O Fim de Lord Voldemort (Parte



N/A: Queridos amigos! Como podem ver este capítulo acabou ficando em duas partes, embora não fosse essa a minha intenção inicial. Mas os que escrevem sabem que as vezes os capítulos tomam vida própria. E foi o caso deste. Tinha que resumir um ano em uma única narrativa e isso não foi fácil. Por isso fiz uma seleção do que seria importante para a continuidade da história que estou contando. Pensei em esperar para depositar as duas partes juntas, mas aí eu só demoraria mais. Vou fazer todo o possível para que a parte dois saia até domingo, ok?

UM AVISO!!! A Batalha dos Dragões a que me refiro é a que está narrada na fic da Belzinha – Harry Potter e o Segredo de Sonserina, cap. 19. (Quem ainda não leu a fic não sabe o que está perdendo).

Quero agradecer imensamente a todos os que vêm acompanhando a fic. Obrigada pela leitura e pelos votos (fiz a maior festa quando cheguei a 50), mas principalmente, muito obrigada pelos comentários. Eles têm sido muito importantes para mim e são uma enorme dose de alegria no meu dia! Quanto às inúmeras vezes em que vocês dizem que eu sou má... bem, espero que compreendam que é por uma boa causa e tenham certeza que no fim vou ser bem boazinha e responder a todas as perguntas (espero...rsrs).

Boa Leitura!


O Fim de Lord Voldemort (Parte 1)



Hogwarts, últimos dias da Primavera de 1998.


A escola tinha mudado bastante no último ano. Não seus jardins, ou o lago ou as paredes de pedra do castelo. Ainda assim, Hogwarts não era mais a mesma.

Muitos detalhes compunham essa mudança... Dumbledore não caminhava mais por horas a fio em seu escritório do sétimo andar. Os alunos não aproveitavam mais suas folgas nos imensos jardins da propriedade. Não havia mais jogos de Quadribol.

Sim, a escola reabrira no ano anterior. Não que essa tenha sido a primeira decisão. Em agosto, a diretora, Profa. Minerva McGonnagal, informara aos pais e alunos que Hogwarts não era mais segura e que não haveria ano letivo. Mas, após o revés sofrido por Voldemort na Batalha dos Dragões*, em meados de setembro, o ministro achou-se seguro o suficiente para forçar a abertura da escola, mesmo sob as dúvidas dos professores, dos pais de muitos alunos e do Conselho Diretor.

Rufus Scrimgeour queria dar um sinal de força para a comunidade bruxa. Na verdade, embora a vitória na já lendária batalha se devesse muito mais a Ordem de Fênix do que ao Ministério, o ministro foi político o suficiente para se aproveitar da onda de otimismo que a seguiu. O Lord das Trevas tivera que recuar mesmo sem Dumbledore por perto para amedrontá-lo. Isso era uma novidade boa demais para que as pessoas, cuja moral estava muito baixa desde a morte do diretor, não se congratulassem e esperassem que a vida logo voltasse ao normal. “Afinal, o mundo não pode parar ou capitular por causa da morte de um único bruxo” – afirmou o ministro, em entrevista ao Profeta Diário. – “Não. Dumbledore era um bruxo poderoso sim, mas era somente UM homem. É dever do Ministério garantir a segurança da escola e de seus alunos e fazer tudo para convencer os pais de que a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts ainda é mais segura que muitos de seus lares”.

Assim, os alunos retornaram, não todos é claro, mas muitos. E, por vezes, ao longo daquele ano as coisas foram quase normais. Estudos, tarefas, exames, detenções e, quando se tem um castelo cheio de crianças e adolescentes, também houve momentos de alegria ruidosa e descontração descuidada. Contudo, a nuvem de receio e tristeza própria das guerras não nunca abandonou Hogwarts durante aquele ano. Esteve ali. Palpável. Silenciosa. Real.

Mesmo que tivesse dito que não voltaria para a escola, Harry Potter voltou. Quando ficou decidido que a escola seria reaberta, Minerva McGonagal não descansou até que o garoto concordasse em retornar e continuar os estudos. A velha professora fez de tudo. Disse que ele devia isso a Dumbledore, que não podia abrir mão de seu desejo de ser Auror, e que era, mais do que nunca, necessário se tornar um bruxo qualificado, até mesmo para não ter que ficar se explicando o tempo todo para o Ministério. Entre os Weasley, Arthur, Molly, Gui e Carlinhos se juntaram a cruzada para convencer Harry. Disseram que esse seria o papel de sua família e eles o cumpririam risca e não deixariam o garoto em paz até que ele concordasse. Lupin foi outro. Invocou a memória dos pais dele e de Sirius. Disse que nenhum deles ficaria satisfeito se Harry não terminasse sua educação. A verdade é que, anos depois, ele até acharia graça de tudo isso, mas na época, Harry odiou ser alvo de toda aquela pressão. Parecia que todo mundo achava que podia governar sua vida.

Mas no fim, ele cedeu. Nem saberia dizer o porquê. Talvez porque, de uma forma ou de outra, Hogwarts ainda era o seu lar apesar de tudo. Combinou com a Profa. McGonnagal que iria continuar sua busca pelas Horcrux e para isso ela garantiu que ele teria liberdade na escola e o auxílio da Ordem.

Agora, sentado no alto da torre de Astronomia enquanto a tarde se esvaía lentamente, as memórias atingiam Harry como uma enxurrada. Lembrava de como as coisas haviam se precipitado no fim do inverno, com Voldemort se recuperando e voltando a atacar. Como a guerra atingira finalmente uma fase declarada e ininterrupta. Os últimos meses tinham sido bem difíceis para todos. Hogwarts passara a ser uma espécie de refúgio, afinal, nenhum outro lugar no mundo bruxo era mais protegido naquele momento, exceto talvez, o próprio Ministério da Magia. Minerva era uma sucessora a altura de Dumbledore e manteve sua política de “em tempos de trevas, acender ao menos uma única vela, bem no alto, para romper a escuridão”. E, de uma forma que o grande mago teria gostado, pensou Harry com um sorriso, Hogwarts fora essa vela.

Na altura da Páscoa, o castelo não era mais o lar apenas de professores e estudantes. Famílias bruxas inteiras, órfãos menores, pessoas a quem a guerra havia roubado casas e afetos buscaram o castelo. E Hogwarts, magicamente, acolheu a todos. A presença de muitos bruxos adultos teria tudo para fortalecer suas defesas, mas não foi o que aconteceu de imediato.

Uma nova onda de amargura subiu até a garganta de Harry e a pedra do balcão da torre em que escorava suas costas pareceu mais fria. Alguns bruxos acharam perigoso demais ficar sob o mesmo teto que o “Eleito”. Afinal, mais cedo ou mais tarde, o Lord das Trevas viria atrás dele. Uma pequena delegação resolveu exigir que a diretora tirasse Potter dali e o enviasse para outro lugar. Isso, para eles, tornaria o castelo mais seguro. Para quê? Qual era mesmo o lema de Hogwarts? Draco dormiens nunquam titillandus, ou seja, não mexa com um dragão adormecido. As pessoas deviam prestar mais atenção a isso, ainda mais em se tratando de Minerva McGonnagal. Rony ainda lamentava não ter estado presente, mas não se cansava de imaginar a descompostura passada pela diretora no grupinho de desavisados. “Me sinto como se tivesse perdido de assistir a final do campeonato de quadribol”, afirmava para uma sorridente Hermione, “imagine, um batedor, várias goles, e ele acerta todas de uma só vez” – encenava com gestos. “Um momento único! Deveria entrar para as aulas de história da magia! Desde que a McGonnagal desancou a Umbridge, eu não me divertia tanto.”

Duas noites depois que a diretora colocou a tal “delegação” em seu devido lugar, um Harry muito machucado chegou à ala hospitalar. Mais uma vez ele havia arriscado a vida para derrotar as forças das trevas e, para a sua felicidade, a partir daquele momento restava apenas uma porção da alma de Voldemort para ser destruída, a que estava no corpo dele. A diretora e os professores, especialmente Hagrid, usaram esse fato quase com violência contra os que olhavam torto para Harry. E quando ele finalmente se viu livre dos cuidados de Madame Pomfrey, ninguém mais parecia se opor a sua presença.

Harry ouviu um barulho nas escadas que levavam à torre e praguejou baixinho. Havia se isolado ali para ficar sozinho. Achou que ninguém o procuraria na torre de Astronomia porque ele próprio evitava o lugar desde a morte de Dumbledore. Mas naquele dia, ele havia achado que ali encontraria consolo apenas lembrando a presença amiga do diretor. A porta da torre escancarou antes que ele puxasse a capa de invisibilidade do bolso interno da jaqueta. Rony e Hermione entraram meio que discutindo em voz baixa, o garoto gesticulando enquanto ela erguia o queixo e fechava os punhos visivelmente perdendo a paciência.

– Se estão procurando um lugar para discutir, podem dar meia volta, aqui já está lotado – falou Harry de mau-humor, mas os dois parecerem esquecer o motivo da briga no mesmo momento.

– Cara, finalmente te achamos. A gente te procurou pelo castelo todo. Tava se escondendo? – o ruivo o olhava preocupado parecendo procurar algum ferimento ou alguma parte sobressalente fora do corpo.

– É, tava sim. Agora que vocês me acharam podemos recomeçar. Eu conto até cem e vocês podem se esconder – não estava nem aí por ter sido grosseiro. Rony estacou sério e colocou as mãos no bolso das calças. Hermione, porém, ajoelhou-se no chão ao seu lado, o olhar tão cheio de piedade que Harry o desviou no mesmo momento. A garota fez um gesto em direção aos seus cabelos, mas ele não deixou que ela o tocasse.

– Harry – Hermione começou – não foi culpa sua... foi...

–Foi culpa de quem então, Mione?

– Foi uma fatalidade... Dois feitiços potentes combinados. Você e Neville não podiam prever, tinham tanta raiva... Bellatrix era tão detestável, um monstro... O que ela fez com os pais do Neville, com o Sirius, ninguém culpa vocês...

– Quem ela era não muda nada, Hermione. Eu... matei uma pessoa!! – A voz saiu estrangulada – e não me venha dizer que entende, ok? Não aparece em livros como isso é, ou o que a gente sente!!!

Hermione olhou para Rony aflita.

– Me diz Harry, nos insultar está te fazendo se sentir melhor? – Questionou o ruivo sem mudar de posição. O outro deu um salto do chão e encarou o amigo.

– Não pedi para vocês dois virem aqui.

No segundo seguinte, sentiu algo muito duro bater no seu rosto e a cabeça explodir em milhões de estrelinhas. Um grito aterrorizado chegou aos seus ouvidos enquanto ele cambaleava e se apoiava na murada. Nem pode ver o que o atingiu.

– RONY!!! – Hermione gritou novamente segurando o braço do ruivo, mas ele não fez o menor gesto de que continuaria a bater em Harry. Na verdade, olhava para ele muito friamente.

– O que deu em você? – Perguntou Harry chocado massageando o queixo. – Ficou maluco, é?

– Não. Só achei que você precisava de um balde água fria, mas fiquei com preguiça de conjurar um. – Deu dois passos na sua direção olhando-o como se ainda o analisasse. – E aí? Passou a crise de histeria?

Harry olhava Rony incrédulo. Não sabia se ria, se chorava, se devolvia o soco... Mas de alguma forma uma coisa quebrou dentro dele. Seu queixo doía bastante, mas isso não era nem perto da dor horrível no seu peito. Uma dor pegajosa e borbulhante que o fazia se sentir sujo, mau, indigno... Bellatrix era um monstro sim, mas ele não era e também nunca quisera ser carrasco de ninguém. A dor subia pela sua garganta. Harry se sentiu tonto e trêmulo, as pernas bambas o obrigaram a se apoiar mais fortemente na murada. Sentiu Hermione puxá-lo para um abraço ao qual ele não resistiu e desabou no ombro da amiga, chorando como nunca fizera na vida. Rony colocou a mão em seu ombro e os três ficaram assim até que, depois um tempo que ele não saberia precisar, a dor diminuiu e com ela as lágrimas.

Harry se afastou de Hermione enxugando o rosto nas mangas da jaqueta.

– Rita Skeeter adoraria este furo de reportagem – falou tentando aliviar seu próprio embaraço e a tensão entre os três.

– Nãm... ela esgotou a sua imagem de herói trágico e bebê chorão nas horas vagas no quarto ano – disse Rony com um sorriso.

Harry notou que Hermione tinha os olhos muito brilhantes, mas ela também sorria. Ele encarou os dois.

– Obrigado – falou em voz baixa – não sei o que seria de mim sem vocês.

– Provavelmente, seria um cara mais normal – disse Rony.

– Eu duvido muito – agora, definitivamente, o riso parecia ter voltado à voz de Harry.

– Você está se sentindo melhor, Harry? – Perguntou Hermione ainda cheia de preocupação.

– Tô sim, Mione, obrigado.

A garota deu um suspiro de alívio e Rony a puxou para ele passando o braço em seus ombros e lhe dando um beijo nos cabelos. Era um gesto que vinha se tornando característico nele. Fazia sempre que ficava orgulhoso da namorada.

– Afinal, o que vocês dois vinham discutindo? – Perguntou.

– Ahh... O Rony dizia que não íamos encontrá-lo aqui, mas a gente já tinha procurado no castelo todo e... eu tive um palpite, acho...

– Sério? – Harry estava encantado com a leveza e o calor que invadiram o seu corpo após o desabafo. – Não me diga que está desenvolvendo a sua visão interior Mione – a garota deu-lhe um tapinha no braço. – Hei! – Reclamou rindo. – Vocês dois vieram aqui para me bater, é?

– Você não tá com fome, cara? Sumiu o dia todo. Não tomou café, não almoçou... – Rony revirou os olhos ante as próprias palavras – Por Mérlin, tô falando igual a minha mãe. – Dessa vez os três riram.

Harry realmente não tinha tido fome. Tinha passado o dia se alimentando de culpa e auto-piedade. Mas agora que Rony falara, acabou concordando com a cabeça. Era impressionante o poder que os dois tinham de fazê-lo se sentir melhor, mesmo nos piores momentos. Hermione não precisou de um segundo sinal, conjurou imediatamente uma bandeja cheia de sanduíches de peru e pedaços de bolo de chocolate e uma enorme jarra de suco de abóbora. Os três sentaram-se no chão em torno do improvisado piquenique. Harry estava com fome e comeu calado. Mas quando a fome já parecia saciada, a leveza que ele sentira com a presença e o apoio dos melhores amigos pouco a pouco começou a abandoná-lo, sendo substituída por uma sensação muito mais desconfortável. E ele sabia que essa sensação nada tinha a ver com culpa. Uma brisa gelada arrepiou-lhe os cabelos da nuca.

– Ele está vindo.

– O quê? – disseram os outros dois juntos.

Harry deu um pulo ficando em pé e passou os olhos pelo horizonte. Todo e qualquer vestígio do adolescente em crise e mal humorado ou do garoto em lágrimas havia sumido. Os amigos tinham certeza que nunca o tinham visto tão adulto como quando ele se virou para os dois.

– Temos ainda até o por do sol. Mais umas duas ou três horas, talvez – os dois ainda o olhavam sem entender – Voldemort está vindo para cá. – Rony e Hermione levantaram do chão como se fossem de mola.

– Tem certeza, Harry? – Perguntou a garota, embora soubesse ser uma pergunta inútil.

– Tenho. E, hoje, isso acaba Mione. De hoje essa tortura não passa – a decisão na voz dele fez os outros estremecerem, mas Harry não lhes deu tempo de reagir e rumou para a porta da torre. Estacou antes de chegar lá, lembrou de uma coisa importante.

– Cadê a Gina? – Estranhou que ela não estivesse junto com eles, embora não soubesse ao certo se iria querer que ela o tivesse visto até á pouco.

– Ahh, Harry – Hermione se adiantou – Madame Pomfrey e a Sra. Weasley a obrigaram a dormir depois do almoço. Ela cuidou do Jorge a noite inteira na ala hospitalar e depois te procurou a manhã toda e não quis se alimentar, estava quase desmaiando de cansaço.

Ele sentiu uma pontada de remorso. Jorge se ferira gravemente na batalha em Hogsmead, ocorrida pouco mais de dois dias antes e ele esquecera completamente, afundando-se nos seus próprios problemas.

– Claro... humm, er... como é que está o Jorge?

– Melhor, cara, bem melhor – respondeu Rony – aliás, acho que ele está até gostando de estar lá na ala hospitalar. Tem recebido uma atenção bem exagerada da Alícia.

Harry sorriu. Alicia Spinnet estava fazendo estágio como curandeira no St. Mungus e viera para auxiliar Madame Ponfrey quando o castelo começara a concentrar gente. Desde, então, ela e Jorge pareciam ter muito o que conversar e ela não parava de rir quando o garoto estava por perto.

– A Gina está na torre da Grifinória, Harry – Hermione finalmente respondera o que ele queria saber.

– Hum... ok. Vocês – viu que eles esperavam para ver o que Harry queria que eles fizessem – porque não ficam por aí mais um tempinho – falou simpático – eu vou dar o alarme e vocês podem descer daqui a pouco.

Diante da idéia de uma batalha iminente, achou que os dois deviam ficar alguns minutos a sós. Abriu a porta e voltou-se para trás mais uma vez.

– E, Rony – encarou o ruivo esfregando o queixo ainda dolorido – parece estranho, mas, obrigado pelo soco. Só que, da próxima vez, se eu puder escolher, prefiro que conjure um balde de água fria, tá.







O ar despreocupado que ele assumira diante dos amigos evaporou quando chegou ao andar de baixo. Certamente os dois o haviam ajudado a sair do estado entorpecido em que se encontrava, mas de forma alguma as decisões que ele tomara ao longo do dia tinham se modificado. Agora precisava ser rápido. A sensação de que Voldemort aproximava para um ataque definitivo era cada vez mais urgente. Esticou a varinha à frente e conjurou seu patrono. O imenso cervo prateado saltou pelo corredor e se voltou para ele.

– Dê o alarme para Remo, Mood e a Profa. McGonnagal – ordenou Harry e o patrono partiu num galope rápido e silencioso. Um farfalhar de asas o avisou que sua ligação com Edwiges se mantinha a mesma. A coruja estava encarrapitada na janela logo atrás dele esperando pela sua tarefa. O garoto se aproximou e fez-lhe um carinho nas penas da cabeça. Conjurou um pedaço de pergaminho e uma pena e escreveu um bilhete rápido. – Entregue isso para o ministro – disse enquanto amarrava a mensagem na pata da coruja. – Ele está em Hogsmead agora, mas seja o mais rápida que puder, está bem?

Edwiges bateu o bico em assentimento e inclinou a cabeça para o dono acariciando a mão dele que se afastava. No segundo seguinte ela ganhou os céus na partida mais veloz que Harry já a observara fazer. Pronto. Ainda tinha mais duas tarefas pela frente. Nenhuma delas agradável. Escolheu fazer a mais fácil primeiro e tomou o caminho em direção as masmorras.

Seguiu por todos os atalhos que conhecia e só parou quando chegou à frente da sala que agora era ocupada pelo Prof. Slughorn. Harry bateu na porta, mas não esperou ser convidado para entrar.

– Harry, meu rapaz – saudou o velho professor sentado atrás de sua escrivaninha, ao que parecia, lendo o Profeta – hã, algum problema?

– Vários, professor, e todos vindo para cá – e acrescentou diante da expressão aturdida de Horace – teremos visitas em breve – Slughorn ficou sem cor – se o senhor quiser se juntar aos outros, creio que já começaram a se preparar, se quiser partir, eu aconselho a fazer o mais rápido possível.

Horace pareceu considerar as palavras de Harry. Era óbvio que estava aterrorizado. Ficara no castelo por segurança. A sua própria. Vira com horror cada uma das batalhas que tinham ocorrido até ali e evitara participar diretamente de todas. Levantou-se lentamente, ainda muito pálido, e respondeu que iria procurar a diretora e os outros.

– Hã, e você? – Questionou já na porta.

– Vou trocar umas duas palavrinhas com o seu hóspede, professor, logo estarei com vocês. Diga isso aos outros, por favor.

– Claro, claro... – e saiu acenando com a mão gorducha como se continuar ali fosse ainda mais incômodo que a perspectiva da batalha.

Harry contornou a sala e dirigiu-se para os aposentos do professor que eram acessados por uma porta lateral. Desta vez não bateu na porta. O quarto parecia bem frio e Harry não pode culpar Slughorn por estar preferindo sua sala de aula aos seus cômodos pessoais. Ele precisou acostumar um pouco os olhos a penumbra para divisar o homem de vestes negras sentado numa cadeira a sua frente. Uma das pernas estava esticada sobre a cama, coberta na altura do joelho por uma grossa camada de curativo sobre uma ferida que ainda sangrava de forma evidente. O homem curvava-se sobre um livro iluminado apenas uma vela que flutuava ao lado de sua cabeça. O nariz adunco quase encostando nas páginas e os cabelos escuros e oleosos caindo como uma cortina sobre o rosto macilento. Snape notou a presença de Harry antes que ele falasse.

– Potter! Que surpresa! A que devo a honra de sua visita?

Harry fingiu não notar a ironia. Não estava ali para trocar farpas com Severo Snape.

– Voldemort está vindo para cá – disse se escorando na parede ao lado da cama, cruzando os braços diante do corpo e encarando de frente o ex-professor. Snape endureceu o maxilar. – Assim, como pode perceber, não vou ter muito tempo a perder com você.

– O que quer?

Havia ódio em cada palavra dita por Severo. Harry, porém, respirou fundo engolindo sua própria raiva. Para ele, as resposta que o outro podia lhe dar eram mais importantes que toda a animosidade que sentia.
Seria difícil resumir como Severo Snape, Comensal da Morte caçado, assassino e traidor, podia estar ali, em Hogwarts, protegido pela Ordem de Fênix e escondido do Ministério da Magia. Dumbledore estivera certo em confiar no Ranhoso? As últimas ações deste pareciam provar que sim. Mas Harry achava conhecer suficientemente a natureza de um soncerino para saber Snape nunca fizera nada sem avaliar seus próprios ganhos em cada situação. Se optara por trair Voldemort há dezoito anos atrás fora por motivos bem pessoais. E isso não o tornava melhor ou mais tolerante e muito menos um dos mocinhos. Apenas atestava sua inteligência e capacidade de perceber que a visão de mundo projetada por seu mestre, mesmo que vitoriosa, estaria destinada ao fracasso. Por mais poder que o Lord das Trevas acumulasse, por mais que ele diminuísse o número de pessoas dispostas a enfrentá-lo, sempre haveria resistência. Seria uma guerra eterna, e Snape era inteligente demais para acreditar que isso fosse uma opção de mundo desejável.

Por esses mesmos motivos voltara a ser um agente duplo a pedido de Dumbledore quando Voldemort retornara. Usou toda a sua habilidade de oclumente e sua capacidade de dissimilação para imitar uma coragem muito maior do que a que sentia. Ainda sim, não fora um covarde. Cumpriu cada missão que lhe foi designada, até a mais insuportável: sem outra saída, teve que matar o único homem que o respeitara e compreendera em toda a sua vida. Desde então, tudo o que ele conheceu foi o inferno e, ainda assim, manteve seu posto e cumpriu fielmente todas as tarefas que Dumbledore lhe havia dado antes de morrer. Longe de Hogwarts, mas perto do inimigo, ele havia ajudado Harry Potter a encontrar as Horcrux que precisavam ser destruídas. Conseguiu enganar o Lord das Trevas por mais tempo que qualquer outra pessoa no mundo. Não, ele não era um covarde, jamais aceitaria que alguém o chamasse disso.

Encarou Harry de frente. Ainda o desprezava com todas as suas forças, mas o destino quisera que, por enquanto, ele e o filho de Tiago Potter tivessem uma causa em comum.

– Acho que primeiro tenho que lhe agradecer, Snape – Harry falou sem emoção – sua intervenção com Nagini foi providencial.

O outro ergueu as sobrancelhas.

– Estamos quites, Potter, se tivesse me deixado lá eu estaria morto. E eu prefiro que não existam dívidas entre nós.

– Eu também.

O silêncio pesou por alguns segundos antes de Harry recomeçar a falar.

– Dumbledore parece ter achado que você vivo seria mais valioso para mim e para a destruição de Voldemort que ele mesmo. Devo confessar que ainda acho a idéia um disparate, mas... não tive escolha sobre isso, não é mesmo?

Estudou o rosto impassível de Snape antes de prosseguir.

– Agora nosso tempo esgotou, Severo. Voldemort está vindo e está disposto a tudo. Esta noite... – parou buscando as palavras para não parecer excessivamente dramático – vai ser decisiva.

Harry finalmente abandonou a postura rígida que assumira junto à parede e começou a andar pelo quarto. Severo o observava, ainda em silêncio.

– Preciso saber. Você é o único que esteve presente no momento em que destruí uma Horcrux, isto é, quando matei Nagini – Harry sentou-se na cama diante do outro – preciso entender exatamente o que aconteceu.

– Exatamente o que você não entendeu, Potter?

– Porque eu consegui destruí-las com tanta...

– Facilidade?

– É... bem, acho que é essa a palavra. Não consigo compreender. Havia encantos poderosos em cada uma delas. Dumbledore era muito mais velho, poderoso e hábil do que eu e quase morreu para destruir uma delas. Régulos Black morreu para destruir a outra. E...eu estou aqui...intacto.

Snape desviou o olhar do rosto confuso de Harry e passou a mirar um ponto vago a sua frente. Manter uma conversa num tom civilizado com o garoto exigia bastante de sua tolerância. Mas ele tinha razão, o tempo se esgotava, e Potter precisava compreender o que acontecera. E, talvez, somente ele pudesse explicar.

– Acredito, Potter, que a razão pela qual pode destruir as Horcrux com relativa facilidade é a mesma pela qual você pode falar com cobras, ou sua varinha é irmã da de seu inimigo, ou seus poderes parecem se equivaler aos dele quando vocês se enfrentam. Como Dumbledore muitas vezes lhe explicou, quando o Lord das Trevas tentou matá-lo ele transferiu para você parte de seus poderes, marcou-o como um igual, como disse a profecia. Isso fez com que as identidades mágicas de vocês se aproximassem. E quando ele retornou e usou seu sangue para confeccionar um corpo, essa identidade aprofundou-se. Aliás, lembro do diretor ter ficado de certa forma satisfeito que Voldemort o tivesse escolhido para fazer o ritual. Para ele isso selaria a destruição de Tom Ridle.

Harry sentiu um estranho desconforto ao lembrar que quando contara para Dumbledore, em seu quarto ano, como Voldemort havia retornado, pensou ter visto um brilho de triunfo em seus olhos azuis. Voldemort havia feito algo que Dumbledore esperava que ele fizesse.

– Está dizendo que pude destruir as Horcrux...

– Porque apenas o Lord das Trevas poderia fazê-lo sem dano e a semelhança das identidades mágicas de vocês lhe deu o mesmo poder.

Harrry passou a mão pelos cabelos revoltos. A sensação de incredulidade devorava-lhe a boca do estômago em pequenos espasmos.

– Pense, Potter. Você tinha doze anos quando destruiu a primeira e não lhe aconteceu nada... Estava ferido, envenenado por um basilísco, recebeu uma imensa carga de magia quando destruiu o diário e, ainda assim, não só permaneceu ileso como ainda pode resgatar a alma de Gina Weasley. Nunca se perguntou como isso pode acontecer? Nem mesmo depois de ver o quanto as Horcrux eram protegidas magicamente.

Harry sentiu-se um idiota. O que acontecia quase sempre que Snape lhe explicava algo que ele não entendia, desde a primeira vez em que se encontraram em uma sala de aula.

– Dumbledore nunca se referiu a isso – achou que o comentário faria com que ele parecesse menos tolo.

– Verdade? – Retorquiu Snape com desdém. – Interessante... já que a teoria era dele.

– Se Dumbledore achava isso, porque ele se arriscou destruindo o anel, porque não...

– O chamou? – Completou Snape novamente. Harry assentiu. – Perguntei isso a ele, certa vez.

– E o que ele respondeu? – Harry mal podia conter a curiosidade.

– Que toda a teoria precisava ser testada. E que sua mão era a prova de que um velho e poderoso bruxo valia menos, naquele caso, que um menino de doze anos com pouca ou nenhuma instrução mágica.

As palavras de Snape estavam deixando Harry zonzo. A resposta do porque ele fora capaz de destruir as Horcrux era porque ele era o único que poderia fazê-lo, como tudo mais que levava ao caminho para a destruição de Voldemort. Isso era inquietante, mas estranhamente, faziam sentido no meio de toda aquela insanidade.

– Por que Dumbledore não me disse nada sobre isso?

– Acho que o diretor ainda pretendia testar uma outra teoria antes de repartir esses fatos com você.

– Que teoria?

– O Lord das Trevas forjou as Horcrux como salvaguardas para sua existência. Confinou nelas pedaços de sua alma, e também muitos de seus poderes. Não queria que fossem apenas os objetos inertes onde as frações de seu espírito seriam guardadas. Por isso escolheu objetos poderosos, objetos carregados de magia, que poderiam somar-se com seus próprios poderes. Isso garantiria que, caso ele se enfraquecesse, poderia recorrer às Horcrux para, a falta de palavra melhor, se reabastecer.

– E porque ele não fez isso quando quase morreu depois de tentar me matar?

– Acho que não pode. Sem um corpo, seria difícil destruir um objeto poderoso. E quando ele o readquiriu, o ritual que fez lhe garantiu entrar novamente de posse de seus poderes sem que precisasse abrir mão dos salvaguardas de sua imortalidade.

Harry respirou.

– Certo! – Era muita informação, mas Snape ainda não esclarecera a teoria de Dumbledore. – E o que, exatamente o Prof. Dumbledore queria testar?

– Não parece óbvio, Potter? Dumbledore acreditava que você não somente podia destruir as Horcrux sem dano, como também podia absorver os poderes que estavam contidos nelas.

Harry teve certeza que seu coração parara de bater naquele momento, ao mesmo tempo em que grandes luzes acendiam em sua cabeça. Fixou Snape como se pudesse perfurá-lo, mas não tinha nenhuma dúvida sobre o que ele dissera. Sabia que era verdade. Não pudera compreender quando destruíra o Diário de Ridle. Era muito jovem. Ainda assim, havia percebido que seus feitiços, quando ele os conseguia fazer, ficaram mais potentes. Mas, no último ano, pudera perceber mudanças em cada uma das ocasiões em que destruíra um dos pedaços da alma de Lord Voldemort. Sentia-se cada vez mais forte. Fazia coisas que jamais imaginara possível. Era assustador. E, ao mesmo tempo, extremamente sedutor. A magia fluía nele, trespassava-o, prolongava seus braços, seus sentidos, atendia suas menores vontades. Harry tinha um imenso receio de deixar esses poderes tomarem conta dele ou serem percebidos pelos outros. Usava toda a sua força de vontade para mantê-los sob controle. Conseguia quase sempre, mas ainda perdia para sua própria raiva. Nesses momentos, seu potencial mágico podia causar estragos imensos e aterradores.

Harry ergueu-se da cama. Sentiu-se pesado e grande como se tivesse metros e pesasse toneladas. Mas isso não era uma sensação boa ou de superioridade, pelo contrário, era extremamente desconfortável.

– Bem, parece que isso realmente pode me dar uma vantagem essa noite – murmurou quase para si. Ergueu a cabeça e um pensamento horrível o fez fechar os olhos por um instante. Não, não perguntaria, nem pensaria nisso. Não agora. Tinha ainda coisas importantes para resolver.

– Minha resposta para isso seria não, Potter – Snape falou calmamente, os olhos fixos nele.

– O que? Eu não perguntei nada.

– Mesmo? Ouvi claramente perguntar se atualmente você também não carrega em si, além dos poderes, parte da alma maligna e perigosa de Lord Voldemort.

“Maldito legilimens!” Pensou Harry diante do sorriso desdenhoso do outro.

– Minha opinião é que isso não aconteceu porque, como o próprio Dumbledore acreditava, mesmo dividindo sua alma, Lord Voldemort preservou seu EU no pedaço que deveria habitar seu corpo. Como você é a prova viva, Potter, grandes poderes, sem inteligência e vontade hábil para usá-los, servem para muito pouco. O Lord das Trevas provavelmente preferiu manter essas partes de si intactas.

Uma sensação boa de chocolate quente descendo suavemente pela garganta pareceu suavizar de novo a sua respiração. Harry sentiu-se grato, talvez pela primeira vez na vida, pelas palavras de Severo Snape. Enfiou a mão no bolso da jaqueta e tirou um pedaço de pergaminho velho. Bateu nele com a varinha e desdobrou-o na frente do ex-professor.

– Não quero que ninguém se machuque, Snape – o outro o olhava interrogativo, ainda um pouco surpreso por Harry estar lhe esfregando na cara o Mapa do Maroto sem a menor cerimônia – me aponte onde. Para onde será seguro levá-lo. Tem que ser dentro dos limites de Hogwarts para não desperdiçar muita energia, mas não quero inocentes por perto.

Snape entendeu o objetivo de Harry.

– Isso inclui os seus amigos?

– Isso inclui especialmente os meus amigos.

Snape olhou o mapa atentamente e esticou o braço apontando com o dedo longo algo que parecia um descampado num terreno alto ao norte do lago.

– O campo de Aradia. Diz a lenda que foi construído pelos fundadores. Usado para antigos rituais mágicos. Será difícil os alcançarem lá. Além disso – fez uma pequena pausa – lugares assim, às vezes, podem se revelar úteis numa batalha.

– Eu deveria entender isso? – Perguntou Harry já puxando e dobrando o mapa. Estava cansado de enigmas.

– Eu não esperaria que conseguisse – falou Snape com a voz aborrecida – mas, talvez um dia você estude a magia ancestral e compreenda. Não creio que precise disso hoje, mas acredite pode ser uma vantagem.

Harry assentiu. Tinha terminado o que veio fazer ali. Dirigiu-se para porta com passos largos, mas deteve-se antes de atravessá-la.

– Er...hã, obrigado, Severo.

Snape não o olhou, tinha voltado a ler seu livro como se nada na “visita” o tivesse perturbado. Harry não esperava mesmo que ele fosse responder, mas ainda sim a voz de Snape chegou a ele antes que a porta fosse fechada.

– Odeio dizer isso, mas, cuide-se Potter. Muita gente morreu para salvar seu pescoço. Seria interessante que você conseguisse mantê-lo sobre os ombros em pagamento.





Gina Weasley acordou em sua cama na torre da Grifinória. A cabeça ainda entorpecida pela poção de Madame Ponfrey como se ela tivesse dormido dentro de uma tina de água. Sentou-se na cama tentando colocar os pensamentos em ordem. Harry! Será que Rony e Hermione já o haviam encontrado? Tremia só de pensar na bagunça que devia estar a cabeça dele. Ajeitou-se o mais rápido que pode e deixou o quarto. A sala comunal estava lotada. Como os alunos arriscavam-se muito pouco fora do castelo, era ali que passavam a maior parte do tempo. Gina buscou algum amigo mais próximo com os olhos, mas logo ficou óbvio que nenhum estava ali. Havia muitas tarefas a serem feitas e a maior parte dos alunos do quinto ano para cima estava envolvida nelas, o que deixava apenas os alunos menores na sala comunal.

Gina lembrou que Madame Ponfrey tinha segurado Neville na ala hospitalar com a desculpa de que precisava de sua ajuda para trazer ervas das estufas para as poções. Mas a verdade é que, depois do que acontecera na noite anterior, o que ela queria era poder manter o garoto sob a sua vigilância e a da Profa. Sprout. Harry conseguira escapar desses cuidados antes mesmo de amanhecer e mesmo que ela, Rony e Hermione o tivessem procurado a manhã toda não haviam sido capazes de encontrá-lo.

Acabara de passar pelo buraco do retrato da mulher gorda quando viu Harry vindo pelo corredor em sua direção. Saiu correndo para ele, o coração aos pulos. O rapaz abriu os braços e a recebeu num abraço muito, muito apertado. Levou alguns minutos, que para eles pareceram dias, para que os dois finalmente se soltassem convencidos que eram reais. Gina o fitou cheia de preocupação.

– Como você está?

Harry lhe fez um carinho lento, desenhando seu rosto com os dedos.

– Bem melhor agora – a menina sorriu. Ele a tomou pela mão e puxou para uma sala vazia – vem – o sorriso de Gina aumentou.

Harry fechou a porta assim que eles a cruzaram e virou-se para encarar a garota. Céus, isso não ia ser nada fácil. Era engraçado, quando Gina estava perto, como há pouco, ele perdia completamente a capacidade de raciocínio, mas quando ela ficava a alguns passos ele podia sentir seu ódio por Voldemort triplicar. Já fazia quase um ano que a irmãzinha de Rony se tornara o exemplo vivo de tudo o que ele queria e que, naquele momento, acreditava que nunca iria ter. Por causa Dele! Gina continuava sorrindo para Harry. Tinha certeza que ele a tinha puxado para a sala para que pudessem ficar juntos sem serem interrompidos. Provavelmente as idéias de ficarem juntos que os dois tinham naquele instante eram bem diferentes e se Harry tivesse um pouco mais de tempo não ficaria triste em corresponder as expectativas da garota, mas a verdade é que não tinha.

Harry passou por ela colocando uma boa distância entre os dois e enfiando as mãos decididamente nos bolsos das calças pensando em mantê-las ali o maior tempo possível. O sorriso de Gina evaporou, mas ela não disse nada.

– Voldemort está vindo para cá – disse com seriedade. – Acho... acho que teremos mais uma noite difícil – fixou o olhar na ponta dos tênis.

Gina assumiu a mesma postura firme e séria dele.

– Os outros já sabem? – Harry confirmou. – O que está pensando em fazer? – Ele não chegou a se surpreender com a pergunta.

– O que for preciso.

Gina deu vários passos na sua direção, diminuindo a distância que ele havia colocado entre os dois. Ficou perto o suficiente para Harry se sentir obrigado a olhá-la. A sala parecia mais quente agora.

– O que você quer que eu faça? – Perguntou num tom mais baixo, mas igualmente firme, os olhos fixos nele com intensidade.

Harry sentiu de novo que havia uma enorme bola em sua garganta dificultando-lhe a respiração, mas fez um esforço sobre-humano para não desviar o olhar dela.

– Quero que fique o mais longe possível de mim – Gina fez uma expressão de incredulidade e mágoa. – Não posso impedi-la de lutar, bem que eu queria, mas não posso. Além disso, sei que precisaremos de cada bruxo hábil que esse castelo puder ter. Eu só não a quero perto de mim.

– Por quê? – Ela agora parecia definitivamente magoada – já lutamos juntos antes. Você até disse que se eu queria lutar, você preferia estar por perto. Sei que era para... – ela fez uma careta meio sem graça – me proteger. Por que isso agora? Está pretendendo morrer e quer que eu fique longe o suficiente para não tentar impedir?

Ela ainda podia ler o que se passava nele. Harry sentia-se cada vez mais desconfortável e quente já que Gina continuava se aproximando e ele não pretendia ceder um milímetro do que tinha decidido. Tampouco ia confirmar que achava que sua luta com Voldemort terminaria naquela noite e que ele estava decidido a morrer para levar o cara de cobra junto. Nem ia dizer que se sobrevivesse já tinha decidido que ia sumir do mapa. Que não achava que um assassino fosse digno dela e que não teria coragem de voltar a encarar qualquer um dos seus amigos. Que a certeza de que estava acumulando poder demais vinha fazendo com que se sentisse perigoso e ele não queria ser uma ameaça para ninguém. Na verdade, podia pensar em coisas muito mais importantes para dizer para ela naquele momento, mas também não podia dizê-las. Fechou os punhos dentro dos bolsos das calças, frustrado.

– Desculpe, Gina, mas é uma decisão que não pretendo alterar. Gostaria que você concordasse e me prometesse que...

– Não – disse ela com simplicidade.

– Gina, por favor, entenda... eu preciso...

– A resposta é não, Potter – Gina não alterou o tom de voz, apenas cruzou os braços e ergueu o queixo, sinal de batalha perdida para ele – você toma as suas decisões e eu as minhas.

– É a sua última palavra?

– Pode apostar sua vida nisso.

Harry bufou. Francamente, o que é que ele esperava? Que a ruiva fosse deixar de uma hora para outra de ser voluntariosa e dona de si. Que ela ia docemente se moldar ao que ele queria. Ainda assim, não pode deixar de sentir raiva. Por que ela tinha que ser tão teimosa? Ele não estava pedindo nada demais. Respirou fundo buscando recuperar o controle. Ela queria assim, tudo bem, não mudava nada. Ele só precisaria ser mais rápido.

– Era só isso? – A voz dela soou glacial, Harry assentiu triste. – Ótimo! Então estou dispensada – concluiu e se encaminhou resoluta para a porta.

Harry estava pregado no chão. Aquela podia ser a última vez que eles ficavam sozinhos. Que ele a via com calma. E eles tinham brigado.

– Espera!

Atravessou a sala em passos tão largos quanto foi capaz e antes que ela pudesse fazer qualquer movimento, ele já estava com a boca grudada na dela, quase sem respirar. Era incrível como certas coisas aumentavam de intensidade com o tempo. Quando haviam namorado no ano anterior Harry tinha achado que Gina mexia em demasia com ele, mas agora, parecia que cada intervalo de tempo que ele ficava sem ela, era tempo demais. Esse era o gosto do beijo dele. O gosto de alguém que havia esperado demais por aquilo.

Ele aspirou profundamente. Queria lembrar do cheiro dela, do calor, do gosto. Queria ter isso para sempre com ele. Fazendo parte dele. Suas mãos subiram lentamente pelas costas da garota, acariciaram os cabelos cheirosos e terminaram emoldurando o rosto dela. Harry se afastou apenas o suficiente para colar suas testas.

– Eu só queria que soubesse – falou com a voz rouca – que nunca gostei de ninguém como eu gosto de você.

Então, ele a soltou rápido e saiu da sala sem olhar para trás. Não queria ver os olhos dela e nem ouvir a sua voz. Achou que não agüentaria ficar nem mais um minuto tão próximo ou perderia o pouco juízo que ainda lhe restava.

Gina ficou parada exatamente onde Harry a soltara. Ouviu pelo menos uns dois estouros no corredor que lhe pareceram vidros. Ela tocou os próprios lábios com as pontas dos dedos e respirou profundamente. Em outra ocasião ela certamente estaria arrasada com aquilo. Mas de alguma forma não estava. Conhecia Harry Potter bem demais para não saber que ele tentaria dar um jeito de mantê-la longe. “Só que dessa vez Harry”, pensou enquanto saía da sala e o via desaparecer no fim do corredor por entre uma grande quantidade de pessoas que lhe abriam caminho, “as coisa não vão ser do jeito que você quer”.

A ruiva não precisou mais que alguns segundos para formar um plano na sua cabeça. Entrou na sala comunal como um furacão sem dar a mínima para os olhares chocados que a acompanharam quando ela subiu até o dormitório dos meninos do sétimo ano. Por sorte, nenhum deles estava por ali e ela não precisou nem parar para se explicar nem teve que azarar ninguém caso houvesse oposição. Levou menos de um minuto para localizar e pegar o que queria. Deu um olhar breve para a janela e viu que a luz do dia não demoraria muito para desaparecer. Apressou-se. Ainda queria fazer duas paradas antes de seguir o seu plano. Saiu ventando da torre de Grifinória. Na mão direita, a Firebolt de Harry.

Gina manteve o passo apertado nos corredores, mas era difícil avançar com muita rapidez. O alarme de que o Lord das Trevas se aproximava havia sido dado e as pessoas corriam para todos os lados. Muitos queriam lutar e estavam se dirigindo para os andares inferiores. Outros, em especial alguns mais jovens, seguiam pela mão de mães, pais e irmãos mais velhos para lugares considerados mais seguros. Foi com dificuldade que ela atingiu a sala no quarto andar torcendo para que seu pai e os irmãos ainda estivessem lá. Antes de entrar, escondeu a Firebolt atrás da estátua de uma bruxa que olhava maldosamente para uma maçã. Os que estavam na sala pareciam estar se preparando para sair. Ela tinha que ser rápida.

Chegou ao lado do pai que ainda estava sentado e deu-lhe um abraço e um beijo no rosto. Artur a fitou intrigado, mas acabou sorrindo e perguntando se ela tinha descansado durante a tarde. Gina confirmou. Depois, de forma displicentemente estudada, aproximou-se da cada um dos irmãos que estavam por ali e os abraçou, com a desculpa de desejar boa sorte. Queria se despedir, mas também não queria que nenhum deles ficasse no seu pé. Apenas Carlinhos a segurou um pouco mais de tempo.

– O que está pretendendo fazer, baixinha? – Perguntou entre severo e carinhoso.

– Vou ficar com a mamãe na ala hospitalar. Precisarão de gente lá para fazer a segurança dos feridos – sustentou com o olhar mais sincero que conseguiu, embora estivesse odiando a mentira. Ainda mais porque Carlinhos quase sempre a pegava. Sempre fora o mais difícil de enganar. Resolveu mudar de assunto para que o ruivo parasse de encará-la. – Você tá legal?

Deu certo. Carlinhos a soltou com uma expressão triste.

– Não – disse sinceramente – mas tenho que ficar vivo, não é?

– Claro que tem. A Ana me deixou encarregada de vigiá-lo. Você não tem permissão nem para se arranhar, viu moço?

O irmão mais velho riu. Gina disse que precisava ir e saiu calmamente da sala. No corredor, pegou a vassoura e disparou como uma flecha para a ala hospitalar. Chegou na porta e escondeu de novo a Firebolt atrás das cadeiras que ficavam próximas à porta da enfermaria. Antes de entrar, fez uma prece para que os sentidos aguçados da Sra. Weasley estivessem enferrujados ou embotados por outras preocupações. Vestiu uma expressão angelical tomando cuidado para não parecer entusiasmada e dirigiu-se direto para a cama de Jorge. Molly estava sentada numa cadeira ao lado parecendo encantada em observar Alicia ajeitar os travesseiros do convalescente. O rapaz a olhava de um jeito malicioso e Gina teve certeza que ele estava muito bem e louco que a mãe fosse arranjar o que fazer.

Gina seguiu o mesmo roteiro. Beijou e abraçou a mãe e o irmão tentando fazer o gesto parecer natural. Quando lhe perguntaram aonde ela iria respondeu que tinha combinado que ficaria perto do pai, com Gui, Carlinhos e Fred. Molly Weasley a olhou desconfiada, mas Gina sustentou, cruzando os dedos nas costas, torcendo para a mãe se convencer. Por fim, a senhora assentiu e recomendou que ela tivesse cuidado. Gina saiu bem rápido. Não queria que os dois percebessem que ela estava quase chorando. Doía muito o que estava fazendo, e tomara que desse tudo certo, mas queria ter certeza que sua família soubesse que ela os amava muito. Estava bem menos leve quando pegou mais uma vez a Firebolt e se encaminhou para a torre de Astronomia.

Quase tinha chegado, quando viu a porta da escadaria da torre ser aberta por Rony e Hermione. Gina também queria se despedir dos dois, mas se a vissem ali, com a vassoura do Harry nas mãos, todo o seu plano iria por água a baixo. Não tinha escolha, escondeu-se rapidamente atrás de um pilar do corredor até que os dois passassem.

Quando sumiram de vista, ela subiu o mais silenciosamente que pode. O ar frio da noite atingiu o rosto quente e corado pela correria. Gina sentiu um aperto na boca do estômago. Dava para sentir: o ar estava saturado de mágica poderosa. Ela se aproximou do balcão, mantendo a Firebolt firmemente próxima ao corpo e esperou.

Na verdade, não foi uma espera longa. Tão logo o sol desapareceu no horizonte a batalha teve início. Lamentou que dessa vez não poderiam contar com os dragões de Carlinhos, seria arriscado com a floresta tão próxima, além de que seria mais difícil acertar somente os inimigos numa batalha campal. As proteções mágicas do castelo resistiram, mas não muito tempo. Gina observou que um grupo de vultos imensos pareceu ser detido antes de entrar nos portões da muralha que contornava o castelo. Barrando-os, ela reconheceu Hagrid, Groupe, Madame Máxime e mais uns 5 vultos igualmente descomunais, os poucos gigantes que Hagrid conseguira recrutar. Junto a eles estava o mais improvável grupo de aliados que Gina poderia imaginar. Um grupo de centauros armados de arcos e fundas (que eram especialmente eficazes para atacar gigantes) parecia ter achado que a extraordinária e agourenta conjunção entre Marte, Saturno e Plutão, a tríade maléfica dos céus, exigia, ao menos naquela noite, sua intervenção junto aos humanos. Continuavam achando que a humanidade não valia a pena, mas tinham a consciência que Voldemort não era mais apenas um problema dos bruxos.

Gina viu quando os portões do castelo foram abertos e um exército de bruxos saiu dele indo enfrentar o imenso grupo de vultos mais baixos que avançava pela entrada, após ter passado sob as pernas dos gigantes. A garota engoliu em seco tentando conter as lágrimas. Nem queria pensar em quantos amigos poderia perder naquela noite, apenas pedia que fosse o menor número possível. Puxou do bolso interno da capa que vestira sobre o jeans e o suéter um oinióculo e passou a buscar por Harry. Ele parecia ainda não ter saído do castelo. Gina localizava a maior parte de seus amigos e parentes já travando duelos, inclusive Rony e Hermione, mas nem sinal de Harry Potter.

Foi então que ela viu. Lord Voldemort em pessoa caminhava lentamente entre os combatentes. Seu rosto desfigurado estava pleno de satisfação. As longas vestes oscilando no vento lhe davam um aspecto majestoso e espectral. Ele parecia divertir-se com o inferno que se instalara a sua volta, mas não parecia estar disposto a lutar. Procurava quase que entediado por alguma coisa, mais provavelmente, alguém. Quase instintivamente Gina virou o oinióculo para uma porção de terreno mais próxima ao castelo. Lá estava Harry. Ele caminhava decidido em direção a Voldemort. A mão direita empunhando a varinha e na esquerda ele carregava... Gina ajustou a visão do oinióculo... não podia ser...mas parecia... Pelas barbas de Mérlin, era uma... GOLES!!! O que é que o Harry queria com uma goles? Parecia um absurdo... Gina gelou. Percebeu em pânico o que o garoto poderia estar prestes a fazer. Praguejou em voz alta no mesmo instante em que montava na vassoura e dava impulso para ela alçar-se ao ar.

Já tinha apontado o cabo da Firebolt para baixo, iniciando um mergulho quase vertical, quando viu Harry tocar a goles com a varinha, o que a fez tremer e iluminar-se por um instante. O garoto deu um sorriso e jogou a goles o mais alto que pode, em seguida apontou a varinha para si mesmo e desapareceu. Ele não havia aparatado, não podia. A cabeça de Gina gritava enquanto o vento zunia cada vez mais rápido em suas orelhas, mas tinha certeza de que a goles era uma chave portal para onde quer que ele tivesse ido. Ouviu os gritos de Rony e Hermione. Viu quando o cara de cobra deu uma gargalhada fria e se aproximou da goles. “Mais rápido”, suplicou como se a vassoura pudesse atendê-la. Voldemort tocou na goles e também desapareceu. Gina nem ao menos prestou atenção na reação das pessoas que haviam notado o que estava acontecendo. Viu apenas que Rony e Hermione continuavam a correr para a chave-portal e que sem pensar os dois tocaram nela ao mesmo a tempo e sumiram. Gina gemeu, o corpo grudado ao cabo da vassoura numa reta alucinada em direção ao chão. Estava bem perto agora, só uns segundos, esticou a mão e ergueu levemente o cabo. Um pouquinho mais. Tomara que ainda esteja aberta. Quase lá. Ouviu um grito muito perto que dizia seu nome. Só a pontinha do dedo, só a pontinha...

Houve mais um clarão e Gina Weasley desapareceu em frente aos olhos desesperados de Carlinhos e Jorge.



>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>><<<<<<<<<<<<<<<<<<<<<<<<<<

Beijos Mil!!!
COMENTEMMMMMM!!!!!!!!!
Até o próximo!

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.