O rato, os amantes e as confid
Vontades
III.O rato, os amantes e as confidências bêbadas
Lendo o capítulo anterior, você, leitor atento, pode perceber que mesmo depois da minha declaração de “mulher independente”, continuei sentimental, inocente e imatura. E todos os outros adjetivos.
Peço-lhe perdão, caro leitor, pois pequei no posicionamento dos fatos.
O início da fase que chamo de “mulher independente” marcou-se com o casamento de Lúcio e Narcisa. E nesse ponto, eu já estava noiva de Régulo, e ao contrário do que eu mesma pensava, ainda nutria sentimentos por Lúcio.
Mas é de muita importância narrar que Sirius e seus amigos já tomavam consciência de nossa existência; nós, os Comensais. É importante também frisar que eu me tornaria uma Comensal com ajuda de minha prima, Bellatriz.
***
Com o término do meu sétimo ano, continuei morando com meus pais. Em breve, eu e Régulo compraríamos uma pequena casa no centro de Londres, mas isso eu conto-lhes depois.
Durante as férias, Régulo ia me visitar todos os dias. Meus pais o adoravam! E diziam-se privilegiados por ter Régulo e Bellatriz em nossa família. Seguiam as tradições e, é lógico, eram ricos.
Quando me anunciaram o casamento de Narcisa e Lúcio, fiquei extremamente feliz. Não me perguntem o porquê. Talvez o riso fosse conseqüência do desespero. Iriam se casar dia vinte e seis de dezembro, quando Narcisa viesse para as férias (ainda cursava o sétimo ano).
- Lore, eu preciso falar com você. – disse-me Lúcio quando nos encontramos na sede.
- Fala. – disse-lhe sem emoção.
- Bom. – começou sem se importar com meu pouco caso. – Você sabe, eu e Narcisa iremos nos casar e eu queria... – ele parou, hesitando. – queria... – parou novamente e eu ergui uma das sobrancelhas.
- Quer que eu seja sua dama de honra? – perguntei com veemência.
- Não, não. – ele riu, sem graça.- Queria q-que fosse minha... madrinha.
- Isso foi idéia de Narcisa, suponho.
- Não... na verdade, ela se opôs.
- Aaaah. – fiz eu.
- É. Bom, se... se você quiser... aceitar.
- Primeiro, Lúcio. Não precisa falar desse assunto comigo com TANTO cuidado. Eu sei que vocês vão se casar, e aplaudiria se minhas mãos não estivessem tão ocupadas. – na verdade, minhas mãos estavam dentro dos bolsos, nesse momento. – Segundo, eu aceito. – sorri dissimulada. – Convite aceito.
- Obrigado. – disse-me. – E eu não estava tendo cuidado.
- Ah, desde quando você é tão inseguro a ponto de gaguejar e hesitar quando vai falar? – perguntei, dessa vez sem sorrir. – se...se... você quiser. – imitei.
- Não seja idiota. – disse ríspido.
- Está bem, Lúcio. Se você me der licença. – levantei-me.
- Quer saber? Se for pra aceitar só porque Narcisa se opôs, não precisa.
- Que outro motivo eu poderia ter? – perguntei.
- Não sei, aceitar por tudo o que já tivemos um dia.
- Ok. – disse afetada. – Bem, Lúcio, eu aceito ser sua madrinha por todas as vezes em que a gente transou. Tá? Feliz agora?
- Você está morta de ciúmes. – ele riu.
- Ciúmes? – perguntei incrédula. Porém, uma falsa incredulidade. – De quê, exatamente?
- De quem... você quer dizer.
- Hum.
- Admita que está morta de ciúmes. Afinal, vou me casar com Narcisa.
- É, realmente estou morta de ciúmes. – disse, sarcástica.
- Está mesmo. Se não estivesse, conversaria comigo em tom natural, não nesse tom sarcástico.
- Cala a boca. – retruquei.
- Está vendo... – ele sorriu vitorioso.
- Tem mais algo a me dizer? Vou-me embora.
- Ótimo. Talvez eu vá hoje a sua casa falar com Rodolfo.
- Ótimo. – saí em passos apressados; a fim de que Lúcio não percebesse minha irritação diante aquele assunto.
Parei no meio da calçada respirando rápido. Nesse momento, meu braço esquerdo ardeu ferozmente, fazendo meus olhos lacrimejarem. Mestre me chamava. O mais rápido que pude, aparatei na sede e entrei em sua sala.
- Me chamou, mestre? – perguntei durante a reverência.
- Lestrange. – disse. – Quando a marquei, disse-lhe que via lealdade em seus olhos.
- Lembro-me como se fosse hoje, mestre. Único digno de minha lealdade e submissão. – reverenciei-o novamente.
- Exato. Está na hora de testar sua coragem, Lestrange. – mestre pausou, e minha curiosidade aguçou de forma angustiante. – Um pequeno serviço...
- Ao seu inteiro dispor, mestre.
- Não me interrompa. – disse ríspido. – Há um bruxo, Lestrange. Dividido entre trair seus amigos, e juntar-se a nós. Esse bruxo carrega consigo informações importantes e irrelevantes; você irá procurá-lo, interrogá-lo e se ele se mostrar intimidado, torture-o. Se estiver acompanhado, mate-os. – ele parou mais uma vez. – Chama-se Pedro Pettigrew e você deverá trazê-lo até mim, caso ele se porte adequadamente. – seus olhos faiscaram.
- Ao seu inteiro dispor, mestre.
- Agora vá, Lestrange. Não me decepcione. – reverenciei-o pela terceira vez e aparatei no meu quarto.
A casa estava silenciosa e todas as luzes apagadas. Só se ouvia, é claro, Lane, nossa elfa-doméstica, na cozinha.
Poucos minutos depois, ouvi Rodolfo e Lúcio aparatarem na sala, rindo e conversando alto.
- Cheguei! – gritou Rodolfo, não respondi. Por mais que eu me envergonhe disso, queria ouvir o que conversavam. – Ninguém em casa.
- Deseja alguma coisa, senhor Rodolfo? – perguntou Lane.
- Não. – respondeu. – Lúcio?
- Sei lá, me traga conhaque.
- Dois.
- Aaaah. A Sra. Lestrange proibiu Lane de servir bebidas para Sr. Rodolfo e seu amigo Malfoy!
- Cala a boca, Lane. E traga. – disse ríspido.
- Lane terá de se castigar. – murmurou. Encostei a porta, para poder ouvir com mais clareza.
- Cara, não acredito que vou me casar! – exclamou Lúcio. Sua voz trazia um misto de ansiedade e decepção.
- Bem... pelo menos Narcisa é gostosa. – disse Rodolfo rindo.
- Tá. Mas não dá pra conversar com ela por mais de dez minutos. – eu ri. – E para ser sincero, gostosa é a sua irmãzinha. – Lúcio riu e eu passei de feliz para extremamente sem graça em dois nanômetros de segundo.
- Respeito, por favor. – censurou Rodolfo.
- Ah, não me venha com esse falso incômodo. Já te disse isso mais de mil vezes. Sua irmãzinha tem algo que me prende... talvez seja aquele jeito estourado. Ou quem sabe aqueles enor...
- Tá! – exclamou Rodolfo, que agora ria. – Ela é minha irmã, cara. Não consigo vê-la com esses olhos.
- Eu daria quinhentos galeões para poder pegá-la de jeito de novo... será que ela aceita? – os dois riram.
- Pára... – disse Rodolfo. – Estou ficando enjoado.
- Larga de ser viado. Vai dizer que nunca a espiou no chuveiro? – houve uma pausa, seguida de gargalhadas.
“Rodolfo, seu... nojento.” Pensei comigo mesma. Achando que já havia ouvido o suficiente para achar Lúcio ainda mais repugnante, anunciei minha chegada:
- Mãe, pai, Rodolfo! Cheguei.
Os dois pararam de conversar imediatamente e então ouvi passos de alguém subindo as escadas. E pelo ressoar dos degraus, apenas uma pessoa.
Sem anúncio, a porta do meu quarto abriu-se e, parado sob o portal, estava Lúcio com um sorriso, no mínimo, malicioso. Enxerguei-o pelo espelho da penteadeira. Estava trançando meus cabelos.
- O que você quer? – perguntei ríspida e, lembrando-me da oferta de quinhentos galeões, tive vontade de esganá-lo.
- Conversar.
- Se não se importa, só passei em casa para comer algo. – levantei-me.
- Pare de fingir que está arredia. – puxou-me pelo braço.
- Não estou fugindo porra nenhuma. Me solta. – e ele não soltou. – Me... SOLTA! – gritei. – Estou na minha casa e você não tem o direi... – aproximou-me com força de seu corpo. – ...to de... de... – perdi as palavras, os sentidos, os pensamentos, a força. A voz, o chão, o controle.
- Uma única, única palavra sua, pode mudar meu casamento, o seu e o futuro de três pessoas. – eu respirava angustiada. – Só depende de você.
- Não, não depende de mim, Lúcio. Pare de tentar acender coisas que já são cinzas...
- Para mim não são cinzas. – ele me largou.
- Pois para mim, são! – disse ressentida. – Você vai se casar em menos de 3 meses... e eu estou noiva! – ergui o anelar esquerdo. – Noiva, Lúcio.
- Eu nunca pensei que vocês fossem chegar tão longe. – encarei o chão durante um bom tempo enquanto ele falava e falava. Eu não escutei nem metade, e nem tenho curiosidade de saber do que ele tanto falava. – Bom, Ray... eu tentei. Pela última vez.
- Tentou pela última vez transar comigo. E pela não-primeira nem última vez lhe digo: eu não cedo mais.
Lúcio me encarou durante alguns instantes, depois baixou os olhos, decepcionado. No momento, senti minhas entranhas revirarem, e uma vontade louca de abraçá-lo e beijá-lo. Hoje em dia, vejo quão bem Lúcio atuava.
Sem dizer nada, ele saiu em direção à porta. E como se algo ou alguém me empurrasse, fui até ele e segurei-o pela mão. Se hoje em dia eu não encarasse a cena como o ápice de minha fraqueza e ingenuidade, a cena seria descrita de forma, no mínimo, romântica.
Enfim, como era de se esperar, nos beijamos. Seria surpresa se eu dissesse que não transamos. Sinto decepcioná-lo, leitor, mas minhas obras inesperadas e surpreendentes só virão mais para frente.
Depois do incidente da tarde, porque só posso chamar aquilo de incidente, cobri-me com uma capa preta de capuz e desaparatei para o Caldeirão Furado, queria beber alguma coisa.
Minha surpresa foi grande quando encontrei Pedro Pettigrew sentado ao balcão, sozinho e pensativo. Parecia um rato com traços humanos! Resmungava consigo mesmo, e só então me lembrei realmente quem era. Um rapaz baixo e gordo, deveria ter minha idade, senão um pouco mais velho. Conhecia-o de Hogwarts, era um dos amigos de Sirius, Tiago Potter e Remo Lupin. Andava sempre atrás dos três grandes da Grifinória; sempre alvo de gozações, tanto dos três, quanto dos outros.
- Pettigrew. – sentei-me ao lado dele, sem mostrar meu rosto. Senti o gorducho estremecer. – Soube de suas intenções e precisamos conversar.
- Q-que tal no C-ca-cabeça de Ja-ja-javali?
- Não. Encontre-me no Visgo do Diabo, hoje, às dez. – e saí.
Visgo do Diabo era mais um bar encardido e mal freqüentado, muito pior do que o Cabeça de Javali. Ficava na Travessa do Tranco, Beco Diagonal.
Fiquei esperando-o por mais de quinze minutos, e quando me levantei para ir embora, ele atravessou o portal como um animal encurralado, os olhos arregalados e aparentemente, pêlos ouriçados.
Sentou-se a minha mesa, um tanto nervoso.
- Trouxe companhia? – perguntei.
- Não. – respondeu rápido, olhando nervoso para os lados. – Não vai me matar, vai? – eu ri.
- Depende só de você. – disse girando a varinha nos dedos, percebi que ele recostou na cadeira, aturdido. – O que tem a me dizer, que realmente valha a pena?
- S-sei muito sobre a O-Ordem da Fê-Fênix.
- Muito, e isso é quanto?
- F-f-faço parte dela. De t-t-odas as re-reuniões e...
- PARE DE GAGUEJAR! – esbravejei irritada, ele soltou uma exclamação assustada.
- Ninguém p-pode saber que estive com você. – disse-me finalmente.
- Ah não, - disse-lhe sarcástica. – espiões são realmente conhecidos por todos. Não seja idiota, sou uma profissional. – ele fitava a mesa com grande interesse, como se através dela pudesse ver alguma jóia. – Bom, já que não tem mais nada a me dizer eu vou ter que... – levantei a varinha.
- NÃO! – exclamou assustado. – Posso lhe dizer... n-nomes! Isso, nomes. Componentes da Ordem...
- Isso não me interessa! – sua face agora mesclava medo, dor, arrependimento e ansiedade.
- Piedade! Não me mate, por favor...
- Piedade... – ri alto. – Agüentei-o demais, perdi meu tempo! Você não me serviu de nada, só para provar que era mais um idiota querendo se meter nos planos de meu mestre. – ergui a varinha. – Av...!
Nesse instante minha marca ardeu, como nunca havia ardido antes. Fazendo pingar lágrimas de meus olhos, Pettigrew encarou-me assustado.
- Fiquei aí. – gritei, apontando a varinha para ele. – Venha comigo. – puxei-o pelo braço pelo bar a fora. Não sabia o que fazer. Deixá-lo ir seria burrice, ele sabia quem eu era e não poderia sair por aí, gritando aos ventos que eu era uma comensal. Levá-lo comigo, no momento, parecia a melhor opção. E foi o que eu fiz. Entramos em uma das lojas escuras, e através do Pó de Flu chegamos à sede.
Empurrei-o em uma das cadeiras perto da lareira e amarrei-o com um feitiço. Parecia impressionado e assustado, como sempre.
- Mestre. – reverenciei-o. – Vim o mais rápido que pude.
- E fez exatamente o que deveria ter feito. – disse-me alegremente. Não entendi, pois não era do feitio de meu mestre rir aos quatro cantos – Traga-o aqui.
- Accio cadeira! – Pettigrew guinchou assustado.
- Ótimo. Deixe-nos a sós, Lestrange. Por hoje basta para você...
- Deixá-los a sós, mestre? Tem certeza?
- Não seja tão ridícula a ponto de replicar uma ordem minha, Lestrange. – disse com rispidez. – Não lhe devo satisfações, apenas digo-lhe que estou entediado e precisando de diversão. – Seus olhos faiscaram de maldade, reverenciei-o novamente e saí da sala. Fiquei alguns instantes parada na ante-sala, ouvi risadas de mestre e gritos de dor de Pettigrew. “Cruciatus” pensei comigo mesma, e aparatei de volta a minha casa.
***
Dois meses passaram tão rápido que eu só me dei conta de que o casamento estava próximo, quando Lúcio veio confirmar se eu realmente seria sua madrinha, dois dias antes do casamento. Eu estava em casa, almoçando.
- Madrinha? Ah! Sim... claro. - sorri decepcionada.
- Ótimo! Imagino que já tenha seu vestido... – É claro que eu não tinha o vestido, havia esquecido completamente do casamento. Sempre tive o poder de esquecer tudo que me incomodava.
- Claro que tenho, Lúcio. – disse apressada.
- Não se esforce para não ficar mais linda que a noiva. – ele acariciou meu rosto.
- Bom, estarei lá. Às três, certo?
- Isso. Eu também ia te...
- Lúcio, meu caro amigo! – exclamou Rodolfo descendo as escadas. – O que faz aqui essa hora? Deveria estar se aprontando para a despedida de sol... Ah, está aí Loraine...
- Já estou de saída, Rodolfo. – levantei-me.
- Não, calma. Vim aqui exatamente para convidá-la para minha despedida de solteiro. – ele sorriu, e eu espantei-me.
- Ah, era só o que faltava. – murmurou Rodolfo. – Sinta-se desconvidada, Loraine. Largue de ser ridículo Lúcio, lá estará cheio de mulheres... não é ambiente para Loraine.
- Não, eu faço questão que ela vá. – insistiu. – Você vai, não vai?
- N-não, Lúcio.
- Ah, vamos. – insistiu novamente.
- Não, Lúcio. – censurou Rodolfo. – Pare de tentar persuadir minha irmã.
- Ele não está me persuadindo. – repliquei.
- Cale a boca.
- Por que não quer que eu vá? – perguntei irritada. – Só para eu não contar para Bela que andou comendo outras mulheres?
- Não, ela sabe que eu vou. – seus olhos faiscaram. – Só estou cuidando para que você não seja uma das outras mulheres de Lúcio.
- Rodolfo, só a estou convidando por ser minha amiga, assim como você. Nada do que você está pensando. – disse num tom pouquíssimo convincente.
- Eu os conheço de anos.
- Largue de ser velho e chato. – pirraçou Lúcio.
- Não estou velho e não estou sendo chato. – replicou Rodolfo. – E quer saber? Vá, Loraine, depois não fique chorando pelos cantos.
- Eu NUNCA fico chorando pelos cantos. – contestei irritada.
- Fica sim!
- Se fico não é por causa disso. – resmunguei.
- Por que é, então? – perguntou Lúcio curioso.
- Então é porque Régulo não a escreve... – riu Rodolfo.
- MENTIRA! – exclamei aborrecida. – Ele... ele me escreve sim! Só que as cartas não vão... para o corujal. Vem direto para meu quarto. Aliás, eu não preciso prestar contas a você de quem me escreve ou não!
Não, não era mentira. E eu e Rodolfo sabíamos bem disso. Régulo não me escrevia fazia quatro ou cinco semanas. Não sei o porquê. Também não corri atrás, mas me mantive como se ainda continuasse noiva. Pois afinal, sem reincidência oficial eu continuava noiva.
- Parem de se meter na minha vida. – bradei.
- Mas você vai? – perguntou Lúcio.
- Não. – disse Rodolfo.
- Sim.- disse-lhe. – Sem mais discussões, Rodolfo. Que horas você passa aqui?
- Às dez. – disse Lúcio sorrindo, Rodolfo amarrou a cara.
***
Três da manhã, salão lotado.
Talvez eu fosse a única mulher que não estava usando apenas lingerie; mesmo assim, era confundida constantemente com uma das moças da casa.
Apesar dos pesares, estava divertido. Amigos de Lúcio por todos os lados bebendo, rindo, bebendo, bebendo. Com mulheres, alguns com duas, outros com nenhuma, apenas bebendo. Lúcio não estava com mulher alguma e Rodolfo, com duas. Uma era morena de cabelos compridos e muito lisos, assim como os de Bellatriz. Tinha um rosto com traços mesclados como os dela, com exceção do nariz que era mais curto, e seu queixo, arredondado. A outra era loira e parecia divertir-se excessivamente, pois ria a cada cinco segundos e, para acompanhar, jogava seus cabelos brilhantes para trás.
- Diverte-se? – perguntou-me Lúcio. Fiz força para ouvi-lo, pois a música de cabaré estava muito alta.
- Sim. – gritei, para que ele ouvisse. Lúcio sorriu.
- Vamos conversar? – ele me mostrou um copo.
- Não, já bebi!
- Não, eu disse, VAMOS CONVERSAR! EM OUTRO LUGAR! – gritou, pausadamente.
- OK! – fiz um sinal positivo com a mão, ele sorriu.
Pensei, comigo mesma, onde iríamos conversar. Cada centímetro do lugar parecia estar ocupado, e barulhento.
Lúcio logo respondeu minha pergunta, puxou-me pela mão e me levou ao lugar mais inesperado. O banheiro.
- Quer beber alguma coisa? – perguntou-me quando entramos no banheiro, vazio.
- Ah não! – exclamei alegremente. – Já bebi demais!
Deveria ser um bar (se assim posso chamá-lo) de luxo. O banheiro estava impecavelmente limpo e as torneiras pareciam ser feitas de ouro. Os vasos e as pias também tinham adornos dourados.
- Ainda bem que você veio. – disse-me. Ao contrário de mim, não parecia nem um pouco bêbado.
- Vim só porque Rodolfo implicou...
- Aaaaah. Só por isso?
- Sim! –menti. - Mas é um bom lugar... tirando os bêbados e as mulheres. – eu ri.
- Hum.
- Por que se casar tão cedo, Lúcio? – perguntei distraída e ele soltou um muxoxo abatido.
- Meus pais acham Narcisa... simplesmente maravilhosa. – ele soltou outro muxoxo. – Não é minha opinião. Mas, ah. Não dá pra explicar.
- Muito menos entender. – dei um sorriso alegre.
Bebida sempre foi meu ponto fraco. Eu sempre bebi muito, não a ponto de perder meus sentidos, mas a ponto de ficar alegre e não medir minhas palavras.
- Se você quer minha opinião, sinceramente acho que esse casório não vai dar certo. – eu virei o resto de bebida do copo. – A não ser que você perca o costume de ir me visitar, no meu quarto.
- Se fosse um simples costume, seria mais fácil de parar.
- E n...
- E se é para sermos sinceros – ele interrompeu-me. – Na verdade eles não acham Narcisa tão boa assim... eles só acharam que nosso namoro deveria se tornar mais sério antes que nós terminássemos. Porque sabiam que, querendo eles ou não, nós voltaríamos.
- Nós? – perguntei assustada. – Não, espere. – saí do banheiro, procurei alguma garçonete com algum copo, peguei o primeiro copo que vi e entrei novamente. – Continue.
- É. Nós. Eles não te acham... digna para mim. Sabe?
- Não. – falei com um quê de irritação. – Como assim não sou digna? Sou sangue-puro, puríssimo! E além do mais, minha herança é MUITO maior que a da Narcisa. Praticamente o dobro...
- Eu sei. Mas pela primeira vez na vida, meus pais não foram movidos pela ambição...
- Como assim? – perguntei.
- Bom, você não vai gostar de ouvir isso, mas... – ele deu uma risadinha sem graça. – Quando éramos menores, antes de entrarmos em Hogwarts, você era muito ligada com o traidor Black...
- E daí? Ele era meu primo, tanto como você!
- Eu sei! Mas depois que ele se tornou o que você sabe o que ele se tornou, meus pais acham perigoso eu manter... manter... relações com você.
- Mas eu sou uma COMENSAL! – bradei indignada. – Não estou lá... com ele!
- Maselesteachamfraca. – ele disse rapidamente, e eu fiz uma careta ainda mais indignada. – De fácil persuasão.
- ÓTIMO! – bradei. – É bom saber que vocês pensam assim. Que não acreditam em mim, não preciso de ninguém. Já> tenho tudo que preciso, meu mestre, minha lealdade e...
- Para com isso. – disse com o cenho franzido. – Eu não acho isso, na verdade Narcisa sempre me pareceu mais ingênua que tudo.
- É, mas você vai se casar com ela! – virei, de novo, todo o conteúdo do copo que ainda se encontrava cheio. – E foda-se, se quer saber. Não me importo mais com você, nem com Régulo! Ele deve ter me chifrado que nem não-sei-o-que mesmo. – Lúcio abafou uma risada. – NÃO RIA.
- Acho que ele achou que você deve ter o chifrado mais do que não-sei-o-que, por isso não te escreveu...
Gritei de raiva.
- ÓTIMO. Realmente muito bom. Fraca, de fácil persuasão. É realmente muito bom saber o que pensam de mim. ÓTIMO. – exclamei irritada, conjurando mais e mais bebida. Lúcio estava parado, encostado na pia fitando-me entediado.
- Isso quer dizer que está chateada por eu me casar com Narcisa? – perguntou com um sorriso fino nos lábios.
- É! Pra quê eu vou mentir se você já sabe a...a... verdade.- sentei em um dos vasos e cobri meu rosto com as mãos.
Sentia minhas entranhas revirando; acabara de assumir a Lúcio que o amava! E ele sorria, satisfeito. Não disse uma palavra sequer, apenas sorria.
“Belo sorriso” pensei. Estava sentindo-me indefesa e fraca. Vontade de beber, acabar com toda a bebida do lugar e sair ilesa ou, talvez, carregada para provar para todos que era realmente fraca.
Bateu-me uma súbita vontade de beijá-lo, por uma última vez. Então,para cessar essa vontade, cessar a vontade de me sentir indefesa, cessar a vontade de me sentir fraca, cessar a vontade de me sentir dele, cessar seu sorriso provocativo; beijei-o.
Acordei por volta das quatro da tarde, com a cabeça latejando e cheiro de bebida por cada centímetro do meu corpo. Permaneci deitada e com os olhos fechados por um bom tempo, quando ouvi a porta bater.
- Acorda, Loraine. – ouvi uma voz arrogante, demorei a reconhecê-la. Soltei um resmungo e virei de bruços com a cabeça enterrada no travesseiro. – Sabe que horas são?
- ‘aum. – resmunguei.
- Quase cinco, da tarde – disse ríspido. E então, percebi quem era: Régulo. Já havia chegado de Hogwarts.
- E daí? – perguntei virando-me, ele me fitou com nojo.
- Você está bêbada!
- E daí? – repeti.
- Eu não quero minha noiva por aí.
- Se você não percebeu, estou no meu quarto!
- É, mas sua mãe me contou que chegou às seis horas da manhã. Isso não é hora! Eu não admito...
- Ah, e desde quando dependo de alguma aceitação sua?
- Desde que você aceitou se casar comigo!
- Espera aí! – sentei na cama, totalmente acordada. – Você não me escreve faz mais de cinco semanas, não dá notícia! E agora, você vem com essa de noivos?
- Você também não escreveu. – rebateu.
- É. Porque a última carta escrita foi minha. E se você não se importa, estou com dor de cabeça e quero dormir.
- Não, você não vai dormir. Nós vamos ao Beco Diagonal comprar suas vestes de madrinha.
- Eu sei que sou madrinha, mas não estou disposta a comprar as vestes agora.
- Levante-se, Loraine. – ordenou.
Ergui uma das sobrancelhas e cruzei os braços.
- Você NÃO pode chegar me dando ordens!
- Porque é que você tinha que ir a MALDITA DESPEDIDA DE SOLTEIRO? – explodiu.
- PORQUE EU FUI CONVIDADA! O QUE HÁ DE MAL NISSO?
- O QUE HÁ DE MAL? O QUE HÁ DE MAL? – repetiu nervoso. – Não há nada de mal, é péssimo! Você sabia que só haveria homens lá, e Lúcio também! Porque você tem que fazer isso comigo? Isso... eu não vou tolerar traições Loraine. NÃO VOU! – encarei-o. Estava coberto de razão, meus lábios estavam tremendo... não consegui dar uma só resposta decente e convincente. – Sabe como eu me sinto, quando encaro meus amigos? Péssimo! Você me humilhou da pior forma, da pior!
- Régulo... eu...
- Você nada! Não irá mentir pra mim, não mais...
- O q-que você quer dizer, Régulo?
- Acabou, Loraine.
- Não, calma agente precisa conv...
- Não. Acabou! – gritou exacerbado.
- Por favor, as coisas não podem acabar assim...
- Acabará como? Você grávida de filhos do Lúcio? Não, obrigado. Ao contrário de Narcisa, meu orgulho está muito acima do meu... afeto.
- Eu... eu...
- Você está errada!
- Eu sei, mas...
- PÁRA DE TENTAR MENTIR! –gritou.
- Estou com dor de cabeça, por favor, pare de gritar e me ouça! – mantive meu olhar inflexível e ele se sentou, arrasado.
- Você acabou comigo... não sabe como estou. – murmurou.
- Eu errei, Régulo. E não foi só uma vez. Só nessas férias foram duas. – respirei, e ele tornou abrir a boca para me xingar, ou coisa parecida, e fechou-a em seguida. – Para mim essa de “estava bêbada” é só romantismo, coisa de literatura. Eu fiz, me arrependo e sei como você se sente.
- Não, não sabe como eu me sinto. – resmungou.
- Desculpe-me, mas eu sei como é se sentir enganada e traída. – respirei fundo novamente. – Não posso pedir para que me aceite novamente... eu... eu... estou errada. Não tenho explicação pra isso. Fui fr-fraca... – ele balançou a cabeça, contrariado.
- Não me diga que Lúcio a persuadiu...
- Não! Eu não sei o que dá na minha cabeça quando estou com ele...
- Você o ama, admita!
- Não, eu não o amo... é mais uma obsessão infantil...
- Está bem.
- Acredite em mim, me ouça.
- Estou te ouvindo!
- Ótimo. – abaixei os olhos, envergonhada. – Você é importante pra mim... nesse tempo longe eu pensei muito em você, e fiquei chateada porque não me escreveu.
O que não deixava de ser verdade, eu pensava em Régulo sempre que me sentia atraída por Lúcio.
- Não quero mais discutir isso... – disse finalmente. – Se não se importa, eu vou embora...
- Não me deixe sozinha, Régulo... eu preciso de você. – falei, como último suspiro.
- Você tem Lúcio... – disse, impaciente.
- Não, não tenho! – disse com veemência. – E mesmo que o tivesse, não o quero mais... Dê-me uma última... última chance.
- Preciso pensar... – disse-me.
- Enquanto você pensa, vou tomar um banho.
Saí da cama e entrei no banheiro. Demorei o máximo que pude, não conseguia encará-lo depois de saber que ele sabia que eu e Lúcio dormimos juntos durante sua ausência. Eu errei, errei duas vezes e não havia concerto. Eu poderia pôr culpa na bebida, mas isso não seria honesto. Mas desde quando eu precisava ser honesta? Seria tão mais fácil achar um bode-expiatório.
Esse sentimento de burlar o correto estava cada vez mais presente em mim mesma... já quase não conseguia controlá-lo.
Saí do banheiro enrolada na toalha, e Régulo estava sentado na minha cama, como eu o deixei. Não disse muita coisa, me abraçou forte e me pediu desculpas por ser tão duro, disse que me entendia.
Se ele me entendia realmente, não sei. Porque eu não entendo até hoje porque eu, quando estava perto do Lúcio, era tão ingênua, e tão fácil de persuadir.
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