O Tempo Não Pára



AVISO: Galerinha sangue-bom que acompanha as minhas fics e as da Sally Owens *Belzinha tendo surtos de surfista, hehehehehe!* Seguinte: eu estou usando informações de outra fic aqui, a da Regina McGonagall, chamada “O Paciente Inglês”. Os personagens novos que entraram são dela (o endereço está lá no final deste capítulo). Lembrando que a opção por “cruzar” os dados da fic com os da Regina foi minha idéia, e que a fic da Sally Owens continua independente (embora ela seja tão fã da Regina quanto eu, hehe). O que quer dizer que pode ser que personagens e tramas não sigam exatamente o mesmo curso daqui para frente nas nossas fics, ok? Beijos! Amo todos vocês.
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Smith House é uma simpática mansão localizada na vilazinha de Hogsmeade, que é, como todos sabem, o único povoado totalmente bruxo da Grã-Bretanha. Para os que se perguntam como é que uma mansão pode ser simpática, quando o próprio nome “mansão” traz à mente a imagem de uma enorme casa, imponente e esnobe (como seus possíveis habitantes), e cheia de coisas velhas nas quais não se pode tocar... A explicação é simples: essa mansão não era assim.

O lugar irradiava descontração em cada um de seus cantos, e uma simplicidade que as pessoas que a visitavam esqueciam-se de estarem em uma “mansão”. De fato, em nada diferia da maioria das casas, exceto pelo tamanho.

Por exemplo, seus jardins ostentavam estátuas bem curiosas. Nada das célebres poses das estátuas gregas, muito pelo contrário: havia a de um velho bruxo assuando o nariz, a expressão contorcida de quem estava na iminência de soltar um poderoso e sonoro espirro. Tia Agatha lhe explicara que a estátua era de seu trisavô, Ebeneezer Smith (1). O pobre homem passara a vida toda espirrando, conseqüência de uma alergia cuja cura, na época, não tinha sido encontrada nem por bruxos nem por trouxas. Mas ele tivera o bom humor de mandar fazer uma estátua de si mesmo, daquele jeito, com os dizeres: “Respiro, logo espirro”.

Com coisas assim por toda a propriedade, não seria de se surpreender se as pessoas imaginassem que a loucura corria solta pelas veias dos Smiths. Como era uma loucura inofensiva e de índole festiva, Ana não se importaria se descobrisse ter herdado um pouco dela também.

Estava em Smith House visitando a tia, que acabara de retornar de sua última viagem com Moody. Eles tinham ido conhecer algum lugar longínquo da Europa Central. Um desses lugares que os trouxas só costumam ligar a prosaicas histórias do sobrenatural, mas que não colocam entre suas escolhas turísticas. No entanto, são lugares de intensa visitação da bruxilidade, por razões que só esta conhece.

Tia Agatha estava de ótimo humor, e parecia ter rejuvenescido uns dez anos. Na realidade, Ana desconfiava que talvez tivesse mesmo, pois tinha uma vaga lembrança de ter lido algo a respeito de uma poção rejuvenescedora vinda daquela região onde a tia estivera, em uma das revistas medibruxas de Alicia, a esposa de Jorge.

- Entre, querida. - Agatha chamara. - O chá está pronto.

A voz da tia a fez retornar de suas lembranças daquele jardim. Carlinhos e ela tinham passado bons momentos ali em seu começo de namoro. Momentos angustiados também, mas, ainda assim, tão belos... Um sorriso bobo delineou-se no canto de seus lábios: “tão bons...”.

Respirando fundo, deu por encerradas suas divagações sobre o passado. Foi quando sentiu uma coceirinha no nariz, insistente, mas poderosa. Todo o corpo se contraiu, na antecipação do que aconteceria. Ah, a urgência do desentupimento das vias nasais! Depois do espirro, a sensação de alívio, bem estar, contentamento.

“Dá para entender o porquê de o vovô Ebeneezer ser tão bem humorado”, Ana pensou, soltando uma risadinha antes de entrar.

Acomodando-se em uma das poltronas da sala de estar, lembrou-se que, antes do confronto com Voldemort, naqueles meses que passara ali depois de literalmente ter sido “sugada” por um livro, Harry e ela costumavam estudar Oclumência naquela mesma sala. (2) Naquela época – que para Ana havia sido há apenas quase um ano, mas para os outros eram nove – imperava a preocupação com a Guerra, com as horcruxes, com Voldemort. Tempos sombrios, que pareciam querer voltar agora...(3)

- Soube que Harry e Gina vão ter gêmeos! – Moody fez sua voz de rosnado soar pela sala, em um tom que os amigos reconheciam como sendo o “rosnado satisfeito”.

Ana custou a voltar ao presente e entender o que o ex-Auror dizia. Quando compreendeu, abriu um pequeno sorriso feliz. Sim, os Potter iriam ter gêmeos. A notícia maravilhosa tinha sido dada algumas semanas atrás. Um pouco antes de Carlinhos e ela terem que estragar a felicidade de todos contando sobre os “beusclainh”. (3) Moody e Agatha iriam ser informados sobre tudo aquilo na reunião da Ordem marcada para dali a alguns dias. Portanto, ela resolveu falar nada para os tios sobre aquelas criaturas terríveis, esperando a reunião. Agatha não era nenhuma flor de fragilidade, mas Ana sabia que também não era feita de ferro. E Moody não precisava de muito para deixar a tranqüilidade que a tia a custo havia lhe incutido, voltando a sua “vigilância constante”.

- Querida, algo a está preocupando. – Agatha sentenciou ao perceber as reações da sobrinha-neta. – Te conheço o suficiente para saber que quer me falar algo.

Ela sorriu fracamente para a tia. Sim, precisava muito dela agora. Mas o pedido de ajuda não era sobre os problemas envolvendo os comensais foragidos, ou os demônios chamados “beusclainh” com os quais aqueles haviam se aliado. Era um tanto constrangedor falar sobre isso, e ela sentia-se egoísta se preocupando com estas futilidades quando demônios estavam à solta, aliando-se a Comensais da Morte e seqüestrando crianças... Mas precisava desabafar. E quem melhor que Tia Agatha para entendê-la e ajudá-la?

Moody percebeu seu constrangimento:

- Acho que precisam conversar sozinhas... – O velho Auror nunca tinha sido muito bom com “sutilezas”, e já estava saindo quando Ana protestou:

- Não, tio Moody, por favor, fique. Não tenho nada a esconder do senhor.

Olho-Tonto Moody não tivera filhos e, de repente, ser “tio Moody” lhe trazia grande alegria. Ele exibiu um esgar que correspondia a um sorriso sem graça, que mal disfarçava o contentamento pela confiança que a “sobrinha” depositava nele e voltou a sentar-se ao lado da esposa.

Então, ela contou sobre o jantar, sobre os pequenos detalhes que havia na vida bruxa que, infelizmente, não faziam parte do “Kit Helga Hufflepuff Para Transmissão de Conhecimentos Via Braceletes Encantados” – e a comparação, inevitavelmente, fez Agatha e Moody rirem, sendo seguidos por Ana. Depois de desabafar com os tios, sentia-se bem mais leve e a brincadeira descontraiu o ambiente.

Já mais séria, Agatha pegou as mãos da sobrinha, e disse:

- Perdoe-me, Ana. Eu DEVIA ter pensado nisso. – Censurou-se. - Quer dizer, estava tudo tão perfeito, com você e Carlinhos ficando juntos depois de tanto tempo, e você finalmente podendo voltar ao mundo mágico... Não cogitei sobre os costumes bruxos, que eles talvez não tivessem sido transmitidos a você. Essas coisas são tão... Pequenas!

- Realmente, um monte de bobagens! – Moody concordou, áspero. – Do tipo que gentinha esnobe como Lúcio Malfoy gostava de exibir, mas que não serve para nada, além de dar a ilusão a alguns bruxos que são melhores que os outros por conhecerem seus “códigos”. Você é muito melhor do que isso, Ana.

Ela sorriu, agradecida, diante daquela defesa veemente de Moody.

- Obrigada. Mas... Acho que não vai fazer mal algum se eu me inteirasse desses costumes, não é?

Agatha sorriu, e um brilho determinado passou por seus olhos. Se Ana conhecia aquele brilho, significava que a velha senhora tinha acabado de tomar a decisão de fazer de Ana uma versão de “My Fair Lady” (4). E brasileira torcia do fundo do coração que o plano de Agatha desse certo.

A tia afirmou confiante, dando palmadinhas na mão de Ana:

- Entendo perfeitamente pelo o que está passando, querida. Fiz o caminho inverso do que você está fazendo agora, há quarenta anos atrás, lembra-se? E, acredite, vai ser mais fácil para você. Vamos conseguir contornar esta situação em dois tempos, minha filha.

- Mais fácil? – Ana ergueu uma sobrancelha, duvidando.

- A maior parte do caminho já foi percorrido, seja através do bracelete, seja por causa dos... Livros. E você foi criada em um mundo onde se adaptar, e rápido, é fundamental. – Agatha acrescentou com um sorriso: - Se tem uma coisa que os trouxas fazem bem, é absorver uma grande quantidade de informações em um pequeno espaço de tempo. Quando você se der conta, o problema não existirá mais.

Um “crack” foi ouvido no hall de entrada.

- Deve ser o Carlinhos. – Ana anunciou, a face iluminada de um jeito que só acontecia quando sabia que o marido estava por perto.

Smith House tinha uma proteção anti-aparatação muito específica: os membros da família tinham acesso a ela e, ainda assim, os que estavam em um “círculo de confiança” do seu atual senhor. Carlinhos, é claro, estava mais do que autorizado por Agatha.

O marido também apreciava visitar os tios da esposa. Agatha fora sua melhor amiga naqueles oito anos que se vira obrigado a ficar separado de Ana, pondo-o a par do que estava acontecendo na vida da sobrinha, amenizando um pouco da dor que ele sentia por estar longe dela. A velha senhora o escutava, aconselhava e compreendia, tornado-se uma segunda mãe para ele. Quanto a Moody, conhecia-o desde que era um menino e visitava o pai no Ministério. Na época, já era o Auror mais respeitado de todos os tempos e... Um pouco assustador também, mas isso o tornava ainda mais interessante para o garoto ruivo que gostava de se meter em confusões.

Conversaram a tarde toda com eles, mal notando o tempo passar. Quando finalmente notaram o adiantado da hora, se despediram do casal, resolvendo dar uma volta pelos jardins antes de irem embora.

- Lembra-se dos nossos primeiros passeios por aqui? – Carlinhos perguntou, um misto de saudade e malícia na voz.

- Hum... Vagamente – ela provocou, rindo muito da expressão de falsa indignação que o marido exibiu.

- Como é? – Ele a abraçou, trazendo-a para junto de si.

- Isso não é justo! – Ana ria enquanto tentava se desvencilhar – Você é muito mais forte do que eu. Que armas eu tenho contra o ex-capitão do time de quadribol da Grifinória?

- Mérlin, seu problema de memória deve ser mais grave do que eu pensava! Se não tem idéia de que armas suas me deixam... “Rendido”... – Ele falou enquanto salpicava beijos da têmpora ao queixo de Ana, fazendo-a rir ainda mais.

- Comporte-se, meu marido. – Ela pegou o rosto dele entre as mãos – Temos que ir até a Dedosdemel ainda.

- “Temos”? – A pergunta saiu mais como um “Ah, vamos ficar aqui!”.

- Temos sim. – Ana fez força para resistir ao olhar que ele lhe lançou – Gina andou comentando comigo sobre uns desejos que ela vem tendo de comer doces da Dedosdemel, e que só tem por lá. – Pegou a mão dele e começou a puxá-lo – Vamos, você não quer que seus sobrinhos nasçam com cara de Ratinhos de Sorvete ou de Penas de Algodão Doce, quer?

- Decididamente, não! – Ele arregalou os olhos, fingindo horror, e, roubando um último beijo, a seguiu para loja de doces de Hogsmeade.

Naquele momento, Ana jurou que iria fazer de tudo para ser motivo de orgulho para Carlinhos. Ele merecia.

***

[Dezembro de 2006]

Amizade.

Pela primeira vez, Mel sabia o significado desta palavra. Era curioso observar aquele grupo singular. Mel era a única do primeiro ano, e ainda havia o fato dos outros serem de Casas diferentes. Mas, contra todas as probabilidades, os meses se passaram e a união entre eles cresceu a tal ponto, que era de conhecimento geral em Hogwarts que mexer com um deles era mexer com todos.

O inverno havia chegado com toda a sua força. À apenas algumas semanas do Natal, a neve cobria toda a paisagem da escola de magia e bruxaria. O efeito era digno de ser retratado por um grande pintor, ou então ser cenário daqueles filmes de fantasia como... Harry Potter!

Naquela manhã, a agitação era completa, pois os alunos estavam se preparando para partirem para as férias de fim de ano. Hogwarts virara uma mistura de branco (da neve), de casacos, luvas, gorros e cachecóis de lã das mais variadas cores, e de rostos rosados por causa do vento frio que soprava. E tudo em constante movimento.

- Aqui estão aqueles livros que eu te falei, Mel – Andy lhe entregou três volumes enquanto estavam voltando para os dormitórios – Eles me ajudaram muito no ano passado, em DCAT.

- Ah, obrigada! – Mel sorriu, os olhos brilhando ao imaginar-se descobrindo o conteúdo dos livros.

- Quer saber de uma coisa? – Josh se meteu no meio deles, passando os braços nos ombros dos amigos. – Acho que vocês dois são malucos. Estudar durante as férias, imagine!

Ambos riram do comentário típico de Joshua. O bom-humor do lufa-lufano “contrabalanceava” a pressão por ter dois irmãos mais velhos que eram um sucesso em Hogwarts. Otwani estava no sétimo ano e era o goleiro da Lufa-Lufa. Madeleine – ou Lane, como a chamavam – era uma quintanista belíssima e muito popular. Por fim, ser filho de Kingsley Shacklebolt, o chefe dos Aurores, não devia ajudar muito para aliviar a responsabilidade que Josh sentia de ser tão bem-sucedido quanto as pessoas em sua família. Ainda assim, era inegável que o espírito “para cima” do menino o fazia encarar tudo melhor. Tanto, que ele acabava sendo o “pacificador” nos desentendimentos dos amigos.

Com Andy, as coisas eram um pouco diferentes.

Andrew Bennet era da Grifinória, e o mais responsável dos cinco. Estudioso e seguidor das regras, frequentemente era chamado de “o Senhor Certinho”. Mel tinha a impressão de que ele era muito cobrado pelos pais e, em conseqüência, não tolerava erros, especialmente os próprios.

- Para a gente, estudar é uma distração, Josh – ela respondeu, ainda rindo.

- Loucos! – Josh reafirmou, balançando a cabeça em desaprovação.

O menino iria dizer mais alguma coisa, mas murmurou que os encontraria mais tarde e saiu rápido e rasteiro em direção a Sala Comunal da Lufa-Lufa. Procurando pelo quê teria espantado o amigo, eles viram Lane com uma cestinha de frutas, chamando o irmão.

Comida saudável. Tudo o que Josh mais odiava e o que a irmã insistia em empurrar para ele.

Ainda rindo das “desventuras” do amigo, os dois seguiram para as escadas. Danna e Hector haviam tomado o café da manhã correndo porque tinham que fazer as malas ainda. Sabia que a grifinória não precisaria mais do que alguns minutos para arrumar as suas coisas, pois era muito cuidadosa com seus pertences. Já Hector... Bem, ele era do tipo despreocupado e confiante, que sempre deixa tudo para a última hora.

Encontraram a colega no sopé das escadas, esperando sozinha.

- Onde está o Hector? – Andy verbalizara a pergunta antes de Mel.

- Procurando o Ferdinando – Danna respondeu, mal contendo a risadinha tímida.

- Ferdinando sumiu... De novo? – A corvinal exclamou, caindo na gargalhada junto com os amigos.

Os hábitos fugitivos de Ferdinando, o gato de Hector, eram bem conhecidos por todos. Era impressionante como o animal sempre dava um jeito de escapar de seu dono.

Ferdinando odiava Hogwarts. E Hector encarava isso como uma afronta a sua autoridade de dono, já que, teoricamente, todo animal de estimação gosta de ficar com o seu, não importa onde. Orgulhoso, apressava-se a explicar que o bichano era um “espírito livre”, como ele próprio. Assim, exaltando o gato, esperava salvar sua imagem de dono. A desculpa não colou, claro. Especialmente porque o gato começou a seguir Mel para onde quer que ela fosse.

Quando Mel finalmente conseguiu parar de rir, viu que Andy exibia aquela mesma expressão esquisita sempre que Danna sorria. Um jeito meio abobalhado, como se não conseguisse olhar para nada além da garota. E ele não era o único. Mel desconfiava que as “selkies”(3), o povo do qual a família da mãe de Danna descendia, tivessem algum poder semelhante às veelas. Ou então, o garoto gostava dela. Bem, provavelmente era os dois. E, como diria a tia Ana, aquilo era “tão fofo!”. Pena que a amiga sorria tão pouco... “Tenho que fazer Danna sorrir mais”, pensava com seus botões.

Decidindo que não havia muito que fazer senão esperar, foram subindo as escadas e conversando. De repente, uma cauda de pêlos castanhos passou pela entrada de um dos corredores, chamando-lhes a atenção.

- Deixem que eu vou atrás do Ferdinando – a brasileira se prontificou, com um sorriso zombeteiro – E digam para o Hector onde estamos – ela sabia que o grifinório iria ficar injuriado ao ter uma nova demonstração de que o gato fugia de todos (especialmente dele) menos de Mel.

Não sabia porquê, mas fazer Hector Lupin saber que não era o centro do Universo era muito compensador para ela.

Estava no quarto andar. Chamou Ferdinando algumas vezes, até que o gato veio correndo em sua direção, enroscando-se em suas pernas.

- Eu acho que vi um gatinho! – Ela riu, pegando o bichinho no colo e o acariciando.

Voltando os olhos para as paredes, visualizou o retrato que tanto lhe chamava atenção nos seus primeiros dias em Hogwarts. Abandonar o mistério não tinha sido intencional. Simplesmente... Esquecera. Envolvera-se em tantas confusões desde que conhecera os amigos, que sua mente fora ocupada pelas aventuras que estavam tendo.

- O olhar dela intriga, não é?

Um garoto aproximara-se sem que notasse e estava parado a alguns passos dela. Mel nunca tinha falado com aquele menino da Sonserina, mas já o tinha visto com Rupert, o irmão mais velho da intragável Caroline Bothwell. Se não estava enganada, estavam no mesmo ano.

O aviso de tio Carlinhos para se manter longe dos sonserinos reverberou em algum canto de sua cabeça, mas ela o afastou. Nunca vira o garoto participando das atividades condenáveis que os membros de sua Casa promoviam. Pelo contrário, ele se mantinha afastado deles, sendo Rupert um dos poucos com quem conversava. E ser amigo de Rupert, que apesar de sonserino era uma boa pessoa, contava pontos a favor do garoto.

- Sim, mas... – Ela respondeu, sorrindo timidamente – É aquele símbolo que eu acho estranho.

- Ah! – Ele ergueu uma sobrancelha – A Rosa dos Ventos.

- Rosa dos Ventos? – Mel piscou várias vezes, confusa – Mas não é o símbolo celta para “energia mágica”?

- Os símbolos celtas – começou a explicar, parecendo satisfeito com a questão proposta pela garota – geralmente não significam apenas uma coisa. Esse aí – fez um gesto com a cabeça para o desenho – inspirou vários símbolos trouxas.

- Como o símbolo atômico. – Ela concordou.

O garoto cerrou um pouco os olhos, como se estivesse buscando a informação.

- Ah, sim – ele era excessivamente formal para um garoto – Sei ao que se refere.

- Consigo entender porque “energia mágica” virou “energia nuclear” – Mel não se deu por vencida – Mas o que os pontos cardinais teriam com isto?

Um novo sorriso do sonserino. Ele estava achando agradável a conversa.

- Simples. Os celtas ligavam a mágica com intervenções divinas. Todo o poder vinha dos deuses. E a Terra Sagrada ficava ao Norte. Inclusive a palavra “norte” é a mesma para “céu” em celta. – Verificando o interesse crescente da menina, ele continuou: - A Rosa dos Ventos aponta o Norte para cima – o céu – sendo que a ponta de cima do símbolo faz às vezes da agulha do Norte, a de baixo, o sul, e assim por diante, o Leste, o Oeste, Nordeste, Sudoeste, etc...

- Como você sabe disso tudo? – O queixo da corvinal estava caído. Nada da pesquisa que Lipe fizera na Internet apontava para aquela direção.

- Meu pai me contou quando nós vimos uma Rosa dos Ventos pintada em uma calçada.

Ela desanuviou o semblante e sorriu. Ao se perguntar quem seria o pai dele, lembrou-se de que ainda não tinham sido apresentados. Sem jeito, passou Ferdinando para um dos braços, de forma que a outra mão ficasse livre para ser estendida:

- Sou Mel Warmlling.

- Eu sei – ele apertou a mão estendida e arqueou os lábios em um esboço de sorriso – Sua harpia chama bastante atenção.

Ela fez uma careta divertida, não se ofendendo com o comentário.

- Sou Alan Snape – ele se apresentou. (5)

A corvinal parou de sorrir. Dois segundos mais tarde, soltou um suspiro de alívio, como se tivesse compreendido algo, e disse, com uma risadinha marota:

- Você quase me pegou!

Alan torceu os lábios e também suspirou, mas como se dissesse: “Estava demorando”.

- Não, é isso mesmo que pensou. Sou filho de Severo Snape.

Ela esbugalhou os olhos, o queixo caiu ainda mais do que quando ele mencionara a Rosa dos Ventos:

- Isso é impossível. O Morcegão não tem filhos.

Lançando-lhe um olhar ao mesmo tempo superior e condescendente, o sonserino replicou:

- Não deveria acreditar em tudo o que lê.

“Ele sabe dos livros”, Mel pensou. Analisou mais atentamente o rapaz. Todo vestido de preto, cabelos negros e compridos até os ombros. Porte altivo e maneiras adultas – até demais para a idade dele. Céus, encaixava!

- Não... – A menina balançou a cabeça negativamente – Seria até antinatural Snape sendo um... Pai!

- Estou vendo que não é fã dele.

- Sinto muito, mas... Não. – Respondeu com todo o tato possível. – É realmente filho dele? Quer dizer... Existe uma “Sra. Snape”? – Ela estava assombrada.

- Sim, e não. – O garoto agora parecia estar se divertindo com a reação dela. – Sou adotado.

Aquilo era ainda mais surpreendente para Mel. Adotar alguém parecia um gesto tão... Humano! Não combinava, em absoluto, com o Seboso. Mas o garoto não estava brincando ao dizer que era filho de Snape, podia perceber isso.

- Bem... – Concluiu mais para si mesma, olhando-o de lado. – Pelo menos os cabelos não são oleosos. – Ela levou rapidamente a mão à boca, horrorizada, quando percebeu que deixara o comentário escapar.

- Vou tomar isso como um elogio – ele riu mais abertamente, demonstrando não ter se ofendido.

Alan era do tipo compenetrado que vivia com o nariz enfiado nos livros. E a solidariedade existente entre duas pessoas que passam tanto tempo entre páginas e mais páginas de livros acabou por facilitar um sentimento de simpatia mútua.

- Seu... Seu pai e eu não tivemos um encontro muito agradável em agosto – ela resolveu contar de uma vez. Assim daria oportunidade para ele decidir se queria continuar conversando com ela depois disso ou não.

- Hum... – os olhos do menino se tornaram sombrios – O Ministério quase me tirou dele, nesta época. A adoção ainda não tinha se oficializado, e eles tinham dúvidas de que ele... Bem, seja lá o que tenha acontecido, não ligue. Ele estava nervoso naqueles dias.

Por um segundo, Mel quase fez isso mesmo. A possibilidade de perder um filho... Mas não, corrigiu-se. Como se o Ranhoso pudesse ser afetado por “sentimentos”. No entanto, ele “adotara”! A atitude geralmente era impulsionada por nobreza e afeição...

Curiosa como só Mel podia ser, estava prestes a fazer mais perguntas quando a chegada de Hector desviou a atenção de ambos.

- Há-há! Aí está você, Ferdinando! – Entre o alívio e a contrariedade, o grifinório dirigiu-se diretamente para o felino, aparentemente ignorando os dois.

Já com o animalzinho no colo, Hector finalmente se deu conta dos demais.

- Olá, Alan – cumprimentou polidamente, recebendo um aceno de cabeça em resposta. – O que Ferdinando estava fazendo com você? – Dirigiu-se a Mel, com um tom levemente acusatório.

- Eu o encontrei! – Respondeu um tanto indignada.

- Impossível. Eu o procurei no quarto andar antes.

- Não tenho culpa se seu gato aparece quando “eu” chamo, e não você, Lupin! Estou começando a pensar que não é de Hogwarts que ele não gosta, mas de você.

Torcendo o nariz e ignorando acintosamente o comentário, Hector voltou-se para o outro:

- Vai passar o Natal em casa?

- Sim, meu pai está me esperando.

- Que bom, nos vemos na volta, então.

Havia certa distância na maneira como os dois garotos se comunicavam. Ainda assim, parecia haver simpatia, e até respeito entre eles, embora o constrangimento fosse evidente.

Despediram-se de Alan e, enquanto estavam se afastando, Mel perguntou:

- Você sabia que ele é filho do Snape?

- Claro, o sobrenome já diz tudo não? – Ele deu de ombros. – Ele está no mesmo ano que eu, fazemos algumas aulas juntos. Mas não conversamos muito. Acho que o Alan não compartilha da minha opinião do que é ser aluno de Hogwarts.

- Ou seja, uma aventura – ela revirou os olhos, provocando.

- Claro. Além do que... As pessoas parecem esperar que a gente seja um tipo de... Inimigo mortal, só por causa dos nossos pais. E eles nem são inimigos, só... – o grifinório não sabia como definir a situação exatamente.

- Entendo. – Ela balançou a cabeça afirmativamente. – As pessoas apenas vêem Comensal da Morte e o membro da Ordem da Fênix, e imaginam... Bem, a verdade é que a época de estudantes deles não traz boas recordações, não é?

Hector passou de indiferente para subitamente interessado:

- Você diz isso por causa do que está nos... Você-Sabe-O-Quê, não é? – Os olhos do menino estavam imensos, a ansiedade evidente no seu rosto.

- “Você-Sabe-O-Quê”, “Você-Sabe-Quem”. As pessoas podem pensar que os bruxos não têm muita imaginação, sabe? – Riu – Não precisa ser um gênio para inventar o próximo apelido: “Aquilo-Que-Não-Deve-Ser-Mencionado”. Que tal?

- Você está fazendo de novo. – Hector franziu o cenho.

- O quê? – Ela parou de subir os degraus, esperando uma resposta.

O grifinório parou também, ficando dois degraus acima:

- Fugindo do assunto. – Ele respondeu encarando-a com os lábios apertados.

- Não estou não! – Protestou. – Eu não posso falar, você sabe disso. As palavras “encantamento” e “expulsão” te lembram alguma coisa? – Ela Desanuviou a expressão do rosto e acrescentou: - E eu já respondi o que você quer saber, Hector: Você chegou “depois”. Tudo parou em junho de 1997!

Os bruxinhos gastaram dois segundos medindo-se, tentando avaliar o que se passava na cabeça do outro.

- O que parou em 1997? – Andy apareceu puxando um baú pesado, com Danna logo atrás dele.

Hector e Mel se sobressaltaram. Não tinham notado que estavam tão próximos da Sala Comunal da Grifinória. O que diriam?

- Bem... É... – Mel começou.

Hector viu um setimoanista, apanhador da Grifinória, passar e disse:

- Quadribol.

- Quadribol?!? – Andy e Danna os fitaram, confusos.

- Quadribol? – Mel disse quase ao mesmo tempo, no mesmo tom confuso. Hector lhe lançou um olhar de aviso, e ela percebeu a mancada: - Ah, é... – Continuou, também dizendo qualquer coisa: - Campeonato.

Os olhos do grifinório brilharam, e ela soube no mesmo instante que, agora sim, ele tinha uma idéia:

- É. A Mel estava dizendo que a Grifinória não tem um time decente desde 1997.

Vários grifinórios que estavam passando a olharam com despeito, enquanto Hector exibia um risinho debochado e satisfeito. Parecia que ele acabara de se vingar pelo que ela dissera sobre Ferdinando.

- Melhor você se apressar, Mel – Danna a avisou – Temos que estar lá embaixo em vinte minutos.

- Mérlin! – Ela começou a correr em direção à Torre da Corvinal.

Falara tanto de Hector, que sempre deixava tudo para a última hora, e no entanto se esqueceu que ela tinha que pegar suas coisas no dormitório ainda.

- Vou ficar te esperando aqui! – Hector falou mais alto, para que ela ouvisse.

Mel parou, apoiou-se no corrimão do corredor e olhou para baixo:

- Não, vão indo na frente, assim avisam o Hagrid!

- A Danna e o Andy vão, eu fico aqui. Caroline ainda está bem brava.

- Eu sei me defender! – Retrucou.

- Não contra cinco de uma vez só. – Hector sorriu, sabendo que tinha dado o “cheque-mate” no assunto.

Bufando em resposta, Mel retomou sua corrida em direção ao dormitório. Essa era boa. Primeiro, ele a acusa de ter pego o seu gato, depois, inventa uma mentira onde “ela” acaba falando mal do time da Grifinória. Agora, está preocupado com a segurança dela! Garoto idiota!

Minutos mais tarde, Hector e ela chegaram ofegantes até as carruagens que levariam os alunos para a estação em Hogsmeade. Josh chegou também, embora o motivo do atraso dele fosse outro: Lane agora estava dando de ombros, desistindo de procurá-lo, e entrando em uma das carruagens com os amigos.

- Me diz – o lufa-lufano puxava o ar entre os dentes, recuperando o fôlego – O que tem demais querer comer os doces do Expresso de Hogwarts em vez de frutas e aquelas coisas que a Lane vive me empurrando? Só uma vezinha?

***

Mãos nos bolsos do casaco, encolhendo-se toda por causa do vento gélido que soprava, caminhou com falsa determinação pelas ruas de Londres até o casarão antigo. Um rápido olhar pelo ambiente demonstrava o quanto o homem que pretendia visitar mudara.

A grande metrópole estava agitada com a proximidade do Natal. Nas ruas, trânsito lento e congestionado, calçadas exibindo os últimos vestígios de uma fina neve que caíra na noite anterior. A Prefeitura tinha trabalhado rápido na remoção da neve, de forma que os londrinos não interrompessem suas atividades – especialmente as consumistas, que enchiam os olhos de satisfação, os bolsos dos vendedores de dinheiro, e os cofres públicos de impostos.

E lá estava o velho casarão no meio dos prédios modernos. Estranhamente, naquilo tudo, ele era o que mais lembrava o Natal em Londres.

Tradicional e rebuscado, por certo algum dia aquela casa teria sido imponente. Mas agora parecia que o século XXI a oprimia com a sua magnitude, erguendo-se ao seu redor e projetando ameaçadoramente as sombras da modernidade sobre ela. Ainda assim, o lugar permanecia de pé, resistindo de forma digna a qualquer olhar de estranheza que lhe lançassem.

“Cheio de nobreza, poesia e nostalgia. Como em um conto de Natal”, pensou Ana.

Só percebeu que estava parada na calçada quando um passante se chocou contra ela. Fez um sinal de “tudo bem” quando o homem lhe pediu desculpas, sorrindo e pensando que, afinal de contas, Londres ainda não estava perdida se as pessoas tinham a decência de se desculparem. A menos que... Botou a mão no bolso do casaco, verificando que sua carteira ainda estava lá. Que alívio! Rindo de si mesma, pensou que, se a faculdade de Direito não tivesse feito dela uma pessoa desconfiada, acharia que era a proximidade com o Morcegão que devia estar a afetando.

Decidiu-se por entrar de uma vez. O tempo não estava nada bom para ficar do lado de fora, mesmo com o pesado sobretudo preto de lã, calça no mesmo tecido e botas que ela usava.

Subiu os degraus até a porta de carvalho decorada com uma guirlanda de ramos verdes trançados e amarrados com uma bela fita vermelha. Concluiu que aquele enfeite só poderia ter sido idéia de sua sogra. Claro, “dele” é que não iria ser.

Tocou a campainha, sentindo todos os músculos do corpo ficarem tensos. Tinha se aproximado bastante de seu “vigiado” naqueles meses, mas sabia que ele não tinha gênio fácil. Especialmente quando indagado sobre assuntos de índole pessoal.

A porta foi aberta bruscamente, um gesto que indicava o quanto seu anfitrião estava irritado por estar recebendo visitas. E, naquele momento, Ana desejou ter se preparado melhor para o confronto. Ficou imóvel, fitando homem mudamente, enquanto procurava uma linha de raciocínio lógico que lhe garantisse se sair bem daquela situação.

- Smith, aposto que tem coisas melhores para fazer do que ficar parada em frente à minha porta e tremendo de frio – Snape fez ressoar secamente sua voz grave.

Pelo pouco que conhecia daquele homem, sabia que a grosseria dita “a queima roupa” se devia ao fato de saber o assunto que a trouxera até ali. Fora por decisão do próprio Snape que Molly lhe contara tudo, mas mesmo assim, ele reagia àquela abertura de sua vida particular erguendo um muro ao seu redor, um aviso: “Cuidado. Não importa o que saiba sobre mim, ainda sou Severo Snape, o temível professor de Hogwarts”.

- Se isso foi a sua versão de “Por favor, entre, está frio aí fora” – Ana respondeu ironicamente assim que recuperou a fala – Receio dizer que precisa melhorar muito seus modos, Snape.

A reação dele foi puxar os lábios em seu característico sorriso “sarcástico-desdenhoso”. Ainda segurando a maçaneta com a mão esquerda, ele abriu a porta, afastando-se e dando passagem, a mão direito estendida para o interior da casa, convidando-a a entrar. Apesar de o gesto ser calculadamente irônico, não pôde deixar de notar o brilho de alívio nos olhos negros. Ao aceitar trocar farpas verbais com ele, garantiu ao ex-Mestre de Poções que não pretendia alterar sua opinião sobre ele por conhecer seu segredo, muito menos ter pena dele.

- Suponho que deva ter aprendido alguma coisa sobre boas maneiras com Agatha neste meio tempo, então.

Ana virou-se bruscamente para ele, um brilho furioso e magoado ao mesmo tempo no olhar. Desta vez, era ela que dizia “Cuidado” silenciosamente. Mas Snape já se mostrava constrangido, como se só tivesse se dado conta da exata repercussão de suas palavras depois que as pronunciara. Ela percebeu isso e, se Snape estava falando coisas sem pensar antes, coisa que não era de seu feitio, era indicação de que estava muito preocupado. Então, ele disse em um tom mais brando, evitando fitá-la nos olhos:

- Por favor, sente-se.

Respirando profundamente, Ana buscou forças para retomar a calma. Estavam se dando relativamente bem nos últimos tempos – “bem” para os padrões de Severo Snape – e precisava ter muita paciência agora. É claro que o assunto que a trouxera até ali perturbava o mundinho fechado do antigo professor.

Havia algumas poltronas no que seria a recepção do local, e aceitou o convite para se sentar, sendo imitada por ele. Ana controlou um sorrisinho irônico ao lembrar que até mesmo aquele lugar era um contra-senso à personalidade de Severo Snape. Vinha apoiando-o naquele projeto desde que lhe contara sobre ele, apesar do choque inicial que levou ao ouvi-lo expor o que tinha em mente. Embora ela fosse seu contato no Ministério (ele preferia considerá-la sua “agente de condicional”) e dele estar os auxiliando com o problema dos Comensais da Morte fugitivos, nunca dera indícios de que tinha mudado a tal ponto de querer fundar um local como aquele.

Um orfanato. Não, um... Um refúgio para crianças que haviam perdido seus pais durante a Guerra. (5) Fora uma surpresa e tanto para ela, apesar de se considerar, até então, a pessoa adulta mais próxima do ranzinza ex-Comensal. Ana quase se levantara ao fim da exposição de idéias que ele lhe fizera, a fim de questionar, perplexa: “Quem é você e o que fez com Severo Snape?”.

E agora... Mais uma revelação que causava uma reviravolta na idéia que ela fazia do mistério que era aquele homem. Quando Molly a chamara para vir a Toca porque tinha algo muito sério para lhe falar, jamais imaginou que ela lhe contaria algo parecido. Para falar a verdade, sequer imaginou que fosse sobre Snape, apesar a sogra também estar mais próxima dele porque era voluntária na instituição.

- Molly deve ter lhe contado sobre meu... Encontro com o passado no último Natal. – Ele foi direto ao assunto.

- Sim. E confesso que estou surpreendida por terem escondido isto de mim. Eu teria entendido a situação, e teria podido te ajudar... – Ela passou os olhos irrequietos pela sala, buscando palavras – Ajudar a estabilizar sua situação mais rápido para que pudesse adotar Alan – Ela o encarou, muito séria: – Para que pudesse buscar a moça também.

- Arthur Weasley e Potter também sabiam. Ou acha que poderia fazer mais do que o “maravilhoso Harry Potter”? – A voz dele estava entre a zombaria e o despeito.

- Pensei que confiasse em mim – ela rebateu.

- Confiei a você mais segredos do que a qualquer outra pessoa. – Os olhos dele brilhavam em amargura – Não precisa se sentir em dívida comigo pelo que acha que eu deixei de viver, Smith.

Então era isso, pensou Ana. Snape não queria depender emocionalmente de ninguém. Vivera tempo demais alimentando sua fama de homem sem sentimentos para abrir mão deste escudo que o envolvia. Devia ser difícil demais para ele conviver com o fato de que alguém tão próximo a Elizabeth soubesse de seu segredo da juventude. Ainda que Harry também soubesse, preferia o auxílio altruísta e impessoal com que o ex-grifinório agraciava a tanta gente do que a ajuda dela, que seria motivada por sentimentos pessoais de culpa pelo que literalmente “arrancara” da mente dele naquela noite em que Ana se defrontara com Voldemort.

- Pro inferno com suas idéias sonserinas sobre confiança, Snape! – Ana sentia-se frustrada com o quebra-cabeça que era a mente daquele homem. – A forma como fica medindo intenções e relacionamentos, esquadrinhando cada mínimo detalhe antes de admitir que precisa de ajuda... As pessoas têm mais a dar umas a outras do que jogos de poder! Quando vai entender que é possível confiar em alguém sem temer que ele use isso contra você?

Ela estava de pé, encarando-o com o ardor típico de quem acreditava em suas palavras. Snape não se perturbou, apenas suavizou a expressão, fitando-a com um sorriso triste:

- É em momentos como este que tenho certeza de que é filha de sua mãe.

Desconcertada com a frase, ficou sem ação. Ser comparada a sua mãe a pegou de surpresa: primeiro, porque sabia que vindo de Snape era um elogio e tanto; segundo, porque ambos sempre evitavam falar sobre a mãe de Ana. Era um acordo tácito que tinham.

- Teria sido mais fácil com Alan se a moça estivesse aqui. – Ela voltou a sentar-se, retomando o tom polido, embora a voz estivesse mais carregada de intimidade: - Uma mulher, tão próxima a você, com fortes laços de afeto... Uma figura feminina dentro da família em quem Alan pudesse contar.

- Ela ainda não estava preparada, não poderia trazê-la naquela época, de qualquer jeito. Ponto final, Smith. – Snape suspirou, evidentemente cansado. – De qualquer forma, chegamos até aqui e temos outras coisas com que nos preocupar. Quero saber se posso com você.

- E precisa perguntar? – Ela começou a abrir um pequeno sorriso. – Se estar com ela apenas algum tempo já te mudou a ponto de pensar nisso... – Ana olhou ao seu redor, indicando a instituição, e continuou: - Eu quero mais é que ela venha! Além do mais – agora o sorriso era malicioso – Vai ser muito divertido. Aposto que a chegada dela será uma bomba na comunidade bruxa!

- Pelo o que andei sabendo, também o seria entre os trouxas. – Ele ergueu uma sobrancelha, rosto contorcido em uma expressão sarcástica e mal humorada – Estive entre eles, li o que comentam sobre mim na tal da Internet. E, para não restar dúvidas, ouvi muito bem do que sua “sobrinha” me chamou no Ministério.

“Morcegão”, lembrou-se Ana. Mordendo os lábios para não rir, disse:

- Ora, não pode culpar os leitores por terem te dado este apelido. – Ela deu de ombros – Todo vestido de preto, pálido como se tivesse medo do sol e... Lembra-se do terceiro ano do Harry? Aula de Defesa Contra as Artes das Trevas. Aquele clima de mistério sobre o que teria acontecido com Lupin, para ele não ter vindo dar aula. E você, que não era exatamente o professor mais querido de Hogwarts, chega para substituí-lo. Qual é a primeira coisa que faz? Fecha todas as janelas! Como um... Morcego que não suporta a luz do sol!

Snape apenas fez um gesto com a mão, indicando que aquilo não era importante para ele. Mas sua convidada tinha mudado a expressão zombeteira por uma de perplexidade:

- Mérlin, se eu consegui falar tudo isso... Eu bem que desconfiava! – Ela sorriu marotamente, fingindo censura quando ele não se abalou com a sua reação: - Snape, seu patife! Você arranjou um jeito de neutralizar o feitiço do Ministério!

Quando ele permaneceu em um silêncio satisfeito, ela comentou:

- Não vai me dizer como faz estas coisas, não é?

- Não mesmo. – Ele sorriu, presunçoso. – Sou um patife, como você mesma disse. Não é a idéia geral que se faz de mim?

Ana recostou-se na cadeira, estreitando os olhos.

- Não, e se teve acesso ao mundo trouxa no final do ano passado, deve saber disso. – Snape devia ter “esbarrado” nas “Fan Fictions” sobre ele na Internet quando estava procurando informações sobre os livros. É claro que tinha conhecimento de que era a fixação de muita gente. – O que me faz lembrar...

Ela levantou o dedo indicador em sinal de “espere um minuto”, enquanto tirava um papel dobrado de seu casaco:

- Pedi para meu sobrinho, Felipe, imprimir isto – E entregou-lhe a folha. – Arrisquei minha posição no mundo bruxo ao carregar isso por aí, espero que reconheça meu sacrifício.

Snape desdobrou o papel e percorreu o olhar por seu conteúdo, reconhecendo o formato de um famoso “fórum” de discussão sobre os livros e os filmes. Seu primeiro contado com a ferramenta que os trouxas chamavam de “computador” fora feita através da mesma mulher que estavam planejando trazer para perto dele.

- O que é isso? – Ele franziu o cenho, confuso, quando se deteve em um quadrado em específico na folha.

- A frase é bem clara. – Ana abriu um sorriso de falsa inocência: – “Eu ainda acredito em Severo Snape”. É o que muitos trouxas estão colocando em suas assinaturas nos fóruns de discussão da Internet. - Ela indicou a folha em suas mãos: - Essa assinatura ganhou espaço nos fóruns em janeiro deste ano. Logo, imaginei que ainda não tinha visto isso.

Ele permaneceu alguns instantes com o olhar fixo na frase e... “Não, será?”, Ana pensou, satisfeita. Aquilo teria sido um brilho emocionado que vira nos olhos do Morcegão? Definitivamente, agora poderia sair por aí dizendo que já tinha visto de tudo nesta vida.

- O “Seviezinho” que desenharam não é uma gracinha? – Ela provocou, fazendo o velho Mestre de Poções voltar à realidade e lhe lançar um olhar que poderia congelar o inferno. – Ora, vamos... – Ela não se abalou – Vai me dizer que não é?

- Francamente, Smith! Temos coisas mais sérias para tratar! – Ele largou o papel como se queimasse em sua mão.

- Certo, tem razão. – Ela balançou a cabeça, rindo e concordando. - Depois eu tenho que buscar Mel em Kings Cross. Suponho que tenha que ir buscar o Alan também, não?

- Sim. – Ele voltara, definitivamente, à antiga frieza “snapeana”.

Passaram as horas seguintes conversando sobre as últimas notícias que tivera da outra brasileira, e que em breve ela estaria na Inglaterra. Havia tantas coisas que a mulher deveria saber! Ana ponderou que deveriam ir com calma, realmente. Mas se mostrou confiante de que tudo iria dar certo.

Quando comentara com ele, mais uma vez, que ele não parecia o mesmo, Snape simplesmente comentou: “O tempo não pára Smith. E as pessoas mudam com ele. É assim que o mundo é”.

Notas

(1) Nome inspirado em “Ebeneezer Scrooge”, personagem central do conto de Charles Dickens, “O Conto de Natal”, que era um velho avarento e muito rico, que recebe, na noite de Natal, a visita dos fantasmas ou espíritos dos natais passados, presente e futuros. Depois das lições aprendidas com os fantasmas, ele muda seu modo de viver, e passa a ser generoso e gentil.

(2) Harry Potter e o Segredo de Sonserina.

(3) Harry Potter e o Retorno das Trevas, da Sally Owens.

(4) “My Fair Lady”: Filme norte-americano de 1964, baseado em uma peça de teatro de mesmo nome, da Broadway. Henry Higgins (Rex Harrison), um intelectual e professor de fonética, aposta que conseguirá, no período máximo de seis meses, transformar Eliza Doolittle (Audrey Hepburn), uma simples florista de rua que não sabe falar direito, em uma dama.

(5) O Paciente Inglês, da Regina McGonagall. (http://potterish.com/forum/viewtopic.php?t=26259).

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N/A: Olha gente, eu planejava só postar este capítulo quando já tivesse escrito mais uns 3... Mas não deu. De qualquer forma, aí está ele, desculpem pela demora. Me deixei levar nele... Saiu enoooorme, mil desculpem por isso também. É um “Groupe”, sem dúvida... *ficando vermelha*.

Valeu pelo incentivo, pelos pedidos de atualização, e pelas opiniões lá nas Comunidades sobre quem seria o rosto perfeito para a Ana. Adoooooooooooooooro vocês!

A foto do personagem novo, o ALAN (Bem, não é “novo” exatamente, né? Esse persongaem é da Regina McGonagall, da fic “O Paciente Inglês”) está “publicada” lá no Espaço MSN dos SEGREDOS DOS FUNDADORES: http://segredodosfundadores.spaces.msn.com/


Bem, vamos aos comentários:

MARIA LUÍZA: Insuficiência de fics? Hahahahahaha! Eu entendo perfeitamente, também sofro da mesma doença. “Soltei” mais uma pista do mistério, notou?

BRUNINHA: Ainda bem que a minha intromissão no capítulo foi “bem recebida”. Como diz a Ana: “Dá para tirar uma pessoa do mundo trouxa, mas não o mundo trouxa de uma pessoa”. Sim, o livro e a moeda são pistas para o segredo. Apaixonada pelo Ron? Não deixa a Mione escutar isso! Hehehehe! Fico muito feliz quando alguém diz que tem que parar para se lembrar de qual fic está lendo. Isso quer dizer que a gente não está deixando furos quando escreve, né? “Esquilícia”? Hahahahaha! Vocês são ótimos em arranjar apelidos! Amei! Ah, o Lipe é do tipo de garoto que não se deixa esquecer, sabe? Daqui a pouco ele aparece de novo. Valeu pelo comentário gigante, fiquei superfeliz com ele. *É tão bom quando os leitores dizem do que gostaram (sou uma mãe orgulhosa, hehehe).

CARLAPIKS: Eu vi seu comentário no Segredo de Sonserina (amei ele). Tem toda a razão: a Ana é a realização de todo fã. Obrigada por ler e vir dar uma conferida no Segredo de Corvinal.

CHARLORRE RAVENCLAW: Hihihihi *Desculpe, achei hilário o seu comentário*. Sou obrigada a repetir: “E que raiva que dá quando os bruxos ficam subestimando a inteligência dos trouxas! Vão se catar!!!” Hahahahaha! Pois é, a Ana usou todo o conhecimento que lhe restava das aulas de Biologia naquela resposta! Surtou? Sem problemas, eu vivo fazendo isso (hihihi).

VANESSA ALMEIDA: Também adorei muito, muito, muito, muito, muito, muito, muito o seu comentário!

ANA CAROLINA GUIMARÃES: Calma, estou arquitetando planos terríveis para a Felícia *Belzinha praticando seu lado sádico*. Agora temos um rosto para o Carlinhos: ta lá nas Comunidades do Orkut. Hihihi. Eu deveria por um aviso no Segredo de Sonserina: “Não, não é um elogio aos sonserino”. Hhahahaha! Mas daí os “sonserinos” é que não iriam ler, hihihi. Que bom que vc deu uma chance à fic, e melhor ainda, gostou.

MORGANA BLACK: Pois é, menina, eu literalmente “me meti” na história. Já que não dá para “ser sugada por um livro” e participar mais de perto, foi o jeito que eu encontrei de dizer a minha opinião nada convencional, hihihi. O que faz parte do imaginário da gente (nós, os trouxas) que não tem nada com bruxos e contos de fada? Respondo: “Eu quero ser astronauta quando crescer!”. Bus Lightyear (é assim que se escreve?) é o subconsciente de muita “criança interior” das pessoas por aí. Hum... Mal sinal... Se vc, que é vc, não tem idéia do que significa aquele símbolo... (Hihihihi: brincadeirinha). Tem um motivo para vc não ter ouvido sobre a etiqueta bruxa (que vai além de não aparatar nas casas das pessoas...): eu a inventei! MSN em Hogwarts?!? Hhahahahaha! Menina, você está com a corda toda, heim?

PRISCILA: “Pão que o Kreature amassou”! Essa foi ótima! Tem muitas aventuras vindo por aí, mas a Mel agora tem amigos com os quais contar. Obrigada por ser minha mais nova fã.

SALLY OWENS: Ah, a Umbridge! *mulherzinha nojenta* Ainda bem que você nos vingou (nós, os fãs de HP) lá na sua fic. Ih, quanta gente surtando? Será que as minhas neuroses passam por osmose e via Internet? *Belzinha preocupada* Hahahahaha! Calma gente, eu estou inventando outra pequena vingança dessa mania dos bruxos de achar que todo “não-mágico” (agora me revoltei com o termo “trouxa”) não tem nada na cabeça. (aguardem os próximos capítulos...). Bem, o Carlinhos e o Rony têm genes em comum (embora eu duvide que os bruxos saibam o que são “genes”. Huhahahaaha! Sou má!). Amei seu comentário “parceira”. Beijos!

ANDERSON POTTER: Em breve mais aventuras dos Novos Marotos, Anderson, em breve!

GRAZY DSM: “O Pentágono” tb é ótimo! *Esses leitores são demais! Vocês mostram exatamente o que é a criatividade dos trouxas. É isso aí galera!*

KIKA: Gente, estas duas (a Grazy e a Kika) fizeram duas maravilhosas Comunidades (o endereço está lá na página incial). Calma Kika, calminha... Nada de esbofetear a Felícia, ta? Deixe isso para a Ana! O prazer é todo dela! Huhahahahahah! Bem, aparentemente o medalhão e o símbolo do retrato não tem nada em comum além de serem símbolos celtas... (eu disse “aparentemente”, viu? Hhahahaha!).

BRUXICCA: Ô, valeu *ficando vermelha*. Um abraço enorme para você, e obrigada por me agüentar no MSN. (Aliás, a todos os que me agüentam no MSN, hahahaha!).

BERNARDO: Rapaz, que bom que continua gostando! Valeu mesmo!

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