Aves-
Aves-
Acordar foi tão doloroso quanto dormir... escutou a tia chamar mas não atendeu, ela se dignou a subir e bater na porta, mas ele não tinha vontade de se mover, mas sussurrou um “estou me vestindo” e levantou da cama, se vestiu tentando não encarar o espelho, mas de relance viu o que não queria, outro, estranho, lhe olhando pelo espelho, balançou a cabeça e desceu,colocando o óculos que remendara a noite, haviam se partido na luta com o primo, e entrou na cozinha, o tio apenas agitou o jornal ao nota-lo, a tia empurrou um pedaço de pão e uma xícara para ele enquanto recolhia seus talheres a pia, então Harry olhou para o primo, apesar do contorno torto ele viu e quase esboçou um sorriso, fungando de cabeça abaixada, o primo exibia uma fachada tão acabada quanto a dele, não haviam cortes aparentes, mas um enorme hematoma roxo-escuro onde ele acertara o primeiro soco, e outros mais claros demonstravam claramente que Harry não devia ter duvidado de sua própria força, esse pensamento gerou uma nova autocensura e ele se concentrou no pão até se sentir enjoado, tirou os óculos com um repelão furioso que assustou Duda, que quase derrubou seu copo de achocolatado.
-Que foi moleque? –perguntou o tio irritado ao observa-lo coçar o olho enquanto com a outra mão segurava e olhava os óculos que remendara antes de dormir, insatisfeito.
-Ficou torto...-ele sussurrou mais pra si do que pro tio.
-Além de tudo conseguiu estragar um bom óculos.- falou baixo a tia.
Harry fingiu não ouvir, tinha aquela coisa há anos, e tinham que aceitar, estava quebrado há séculos, mas ele deu de ombros e colocou os óculos de novo. A imagem meio torta ia acabar lhe causando mais dor de cabeça, ele levou sua xícara até a pia e voltou a subir, isso estava virando uma rotina nauseante, ele sempre acabava assim nas férias, isolado naquele quarto, Dumbledore lhe explicara no ano anterior, naquele momento meio de desculpa e confissão, que era para sua própria proteção, mas até quando, pensou com raiva, iria aceitar ficar se protegendo em sua própria prisão?
Abriu a porta e se jogou na cama, e se arrependeu no ato, suas costelas reclamaram indignadas ao impacto, Mais um dia, mais um dia de pensamentos infelizes e torturantes.
Então escutou um movimento na janela e se ergueu com esforço, mas não era Edwiges, ela não voltara desde a noite, era uma coruja enorme, castanha escura, olhos avermelhados, por um segundo Harry se sentiu estranhamente incomodado com a ave, mas se forçou a levantar e foi até ela, estendeu a mão, mas percebeu que ela não carregava nada, perguntou meio apreensivo.
-Se perdeu? Ou perdeu o que devia entregar?
A coruja o olhou friamente, ele definitivamente não gostava dela, se encararam por um segundo. Ela abriu as asas enormes, então Harry sentiu sua cicatriz queimar e escutou, com horror a voz em sua cabeça, clara como se fosse dita pela própria coruja.
-Eu estou observando.Ainda...
Estacou congelado, a criatura abriu as asas e voou pra fora, Harry ficou ali e percebeu que estava tremendo, a voz... a voz era de Voldmort.
Ele percebeu que aquilo estava mais do que errado, “ouvir vozes, não é bom sinal, nem no mundo da magia...” a frase era um eco de memória, mas ele sabia que o que acontecera era no mínimo aterrador, pegou um pergaminho e escreveu:
“Algo perturbador ocorreu, preciso falar de modo seguro com Dumbledore.”
Achou que era dramático, mas o que ocorrera fora dramático, ele ainda tremia, ou Voldmort tentara possuí-lo de novo, ou o vigiava possuindo uma coruja. Ele desejou ver Edwiges o mais rápido possível. E temeu que ela pudesse ser atacada ou possuída.
-Estou paranóico. Nessa casa ele não pode me fazer mal...- Então a ficha caiu.
Ainda...
Ele pulou da cama ao escutar um farfalhar de asas na janela, e quase chorou de alegria e alívio, era Edwiges, ainda do mesmo jeito, ela entrou e pousou no seu ombro e beliscou de leve sua orelha, ele soltou um suspiro angustiado e olhou a coruja que se empoleirava agora na cadeira da escrivaninha, ele a olhou com uma ternura nunca antes sentida e ainda temeroso de manda-la, e se fosse atacada?, perguntou num sussurro rouco:
-Consegue entregar algo o mais rápido do que já fez antes? Agora?
A coruja apenas o olhou, e parecendo entender que era algo grave, esticou prontamente a pata, ficando quieta como sempre ficava, ele sorriu pra ela:
-Tenho total confiança em você, sei que fará o mais rápido que puder e agradeço, mas se cuide viu?
A coruja deu um pio baixo e saiu, Harry ainda ficou olhando mesmo depois dela não ser mais visível.
Ainda... a palavra queimava em sua cabeça como a cicatriz em sua testa, o que ele queria dizer com aquilo? Que encontrara um modo de atingi-lo na rua dos Alfeneiros? Afinal o que podia impedi-lo de entrar ali e fazer o que fizera com seus pais? Harry apenas sentiu um frio que vinha dele mesmo, uma inexpressividade fria, na vida dele tudo chegava e desabava aos seus pés sem nenhum rumor de aviso, não como esse, será que ele estava tentando assusta-lo? Ele não entendera totalmente, desde quando Voldmort avisava algo? Ele não preferia surpreender? Harry meneou a cabeça muito irritado, além de tudo os óculos tortos lhe davam enjôo.
Já passara o almoço e a tarde quando ele, lendo, sem óculos, nariz encostado em um livro de feitiços, da coleção que ganhara no natal, escutou um rumorejo de asas, olhou para a janela intrigado, Edwiges não era tão rápida assim, mas na janela não estava nem Edwiges nem a outra.
Era uma coruja-das-torres comum, e carregava um envelope. Harry se aproximou com receio, mas a coruja esticou a pata e ele tirou o envelope, ela se virou e foi embora.Ele viu seu nome e endereço, e virou o envelope:
NIVEIS ORINÁRIOS DE MAGIA
RESULTADOS DA AVALIAÇÃO
Há um tempo ele teria recebido o envelope com apreensão, ou até receio de ser reprovado... mas ainda com aquela estranha frieza que se apossara dele, abriu o envelope com um descaso que lhe deixou revoltado consigo mesmo.
-Não seja burro.- disse a si mesmo.- Se isso puder mudar minha vida, eu ficarei grato.
Leu.
Jogou o envelope de volta a escrivaninha, ficou com o pergaminho na mão, leu de novo, e de novo, mas as palavras pareciam não penetrar nele, escutou um novo rumorejo de asas, mas ao contrário dos outros, reconheceu na hora quem chegara, pois ainda voava, em volta de sua cabeça...
Harry estendeu a mão vazia e segurou Pichí em pleno vôo, a corujinha continuou a se agitar:
-Quieto pichí!- ele disse ainda olhando o pergaminho, que jogou displicentemente na cama e olhou a ave em sua outra mão:
-Vou soltar você, mas espere que vou te mandar com uma resposta.- e depois de tirar o bilhete, soltou a ave, e se arrependeu no ato.
Pichí voava em torno da sua cabeça quase o deixando mais tonto do que já estava. Sentou-se na cama e leu o bilhete:
“Já ficou informado da novidade? Se não, vou estragar a surpresa, parece que nossa Mione quase bateu o recorde de NOM´S possíveis, mas não está satisfeita, parece que ela não tirou o máximo possível em Runas... Uma tragédia não? Não ligue se ela mandar um pergaminho enorme... ela me mandou... eu fui bem , melhor que Fred e Jorge, mas espero que a gente logo se encontre pra trocar mais detalhes... Rony.”
Era tão distante dele que chegava a ser impessoal, ele esboçou um sorriso ao ler “nossa Mione”, pensou que gostaria de receber um pergaminho enorme dela, talvez o distraísse. Se esticou na cama. Pichí fez ainda mais barulho, ele olhou distante e rabiscou num pergaminho.
“Legal Rony! Não duvidava dela, espero saber mais em breve...
Harry.”
Sem perceber o que fazia, enrolou o bilhete e soltou Pichí que saiu ainda mais agitada, aparentemente alegre por estar sendo útil. Ele apenas fitou o horizonte, escurecia.
Sentiu algo nas suas costas, e se virou ao ver o clarão.
-Fa...Fawkes?-ele disse abismado.
A Fênix de Dumbledore pousou mansamente em seu ombro, ele finalmente se sentiu aquecido, ela deixou um pedaço de pergaminho em sua mão.Ele abriu e leu.Um bilhete tão curto quanto o seu.
“Sinto que é urgente... Mande seu recado por Fawkes, que saberá como achar Dumbledore rapidamente, Cuide-se, em breve você deverá deixar a casa dos seus tios.
Lupin.”
Relatou o ocorrido com todos os detalhes que lembrava enquanto Fawkes se aninhava em sua cama, com aqueles olhos que pareciam admirá-lo e aquece-lo, soltou uma nota fraquinha, e pousou nos joelhos de Harry quando ele se virou e disse sério:
-Eu preciso de respostas, ou de uma idéia do que fazer agora, lembre a ele que ninguém gosta de ficar sem respostas...- disse quase sem pensar no que falava.
Fawkes sumiu em outro clarão, deixando uma pena pra trás, Harry apanhou a pena e colocou sobre a escrivaninha.
Foram tantos pássaros que ele parecia exausto como se tivesse voado com cada um deles, ele fitava o teto quando adormeceu...
Foi acordado por uma sensação estranha, sentia-se na água, flutuava em algo líquido, tão morno quanto as lágrimas de Fawkes, e havia uma luz fraquinha, muito distante, poderia ser acima, ou a frente, ele não sabia se estava de pé ou deitado, uma luz estranhamente esverdeada, então tudo ficou escuro e gelado, ele agarrou os próprios braços com frio, sentiu seu nariz e orelhas congelarem como se estivesse voando em uma vassoura em uma tempestade, se viu em uma floresta escura, mas era tão irreal, como se ele fosse um fantasma, além da apreensão ele sentia um ódio que só crescia dentro dele, estava sozinho, abandonado, fraco, isolado, perturbado com o que dera de errado... então algo também começou a crescer dentro dele, um desejo de vingança, de destruir, acabar, matar o responsável por sua dor... Harry apesar de constrangido com o pensamento, concordava, o autor daquele sofrimento tinha que pagar, sim merecia morrer... qualquer um que causasse aquilo merecia morrer... então se aproximou de um lago, se curvou para beber...
O reflexo na água escura era de Voldmort... ele sorria... por um segundo antes de acontecer, pois ao contrário de medo ou espanto, ele sentiu um assomo de ódio tão particularmente grande que sentiu que poderia esganar o reflexo quando afundou as mãos na água, sentiu que tudo que sentira não era seu sentimento, mas os próprios sentimentos de Voldmort por ele, suas mãos saíram da água enlamenadas, ele as olhou sujas, escorrendo lama aguada e pegajosa, avermelhada, se sentiu tão sujo quanto suas mãos.
Tão incomodado que abriu os olhos, finalmente acordando, viu que estava ajoelhado no chão, as mãos a frente, as olhou em busca de vestígios de lama, mas estavam limpas, ele se ergueu com dificuldade, se sentia cansado, a cama estava desfeita, ele balançou a cabeça puxando o travesseiro que pôs no colo ao sentar na cama apoiando as costas na parede, colocou as mãos na cabeça e sussurrou nervoso:
-Pare de brincar comigo.- se sentia invadido.- Pare de entrar na minha cabeça...
Edwiges piou tristemente ao pousar, não trazia nada, então se balançou arrepiando as penas e o olhou, Harry esticou o braço e a coruja pousou nele, ao verificar que ela estava inteira e bem, ele passou as mãos pelas penas dela em um carinho e disse com a voz embargada:
-Que bom que voltou... estava preocupado. Que bom vê-la de novo.
Mas ela não estava só, um pássaro estranho crocitou na janela, um corvo grande, ele se levantou e Edwiges soltou um pio indgnado com o invasor que deu um saltito e crocitou novamente.
O corvo soltou o que trazia no bico e rapidamente pousou na cabeça de Harry, Edwiges bateu as asas indignada e Harry abriu o novo bilhete.
“Amanhã você será levado daí, avise os trouxas que iremos busca-lo.
Lá pelas três da tarde. Esteja pronto. Dumbledore já planejou tudo, fique sossegado.
M.”
“P S: deixe os trouxas tranquilos, irão te buscar a maneira deles.”
O bilhete era tão informativo quanto o M que assinara, não era a letra de Mione e nem da Srª Weasley, ela não assinaria Molly em um bilhete para ele, quem era M? A professora Minerva? Não, ela assinaria o nome. Dumbledore planejara tudo, então não mandaria nenhuma resposta, de novo? E de que “maneira deles” eles iriam busca-lo? Foi tirado de seus pensamentos pelo corvo que crocitou e saiu pela janela sem nenhuma explicação, talvez só tivesse ficado para ter certeza de que ele leria o bilhete. Harry estava tão cansado, confuso, que olhou pela janela esperando que mais aves aparecem e lhe dessem respostas, mas não haveriam mais aves, ele sabia, encostou a janela e viu Edwiges se aprumar no guarda-roupa, olhou para a escrivaninha e notou um montinho de cinzas onde estivera a pena de Fawkes. Com um sentimento de abandono ele se deitou com a certeza que não dormiria mais.
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