Capítulo XX
Os Marotos e o Segredo de Sangue
Capítulo XX – Um retorno e algumas confusões.
A rotina que se desenfreara pelo menos estava fazendo com que eles tivessem tempo para estudar, namorar e marotar, tudo em seu devido tempo, e Lílian parecia a mais orgulhosa com tudo aquilo. Thiago finalmente estava entendendo que a ruiva parecia mais dócil com ele e passava horas ao seu lado sem que ela ao menos resmungasse alguma reprovação ou o xingasse. Às vezes, eles se ajudavam nos estudos, e certa vez Lílian ajudou-o a escapar de uma detenção, quando Filch encontrou um sapo amarelo enorme grudado no pescoço de sua gata. Embora estivessem passando por aquela paz pós-guerra, Thiago não tentara beijá-la depois do baile de Páscoa em sua casa, mesmo que às vezes não conseguisse desviar os olhos dos lábios cor de cereja e do pescoço de Lílian, e dos seus cabelos acaju que se balançavam com leveza quando ela ria.
Ao contrário, Sasha e Sirius não poderiam se mostrar menos... apaixonados. A declaração que ele fizera a ela simplesmente assumindo-se em um namoro custava mais do que as fofocas que ela ainda ouvia pelos corredores, como as de que Sirius Black estaria atracado com uma garota em algum corredor ou que fora visto cortejando Franciny Turner. Sirius gargalhava quando Sasha lhe contava. Só de ouvir aquele riso feliz e espontâneo, tudo se esclarecia e ela sorria, sem acreditar que por um momento pudesse ter dado ouvidos às fofoqueiras de plantão de Hogwarts. Bertha Jorkins era a única garota em toda a escola, que tivesse ficado com Sirius, que não a metralhava com os olhos cada vez que a via, além é claro de suas amigas, mas isso realmente não importava para ela. Sasha sabia que tinha coisas muito mais importantes do que estar bem na língua das invejosas.
O romance de Remo e Gloria parecia ir de vento em popa. Assim como Sasha, ou talvez ela reagisse pior, às vezes a garota estourava com as milhares de fofocas que faziam questão de contar-lhe sobre Remo, e elas se ajudavam bolando planos malignos que nunca se concretizariam contra algumas garotas que pareciam o comando da máfia invejosa. Franciny Turner erguia-se em primeiro lugar quando apenas pensavam nisso. Mas apesar de tudo, e apesar da timidez e do segredo que Remo não contaria a Gloria, o carinho que eles tinham parecia imenso e cúmplice. As atitudes dos dois eram parecidas em vários aspectos, além da responsabilidade.
Mas como sempre acontece, quando está indo tudo bem, maravilhosamente bem, tão bem a ponto de se duvidar, alguém duvida: e aí tudo começa a desmoronar lentamente. Começou na segunda semana de maio, quando, cansados de livros e pergaminhos, Thiago e Sirius subiram para o dormitório e adormeceram como pedra, e logo foram seguidos de Remo. Era quase óbvio que algo daria errado no outro dia, pois tudo estava dando tão certo.
Sob o sol que irradiava pela janela anunciando a chegada de um novo dia, e sob o vento que acariciava o rosto dos alunos que dormiam como nunca em suas camas de dossel cujas cortinas estavam totalmente abertas para não sufocá-los, uma das camas amanheceu desarrumada. Não seria totalmente estranho se tal cama não tivesse ficado desarrumada sobre um malão cujo dono havia desaparecido há meses. O corpo de Rabicho estava enrolado como uma bola na cama, sua testa pingava suor, e ele dormia pesadamente.
Remo foi o primeiro a acordar, e dois segundos depois todos os outros do dormitório já estavam acordados.
- Rabicho! – eles o abraçavam, perguntavam que diabos ele estava fazendo fora, sem dar tempo de o garoto responder, e ele apenas sorria para os amigos, festejando com eles.
Pedro Pettigrew estava de volta, com a mesma cara de rato e o mesmo olhar submisso atrás de profundas olheiras que haviam se consolidado embaixo de seus olhos escuros. Não é preciso dizer que foi uma surpresa geral, e principalmente um mistério. Quando eles desceram sorridentes, os quatro – os Marotos unidos novamente – para o café-da-manhã, não houve uma cabeça que não se virasse para olhá-lo estranhamente e fofocar para o amigo ao lado em seguida.
Sasha engasgou com o suco de abóbora quando o viu descer as escadas, e Lílian teve que dar tapas que estalaram em suas costas.
- Que foi? – a ruiva quis saber.
Sasha apenas apontou. Lílian arregalou os olhos.
- Oh, meu Deus do Céu... – ela murmurou.
- Eu disse... lembra? Quando ele voltasse, não seria coisa boa. – Sasha falou sem desviar os olhos do garoto, com a garganta ainda arranhando.
- Será? – Lílian virou-se para ela – quer dizer, se fosse mesmo, o que ele iria querer para voltar?
Sasha olhou-a:
- Temo que iremos descobrir.
Dois segundos depois, eles voavam na mesa da Grifinória. Sirius sentou-se ao lado de Sasha, e parecia mais animado do que nunca estivera. Se limitou a responder o beijo que ele selara em seus lábios e sorriu para ele – era melhor não falar naquilo agora, já que ele parecia estar tão bem. Aliás, não somente ele, mas Thiago e Remo, que se sentaram escoltando Rabicho, e não paravam de empanturrá-lo de suco e pães e tortas.
- Onde ele estava? – a uma certa altura, quando estavam quase saindo para a primeira aula, Sasha resolveu perguntar para Sirius.
- N-não... Hey, seu rato porco! – Sirius lhe chamou a atenção, e Rabicho ergueu os olhos para ele – onde é que você passou esses meses, hein?
Rabicho olhou de Sirius para Sasha, e então repetiu o gesto.
- Estava cansado de estudar, resolvi tirar um tempo pra mim. – murmurou.
- E foi para onde? Para o Hawaí, pegar umas ondas? – perguntou Thiago, rindo.
- Ah, Pontas, estive por aí – disse casualmente.
- Ele esteve na cozinha! – Remo falou, e os três gargalharam alto.
Rabicho encolheu-se.
- Qual é, cara... nem parece que você é um maroto mais. – Thiago deu um soco em seu braço de brincadeira.
Então o garoto esbugalhou os olhos para ele, desesperado.
- N-não! Isso não tem nada a ver, Thiago! – explicou-se rapidamente, e olhou para os outros procurando ajuda, mas eles apenas franziram a testa – é claro que eu s-sou um maroto ainda, nunca, nunca deixa-ria vocês! Por n-nada e...
Mas as palavras dele foram abafadas pelos risos dos meninos.
- Calma, Pedro, eu só estava brincando!
Rabicho suspirou aliviado e enfiou uma tortinha na boca antes de levantar-se com a sua mochila, que dias antes jazia esquecida embaixo de sua cama. Sasha observou as silhuetas do quarteto que se distanciava entre os alunos que se dirigiam à primeira aula, e precisou tomar um beliscão de Lílian para sair do transe de pensamentos que a envolveram.
- Vamos nos atrasar!
Sasha concordou e seguiu-a até as estufas. A primavera parecia estar cansando de brilhar, e naquele dia algumas nuvens pesadas começaram a rodear o céu, fazendo o sol se refugiar atrás delas, escurecendo e umedecendo a atmosfera no castelo.
Na última aula da manhã, Defesa Contra as Artes das Trevas, o professor Takashighi, que ainda os tratava o mais friamente possível por causa do episódio da Páscoa, pareceu estranhamente pior do que nos outros dias, quando avistou o aluno que havia desaparecido. Ele chamou Pedro a um canto quando todos estavam se arrumando na carteira. Sasha fingiu que procurava uns cadernos dentro da mochila enquanto ouvia a conversa dos dois.
- Senhor Pettigrew, já falou com Dumbledore? - o professor perguntou de imediato, em um cochicho.
- Sim, senhor, ele mesmo me trouxe esta madrugada.
- Ele te trouxe? De onde? – o professor perguntou, repetindo as perguntas que Sasha fizera em sua cabeça.
A menina nem havia percebido que havia parado de remexer na mochila e fitava o nada, concentrada.
- Não tenho autorização para lhe dizer, professor.
- Mas eu sou o seu professor agora! E exijo qu...
- Não vai conseguir tirar nada de mim – Pedro o interrompeu de repente corajoso, embora suas mãos tremessem – se quiser saber de alguma coisa vá falar com o diretor.
Bruscamente, o professor ergueu seus olhos e pousou-os em Sasha. Ela desviou os olhos dos dois, corando levemente, sem saber o que fazer. Percebeu que tinha tirado todos os pergaminhos de sua mochila e os misturara sem sentido. Suspirou, e começou a juntá-los, enquanto o professor ia começando a aula.
*****
Ao entardecer, quando eles começaram a voltar para o salão principal para a janta sob os ruídos dos trovões e da chuva que castigava os telhados e as paredes do castelo, Pedro sumiu novamente. Dessa vez foram poucos minutos, mas a sua presença tinha sido tão significante que já fez os meninos clamarem mil opiniões sobre onde ele deveria estar. Quando ele voltou e encontrou-os reunidos no salão principal na mesa da Grifinória, Thiago perguntou-lhe onde estivera.
- Estava sentindo falta de visitar a cozinha – ele disse, dando de ombros e sentando-se entre Remo e uma menina do segundo ano que afastou-se dele horrorizada.
- Ah, claro, como pudemos esquecer? – riu Sirius.
Lílian observou que Sasha franzia a testa, olhando enquanto o namorado ria com um sorriso aberto e feliz.
- O que foi? – ela cochichou.
- Eles não se lembram – respondeu, simplesmente, deixando a voz escapar por um fio – não se lembram do que contei sobre ele ser um deles.
- É melhor deixar para falar com eles sobre isso depois, estão alegres demais agora.
- É. – ela respondeu simplesmente, notando que Pedro olhava-as.
Sasha limitou-se a jogar a mochila no ombro e levantar-se, deixando o prato da janta intocado para trás. Sirius chamou-a uma vez e ela disse:
- Tenho que estudar.
Mas é claro que ele não acreditou. Olhou significativamente para Lílian e ela apenas respondeu:
- Não me pergunte, eu não sei de nada.
- Então, estão juntos mesmo? – perguntou Rabicho, interessado – quer dizer, namorando?
Sirius fez que sim com a cabeça.
- Você não é mais o mesmo Almofadinhas de antes – o garoto falou.
- O que quer dizer? – quis saber Remo.
- Quero dizer que o Sirius que eu conheci a vida inteira não namoraria. – disse simplesmente – ainda mais ela.
- Como assim, ela? – Sirius perguntou, indignado.
Rabicho suspirou.
- Tudo bem que ela é muito bonita – falou – mas sinceramente, Almofadinhas, não combinam em nada.
- O que você está falando, Pettigrew? – Lílian revoltou-se.
- Estou falando que Sirius e essa Mills não têm nada a ver.
- Acho que não estamos falando da mesma Sasha Mills. – Thiago riu.
- Só pode ser. – murmurou Lílian, ainda sem acreditar, mexendo com o garfo sem vontade na comida.
Sirius mergulhou em pensamentos enquanto observava Rabicho devorar a comida, e Remo percebeu o seu olhar. Thiago chamou a atenção de Lílian fazendo flutuar a comida que ela estava remexendo, e ela ergueu os olhos para olhá-lo, sem expressão.
- O que está acontecendo com vocês? – ele perguntou inclinando-se na mesa, só para ela ouvir – não pense que não percebi os cochichos e os olhares. Estão diferentes.
- Pergunte aos seus amigos porque eles estão assim, oras.
- Não estou falando deles, Lily. Estou falando de você e de Sasha.
- Não me diga que está com aquela história de que pode ler pensamentos de novo...
- Não estou dizendo nada – ele falou, na defensiva – você sabe que tem alguma coisa.
Lílian estreitou os olhos para ele. Thiago de repente pareceu estar alheio àquela alegria que havia movimentado os marotos a tarde inteira a jogar bombas de bosta em estátuas e zoar a gata de Filch. Ela falou sem pestanejar, em voz baixa:
- Me encontre em meia hora no corredor do segundo andar. Perto do quadro do francês de Guillevard.
Um leve sorriso brincou no rosto de Thiago.
- E isso não é um encontro. – finalizou, e também saiu jogando a mochila nas costas, desaparecendo entre a multidão de alunos animados nas grandes portas do salão principal.
Quinze minutos depois, Thiago já estava correndo ansioso pelo corredor do segundo andar. Quando virou uns três corredores, e avistou o imenso quadro do francês de bigodinho que brandia uma longa espada e fazia golpes no ar com esta, na frente de uma paisagem impressionante de Guillevard, demorou para notar que havia uma ruiva agachada na parede, lendo um livro entre as pernas, com a mochila jogada ao seu lado.
Ela ergueu os olhos pacientemente quando o viu, e sem dizer nada os voltou ao livro novamente. Thiago jogou-se ao seu lado no chão do corredor, sob os impropérios lançados pelo francês que o desafiava para um duelo se ele fosse capaz.
- Eu sabia que não podia agüentar trinta minutos. – Lílian desdenhou entre os dentes, os olhos fixos nas páginas que desprendiam um cheiro de poeira que fez o nariz de Thiago coçar.
- Para ficar um tempo sozinho com você, não. – ele respondeu, sorrindo.
Ela embaraçou-se.
- Não pense que eu lhe chamei aqui apenas para ficarmos sozinhos. – reprimiu, e antes que ele pudesse dar-lhe uma resposta sedutora, continuou rapidamente – fiz isso apenas porque estou preocupada. Preocupada demais.
Um finco de preocupação surgiu na testa de Thiago, e isso foi suficiente para Lílian saber que ele estava levando-a a sério.
- Ok, não estou tão preocupada quanto Sasha – ela consertou rapidamente – e eu não vou jogar mil problemas na sua cara como está esperando que eu faça.
- Não estou – ele riu com leveza.
- Então comece a esperar! – ela ralhou, na vontade de que ele ficasse sério novamente.
Diabos, confiaria em Thiago se ele estivesse com aquela expressão concentrada que estava segundos atrás, pois não conseguiria, assim como Sasha não conseguia com Sirius, dizer à ele das desconfianças daquele amigo que havia acabado de voltar trazendo sorrisos e boas lembranças.
- Fale de uma vez, Lílian – ele falou, quase grosso – o que está deixando vocês duas dessa maneira?
Lílian suspirou.
- Thiago – ele ergueu as sobrancelhas quando ela disse o seu primeiro nome, animado – não quero que vá falar sobre isso com Sirius até que Sasha o faça.
Ele assentiu devagar, ainda extasiado com a façanha do primeiro nome nos lábios da ruiva.
- E também não quero que ela saiba que eu lhe disse de modo algum.
- Pare de mistérios! – ele pediu.
- Tudo bem. Estamos preocupadas porque vocês parecem estar mais felizes do que bonequinhos de corda com a volta do seu amigo Pettigrew – ela grunhiu entre os dentes – e parece que sequer estão lembrando de tudo o que Sasha lhes contou. Sobre ele. Sobre ele fazer parte de tudo.
Thiago uniu as sobrancelhas, concentrado. Depois soltou um gemido.
- Como ela pode achar que Sirius esquece de alguma coisa que lhe diga respeito? – ele perguntou, com um sorriso torto.
Lílian piscou sem entender.
- Nem eu, nem Sirius e nem Remo esquecemos de nada do que ela contou, Lily – ele lhe assegurou, olhando em seus olhos – não somos tão tolos como pensam.
O garoto piscou um olho para ela, e Lílian estreitou os olhos.
- Então estão sendo falsos com ele?
- Não – respondeu de imediato, mas sem urgência – estamos apenas espreitando. Vamos ver o quanto ele agüenta sem abrir o bico, se estiver fazendo parte de algo mesmo. Vamos colocá-lo contra a parede aos poucos.
Lílian refletiu por um momento.
- Mas é claro que estamos animados com a volta dele, Lily, afinal ele nunca deixou de ser um dos quatro, e estava fazendo uma maldita falta – ele falou com uma careta.
A ruiva ergueu os olhos para ele, e depois começou a enfiar os livros na mochila. Thiago a observou confuso.
- O que está fazendo?
- Bem, já lhe contei, e já que são mais sabidos do que pensávamos, isso era tudo. – falou, e quando ia fechando o zíper da mochila, ele segurou seu braço.
- Pra quê a pressa? – ele perguntou suavemente.
A ruiva deixou a mochila escorregar pelo ombro, fitando aqueles olhos castanho-esverdeados por trás dos óculos desnorteada. Thiago afagou seu rosto com as costas da mão, e ela sentiu seu calor.
- Potter...
- Me chama de Thiago. Soa bonito na sua voz.
Lílian deixou escapar um sorriso no canto dos lábios.
- Potter. Temos que ir para o salão comunal. Está quase na hora do toq...
- Você é monitora. – falou com certeza, e Lílian notou que ele aproximava a cabeça tão lentamente que podia ser até mesmo imperceptível, enquanto sua mão deslizava para trás de sua cabeça, acariciando-a e mantendo a ruiva ali – não tem nenhum problema com isso.
Os dedos de Thiago brincaram na nuca de Lílian entre os fios vermelhos, e por um segundo ela não se importou, sentindo a ponta dos dedos dele escreverem atrás da cabeça dela, como música.
- Fiquei sabendo que deu o fora em Franciny Turner na semana passada. – ela decidiu dizer, quando o rosto dele estava perto o suficiente para que ele parasse de se aproximar.
Thiago fechou os olhos, apreciando a voz dela e os rostos tão próximos.
- Eu disse para você... que... bem... – ele hesitou, gaguejando quando Lily ergueu os dedos e contornou lentamente os lábios perfeitos dele.
- Sim, você disse – ela completou, tão segura quando ele estava ao começar tudo aquilo – o que você disse mesmo, Potter? – ela falou quase num sussurro.
Thiago abriu os olhos faiscantes, tão brilhantes como nunca, e enterrou-os nos verdes de Lílian. Os dedos dela deslizaram para a nuca dele, arranhando levemente o caminho que levava seus dedos para dentro da camisa do uniforme para as costas, mas não se aventurou até lá.
- Não me provoque se não vai me beijar. – ele falou, inclinando-se para que seus lábios tocassem seu ouvido.
- Tudo bem – a ruiva falou, sorrindo com todos os dentes, e levantou-se de um salto, soltando-se do abraço que Thiago já enlaçara nela e de todas as carícias que ele estava fazendo, e começando a caminhar alegremente pelo corredor.
Em dois segundos, Thiago estava ao seu lado, caminhando rígido ao lado dela. Ele encarava o fim do corredor com força de vontade, mordendo os dentes e fazendo com que o rangido pudesse ser ouvido. A ruiva o observou, divertida:
- Sabe, é engraçado vê-lo assim. – ela falou.
- Minha mãe me falou para não forçá-la a nada que não queira. – ele admitiu em um tom duro.
Lílian suspirou, e seus passos ficaram mais lentos pelo corredor. Thiago demorou-se para acompanhá-la. De repente, a ruiva percebeu que era o motivo de algo muito maior do que apenas o joguinho de sedução de Thiago Potter. Já havia percebido que ele não tentara mais beijá-la desde o baile da Páscoa – e isso a deixava ligeiramente receosa – mas que mesmo assim não saía com outras garotas, como havia dito a ela que faria. De repente, ele pareceu ter palavra e profundidade. Por quê não?
A sombra que fazia no corredor vazio tornava o rosto lindo de Thiago de alguma maneira mais perfeito naquela noite, como se estivesse tudo previsto. Quando passaram por uma imensa janela, a única em que passariam durante todo o trajeto, a luz do luar banhou o rosto de Thiago com uma cor perolada que fascinou a ruiva, e sem que ela percebesse, seus passos se tornaram tão lentos que pararam no corredor. Thiago virou-se para ela, e olhou em seus olhos, parecendo curioso.
“É quando as emoções viram luz, e sombras e sons, movimentos
E o mundo todo vira nós dois,
Dois corações bandidos
Enquanto uma canção de amor persegue o sentimento”
(O Teatro Mágico – O Amor é Filme)
- O que foi agora? – ele quis saber, parecendo irritado.
- Eu preferia quando você não era o garotinho comportado da mamãe – ela respondeu em uma voz rouca, e logo em seguida quase não acreditou no que dissera, levando as mãos à boca como se tivesse deixado escapar o mais escondido dos segredos.
Os olhos de Thiago pareceram brilhar mais sob os óculos, como se pudessem. Ainda sob a luz do luar que os protegia irradiando pela janela, contente pela trégua da chuva, o garoto se aproximou de Lílian sem desviar o contato de seus olhos. Primeiro, ele pegou as suas mãos pequenas e frias entre as suas, que eram o contrário, grandes e quentes, e empurrou-a contra a janela, prendendo-a contra seu corpo. Lílian suspirou com o toque caloroso, e a sua mochila escorregou pelo seu ombro e foi parar no chão com um baque. Então ele soltou suas mãos e ergueu uma atrás dela, na vidraça da janela, para ter certeza de que ela estava mesmo presa, e a outra na cintura dela, segurando-a com confiança.
Mas Lílian não escaparia dali nem que quisesse. Nem que a sua razão retornasse e gritasse a plenos pulmões com ela, que ela sairia daquele abrigo quente que Thiago estava fazendo, do seu hálito quente e gostoso contra o seu rosto, avaliando cada centímetro de pele com uma expressão voraz que ela só pôde classificar como desejo. Um desejo que estava começando a corroê-la por dentro...
Então, com um sorriso maroto nos lábios de cereja, Thiago sussurrou:
- E eu que nunca fui um bom garoto...
Mas invés de beijá-la, como ela esperava ansiosamente que ele fizesse, ele tirou delicadamente a mão da cintura dela, e afastou-se com um sorriso glorioso. Lílian quis grunhir, mas não perdeu tempo. Apenas segurou o braço forte dele com uma das mãos – e constatou no primeiro instante que não conseguiria puxá-lo sozinho se ele não quisesse voltar – e virou-o para encará-la novamente. Três segundos depois, Lílian estava a menos de um centímetro de seus lábios, seus corpos tão juntos como antes, e apenas murmurou:
- Não faça mais isso.
Thiago inclinou-se para beijá-la com um sorriso. Mas a ruiva tivera uma ótima idéia no último instante. Com um passe que para Thiago pareceu de bailarina, ela esquivou-se dos braços dele e antes que ele percebesse, já estava com a mochila nas costas, chamando-o no final do corredor, deixando apenas a sombra de um beijo nos lábios dele.
*****
- Não me diga que continuará atrás dela? – perguntou Rabicho, estreitando os olhos para ele.
- Como um cachorrinho na coleira – Remo respondeu por ele, rindo – só não tão original quando ao Sirius.
- Há há há – Sirius desdenhou de sua cama, as pernas cruzadas no ar folgadamente – é claro que Thiago continuará atrás de Lílian, Pedro, que pergunta!
- Ainda mais agora! – Remo falou – que ela está dando...
- ...indícios. – concluiu Sirius.
- ...eu diria chance. – Remo especulou.
- Não! Ela nunca admitiria – Sirius riu.
- Calem a boca! – Thiago falou mal-humorado para eles.
- Ui, o chifrudinho da mamãe está nervosinho! – Sirius falou.
- A ruivinha não quis acalmá-lo, e ele ficou todo amuado – Remo continuou com o amigo.
Rabicho soltou gargalhadas estridentes que lembravam guinchadas.
- Não estou mal-humorado! Só não consigo suportar que vocês sejam tão burros de não perceber o que ela está fazendo. – ele balançou a cabeça negativamente.
Sirius ergueu as sobrancelhas para ele, parecendo curioso. Remo fez o mesmo. Thiago revirou os olhos.
- O que ela está fazendo, Thiago? – Rabicho perguntou antes deles.
- Está me provocando!
Sirius e Remo se entreolharam e depois riram até chorar. Rabicho olhou-os sem entender, mas riu mesmo assim.
- Do que estão rindo? – ele perguntou, com o rosto corado de raiva.
- A ruiva está te provocando? Ah, qual é, Pontas...
- Sirius, você não estava lá.
- Mas eu imagino. Ela deve ter simplesmente andado na sua frente e dado um olhar de não fuzileiro e você já inventou essa história toda pra gente! – ele zombou.
Thiago olhou para eles sem acreditar. Depois, pegou o pijama em cima da cama e entrou no banheiro para se trocar, o que não era comum. Remo franziu a testa para Sirius.
- Mal jeito, Almofadinhas.
- Eu só estava gozando da cara dele – ele disse em voz baixa, com um tom inexplicavelmente inocente – não achava que ele fosse ficar tão nervoso.
- É só mexer com a ruivinha... – murmurou Rabicho. Remo concordou.
- E agora? – perguntou em um sussurro. Thiago fez barulho no banheiro. Parecia estar... socando as coisas.
- Thiago?! – Sirius voou para a porta, colocando o ouvido para escutar – hey, eu estava só brincando, cara! Larga de ser vead...
- SÓ ESTAVA BRINCANDO? BELA BRINCADEIRA A SUA! FERIR OS SENTIMENTOS DOS AMIGOS!!!
Sirius arregalou os olhos e virou-se para olhar para Remo, fazendo uma expressão de nojo.
- Ele virou mesmo veado, não pode ser Thiago aí dentro – sussurrou, em tom suplicante. Remo indicou que ele continuasse, preocupado – Vamos, Pontas, venha aqui fora pra gente resolv...
- PRIMEIRO VOCÊ DUVIDA DO MEU RELACIONAMENTO COM A RUIVINHA E AGORA QUER CONVERSAR? CONTA ESSA PRA OUTRO, SIRIUS BLACK!
Sirius revirou os olhos.
- Olhe, desculpe, seu idiota pscicopata. Não queria dizer nada daquilo.
Então Thiago ficou anormalmente quieto dentro do banheiro. Logo um som pôde ser ouvido de lá de dentro, algo como... um riso sufocado. Depois Thiago explodia em risadas dentro do banheiro. Sirius estreitou os olhos e girou a maçaneta, a porta estava aberta, e Thiago estava sentado no chão, chorando de rir, os óculos sob a pia. Remo acompanhou a risada, e Rabicho também, mesmo que não estivesse entendendo bulhufas.
- Você não passa de um veadinho! – Sirius xingou, apontando para Thiago no chão.
Thiago não conseguiu responder, sua voz estava embargada pelo riso.
- Acha que me atingiu, não é?
- Ele estava qu-quase se mijando, não é, Aluado? – Thiago perguntou para Remo, após recuperar o fôlego.
Remo apenas fez que sim com a cabeça, rindo.
- O veadinho é você! – Thiago falou para Sirius.
Sirius foi até a sua cama com uma rapidez incomparável e segurou dois travesseiros em uma mão só.
- Agora vamos saber quem é o veadinho, seu energúmeno que não consegue nem beijar uma menininha!
- Ela não é só uma menininha, é a minha ruivinha!
*****
- Bem, Lil, pode ter certeza que Thiago vai pensar que significou alguma coisa para você – Sasha falou como se fosse óbvio - ainda mais porque realmente significou algo para você.
- Mas não acham que eu estou apressando as coisas? – ela perguntou, suas bochechas adquirindo um leve rubor.
- Apressando as coisas? – Sasha repetiu, surpresa, e depois deu uma gargalhada.
Lílian abaixou os olhos. Alice olhou-a divertida.
- Talvez seja melhor que tudo fique como era antes. – a ruiva murmurou.
- Não! Nada disso! – Alice falou – Você acabou de dizer que sentiu algo por Thiago ontem à noite e agora está me dizendo isso?
- Mas eu não sei como lidar com ele. – ela respondeu, defensiva – não sei o que fazer.
- Você vai acabar deixando ele louco. – Sasha suspirou, e a ruiva deu-lhe um soco no braço, rindo.
- Por que vocês vivem me dizendo isso? Não gosto de pensar que enlouqueci alguém!
- Lily, deixe que ele faça tudo – Alice deu de ombros.
- Ah, sim, Lílian é só uma fútil sem atitude – ironizou Sasha, abanando-se com um pergaminho.
- Mas ela não sabe o que fazer, Sasha! – Alice lembrou-a, ainda com um sorriso no canto dos lábios que mostrava que se divertia com a situação.
Lílian bufou quando ela disse aquilo.
- Não estou dizendo isso!
- Então a gente te ajuda! – Sasha piscou um olho para ela.
- Não! Parem! Esqueçam tudo o que contei. Não vou tentar nada – ela falou, escarlate e furiosa, desviando os olhos verdes dos da amiga.
- Ok, Lil, a gente estava só brincando, é sério. – Sasha apressou-se em explicar a ela.
Lílian voltou seus grandes olhos verdes para as amigas e depois deu de ombros.
- Você não está apressando nada – Alice ajudou-a – me diga há quantos anos Thiago tenta alguma coisa com você!
A ruiva pareceu pensativa. Depois sorriu com o canto dos lábios, murmurando “Alguns”.
- E agora me diga há quanto tempo ele está sem sair com nenhuma garota porque disse a você que não o faria? – Sasha perguntou também.
Lílian tinha que admitir. Havia um bom tempo que não ouvia rumores de Thiago com alguma garota pelos corredores escuros, e agora os rumores eram que ele devia ter arrumado uma namorada em Londres ou alguma escondida em Hogwarts mesmo, mas ela devia ser tão feia que ele não queria que ela fosse pública; além disso, ouvia as reclamações das suas outras duas companheiras de quarto, exaustas de tanto se exibir para Thiago e Sirius e eles ficarem indiferentes. A verdade é que eles sempre foram indiferentes quando às exibições das garotas, mas eles costumavam sair com elas de vez em quando. Ou algumas vezes por semana. Diabos, ela tinha que admitir que Thiago estava mesmo parecendo comprometido como Sirius.
- Há algum tempo. – respondeu por fim.
- Então me diga o que você está achando ser precipitado.
- Isso de... eu aceitar ele numa boa. De repente. – ela se esforçou para dizer, corando violentamente.
- Lily... você sempre disse “não” à todas as tentativas dele... disse não a tudo que se referia a ele! E desde o começo do ano vocês se aproximaram mais e começaram a conversar, sabe, se entender... ou se conhecer – Sasha falou pausadamente – a coisa não está acontecendo de repente. Está fluindo. Com o tempo.
Os ombros de Lily relaxaram e ela suspirou alto, arrancando risos de Alice. Então, Sasha lembrou-se de uma conversa que tivera com Lílian no dia em que brigara com Sirius na biblioteca. Assunto Snape. Algo como se ela tivesse aprendido que chorar por causa de homem fosse perda de tempo.
- Espere aí! – ela falou alto, assustando-as.
- O que foi, louca? – perguntou Alice.
- Lílian, quando me disse... aquela vez... quando me disse que havia aprendido que chorar por causa de homem era perca de tempo porque eles não choram por mulher – enquanto Sasha ia falando, os olhos da ruiva iam se arregalando – estava... estava se referindo a Thiago?
Ela quase sussurrou o nome dele. Lílian parecia incrivelmente desconcertada, ainda mais quando avistou que três marotos saíam pela porta principal para os jardins. Alice deu uma risadinha abafada.
- Não. Nunca. – ela lembrou-se que tinha que responder – Como? Háháhá, você só pode estar brincando mesmo.
- Então por quem foi?
- É, por quem, Lil? – insistiu Alice.
A ruiva olhou para as duas.
- Oras! Como podem achar que eu gostava no Potter quando ele me chamava para sair e eu o dispensava no ato? – ela respondeu, rancorosa.
- Então por quem era? – repetiu Alice.
Lílian olhou em seus olhos.
- Eu já saí com outros garotos, se vocês duas não sabem! – falou, ofendida.
- Você namorou ano passado! – Alice lembrou, apontando o dedo para ela.
- Com quem? – Sasha ficou boquiaberta, ligeiramente animada.
- Com Amos Diggory! – Alice respondeu feliz, dando um soco no ar.
Lílian revirou os olhos enquanto Sasha lhe fazia mil perguntas de uma vez só.
- A gente não namorou coisa nenhuma... – disse em voz baixa – só saímos algumas semanas, nada demais.
- Ah, sim... então você ficou mal quando terminaram porque? – perguntou Alice, fingindo inocência.
- Eu não fiquei mal quando terminamos! E não terminamos realmente, porque não tínhamos nada! – ela grunhiu – eu fiquei apenas triste, pois era muito amiga dele e...
- Incrivelmente apaixonada por ele. – Sasha concluiu por ela.
A ruiva corou furiosamente.
- Vocês estão me ofendendo! – praguejou, bufando.
Sasha e Alice se entreolharam, e aquele olhar cúmplice era de compreensão. Calaram-se: uma hora ou outra, Lílian ia falar alguma coisa mesmo.
- Tudo bem, foi mesmo por ele. – ela admitiu com a voz em um sussurro. – mas se contarem isso a alguém juro que o resto de seus dias nesta escola serão um inferno nas minhas mãos!
Sasha sorriu e Alice abafou um risinho.
- Tudo bem, Lil, todo mundo chora por alguém.
- Você mais do que todo mundo, né? – riu a ruiva, e a morena lhe fez uma careta.
- Você está me ofendendo! – ela esbravejou da mesma maneira que Lily fizera segundos atrás e elas riram.
Os marotos estavam perambulando pelos jardins, conversando animados entre si, o que não era de se surpreender, embora a volta de um novo membro fizesse com que as cabeças se virassem mais para olhá-los do que de costumo, como se isso pudesse ser possível. Remo não estava com eles, Gloria dissera que eles tinham algo marcado. Alice deu um grito de repente e apontou para um objeto cor de carne que descia no gramado em direção a eles, e elas observaram quando a cordinha branca entrava dentro do bolso de Thiago.
- Merda! – Lily gritou, fazendo um grupo de primeiranistas se assustar atrás delas.
- O que era aquilo? – Alice cochichou para Sasha, vendo Lílian se levantar e ir em direção aos meninos.
Sasha engoliu seco.
- Espero que não seja o que eu estou pensando – respondeu, se apressando em levantar para seguir a ruiva.
Os quatro as fitaram enquanto desciam o gramado na direção deles, se virando para elas. Lílian pisava forte no chão, com os punhos fechados, estava da cor dos cabelos no rosto. Olhou furiosamente para Thiago e simplesmente falou:
- Me dê.
- O quê? – os olhos grandes e brilhantes dele brilharam com inocência. Se eles não soubessem o que acontecia podiam até acreditar.
- Me dá isso agora, Potter! - ela bradou mais alto, e algumas cabeças espalhadas pelos jardins se viraram para olhá-los.
- Eu não sei do que você está falando, Lily! – ele disse, erguendo as mãos para cima para se defender.
- Deixe de ser mesquinho! Acha que eu sou idiota? De agora em diante mais do que nunca é Evans para você! EVANS! Estamos entendidos?
Thiago arregalou os olhos. Aquilo significava regredir, regredir muito em seus progressos. Precisava acalmá-la.
- Líl-Evans – ele começou, ante um olhar ameaçador – tudo bem. É... – ele pensou para falar, gesticulando – o que quer que tenha visto, o que quer que tenham lhe contado, eu não sei de nada.
Sirius trocou um olhar com Rabicho, e eles mantiveram as mãos nos bolsos calmamente. Os olhos de Rabicho quase se esbugalhavam de excitação, há tempos não via uma briga dos dois.
- Tão previsível quanto antes... – Lílian falou entre os dentes, seu rosto ardendo - ...não sei como por um momento eu pensei que pudesse realmente gostar de você! – ela atirou, e depois deu as costas, subindo a encosta com rapidez e fúria.
Sirius segurou o braço de Thiago quando ele fez que fosse segui-la.
- Ela não vai ouvir você – Alice falou, tão fria quanto conseguia.
- E eu espero mesmo que não o faça. – Sasha apoiou, e as duas deram as costas, mas foram impedidas de continuar pelas mãos hábeis de Sirius.
- Não saem daqui enquanto não explicar o que diabos está acontecendo! – ele ordenou, autoritário.
Elas se entreolharam, furiosas.
- Pelo amor de Merlin, não precisam mentir pra gente! – Alice esbravejou.
- Foi realmente idiota que...
- Parem! Do que estão falando? – Thiago interrompeu Sasha, irritado.
Sasha suspirou e aproximou-se dele. Meteu a mão nos bolsos dele, vasculhando. Sirius lançou um olhar curioso e recriminador. A mão de Sasha saiu do bolso de Thiago segurando uma orelha entre os dedos, uma orelha um pouco maior do que o tamanho normal, cor de carne, de cuja ponta saía uma cordinha branca. Ela mostrou a peça a todos eles, que olharam incrédulos, e depois começaram a falar todos juntos.
- Que mal jeito, Pontas! – Rabicho falou, balançando a cabeça.
- Thiago, onde está o seu cavalheirismo...
- Ouviu a conversa das menin...
- Não! Parem - ele pediu em voz alta – Eu não fiz nada disso! Não sei por que isso está aqui!
Ele foi mais sincero do que Alice ou Sasha esperavam, e mais desesperado também. Passou a mão pelos cabelos, bagunçando-os e depois olhou para elas:
- Era importante? Quer dizer, o que ela tinha falado. Significava para ela?
Alice fez uma careta antes de fazer que sim.
- Droga. – ele praguejou.
- Mas como isso foi parar aí? – quis saber Rabicho.
- Pontas, você não comprou nenhum desses na Zonko’s naquele dia?
- Não! Lílian sabe que eu não comprei, ela estava comigo! – ele lembrou-se, e então sorriu vitorioso – é isso! Tenho que lembrá-la! – e então saiu correndo jardins acima e desapareceu na porta principal.
Dessa vez não foi impedido por ninguém. Sasha balançou negativamente a cabeça, sentindo os braços de Sirius contornar sua cintura com firmeza.
- Eu não acho que vá funcionar – agourou.
Alice concordou.
*****
Pelo menos por uma semana, a semana seguinte, não funcionou mesmo. Lílian parecia pior do que era quando Sasha começara a estudar em Hogwarts com relação a Thiago, evitando-o ao máximo, sequer olhando para ele ou cuspindo algum bom-dia. Isso afastou-as consideravelmente dos meninos naqueles dias, pois apesar do namoro com Sirius, Lílian ainda era a melhor amiga dela, e sabia que ela devia estar arrasada por dentro, mesmo que não quisesse falar uma palavra sobre assunto. Ela não deixou que elas contassem a Gloria, e a menina também se afastou delas, chateada com a falta de confiança, mas é claro que Remo devia ter lhe contado – excluindo a parte sobre Amos Diggory e tudo. Mais do que nunca, a biblioteca pareceu a nova moradia das garotas, o novo dormitório e o novo local de lazer. Lílian nem se mexeu quando Sirius soltou três aranhas enormes enfeitiçadas no segundo andar, sabendo que tudo aquilo era apenas para aproximá-la de Potter.
Quando Sasha cruzava com Thiago e trocavam poucas palavras, ele parecia ligeiramente desesperado.
- Eu não fiz nada. – ele murmurou certa vez – às vezes eu desejo ter mesmo ouvido a conversa de vocês apenas para que ela tivesse razão em estar fazendo isso comigo.
- As coisas vão ficar bem – ela dizia, sem saber o que falar.
Thiago dava de ombros.
- Que alguém te ouça.
Sirius lhe dizia que Thiago só sabia falar de Lílian e sobre o assunto da orelha em seu bolso. Eles estavam indignados, todos, sem acreditar que no momento em que Thiago se esforçara ao máximo para conquistá-la – e principalmente porque estava conseguindo – acontecia uma coisa daquelas.
- Ela não quer falar sobre isso com ninguém – Sasha respondia.
- Devia pelo menos lembrá-la que ela foi com ele à Hogsmeade da última vez – Sirius insistia – eles estavam se dando tão bem, Vic, Thiago estava nas nuvens.
Sasha suspirava, sabendo que não conseguiria dizer nada. A inflexibilidade de Lílian ante aos assuntos que se referiam à Thiago era tão mórbida que até cansava, e era principalmente (ou aparentemente) imutável. As coisas pioraram quando Amos Diggory foi atrás da ruiva na biblioteca, e eles ficaram um tempão conversando entre risos – e é claro, flertes. Sasha e Alice saíram da biblioteca sem esperar a ruiva neste dia, e quando ela as encontrou tinha um sorriso débil no rosto.
- Não me diga que beijou ele – Sasha falou, sem acreditar.
- Não! – a ruiva riu.
- Então está apaixonada – Alice resumiu, quase bufando.
- Não diga tolices – Lílian murmurou.
- Qual é o motivo da felicidade então? – Sasha quis saber – afinal, você estava conversando com o mesmo homem que...
- Fique quieta! – Lílian falou, parecendo ofendida – ele só é gentil e as conversas dele me divertem.
- Tanto quanto as que você costumava ter com Thiago? – acusou Alice – você parecia rir muito mais com ele.
- Amos é só um amigo.
- Um amigo com um passado estreito, que você perdoa sem dizer nada e sem se lembrar da dor que ele lhe causou – Sasha lembrou-a; sabia que estava sendo dura, mas Lílian precisava ouvir aquilo de alguém – e quando se trata de Thiago, não quer ouvir uma única palavra.
Lílian grunhiu.
- Parem de me falar sobre o Potter, está bem? - ela esbravejou, raivosa - eu não suporto mais que todos venham me dizer que o coitadinho está sofrendo por minha causa, que ele está isso, está aquilo... pouco me importa! Eu quero que ele coma terra antes de vir falar comigo!
Sasha suspirou, sabendo que seria mesmo capaz de Thiago comer terra a ter uma chance de falar com Lílian agora.
- Está sendo ignorante. – Sasha refletiu, olhando nos olhos verdes dela – só me diga que não é verdade o que eu lhe disse.
Lílian fechou o punho, com raiva.
- Não-me-interessa, Sasha! Não quero saber de nada disso! Quero apenas esquecer o Potter, eu já joguei tudo fora! Já esqueci tudo...
- Impossível. – Sasha respondeu. Alice olhou-a – se tivesse esquecido de tudo mesmo, estaria conversando com ele ou até mesmo aceitando as suas desculpas porque ele tem desculpas! Assim como você já esqueceu o que o Diggory lhe causou e está numa boa com ele, não é?
Lílian estreitou os olhos para ela.
- Tudo bem que é amiga de Thiago, Sasha, mas ficar do lado dele a uma altura dessas...
- Estou do lado dele porque eu sei que ele está me dizendo a verdade! Você mesma estava com ele em Hogsmeade da última vez, você sabe que ele não comprou aquelas coisas!
- Qual é! Qualquer um pode ter dado a ele!
- Você quer acreditar nisso Lílian! Quer acreditar nisso e está desistindo de tudo entre vocês porque você não tem coragem suficiente para admitir que uma vez na vida Thiago está certo, é inocente e você está apaixonada por ele!
Então, Lílian recuou a cabeça, abalada com a força das palavras de Sasha. Alice fez uma careta de desaprovação. Sasha imediatamente relaxou os ombros e ergueu as mãos para a ruiva, falando mais baixo.
- Me desculpe. – pediu, antes que também brigasse com ela – eu não queria dizer essas coisas.
- Então é isso que você pensa? – Lílian retrucou.
- Me desculpe. Eu realmente não tinha intenção. – ela repetiu, evitando responder a pergunta da amiga.
Lílian suspirou intensamente. Sem dizer nada, pegou o pijama nas mãos e começou a se trocar, em silêncio.
- Não fique assim... por favor – Sasha pediu, sentando-se em sua cama.
- Está tudo bem – a ruiva respondeu com a voz um pouco embargada.
Alice avançou e segurou a ruiva pelos ombros, para olhar em seu rosto, quando ela já havia colocado o shorts do pijama. Os olhos verdes de Lílian estavam marejados. Sasha apressou-se em assumir o lugar de Alice, e abraçou a ruiva, que estava trêmula, afagando suas costas quando ela começou a soluçar.
- Lil... não fique assim... não quero ver você assim. Me desculpe, de verdade.
- N-não, Sasha... você t-tem razão... eu sou... idiota demais. – ela dizia, agarrando-se à amiga no abraço.
Elas apenas ouviram a ruiva se lamentar.
- Eu n-não queria admitir mesmo... dia-bos, porque tem q-que ser o P-Potter? P-porque não q-qualquer outro? Tem tan-tantos garotos nessa escola...
Alice passou os dedos em seus cabelos ruivos em um carinho cúmplice.
- É só você ir falar com ele, ou deixar que ele venha falar com você. – Sasha continuou afagando suas costas.
- Agora não tem mais jeito – a ruiva soltou-se do abraço bruscamente, tornando a começar a se trocar.
- Quê? – Sasha perguntou indignada.
- Lil, está sendo infantil e...
- Não tem mais jeito! Amos me chamou para sair agora pouco e nos beijamos! – ela falou, tropeçando nas palavras e nas próprias roupas – e quando eu lhes contei aquilo na semana passada, não era sobre ele. Era sobre Potter.
Alice ficou pensativa, com a testa franzida.
- Você era apaixonada por Thiago? Quer dizer, antes também? – deduziu Sasha.
- Oh, Céus... – ela desabou na cama, sentando-se com um gesto de súplica – como uma garota de treze anos pode resistir à gentilezas e abraços do garoto mais lindo da escola? Eu era apenas uma criança!
- Por isso... por isso você não estava magoada com Amos. – Alice foi falando, parecendo não acreditar na própria voz.
- Isso mesmo... – a ruiva disse – terminamos no ano passado porque ele não agüentava mais as ameaças e as birutices de Thiago porque estávamos saindo. Nós dois concordamos que este ano Thiago parece mais maduro, então...
- Então vai continuar saindo com ele porque parece fácil demais, deixando Thiago, que é por quem você está realmente apaixonada, achando que você estava brincando com ele nos últimos meses? – Sasha despejou.
Lílian bateu a palma da mão na testa.
- Diabos... você tem uma mania de esfregar tudo na minha cara.
- Eu só esfrego a verdade na sua cara. A verdade que você está tentando enganar – ela falou, irritada – vou te dizer de uma vez por todas, Lily. Não entendo. – ela foi andando pelo quarto, sendo observada por Lily e Alice que estavam sentadas na cama - Não entendo nada disso. Depois de tudo o que Thiago fez por você, depois de todos os beijos, depois de todos os carinhos e todas aquelas demonstrações de confiança, depois de tudo o que você nos contou na semana passada sobre estar sentindo alguma coisa por ele, depois de Thiago Potter se negar a ficar com uma garota que certamente não queria só beijá-lo, e tudo isso por você, só por você! Mas mesmo assim insiste que não, que é cedo demais para dar uma chance a ele, que talvez ele não mereça...
Os olhos de Lily fitaram o nada, pensativa. Depois ela fechou-os com força.
- Eu não quero impor nada a você. Como sempre, só estou esfregando as coisas na sua cara. – Sasha falou.
Lílian soltou um riso fraco. Olhou para as próprias mãos.
- Amos disse que estava apaixonado por mim.
Sasha revirou os olhos.
- E você disse o mesmo a ele?
Ela fez que não.
- Ótimo. – sorriu com todos os dentes.
Lílian respondeu o sorriso sob um olhar de compaixão para si mesma.
- Eu tenho que consertar tudo isso, não é?
- Deve. – mandou Alice.
- Droga, não sei o que vou dizer a Amos. Ele parecia animado demais hoje.
- Você não sabe agora. Quando estiver na frente dele, vai saber. – Sasha piscou para ela.
- Isso. Eu vou mesmo.
*****
Mas ela não tentou. No dia seguinte, fugiu de Sasha como uma barata sem rumo, e Sasha ouviu Thiago praguejando que vira a ruiva em um dos corredores conversando de novo com Amos Diggory, que se ele quisesse ia ver o que era bom para a tosse querendo tanto a sua ruiva. Quando as meninas contaram toda a história a Gloria, ela ficou sem palavras, gaguejando por um segundo. Depois bateu a mão na testa, estalando-a e balançando seus cachos dourados, antes de falar:
- Como eu não pensei nisso antes?
- Em que? – Alice perguntou, curiosa.
- Mas a culpa é de vocês! Vocês não me contaram! Bem, estava fazendo uma ronda na semana passada e encontrei Amos Diggory em um dos corredores. Ele estava com uma sacola da Zonko’s.
Sasha arregalou os olhos.
- Que dia foi isso?
- Acho que era... quarta-feira. Mas eu não podia pegá-lo, pois ainda não havia sido dado o toque de recolher.
- Aquilo tudo foi quinta-feira. – suspirou Alice, meneando a cabeça.
- E hoje é sábado, e provavelmente ela vai sair com Amos se não souber que foi ele quem aprontou tudo aquilo!
- Onde ela está? – perguntou Gloria.
- No salão comunal! – lembrou Alice.
Gloria suspirou.
- Tudo bem, vão chamá-la. Eu espero por aqui e vejo se surpreendo Amos pelos corredores, mesmo que não possa fazer nad...
Antes que ela terminasse de dizer, Sasha e Alice já estavam voando no outro corredor, empolgadas. Sasha quase tropeçou nos próprios pés e trombou com Alice várias vezes, fazendo as duas rirem, agoniadas por dar logo a notícia à ruiva e tudo ficaria bem. As coisas vão ficar bem.
Toda a felicidade escorregou entre os dedos finos das duas, quando viraram um corredor e Alice trombou com Sirius, que estava de costas, e Sasha com Thiago, que observava com os olhos estreitos algo no fim do corredor. Algo era Lílian Evans beijando Amos Diggory.
Quando o casal percebeu que eram observados, pelos barulhos das trombadas dos amigos, se soltaram, embora as mãos continuassem nos mesmos lugares, e olharam para eles. Lily arregalou os olhos, mas Sasha pensou que ela devia estar mais preocupada em ter desmanchado o trato de terminar com Diggory do que o fato de Thiago ter visto aquilo.
Então, Thiago fez uma coisa que nunca fizera e a última coisa que qualquer um podia imaginar. Com o rosto explodindo em um vermelho de raiva, ele enfiou calmamente as mãos nos bolsos e deu de costas para eles, passando por Sasha, que viu como seus olhos castanho-esverdeados estavam brilhantes (mas pensou que fosse apenas por causa do óculos) e se retirou, deixando o silêncio com um efeito pior do que uma briga.
- Ótimo, tudo está resolvido! – Sirius falou, jogando as mãos para cima.
- O que você está falando? – perguntou Lílian, soltando-se do abraço de Amos e indo em direção a eles.
- Estou livre da missão de botar fé e Deus no coração dele para que ele não desistisse de você. – Sirius falou com uma voz fria e irritadiça – mas tudo bem, você já resolveu tudo.
Lílian engoliu o nó que se formara em sua garganta enquanto observava Sirius partir.
- Algum problema, Lil? – Amos veio atrás dela, colocando as mãos em suas costas.
- Todos! – Sasha quis gritar, mas manteve-se.
- Lily, precisamos conversar. – Alice ia dizendo.
- Hey, Evans, à propósito – Sirius havia enfiado a cabeça no corredor – Thiago ia lhe dizer algo importante essa noite. Espero que não sinta falta de nada quando for dormir.
Lílian estreitou os olhos:
- Está me ameaç...
Mas Sirius já tinha voltado para o outro corredor, e seus passos duros podiam ser ouvidos. Lílian bufou. Afastou-se das mãos de Amos e passou-as nervosamente nos cabelos.
- O que temos que conversar? – perguntou, ríspida, às meninas.
- Thiago não fez nada. – Sasha disse - Nada.
A certeza que havia em sua voz fez Lílian estremecer.
- O-o quê?
- Seu namoradinho armou tudo. – ela respondeu quase imediatamente. – ele estava com as sacolas da Zonko’s semana passada, Gloria o viu mas como não contamos nada a ela...
Lílian ficou escarlate. Virou-se furiosa para Amos.
- O que elas estão dizendo? É verdade?
Amos deu um sorrisinho.
- Acredita em mim ou nelas?
- Nelas.
- Hmmm... bom saber.
- Eu lhe perguntei se era verdade.
- Não. Não é verdade.
- Então o que fazia com uma sacola da Zonko’s na quarta-feira à noite? – atacou Alice.
- Eu ia entregar a um amigo! – ele respondeu – e quer saber, quinta-feira eu nem estava nos jardins.
Sasha olhou para os três e soltou uma risada de soslaio, que ricocheteou nas paredes e bateu no rosto de Amos:
- Eu não me lembro de alguém ter lhe contado alguma coisa sobre quinta-feira ou jardins, Diggory.
Lílian apertou os olhos, e fechou os punhos. Esse costume estava começando a deixar marcas na palma de sua mão, mas ela pouco se importou, e virou-se de uma vez para o garoto:
- Infantil! - acusou.
- Evans, eu não sou o Potter e...
- Não é o Potter, mas parece trinta milhões de vezes mais infantil do que ele, e olha que ele é muito infantil! - ela ralhou – só pra te lembrar. Não venha mais falar comigo.
- Lil... qual é, eu só lhe salvei de algo que...
- Salvou? – perguntaram Sasha e Alice juntas.
- Tenho certeza de que não queria o Potter. Foi um ótimo plano. Apenas flutuei a orelha para o bolso dele e...
Sasha então percebeu aquele brilho nos olhos. Não havia nada mais reconhecível do que aquele brilho maroto. Mas ele não brilhava tanto. Era falso. Ele estava tentando... se comparar a eles.
- Quem te disse? - Lílian falou entre os dentes.
- O quê?
- Galera, o que fazem até agora nos corredores? – Gloria virava o corredor, parecendo mais cansada do que há dez minutos ou menos – o toque de recolher começou em... – ela conferiu o relógio de pulso – treze segundos!
Antes que Amos partisse, ele movimentou os lábios com um “desculpe-me” que pretendia ser sedutor, e Lílian avançou nele em resposta, mas Alice a segurou. Sasha não podia acreditar no que estava acontecendo. Com Amos fora de vista, Gloria perguntou o que acontecera e elas contaram.
- Oh, céus, Lil... – Gloria lamentou.
- Para onde será que ele foi? – Lílian perguntou com a voz baixa e rouca.
- Acho que isso não importa mais... e sabe, eu acho que você estava mesmo certa sobre as coisas estarem indo rápidas demais. – Sasha falou com o mesmo tom dela, pegando em sua mão para irem para o salão comunal, e a ruiva a apertou – só que do contrário... agora é tarde demais.
Sirius tinha razão sobre uma coisa. Quando Lílian colocou a cabeça no travesseiro fofo em sua cama de dossel no dormitório feminino da Grifinória – e ela ralhou consigo mesma pelo seu próprio egocentrismo – sentiu falta de uma coisa. A certeza de que no outro dia Thiago iria atrás dela para tentar convencê-la.
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