Entre portas e botecos

Entre portas e botecos



Vontades
IX. Entre portas e botecos

O diretor passou reto por todas as mesas e subiu uma escada lateral do balcão do bar. Supus que levava aos quartos assim como no Três Vassouras.
Senti uma ansiedade que me levou até o pé da escadinha.
Realmente levava a quartos, quatro quartos de portas opostas para ser exata.
Alguma coisa me dizia que eu estava no lugar certo, na hora certa. Subi cautelosamente os degraus apurando os ouvidos, esperando ouvir alguma conversa.
Estava tudo demasiadamente silencioso; ou não conversavam, ou as paredes possuíam algum feitiço isolante.
Apostei no feitiço isolante. Lugares lúgubres e com aquela freqüência de pessoas costumavam ter feitiços de todos os tipos para proteger seus fregueses. Comentava-se que no Cabeça de Javali bastava apenas ter dinheiro, pouco que fosse, para fazer qualquer coisa ilegal. Mas o quê de ilegal Dumbledore estaria fazendo ali?
Idéias absurdas passaram pela minha cabeça enquanto decidia-me se subia ou não os degraus. Teria ele uma namorada? Ri da besteira que acabara de pensar. Se Dumbledore realmente tivesse uma namorada não teria motivo para escondê-la.
Ou teria?
Por via das dúvidas, avancei mais três degraus para cima. Silêncio ininterrupto.
Havia quatro portas, e nenhuma das quatro emitia qualquer ruído sinalizando que houvesse pessoas dentro.
Mas, para minha surpresa, a segunda porta da esquerda entreabriu-se e saiu de lá uma mulherzinha, no mínimo, estranha. Era muito magra, usava uns óculos imensos que aumentavam seus olhos várias vezes, vestia roupas surradas e algumas correntes e colares de contas. Usava alguns anéis, uma imitação barata de ouro e prata.
Passou reto por mim como se não notasse minha presença, e voltou alguns segundos depois com uma garrafa e dois copos.
Subi todos os degraus restantes cautelosamente e então pude ouvir vozes, a mulherzinha estranha havia deixado a porta encostada, não a fechou completamente.
- O senhor sabe que a Adivinhação é uma área muito complexa. – disse ela. – Mas como eu tenho o dom -enfatizou. - herdado de minha tataravô creio estar apta a preencher o cargo.
Dumbledore só poderia estar ali.
- Bom, – disse Dumbledore calmamente. – a Adivinhação é realmente uma área complexa, eu mesmo não tenho o domínio dessa área.
- Pois o senhor não teve a oportunidade de desenvolver esse lado! – interrompeu ansiosa. - O senhor deve dar chance aos novos, Professor Dumbledore. Há poucos videntes verdadeiros ultimamente... creio que Hogwarts será um ótimo berço para que novos videntes manifestem-se. – houve uma longa pausa.
- Entreouvindo conversas, Lestrange? – ouvi uma voz sussurrar ao pé do meu ouvido. Era Snape.
- Estou cumprindo minha tarefa, Severo. – repliquei.
- Creio que uma simples entrevista com uma charlatã não vá te trazer prestígio algum. – ele sorriu, vitorioso. Eu, porém, não objetei dessa vez. Mantive meus ouvidos atentos à conversa.
Ouvi um dos copos de vidro bater e quebrar-se no chão. A mulher pigarreou e tornou a falar em um tom diferente, não era o falso amável; era áspero, agressivo.
- Aquele com o poder de vencer o Lord Negro se aproxima. – ao ouvir “Lord negro” abafei uma exclamação ansiosa. Minha voz interior não estava enganada! Eu realmente estava no lugar certo e na hora certa. – Nascido daqueles que por três vezes o desafiaram, nascido ao fim do sétimo mês... – houve uma longa pausa.
- O que você está fazendo aqui? – perguntou o barman, surpreendendo Severo. Provavelmente não me viu, pois Severo bloqueava toda a visão do resto do corredor.
Mantive os ouvidos apurados enquanto Severo dizia ao barman que procurava um amigo em um dos quartos.
- E o Lord Negro vai marcá-lo como seu igual, mas ele terá um poder desconhecido pelo Lord Negro. – houve uma nova pausa. Meu coração batia tão forte que podia senti-lo subindo pela garganta.
- Saia daqui! – gritou o barman.
- E um deve morrer pelas mãos do outro porquanto nenhum poderá viver enquanto o outro sobreviver. – Concluiu. E voltou a repetir três ou quatros vezes.
Logo identifiquei: uma profecia. Uma profecia sobre meu mestre! E eu havia testemunhado sua proclamação!
- Eu er-errei de porta! – disse Severo com veemência recuando uns passos para trás. O barman investia contra ele com a varinha em punho.
Severo estava tão nervoso que tropeçou em um de meus pés que estava próximo da porta; por um instante tive a impressão de que era o fim. Snape cambaleou para trás batendo de costas contra a porta do quarto, escancarando-a.
Dumbledore levantou-se num salto e a vidente piscou várias vezes abobalhada.
- O que faz aqui, Severo? – perguntou Dumbledore ao invasor.
Era minha deixa. Desaparatei no meio da escada.
“Ninguém me viu, ninguém meu viu”.Repeti a mim mesma, dando voltas no seguro quarto do Três Vassouras. Ninguém poderia ter me visto, eu estava sob as sombras. Se nem o próprio barman me viu, quem estava no quarto poucas chances teria.
Respirei aliviada, tentando crer em minhas próprias conclusões.
Quando deitei a cama, senti meu coração voltar a bater em seu natural compasso. Porém, uma nova preocupação me afligia: Vencer o Lord Negro?
IMPOSSÍVEL!
Só poderia ser uma piada! A charlatã, para conseguir o cargo, inventou qualquer coisa para prender a atenção de Dumbledore. Senti-me ridícula ao ter achado que era realmente uma profecia. Mas, por via das dúvidas, amanhã pela manhã levaria a informação ao Milorde.
Virei para o lado e logo adormeci.
***
A sede estava lotada; uma movimentação incômoda e constante.
Dirigi-me até a sala de Milorde apreensiva, qual seria o motivo de tanta movimentação? Será que Mestre havia me deixado fora de alguma tarefa importante?
Hesitei por alguns instantes, mas logo adentrei a sala. Uma leve sensação de déjà vu veio ao meu encontro quando percebi que Severo Snape já estava lá; sua aparência era cansada e suas olheiras ainda mais profundas.
- Trago informações, Milorde. – reverenciei-o brevemente.
- Agora, Lestrange? – perguntou-me, intimidando. Involuntariamente recuei alguns passos. – Vejo que seu sono de beleza é ainda mais importante que qualquer tarefa que eu possa lhe passar!
- Mestre, não compreendo. Pois as informações que lhe trago são completamente irrelevantes...
- IRRELEVANTE? – exclamou indignado. – Uma profecia é IRRELEVANTE?
- Não poderia ser uma profecia, Milorde! – exclamei aborrecida. – Era uma charlatã...
- Severo, retire-se, por favor. – sem hesitar, Severo curvou-se brevemente numa imitação barata de reverência e saiu.
Senti o chão desabar sob meus pés. Era o fim. Eu havia falhado e Milorde acabaria comigo, assim como fez com Régulo. Meu coração voltou a bater descompassado e a cada segundo era mais difícil respirar e me manter de pé ao mesmo tempo.
- Me enganei com você, Lestrange. – ele levantou-se e avançou alguns passos em minha direção.
- Milorde, eu posso compensar essa falha Milorde! – exclamei esganiçada.- Eu pensei que não era uma profecia! Seu poder é invencível!
- Pode compensar? Então me diga como!
Pela primeira vez senti a voz de Milorde estremecer. Por que ele estava levando tão a sério uma encenação ridícula de uma charlatã daquele escalão?
- Me diga como, Lestrange! – repetiu irritado.
- Eu vou procurá-lo! – senti uma luz invadir minha cabeça. – Descobrirei quem é o menino e vou matá-lo!
- Não é uma má idéia. – Milorde sentou-se novamente. – Se for realmente charlatanismo, como você diz, descobriremos em pouco tempo.
- Pouquíssimo, Milorde.
- Essa é a sua última chance, Lestrange. – advertiu-me. – E você está sozinha.
Reverenciei-o demoradamente.
- Não haverá falha alguma, Mestre.


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