quando ele se aproximou buscando seu olhar, Ana o fitou hesitante, um misto de dor e tristeza no rosto. Aquilo foi o suficiente para que Carlinhos experimentasse um peso em seu peito que o impulsionou a dizer:

- Ana, eu não a beijei, estávamos só conversando quando...

- Eu sei. – Ela respondeu tranquilamente, mas Carlinhos não percebeu:

-... Ela me beijou, mas eu jamais pensaria...

- Eu sei. – Concordou mais uma vez, sendo novamente ignorada.

-... Não depois de ter te esperado por oito anos...

- Carlinhos – ela pegou o rosto dele entre as mãos, fazendo-o finalmente fixar a atenção no que ela dizia: - Eu sei. Sei que foi ela que te beijou, e que você não correspondeu.

- Sabe? – Ele piscou várias vezes, confuso. – Então, por que parece tão... Triste? Não há razão para se preocupar, juro que depois que você saiu deixei bem claro para Felícia que não sinto nada por ela, que te amo e que não alimentasse nenhuma esperança.

Ele chegara ao ponto crucial, pensou Ana. Era exatamente aquilo que a estava destruindo por dentro, algo que pressentira estar errado durante todos aqueles meses, mas que não identificara de pronto.

- Você fez isso agora, Carlinhos. – Declarou pesarosa. – Só agora.

- O que quer dizer? – Ele franziu o cenho, a preocupação mesclando-se à incompreensão anterior – Não aconteceu nada antes. Foi a primeira vez...

- Que ela tentou algo mais... “Direto”. Mas não foi a primeira vez que deu sinais do que queria, não é? – Carlinhos permaneceu mudo e desviou o olhar, demonstrando que entendia – Há muito tempo ela vem deixando claro suas intenções de formas diferentes, mas não menos sutis. E você não fez nada.

- Ana, não havia o que fazer...

- Havia sim! – A angústia que estava dentro dela finalmente conseguiu sair – Exatamente o que você fez hoje, deixar as coisas claras, sem perder tempo. E não... Esperar até a situação chegasse a este ponto. – Ela fez uma pausa, respirou fundo, e, mais calma, continuou: - Eu sabia que algo estava errado, mas pensei que era comigo. – Ela balançou a cabeça tristemente: - Não era.

- Pode ser que eu tenha errado por não ter prestado atenção no que estava acontecendo. Mas não fiz nada intencionalmente. Eu te amo, Ana. Isso nunca mudará.

- Eu sei que me ama. Tenho certeza disso, nem por um momento duvidei. No entanto, acho que não será suficiente me amar se tem medo de deixar isso bem claro para as outras pessoas também.

- Como assim deixar claro para outras pessoas? – Carlinhos começava a impacientar-se – Eu esperei por você por oito anos, se isso não é deixar bem claro que...

- Quer parar de ficar repetindo que me esperou por oito anos? Eu sei disso, sua família sabe disso... Mas ter me esperado ou me amar não altera o fato de que você fingiu que nada estava acontecendo.

- Não entendo...

“É claro que não”, pensou Ana. “Como fazer um homem entender orgulho feminino ferido? Que não só a traição com uma mulher pode perturbar este nosso mundinho cheio de inseguranças?”.

- Talvez pudesse ajudar se perguntasse a si mesmo “por que” agiu assim, Carlinhos. – Ela sugeriu com suavidade, olhando-o com um misto de ternura e ansiedade.

Ana prendeu a respiração esperando que ele desse a resposta, temendo-a, ao mesmo tempo. Sabia que o marido não havia sido ele mesmo quando não foi direto com Felícia. Então devia haver um motivo. Medo de prejudicar sua carreira? De que, se Felícia tivesse seu orgulho ferido, e resolvesse descontar em Ana, ela não fosse páreo para a loira? Qualquer destas respostas a feria profundamente e tinha consciência que não poderia viver com elas.

Como ele não respondeu, respirou fundo mais uma vez e continuou em um tom decepcionado, mas decido:

- Talvez ambos precisemos de tempo para pensar... Sozinhos.

- O que quer dizer? – Carlinhos levantou rápido o olhar, buscando o dela, aflito.

- Combinamos de passar o Ano Novo com a minha família, no Brasil. Eu vou mais cedo. Na verdade, vou hoje. – Ela fitou o chão, fugindo dos olhos dele, enquanto tentava organizava as idéias. - Você vai depois, no dia combinado.

- Ana, não! – Ele negou terminantemente. – Isso é absurdo! Sua reação está sendo desproporcional.

- Carlinhos... – Ela suspirou, cansada, perdendo as forças. Não tinha certeza do que estava fazendo, e parte dela se perguntava se ele não tinha razão ao afirmar que ela estava agindo exageradamente. Mas precisava ficar longe de tudo, ficar sozinha para poder pensar. – Eu TENHO que ir. – Ana sentiu a voz tremer.

Subiu as escadas rapidamente, tendo consciência de que era seguida por Carlinhos. Com um movimento de varinha, a mala que estava em cima do guarda-roupas flutuou até a cama e abriu-se. Mais um movimento, e as roupas que escolhia faziam o mesmo caminho, parando bem em cima da mala, dobrando-se sozinhas e logo em seguida se encaixando da melhor forma possível no objeto.

- Não pode utilizar uma chave de portal para tão longe à noite. – Carlinhos usou sua varinha para fechar a mala, interrompendo o que ela estava fazendo - É perigoso, não vai ver um palmo diante do nariz.

Ela considerou a questão por alguns segundos e então concluiu:

- Vou de avião, então.

- A esta hora? O aeroporto deve estar fechado, não vai conseguir passar da porta. E mesmo que esteja aberto, é fim de ano, todos os trouxas devem estar indo para lá e para cá nessas coisas voadoras, não vai conseguir um lugar.

- Pois eu vou ficar plantada lá até conseguir, oras! – Ana não sabia se estava com raiva por ele insistir tanto ou por conseguir, mais uma vez, estar com a razão.

- Amor... – A voz dele soou persuasiva, suave. O tom foi o suficiente para baixar suas defesas e fazer com que visse o quanto suas palavras tinham sido infantis. Carlinhos percebeu isso imediatamente: - Não me deixe – ele sussurrou, aproximando-se.

O pedido definitivamente foi como um trator passando por cima de sua já enfraquecida perseverança. Não resistiu a se aproximar também, enlaçando-o pelo pescoço:

- Não estou te deixando – e para reforçar a afirmação, beijou-o ternamente nos lábios.

Carlinhos aprofundou o beijo, puxando-a para mais perto. Um tremor percorreu-a da cabeça aos pés. Soube imediatamente como aquilo iria terminar, e também entendeu o que o marido pretendia. Sabia exatamente o que ele estava pensando em fazer, porque geralmente era ela quem usava esta tática de persuasão para apaziguar “O Senhor dos Dragões”. Ah, não! Não se deixaria levar...

Afastou-o delicada, porém firmemente, tendo consciência de que ele precisaria de muito pouco naquele momento para fazê-la mudar de idéia:

- Só estou pedindo um tempo a sós com os meus próprios pensamentos, Carlinhos – e se virou para a mala, continuando o que estava fazendo.

Ana soube que o marido novamente se impacientara, porque o suspiro audível que ele dera fora claramente uma tentativa de acalmar a fúria e a frustração. Sentiu uma pontinha de arrependimento e quase desistiu. Quase.

- Tudo bem, se você quer isso... – Ana imediatamente desconfiou do tom conformado dele. - Mas você não precisa ir hoje. – Ele argumentou.

- Preciso. – Olhou-o rapidamente, antes de explicar: - Não vou dormir com você hoje, Carlinhos – Assim, pretendia deixar bem claro que não daria oportunidade para o plano dele ser posto em prática.

Pôde sentir o olhar chocado do marido cravado em suas costas. Até mesmo conseguia imaginar a expressão dele, certamente uma que traduziria o quanto tinha achado aquela declaração louca e ofensiva. Bem, uma parte dela também protestou veementemente quando disse aquilo, mas... Precisava ser forte!

- Bem... – Ele finalmente disse, devagar. – Está bem. Como eu disse, se é o que você quer... – uma pausa – Mas você concorda que não pode usar uma chave de portal agora, nem pegar um avião, não é?

Ainda que relutante, ela teve que concordar, acenando afirmativamente.

- Então está resolvido. Eu vou dormir no sofá lá de baixo, e, amanhã, assim que puder, você vai. – Carlinhos disse tudo rápido, como que para não dar chance a ela de retrucar. Foi separando um travesseiro e um cobertor, para reforçar as próprias palavras, colocando-os sobre o baú aos pés da cama. Olhou para Ana por alguns instantes, indeciso.

- Carlinhos... – Ela tentou argumentar, sendo interrompida por ele.

– Hã.... Vou só trocar de roupa...

Enquanto ele se voltava para o roupeiro, Ana pensou, em questão de segundos, que aquele ruivo teimoso era impossível. Sabia exatamente qual era a tática dele, e não se espantaria se, no meio da noite, ele aparecesse no quarto com a desculpa de pegar mais um cobertor ou travesseiro... Daí, estaria perdida.

A mala estava pronta. Apontou a varinha para um bloco de notas que estava sobre o criado mudo, ao lado da cama. Depois, pegou a mala e desapareceu.

Carlinhos só teve tempo de ouvir um “Crack” atrás de si, e se virou, mal acreditando que ela fizera aquilo... Embora algo dentro dele sempre soubera que ela poderia. Mulher impossível! Mais frustrado ainda, deu um soco na parede, querendo descontar a raiva que sentia de si mesmo.

Foi quando viu o bilhete, no bloco sobre o criado mudo:

“Não se preocupe, não vou usar uma chave de portal, nem pegar um avião. Estou em Smith House. Agatha e Moody já estão no Brasil, mas tenho certeza de que não irão se importar. Por favor, querido, não me siga. Preciso de tempo. Sei que vai entender. E... Antes de sentir raiva por eu ter saído desse jeito... Leve em consideração que eu te amo, e muito. Ana”.


Controlando o impulso de ir até Hogsmeade e fazer justamente o que ela tinha lhe pedido para não fazer, caiu sobre a cama, exasperado. Tinha vontade de aparecer em Smith House, fazer um longo sermão e enchê-la de beijos... Bem, talvez só enchê-la de beijos. Beijá-la até que ambos se esquecessem de qualquer outra coisa que não fosse o amor que sentiam um pelo outro. Era isso que importava, será que ela não via?

Mas ele sabia que Ana jamais o perdoaria se fosse atrás dela quando pediu para ficar sozinha. Além disso, queria amá-la, não sufocá-la com a necessidade que sentia dela.

Dera-se conta que, realmente, não havia sido ele mesmo. Só percebera quando Ana o pressionara contra a parede. Mas... Por quê? Por que fugira de enfrentar o problema? E agora a tinha magoado, mesmo que não entendesse por quê.

Pressionou o travesseiro contra o rosto, sabendo de antemão que não conseguiria dormir naquela noite ou em qualquer outra em que a esposa estivesse longe dele.

*****
Notas
*****
(1) Ler “Harry Potter e o Retorno das Trevas”, da Sally Owens.
(2) Ler “O Paciente Inglês”, da Regina McGonagall. Vários dos diálogos deste trecho foram tirados do Capítulo 20 desta fic.

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(N/A): Estou sentindo que vão vir enxurradas de reclamações com este capítulo! Gente, peguem leve, é minha segunda fic (terceira, se a gente contar com a Short Fic), mas não sou escritora profissional! Eu realmente precisei escrever isso, tá? Juro que deixo tudo explicadinho no próximo capítulo.

Quero agradecer mais uma vez pelo apoio, pelos comentários, pela leitura... São vocês que me dão forças para continuar neste projeto de escrever sobre os segredos dos Fundadores e, no meio do caminho, “fantasiar” sobre o futuro destes personagens que já aprendemos a amar, não é?

E, é claro, tenho que agradecer a duas grandes autoras que me “guiam”, inclusive me emprestando personagens e idéias: A Sally Owens e a Regina McGonagall.

Além de todo o pessoal que sempre aparece por aqui, no MSN, nos fóruns e nas Comunidades no Orkut, pedindo para atualizar, dando sugestões, levando a gente a se animar e continuar escrevendo. Um grande beijo para todos vocês!

Gente, eu não vou conseguir fazer os comentários individuais desta vez, mas prometo que no próximo volto a colocá-los, tá?

Agradecimentos especiais à Kika, Maria Luíza, Bê Black, Carline Potter, Grazy DSM, Regina McGonagall, Priscila, Charlotte Ravenclaw, Bruna Perazolo, Geia, Carolzinha_*, Sally Owens, Ana Loks, Trinity Skywalker, Morgana Black e Bernardo..


Só lembrando os endereços das fics:

* Espaço MSN:
PROJETO SEGREDO DOS FUNDADORES
http://segredodosfundadores.spaces.msn.com/PersonalSpace.aspx?_c02_owner=1
- Capítulos das fics;
- Trilha sonora;
- Fotos do “elenco” (isso mesmo, os rostos dos personagens).

* Comunidades no Orkut:
- E AGORA MENINAS
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=15081574
- SEGREDOS DOS FUNDADORES
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=14959861

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