Capítulo Sete – O Caminho Mais

Capítulo Sete – O Caminho Mais



Capítulo Sete – O Caminho Mais Fácil É Para Baixo


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Nota da tradutora: (Na verdade isso é quase um texto. Muito semelhante ao da Venus. -_-‘) Se vocês ainda não entenderam o final dessa sinopse, não se apavorem, ele se auto-explicará (isso é uma palavra?) depois. Bem, acho que alguns de vocês já sabem que a Venus não pôde continuar como tradutora, então me designou para ser sua *cofcof* aprendiz. Enfim, queria que vocês soubessem que a oportunidade de traduzir DS é uma honra a qual eu devo a Venus e, é claro, à Cassie. Mandem um feedback pra elas porque elas merecem... Agora que eu estou de férias, vou tentar acelerar o processo mais ainda. Agradeçam também à Paty, Mary, Cin e Vênus, as melhores co-tradutoras que eu conheço. ;) Ah! E antes de DS7 sair, entraram para o time mais duas garotas: a Isa e a MC. Mandem feedback prelas tb! :D Se perceberem algum erro, não hesitem em me avisar que eu conserto quando postar o próximo capítulo, ok? As palavras em itálico são sonhos, pensamentos e ênfases... Divirtam-se! Outras notas estão no fim do capítulo... Mais uma coisita: infelizmente eu não consegui mts desenhos presse capítulo. Mas eu prometo que compenso no próx.. ;) Desenhos por LMRourke.

***

- Enervate – Gina sussurrou, e os olhos de Hermione se abriram. Por um momento ela parecia entorpecida, seus olhos refletindo as estrelas e a luz da lua, então ela se sentou e segurou-se em Gina. Surpresa, Gina quase caiu, mas abraçou-a de volta. – Está tudo bem, você está bem. – ela disse.

Hermione continuou segurando em seu braço, e Gina viu que, no fim das contas, o brilho nos seus olhos não era o céu noturno refletido, e sim lágrimas.

- Ele se foi?

Gina repetiu sem ânimo.

- Ele se foi.

Hermione soltou o braço de Gina. Várias emoções passaram rapidamente pelo seu rosto: esperança, sofrimento, anseio, confusão. Gratidão.

- Eu estou feliz que ele se foi. – Hermione disse ardentemente.

- Certo – disse Gina, se levantando e estendendo uma mão para puxar Hermione depois dela. – Vamos lá, levante-se.

- Certo. – Hermione disse, e segurou uma fungada. Ela levantou sua mão para pegar a de Gina e perguntou – Ele disse alguma coisa? Você o viu antes dele partir?

Gina suspirou.

- Não exatamente...

- Deixa pra lá. – Hermione disse, rapidamente. – É melhor eu não saber.

Gina segurou a vontade de falar duramente com Hermione, que estava começando a parecer lacrimosa novamente. Era estranho, ela pensou, Hermione sempre tinha sido não só a mais velha, mas também tão compenetrada, competente, e controlada que Gina sempre teve um pouco de ciúmes. Agora que ela parecia ter sido reduzida a uma ruína do que tinha sido, Gina encontrou-se sentindo menos ciúme e mais desespero para ter a antiga amiga de volta. A antiga Hermione saberia o que fazer. Essa aqui só queria sentar no chão e chorar por causa de Draco. Gina pensou que se Hermione dissesse mais uma coisa sobre Draco ela a sacudiria até o seu cabelo encrespar novamente.

Ela ajudou Hermione a se levantar no momento que Harry e Rony explodiram do meio dos arbustos para dentro da clareira. Ambos os garotos estavam sem ar e cobertos por folhas e gravetos. Rony falou primeiro.

- Hermione, você está bem, nós ouvimos você gritar...

- Eu estou bem. – Hermione disse, virando-se para olhar para eles. – Estou bem.

Gina viu o olhar de pânico no rosto de Harry ser substituído rapidamente por alívio, que depois foi substituído por outra coisa: um olhar meio vazio e parado. Ela olhou rapidamente para Hermione, que não estava olhando para Harry e tinha perdido a interação de emoções em seu rosto. Então ela olhou de volta para Harry. Porque Draco nunca olha para mim da maneira que ele olha para ela?, ela pensou de repente. Não é justo.

- Cadê o Malfoy? – Rony perguntou.

- Ele se foi. – Hermione disse, em uma voz fina. – Saiu voando.

Rony xingou, e chutou o tronco de uma árvore.

Harry balançou a cabeça.

- Eu não acredito que você simplesmente o deixou ir. – ele disse, não olhando para Hermione, mas obviamente falando com ela.

A expressão de Hermione tornou-se sombria.

- Como eu acho que o enorme galo se formando rapidamente na minha cabeça pode atestar: – ela disse em sua voz mais fria. – eu não o deixei ir.

- Ainda assim ele foi, – Harry disse, encarando-a. – não foi?

Hermione encarou de volta.

Rony olhou de Harry para Hermione, então revirou os olhos.

- Ah, sim, vamos começar a discutir um com ou outro sobre de quem é a culpa por Malfoy finalmente ter se mandado, como ele vinha tentando fazer o dia todo de qualquer forma. Isso vai ser produtivo.

- Esperem! – Gina exclamou ansiosamente, e virou-se para Hermione. - O feitiço... nós podemos usá-lo para achar Draco!

Hermione balançou a cabeça.

- Ele o levou com ele.

- Ele levou? – Rony ecoou, incrédulo. – Por quê? Por que ele faria uma coisa estúpida como essa?

- Eu acho que é bastante óbvio porque ele levou. – disse Harry, parecendo exausto. – Ele não quer que nós o encontremos.

Gina sentiu seu coração se contrair.

- Mas nós temos que encontrá-lo. – ela disse, numa voz tremida. – Ele está com problemas.

- Eu acho que você está misturando estar com problemas com simplesmente ser um problema. – disse Rony, mas sem muito rancor.

Harry estava parecendo desesperado.

- É melhor nós irmos falar com Sirius.

Mas ao chegarem na biblioteca, Sirius e Lupin tinham ido embora. Narcisa, sentada atrás da mesa e parecendo terrivelmente esgotada e preocupada, explicou o que tinha acontecido com Dumbledore e Fudge no caminho para a Mansão. A pronunciamento oficial do Ministério tinha dito apenas que dementadores eram suspeitos no ataque. Fudge estava morto; Dumbledore estava em condições sérias. O Ministério tinha indicado que, antes de ficar inconsciente, Dumbledore tinha requisitado a presença de Sirius.

- Eles aparataram para o São Mungos. – Narcisa disse, parecendo estar tentando esconder o quão infeliz ela se sentia. Seus olhos passaram do rosto de Harry para o de Hermione. Com muita calma, ela perguntou – Onde está Draco?

Ouve um silêncio rápido. Então Harry disse:

- Ele foi embora. Eu realmente sinto muito. Nós tentamos... – ele parou e olhou para baixo, escondendo sua expressão, mas Gina sentiu o quão infeliz ele estava. – Eu realmente sinto muito. – ele disse novamente.

Narcisa mordeu seu lábio. Ela estava muito pálida.

- É melhor eu garantir que eles informem Sirius. – ela disse, se levantando e indo rapidamente até a lareira. Ela pegou um punhado de pó do seu bolso e jogou nas chamas, que brilharam roxo brevemente.

Gina a ouviu dizer ‘Hospital São Mungos, por favor’ antes de se virar para Rony e Harry. Harry tinha seus braços cruzados sobre o peito e parecia tanto furioso quanto infeliz. Rony estava dando tapinhas em suas costas distraidamente.

- Sirius vai ficar fulo da vida. – Harry disse, melancolicamente.

- Você acha que Draco vai ficar bem? – perguntou Gina, também estendendo a mão para dar tapinhas no braço de Harry.

Ele olhou para ela, e ela o viu tentando sorrir.

- Eu não sei, Gin. – ele disse, e parecia que estava prestes a dizer algo mais quando seus olhos se direcionaram para o lado. Gina virou-se para ver uma luz fraca no ar quando Anton, um dos fantasmas da família Malfoy, passou calmamente pela parede. Ele cintilou gentilmente para dentro do aposento, tornando-se mais sólido e menos transparente enquanto o fazia, e pausou perto de Narcisa.

- Madame, – ele disse – temos convidados lá embaixo.

Narcisa virou-se do fogo e o olhou com olhos surpresos.

- Quem são?

Anton limpou sua garganta transparente e disse.

- Molly e Artur Weasley.

Rony e Gina olharam um para o outro, horrorizados.

- Mamãe e papai? – Rony gemeu. – Eu esqueci que eles estavam vindo!

***

Fora de um sonho de dragões, Carlinhos Weasley acordou de repente, sentando-se ereto na cama com uma estranha inquietação. De onde essa inquietação se originou, ele não poderia dizer. Não era exatamente uma ansiedade nascida de qualquer coisa racional, mas algo o estava perturbando, inquieto no fundo de sua mente; algo, ele sabia, que não ia deixá-lo descansar até que estivesse resolvido.

- Droga. – ele xingou levemente, e girou as pernas sobre o lado da cama, buscando pelas roupas que ele havia separado para usar no dia seguinte (um hábito enraizado nele por sua mãe bem organizada) e as colocou apressadamente. Então pegou sua varinha da mesa perto de sua cama e, murmurando Lumos, saiu de sua tenda.

Carlinhos seguiu a luz da sua varinha através do campo, escuro e silencioso à essa hora, além das últimas tendas e para a arena dos dragões. O campo estava calmo, mas uma leve palpitação de inquietação vibrou no estômago de Carlinhos. Dragões dormiam de pé, olhos fechados e cabeças encostadas juntas. E eles deveriam estar dormindo à essa hora, o cercado que os segurava silencioso e escuro, mas ao invés disso estava banhado em uma leve luz bronze: a luz refletida dos olhos abertos de cerca de oito dragões, que estavam acordados no centro do cercado.

Carlinhos moveu-se o mais perto que podia para a parede de feitiços de segurança que cercavam a arena dos dragões e a encarou. Através de seu brilho leve, como neblina quente, ele podia ver dentro do cercado.

Seu coração se contraiu.

Havia alguém dentro da arena dos dragões.

Com a boca seca, Carlinhos procurou por sua varinha e começou a murmurar freneticamente os encantos que criariam uma abertura nos feitiços de segurança grande o suficiente para ele engatinhar através dela.

- Alohomora...pariei transe...

A abertura rachou-se em sua frente e ele se jogou através dela, rolou, e se pôs de pé, encarando ao seu redor. Sua boca parecia ter sido enchida de algodão. Era completamente contra as regras, assim como todo bom-senso para qualquer pessoa entrar na arena dos dragões sozinho e desprotegido. Dragões eram indomáveis, maus, e dada a oportunidade, iriam comer alegremente até o bruxo que os alimentava.

Sussurrando um encanto de proteção, Carlinhos começou a andar vagarosamente até o centro do cercado, movendo-se tão calmamente quanto a ansiedade e o completo terror permitiam. Ele podia ver o intruso mais distintamente agora, podia ver mais claramente um esboço de braços e pernas e cabelos claros cinza-louro...

Draco.

Carlinhos botou uma mão sobre a boca para impedir-se de gritar o nome de Draco.

O que diabos ele está fazendo? Tentando se matar?

Apesar de seu assombro, os pés de Carlinhos continuaram a se mover, carregando-o para mais perto do centro do cercado e para mais perto de Draco. Carlinhos podia vê-lo claramente agora na luz da lua, clara e prateada. Ele parecia estar simplesmente de pé, parado no centro do círculo de dragões, que se levantavam acima dele como estátuas que respiravam, suas escamas transbordando de luz das estrelas. Ele tinha suas mãos nos bolsos de suas calças de couro (minhas calças, pensou Carlinhos com irritação irracional) e estava se balançando sobre seus calcanhares, sua cabeça jogada para trás, olhando para as criaturas enormes que se erguiam acima dele como se não fossem nada mais que formações rochosas extremamente altas e extremamente interessantes.

Carlinhos prendeu sua respiração enquanto entrava no círculo de dragões e andava até Draco. Ele colocou uma mão no ombro do garoto, rezando para que ele não gritasse de surpresa.

Draco não gritou. Ele também não pulou ou pareceu surpreso, apenas virou-se e olhou para Carlinhos com olhos grandes, escuros e sem curiosidade.

- Olá, Carlinhos. – ele disse, em um tom perfeitamente normal.

- Olá para você. – Carlinhos falou com voz rouca, e segurou o braço de Draco.

Usando os músculos que surgiram de carregar equipamentos pesados todos os dias, ele puxou o garoto para si, segurou-o pelo estômago, e o arrastou para trás.

Para sua surpresa, Draco resistiu muito pouco enquanto Carlinhos o carregava para longe dos dragões, que assistiam com o que parecia ser distante interesse. Eles alcançaram a rachadura nos feitiços de segurança e Carlinhos entrou nela, puxando Draco atrás de si pelo braço. Uma vez que tinham passado, ele soltou o braço do garoto e o empurrou o mais forte que podia contra a árvore mais próxima.

A parte de trás da cabeça de Draco bateu no tronco da árvore com uma força que parecia que devia ter doído, mas ele não mudou de expressão, apenas levantou sua mão esquerda e friccionou sua garganta.

- Oi, Carlinhos. – ele disse calmamente.

- ‘Oi, Carlinhos?’ O que diabos você está fazendo aqui, Draco? Para ser mais direto, o que diabos você estava fazendo?

- Eu queria ver os dragões. – Draco disse, nada perturbado. – Eu queria vê-los mais uma vez.

- Você queria ver os dragões? Bom Deus, você não pode inventar algo melhor que isso? Se você queria ver os dragões porque não ficou do lado de fora dos malditos feitiços de segurança e olhou para eles?

- Eles não me machucariam. – disse Draco, ainda estranhamente calmo. Então ele sorriu. – Mas eu sei não quanto a você...

- Eles não o machucariam? Você é simplesmente uma lancheira ambulante para eles, seu garoto estúpido. Você é como um sanduíche sobre pernas. Deus, se eu não tivesse acabado de acordar, eu mesmo bateria em você até lhe transformar numa polpa por tentar algo como aquilo. Sorte sua que eu estou muito cansado.

- Não deixe esse detalhe o incomodar. – Draco disse. – Que tal você simplesmente levantar seu punho e eu correr na direção dele com meu rosto? Poupe sua energia.

- Muito engraçado.

Draco lhe deu um sorriso angelical.

- Eles pareciam que iam me machucar?

Carlinhos encarou Draco, não querendo realmente responder aquilo. Ele parece diferente, ele pensou de repente. Fisicamente ele ainda era o mesmo, é claro, mas havia algo – como uma luz dentro dele que tinha sido acesa, algo que queimava através de sua pele como a luz de uma lâmpada através de uma sombra. O ar ao seu redor parecia estalar com eletricidade reprimida.

- Uh... – Carlinhos disse, sentindo-se de repente ainda mais preocupado. – Draco, você está se sentindo bem?

O sorriso de Draco não enfraqueceu.

- Eu me sinto bem. - ele disse, tirando suas mãos dos bolsos e olhando para elas como se fossem estranhos objetos extraterrestres. – Eu sinto como seu eu pudesse fazer qualquer coisa. Qualquer coisa mesmo. Eu pareço diferente?

- Não. – disse Carlinhos decididamente – Você parece cansado, isso é o que você parece. Você parece acabado. Quando foi a última vez que você dormiu?

- Dormir? – Draco disse, e agora havia uma fraca nota de alarme em sua voz. – Uma boa noite de sono, oh, eu não tenho uma dessas faz tempo. Talvez duas semanas.

Carlinhos suspirou.

- O que você precisa, meu garoto, é dormir. Você pode ficar com o sofá na minha tenda; eu lhe darei alguns cobertores, e nós mandaremos uma coruja para Sirius de manhã...

- Não. – Draco interrompeu bruscamente, seu sorriso desaparecido agora.

- Não o quê?

- Não, eu não preciso dormir no seu sofá. Dormir é a última coisa que eu preciso. Eu não quero sonhar – eu não posso sonhar. Mais um vai acabar comigo.

Carlinhos piscou, confuso.

- Mais um o quê?

- Mais um sonho. – Draco tinha começado a andar para longe do cercado, na direção das árvores. – Você não entenderia.

- Olhe aqui, – Carlinhos disse, procurando e segurando a manga de Draco, virando-o para que eles pudessem ficar frente a frente. – que tipo de pílulas você tomou? Azul, vermelha ou verde? Oh, ou você tomou a do tipo parecido com um doce com as cores do arco-íris? Jorge tomou uma dessas uma vez e passou uma semana achando que ele era uma motocicleta.

- Eu não acho que eu sou uma motocicleta. – Draco disse irritado. – Olha, você poderia largar a minha jaqueta? Eu estou perfeitamente bem.

- Você não está bem. – Carlinhos disse decididamente, embora ele tenha soltado o braço de Draco. – Você praticamente se matou. E essa é minha jaqueta.

- Oh, o quê, você quer de volta agora?

- Não, eu não quero de volta. Eu quero que você pare de ser um completo imbecil, volte para a tenda e durma um pouco. E coma alguma coisa. E talvez fazer uma lavagem estomacal. Você não parece bem.

- Mas eu me sinto bem. – disse Draco, abrindo exageradamente seus olhos cinza-pretos. – Eu me sinto ótimo. Eu sinto como se pudesse fazer qualquer coisa. Eu poderia voar, eu poderia montar um dragão, eu poderia... – ele se interrompeu e olhou para Carlinhos decididamente. – O que você diria se alguém lhe oferecesse poderes que lhe permitiriam a você governar todo o mundo mágico?

- Eu diria que governar o mundo não é tão bom quanto parece ser. – Carlinhos disse gentilmente. – Longas horas, acenando para as pessoas o tempo todo, nunca o seu próprio chefe...

- E agora com a zombaria.

- Eu não estou zombando de você – disse Carlinhos, calmamente. – Eu estou preocupado com você. Tentando ser comido pelos dragões, me perguntando coisas malucas; eu sei que você tem passado por muita coisa ultimamente, mas...

- Você não sabe. Nem mesmo eu sei. Eu nem posso acreditar que eu estou confuso sobre isso. De um lado, morte certa. Do outro lado, poder e vida eterna e todos os meus desejos realizados. Eu poderia ser jovem e bonito eternamente. Nem todo mundo pode dizer isso. – ele olhou para Carlinhos e balançou sua cabeça. – Eu odeio o Harry. Isso é tudo culpa dele.

- O que diabos tem tudo isso a ver com o Harry? – Carlinhos disse, exasperado. –Tudo bem, isso é o bastante. – ele pegou o pulso de Draco, com a intenção de puxar o garoto para longe de sua vassoura – e respirou fundo, em surpresa. Sem pensar, ele exclamou. – O que aconteceu com você?

A cabeça de Draco se levantou, seus olhos se estreitando.

Carlinhos podia sentir o sangue correndo no pulso que ele segurava, sangue frio, embaixo de uma pele ainda mais fria – alguém com uma temperatura corporal tão baixa deve estar morrendo, ele pensou.

Draco olhou para ele, e seus olhos mostravam ansiedade, mas nenhuma surpresa.

- Eu lhe machuquei?

- Você está congelando. – Carlinhos disse. – Como gelo… você está doente?

- Está acontecendo rápido, – disse Draco – não está?

Carlinhos apenas o encarou.

- Eu tenho que ir. – Draco disse, puxando seu pulso de volta. Carlinhos permitiu que o fizesse. – Não conte a ninguém que eu estive aqui.

- Draco – Carlinhos disse, tentando soar paciente. – Eu não posso fazer isso. Você praticamente se matou hoje, não percebe isso?

Draco olhou para Carlinhos, a luz da lua liberando faíscas brancas e geladas de seus olhos. Ele disse:

- Não me force a fazer você esquecer que me viu.

Carlinhos piscou.

- Eu preferiria – ele disse vagarosamente, sem muita certeza que estava falando a verdade, mas querendo que fosse a verdade – que você não fosse embora.

- Você sabe que eu posso fazer isso. – Draco disse, como se Carlinhos não tivesse falado. – Prometa-me.

- Eu... – Carlinhos limpou sua garganta, sentindo-se de repente tanto transtornado quanto inquieto. – O que o faz acreditar que eu manteria uma promessa como essa?

- Você é um Weasley. – Draco disse, elevando sua Firebolt. – Você não mentiria.

- Tudo bem... – disse Carlinhos. – Eu prometerei. Com uma condição.

- O quê?

- Deixe-me pegar comida e uma muda de roupas para você, pelo menos.

Draco olhou para ele sem expressão por um momento, antes de concordar com a cabeça. Carlinhos correu até sua tenda, sua mente correndo ainda mais rápido que seus pés. Alguma coisa muito estranha está acontecendo, ele pensou, enquanto ele jogava juntas uma pequena trouxa de comida e algumas roupas: alguns jeans e uma pilha de suéteres; o garoto estava obviamente congelando. Mas é junho, disse uma voz no fundo de sua cabeça. Por que ele está tão frio?

Ele estava quase certo que Draco teria ido embora quando ele voltasse, mas ele ainda estava lá, uma calma e estranha pilha de roupas escuras e cabelos pálidos e bagunçados, sentado ao pé da árvore, segurando sua Firebolt no seu colo como se fosse uma arma.

Carlinhos parou e o encarou.

- Draco, – ele disse – cadê a espada? O Sirius a pegou ela?

- Eu a dei. – disse Draco, levantando-se e dando a Carlinhos um sorriso que ia lhe dar pesadelos por muitos anos. – Ela voltará. Está comigo agora, mesmo quando não está comigo. – Com cada afirmação sem sentido ele estendeu os braços e pegou o pacote de roupas e comida das mãos sem resistência de Carlinhos.

- Tenha cuidado. – Carlinhos disse, percebendo o quão inadequado aquilo soava. – Volte se você precisar...

- Obrigado, Carlinhos. – Draco interrompeu, subiu em sua Firebolt, e foi embora.

Carlinhos estava ao mesmo tempo triste e contente de vê-lo partir.

*******

Lupin seguiu Sirius ao longo do corredor lotado no Hospital St. Mungos para Doenças e Acidentes Mágicos. Quando se aproximaram do quarto onde haviam sido informados que Dumbledore estava, eles viram uma multidão de pessoas reunidas lá. Repórteres – Lupin reconheceu as vestes amarelo-banana e óculos cintilantes de Rita Skeeter –, médicos, e burocratas do Ministério parcialmente histéricos se agitando como formigas.

Sirius e Lupin se espremeram através do nó de pessoas, apenas para serem parados na porta por um medibruxo de jaleco branco, usando óculos e uma expressão incômoda. Ele estendeu um braço para impedir o progresso dos dois.

- Essa área é proibida.

Sirius cruzou os braços sobre o peito e encarou.

- E quem é você?

O medibruxo parecia insultado.

- Eu sou Dr. Simon Branford. Eu sou encarregado deste andar e esse quarto é proibido para todos exceto...

- Eu sou Sirius Black. – Sirius interrompeu. – Eu fui enviado. Pelo Ministério.

- Você é Sirius Black? – o medibruxo abaixou seu braço, olhando de esguelha para Sirius. Houve um tempo quando o rosto de Sirius tinha sido familiar para toda a comunidade bruxa, mas é claro que ele parecia muito diferente agora. – É melhor você entrar. – ele disse – Nós estávamos a sua espera.

Sirius estava prestes a dizer algo rude quando Lupin interrompeu apressadamente.

- Obrigado – ele disse ao médico, que balançou a cabeça em entendimento e rapidamente abriu a porta, guiando Sirius para dentro, na sua frente. Dr. Branford entrou depois dele, e Lupin o seguiu.

Eles se encontraram em um corredor estreito, com uma única porta levando para fora dele.

- Há duas coisas que eu preciso lhes falar. – disse o médico, virando-se para olhar Sirius e Lupin. – Uma é que sua mulher mandou uma mensagem para o nosso Administrador para eu dar a você. – ele olhou duvidosamente para Sirius, que não se incomodou em corrigi-lo em relação a Narcisa, apenas levantou uma sobrancelha. – Ela disse que Draco foi embora e que eles não sabem onde encontrá-lo. Eu suponho que isso significa alguma coisa para você?

- Sim. – Sirius disse, um pouco rápido, e trocou um olhar rápido com Lupin – Isso significa algo para mim.

- A segunda coisa – continuou o medibruxo. – É que o professor Dumbledore está em um estado que nós chamamos de coma mágico. Apenas um número limitado de mágica pré-aprovada pode ser realizada na presença dele. Por favor, mantenham suas varinhas em seus bolsos. Entendido?

Lupin e Sirius concordaram com a cabeça e seguiram o Dr. Branford através da única porta, para dentro de um quarto de hospital médio com paredes de pedra brancas e limpas. O móvel central do aposento era uma cama grande na qual estava deitado Alvo Dumbledore, uma coberta branca puxada até seu tórax, seus olhos fechados. O coração de Lupin se contraiu ao ver o quão velho e indefeso ele parecia. Sirius estava ao lado da cama, suas mãos entrelaçadas, seu rosto sem expressão. O médico, segurando seu prontuário e parecendo muito infeliz, ficou de pé ao lado de Sirius.

Lupin aproximou-se do centro do aposento, os nervos ao longo de sua espinha formigando. A aura de Magia Negra, fraca, mas palpável, pairava sobre a cama e sobre o homem de aparência frágil que ali estava deitado. Lupin olhou para o médico.

- Ele vai morrer?

- Nós não sabemos. Ele não está morrendo agora. Não exatamente. Ele está em coma. Seus sinais vitais estão estáveis, mas ele não pode ser acordado, nem responde a estímulos...

- O que aconteceu com ele? – Sirius interrompeu, sem tirar seus olhos de Dumbledore. – A carta dizia dementadores. Mas Dumbledore poderia ter dado conta de dementadores. Havia algo mais?

- Uma observação muito astuta, Black. – veio uma voz sarcástica da porta.

Lupin e Sirius viraram, e encararam, Lupin com assombro e Sirius com horror.

Era Severo Snape.

Ele não havia mudado desde a última vez que Lupin o tinha visto, há três anos, no Salgueiro Lutador, em Hogsmeade. O mesmo rosto pálido, dominado por olhos encobertos e uma expressão amarga. Ele usava vestes pretas engomadas, o braço esquerdo amarrado com a faixa verde que o marcava como Diretor da Casa da Sonserina, o direito enfaixado com a amarela que significava que ele estava em assuntos do Ministério. Lupin viu os olhos de Sirius fazerem um movimento rápido em direção ao braço de Snape e soube que ele também tinha notado.

- Professor Snape. – disse o medibruxo, soando aliviado.

Snape passou direto por todos eles sem lhes dar nem mesmo um olhar, sentou-se em uma das cadeiras ao lado da cama de Dumbledore, e começou a remover itens dos bolsos de suas vestes – Lupin viu rapidamente um morteiro e um pilão, um saco do que poderia ser casca de besouros, e algum tipo de frasco.

Sirius imediatamente sentou-se em outra das cadeiras, e encarou o Mestre de Poções.

- O que você está fazendo aqui, Snape?

- Assuntos do Ministério, obviamente. – Snape olhou para Sirius com suave malícia. – Eu acho que a pergunta é, o que você está fazendo aqui?

- O Ministério também me procurou. - Sirius respondeu bruscamente – Dumbledore estava indo me ver quando ele foi atacado. Eu acredito que eles pensaram que eu poderia iluminar um pouco a situação.

Snape olhou para o médico, que concordou com a cabeça.

- Talvez ninguém lhe contou. – disse Snape, que tinha começado a fazer algo com seu morteiro e pilão que Lupin não conseguiu definir bem; os gestos de Snape eram escondidos pelas volumosas mangas de suas vestes. – Dumbledore estabeleceu com o Ministério ano passado que se algo desfavorável viesse a acontecer com ele, eu deveria estar encarregado da investigação dentro das circunstâncias. Ele me deu instruções estritas, as quais estou seguindo. – ele lhes deu um sorriso fino. – Eu acredito que vocês não estão planejando em desafiar a autoridade dele nesse assunto?

- O que aconteceu com Fudge e Dumbledore? – perguntou Lupin, tentando manter a suspeita e hostilidade fora de sua voz. – Nós ouvimos falar que dementadores...

- Fudge está morto. Você sabe disso, é claro. Eles estão no processo de escolher um novo Ministro nesse exato momento. E não foram dementadores. Ou pelo menos, não foram somente dementadores. Eles foram atacados por o que pareciam dementadores, mas o Ministério acredita que eles eram na verdade bruxos disfarçados. E um deles, pelo menos, era muito poderoso.

- Então quem era? – Sirius disse bruscamente.

Lupin pôde ver, pelo leve tique nervoso no canto do olho de Sirius que sempre aparecia quando ele estava irritado, que ele estava forçosamente se contendo de investir no outro lado da cama e fisicamente arrancar as respostas que ele queria de Snape.

- Nós não sabemos – Snape disse. – É isso que eu estou aqui para descobrir.

- Descobrir através de quem?

- Através de Dumbledore. – Snape disse calmamente.

- Mas ele está... – Sirius estendeu uma mão na direção da forma propensa de Dumbledore, engoliu em seco, e disse – Ele está em coma. Não responsivo.

Snape deu a Sirius uma encarada velada.

- Talvez se você não estivesse sempre no mundo da lua na aula de Poções, – ele disse friamente – você teria uma idéia melhor de porque estou aqui.

O olho esquerdo de Sirius tremeu novamente, mais violentamente dessa vez.

- Idiota metido e inútil! – ele explodiu, olhando fulminante para Snape.

- Eu preferiria que você dispensasse os xingamentos. – disse Snape, olhando fulminante de volta – Não serve para propósito algum.

- E eu preferiria que você engasgasse até a morte com sua própria imbecilidade metida, mas nós nem sempre conseguimos o que queremos, conseguimos? – disse Sirius, ignorando os olhares dominantes de Lupin.

- Eu não acho que imbecilidade é uma palavra. – apontou Lupin calmamente.

- Oh, cala a boca, Aluado! – Sirius exclamou, estreitando os olhos, exasperado.

- Aluado? – as sobrancelhas de Snape se ergueram. – Vocês dois ainda se chamam pelos apelidos de infância? Que adorável, de uma maneira um tanto triste e retarda.

Lupin rapidamente foi para o lado de Sirius e pôs sua mão firmemente no ombro do amigo. Isso era em parte para mostrar seu apoio e em parte para lembrar Sirius que, se necessário, Lupin poderia segurá-lo e forçosamente impedi-lo de pular sobre Snape. No quinto ano da escola, Lupin tinha uma vez jogado Sirius através do Salão Comunal da Grifinória. Era fácil para seus amigos esquecerem o quão forte ele realmente era.

- Professor Snape, – disse Lupin calmamente – Nós todos estamos aqui pelo mesmo motivo. Vamos tentar impedir que isso se torne uma briguinha pessoal.

Snape o ignorou, ocupado em terminar seja lá o que fosse que ele estava fazendo com seu morteiro e pilão. Ele se virou agora, segurando em uma mão um frasco parcialmente cheio de líquido, e na outra um pequeno saco transparente de pó preto. Ele despejou o pó dentro do líquido, balançou o frasco muitas vezes, e olhou para cima.

- Muito bem, Lupin... – ele começou.

E foi interrompido por uma repentina onda de barulho vinda do corredor do lado de fora do quarto. Lupin, cuja audição era bastante sensível, pode distinguir uma mistura de vozes, todas falando ao mesmo tempo.

- Os repórteres. – disse Sirius sucintamente.

- Eu vou ver o que está acontecendo. – disse o médico, que parecia feliz frente a uma desculpa para sair de perto de Snape e Sirius por um tempo. Ele se safou para fora, ainda segurando sua prancheta.

Snape não percebeu sua partida. Ele tinha enrolado suas mangas volumosas para cima, e estava dobrado sobre Dumbledore, segurando o frasco. Inclinando-se para frente e pondo uma mão no ombro de Dumbledore, – um gesto curiosamente gentil, Lupin pensou – ele começou a despejar o conteúdo do frasco na boca não-responsiva de Dumbledore.

Os ombros de Sirius tentaram se livrar da mão de Lupin.

- O que você está fazendo?

Snape sentou de volta, segurando o frasco agora vazio e encarando a forma flácida de Dumbledore com olhos grandes e brilhantes.

- Apenas esperem.

Lupin encarou. Por um momento, não houve nada – então ele viu a tensão nos ombros de Snape se tornar mais aguda, ouviu Sirius ao seu lado arfar levemente em assombro. Pois o corpo de Dumbledore estava se movendo, as suas mãos se fechando em punhos, suas costas formando um arco. Uma pluma cinza de fumaça repentinamente explodiu do seu tórax e subiu, traçando trilhas de poeira prateada. Ao invés de se dissipar, a fumaça começou a se condensar e endurecer. Começou a esculpir-se em uma forma. Lupin viu olhos se formando, um nariz, uma boca, uma mecha de cabelo prateado, um par de óculos parcialmente transparentes. A forma fantasmagórica da cabeça de Dumbledore, seus ombros. Ela rodou levemente para poder vê-los e Lupin, estupefato com assombro, viu a boca meio transparente sorrir.

- Severo, – disse Dumbledore, olhando abaixo para Snape – Sirius. E Remo. Vocês estão todos aqui.

Snape olhou de relance para as expressões atônitas de Sirius e Lupin, e um sorriso tremeu no canto de sua boca.

- Nós estamos aqui, Diretor. Mas não temos muito tempo.

Dumbledore inclinou sua cabeça.

- Então vamos começar.

******

Narcisa pôs uma mão na boca.

- Seus pais – ela disse, virando para Rony e Gina, que pareciam que tinham levado um choque elétrico. Hermione podia ter jurado que o cabelo de Rony estava em pé com alarme.

- Mamãe e papai? – Gina suspirou, parecendo tanto surpresa quanto horrorizada. – Oh, eu aposto que eles vão nos matar.

Anton, o fantasma, parecia preocupado.

- Não haverá nenhum assassinato aqui. – Narcisa disse ativamente, e fez um gesto para dispensar Anton – Anton, vá e diga a eles que nós estamos indo. Rony e Gina, venham comigo. Harry e Hermione, vocês esperem aqui.

- Não – disse Harry, rapidamente – Eu vou com...

- Você vai esperar aqui. – disse Narcisa, numa voz dura como tiras de ferro. Com uma aparência extremamente imperiosa, ela rodou suas vestes ao seu redor, e começou a sair do aposento, empurrando Rony e Gina em sua frente como patinhos. Quando ela passou por Hermione, tirou uma mão das longas mangas e pressionou algo dentro da mão de Hermione. Hermione olhou para cima em rápida surpresa, viu Narcisa dar-lhe um meio-sorriso, e então ela e os Weasleys foram embora e Hermione ficou sozinha no aposento com Harry.

Ela olhou para ele e viu que ele estava com uma mão na mesa. Ele parecia estar cuidadosamente examinando um dos livros que ela e Rony tinham lido mais cedo, embora ela tenha notado que estava segurando-o de cabeça pra baixo. Não tendo certeza se devia falar com ele ou não, ela olhou para o objeto que Narcisa tinha posto em sua mão.

Era a carta de Snape.

Hermione sentou-se apressadamente numa poltrona próxima e encarou a carta. Era um rolo de pesado papel cor de creme, amarrado com uma fita verde e cinza.

- Harry – ela disse roucamente e segurou a carta onde ele pudesse ver – É a carta do Snape... sobre a poção.

Harry botou o livro para baixo com um ruído, mas não se moveu.

- Então abra. – ele disse, sem expressão.

Vagarosamente, ela puxou a fita e desenrolou a carta, examinando a página cheia com a letra familiar e espremida de Snape. Ela leu uma vez, daí novamente, com olhos arregalados.

Depois ela estendeu a carta para Harry pegar.

Ele andou ao redor da mesa vagarosamente e puxou a carta da mão dela, depois se retraiu para a distância de vários metros antes de abrir e lê-la. Ela observou enquanto os olhos dele examinaram a página, sabendo o que ele estava lendo lá:

Sr. Malfoy,
Considere-me impressionado que você escolheu passar suas férias de verão pesquisando poções obscuras e seus contra-feitiços. Dito isto, eu sugiro que você procure alguma outra poção para fazer seu projeto de pesquisa. Eu reconheço a poção em questão pela sua descrição, embora esteja confuso sobre onde você poderia ter encontrado uma referência a ela. É uma receita muito antiga, e bem ilegal; eu encontrei uma referência nos meus próprios materiais como sendo chamada a Poção Imperio ou alternativamente o Encanto Omnia Vincit - da expressão Latina que o amor vence tudo.
Quanto às reversões ou contra-feitiços não existe nenhum a não ser a morte ou do sujeito ou do objeto da afeição induzida. Explicado então, meu conselho é que você ache outra poção para o projeto. Entre em contato comigo se quiser ajuda com uma lista.
Cordialmente,
Professor Severo Snape.

Harry terminou de lê-la em silêncio, levantou sua cabeça, e piscou.

- É isso, então. – ele disse em uma voz descolorada.

Em um violento gesto não característico, ele amassou o papel em sua mão e jogou-o na lareira vazia. Então ele se virou. Ela podia ver a tensão em seus ombros enquanto ele andou através do aposentou e parou na frente da estante de livros, menos como se ele quisesse estar ali do que como se ele simplesmente tivesse perdido o interesse em continuar seu progresso através do aposento.

Ele estava debaixo dos vitrais, que jogavam um rico padrão de quadrados verdes e azuis através do seu rosto e de sua camisa branca. Ele olhou para cima e para ela e ela pôde ver a infelicidade em seu rosto; Harry, que sempre tinha sido uma pessoa naturalmente feliz.

É minha culpa, ela pensou amargamente.

Hermione ficou de pé, mas não se moveu na direção de Harry.

- Não é isso. – ela disse, sua própria voz parecendo fina aos seus ouvidos. – Harry, só porque Snape diz que não tem uma maneira de tirar a poção, não quer dizer que seja verdade. Eu tenho certeza que tem uma maneira. Tem que ter.

- Nem todo problema tem solução, Hermione. – ele disse, seu tom calmo cortando a raiva da sua voz. – Eu sei que isso pode ser difícil pra você acreditar.

- Eu não vejo porque nós deveríamos acreditar. Eu não vejo sentido em desistir.

Mas Harry parecia não estar ouvindo. Ele estava encarando um ponto vago acima da cabeça dela.

- Eu sinto sua falta – ele disse, a propósito de nada. – Eu já sinto sua falta e só se passaram algumas horas. Eu fico pensando, o quanto eu vou sentir sua falta amanhã, e no dia seguinte, e no dia depois desse? Porque eu não acho que vai melhorar. Eu acho que tem coisas que simplesmente não melhoram e essa é uma delas.

- Harry... - ela começou, andando em sua direção.

Ele estendeu uma mão para impedi-la.

- Não torne isso pior do que já é.

- Pelo menos me deixe explicar. – ela disse, tão rápido que as palavras quase tropeçaram uma sobre as outras. – Deixe-me explicar e pedir desculpas e essa é a última coisa que eu pedirei pra você, eu juro.

- Eu não quero um pedido de desculpas. Eu quero saber.

- O que quer que você queira saber, eu vou lhe falar. – ela disse, e estava sendo sincera.

- Porque você se incomodou em fingir? – ele quase gritou – Quando eu lhe vi, do lado de fora da torre, aquela primeira vez, porque você fingiu que estava feliz em me ver? Por que se incomodar? Qual é o sentido? Eu posso entender você não me contando a verdade sobre a poção. Mas porque a performance? Eu a beijei e não era só eu a beijando. Você beijou de volta. Eu nem notei... – ele se interrompeu, e olhou para longe novamente. – Eu nem notei a diferença.

Hermione olhou para ele em espanto. É claro, ela pensou, ele não sabe...

- Você acha que a poção significa que eu não te amo mais? – ela disse.

Ele não respondeu, só continuou a olhar para longe dela.

- Harry, essa é a última coisa que significa. Meus sentimentos por você não mudaram de maneira alguma e se eu não te amasse tanto eu não teria mentido pra você. Eu sei que isso soa estúpido, mas é verdade. Eu não podia suportar a idéia de te magoar...

Ela se interrompeu, sabendo como soava. As palavras certas pareciam estar lhe escapando, como tantas coisas tinham-na escapado ultimamente. Ela sabia que era o efeito da poção, que não só tinha lhe dado sentimentos que ela não queria, mas também estava tirando dela as mesmas qualidades que permitiriam que ela lutasse contra aqueles sentimentos: vontade, claridade, força de propósito. Era gradual, mas estava acontecendo; ela podia sentir.

- Eu não estou mentindo. – ela sussurrou, mas a expressão de Harry não mudou, e ela pensou, desesperadamente: ele nunca vai acreditar em qualquer coisa que eu lhe fale, não agora, não depois disso. E porque ele deveria?

- Harry, venha aqui. – ela disse

Por fim, ele olhou para cima, e quando ela viu a expressão em seu rosto ela quase desejou que ele não o tivesse feito.

- Venha aqui. – ela disse, novamente – Por favor.

Movendo-se relutantemente, ele atravessou o quarto e ficou em frente a ela, parecendo desafiador. Seu queixo estava erguido, seus olhos verdes impossíveis de ler. Ela procurou e segurou seu pulso direito, e puxou a mão dele em sua direção, colocando-a no seu peito, acima do coração.

- Eu preciso que você acredite em mim. – ela disse – Faça o que tem que fazer.

Por um momento ele parecia não ter entendido. Então entendimento passou pelo seu rosto e seus olhos se arregalaram enquanto ele andava pra trás, tentando retirar sua mão.

Mas Hermione segurou firme.

- Por favor – ela disse. – Ou eu mesma faço.

Ele levantou seus olhos até eles encontrarem os dela, e ela viu algo se desfazer atrás de seus olhos, resolução temporária dando lugar à curiosidade e necessidade de saber a verdade.

- Veritas. – ele disse

Ela sentiu uma leve implosão dentro do seu peito, e procurou por ar. Doía, mas não tanto quanto ela tinha pensado que ia doer, lembrando da agonia nos olhos de Draco quando ela pôs o feitiço nele. Mas ali ele tinha lutado contra o feitiço, e ela não estava lutando. Ela fechou os olhos, pressionando-se contra a mesa, deixando a dor correr através dela como fios de prata.

- Pergunte, Harry. – ela disse.

Ela ouviu a hesitação na voz dele.

- Você me ama?

Ela abriu seus olhos.

- Sim.

Ela viu um pouco da tensão abandonar seus ombros, embora a pergunta não tivesse deixado seus olhos.

- Pergunte se eu estou apaixonada por você. – ela disse.

- Você está apaixonada por mim?

- Sim. Completamente.

Harry olhou para baixo rapidamente, escondendo sua expressão.

- Certo, então... – ele disse em uma voz contrita, e limpou a garganta. – Você está apaixonada por Malfoy?

Hermione segurou a borda da mesa com suas mãos.

- Sim.

Ele não tremeu ou mudou de expressão, mas realmente não era algo que ele já não sabia.

- Mas é a mesma coisa?

- Não. É diferente. Não é real. Eu posso perceber. Não significa que eu não sinto...

- Você realmente acha que há um contra-feitiço?

- Sim. – ela disse, ouvindo sua própria voz com algum assombro. – Eu realmente acho.

Harry moveu-se um passo mais perto dela, não tirando sua mão do seu local de descanso acima do coração dela. Ela podia ver a si mesma refletida nas pupilas dos olhos dele, viu as sombras hesitantes lá.

- Me pergunte outra coisa. – ela disse, desesperada para achar o que quer que fosse que ia o assegurar completamente. – Me pergunte qualquer coisa, eu não me importo.

Harry desviou sua cabeça. Ela poderia ter quase jurado que o viu sorrir, brevemente...

- Qualquer coisa? – ele perguntou.

Ela concordou com a cabeça.

- As vestes novas que Sirius comprou me fazem parecer uma garota?

- O quê? – Essa era a última pergunta que Hermione tinha esperado ele perguntar, mas o feitiço não distinguia entre verdades significantes e insignificantes. – Não. Você fica muito bonito nelas. – ela disse, e quase sorriu ao ouvir as palavras saírem de sua boca. – Viu? Eu te falei.

- Então tá certo. Você realmente gostou do presente que eu te dei de Natal ano passado?

- Não. – disse Hermione, e ficou vermelho brilhante. – Digo... – mas era inútil. – Você me deu meias, Harry! Garotas não querem meias! Elfos domésticos querem meias! Eu sei que a gente não estava saindo na época, mas honestamente!

Harry fez um barulho meio abafado.

- Eu vou lembrar disso – ele disse – Agora. Você realmente acha me assistir jogando Quadribol interessante ou você só vai aos jogos para garantir que eu não morra?

- Eu só vou aos jogos para garantir que você não morra – disse Hermione, e gemeu. – Eu acho que Quadribol é a coisa mais chata em todo o mundo, pior do que assistir tinta secar. Harry, pare.

- Você disse que eu podia lhe perguntar qualquer coisa. Então, você está apaixonada pelo Rony?

Hermione encarou.

- Harry! O quê? Não!

- Você está apaixonada por Viktor Krum?

- Nem remotamente. Onde você quer chegar com isso?

- Professor Snape?

- Oh, isso está ficando nojento. Não.

- Professor Lupin?

- Você está perturbado. Não!!

- Sirius?

Hermione parecia solene.

- Bem, ele é muito sexy.

Harry parecia horrorizado.

- Hermione!

Ela de repente começou a rir fracamente, não conseguindo se conter.

- Não pergunte se você não quer saber a resposta.

Harry sorriu. Um sorriso verdadeiro, do tipo que ela não tinha visto em seu rosto nem sabia há quanto tempo. Naquele momento, ela teria lhe contado qualquer coisa, mesmo se ela não estivesse sob a maldição Veritas.

- Então – ele disse. – Já que estamos no tópico de romance, eu acho que você deveria me contar porque exatamente você me acha tão devastadoramente atraente. Leve o tempo que quiser e sinta-se livre para usar palavras grandes.

- Ah, não, isso não é justo. – ela protestou, sentindo seu rosto queimando.

- Vamos, responda a pergunta. Porque você me ama?

Hermione sentiu as palavras saindo de sua boca incontrolavelmente.

- Eu te amo porque...

E então a mão de Harry estava sobre a boca dela. Ela ouviu-o dizer Finite Incantatum, e sentiu a dor atrás de suas costelas desaparecer. Ela olhou para cima e viu Harry olhando para ela, não mais sorrindo, mas também sem raiva.

- Eu sinto muito. – ele disse, tirando sua mão da boca dela. – Aquilo foi injusto.

- Eu mereci... – ela disse. – E muito mais que aquilo.

- Doeu?

Ela cerrou o maxilar.

- Não importa. Nada importa, a não ser que você acredite em mim. Você acredita em mim?

Ele concordou com a cabeça.

- Sim, eu acredito, eu realmente acredito. – ele procurou e puxou-a em sua direção, passando seus braços ao redor dela e descansando seu queixo no topo de sua cabeça. Ela podia sentir o cheiro familiar de sabonete, e o ar frio da noite preso nas suas roupas. – Contanto que você acredite que há realmente um contra-feitiço...

Ela levantou seu queixo e olhou para ele, determinada.

- Eu tenho que acreditar.

- Eu sei.

- Harry, eu...

Mas ela não conseguia encontrar as palavras para expressar o que ela queria dizer, a importância e a seriedade de quanto ela o amava. Então ela colocou as mãos em seus ombros, puxou-o em sua direção e o beijou; tentativamente, no início, já que ela raramente tinha beijado-o antes, normalmente ela esperava para ser beijada, e depois com maior urgência, ficando de ponta de pé para ficar tão perto dele quanto possível.

Ela sentiu as mãos dele deslizarem até sua cintura, e então ele a tinha levantado e ela estava sentada na mesa e ele estava beijando-a de volta, beijando-a tão forte que quase doía. Ela estava um pouco surpresa; estava acostumada a beijos doces de Harry, acostumada ao seu cavalheirismo quase tímido; ela tinha pensado que esse tipo de energia e tipo quase-doloroso de paixão estava reservada para... mas não, aparentemente não. Ela estava feliz que estava sentada, porque os ossos em seus joelhos pareciam ter se transformado em manteiga. Ela sentiu-o empurrá-la para trás até ela estar praticamente deitada na mesa, sentiu suas mãos escorregarem para cima para abrir os botões de seu suéter. Ela envolveu suas pernas ao redor da cintura dele, estendendo suas mãos para puxá-lo para ainda mais perto e...

Crash!

Hermione pulou ao repentino barulho de estilhaços, quase caindo da mesa em seu assombro.

- O que foi aquilo? – ela respirou contra o ombro de Harry. – Aquilo era algum tipo de... coisa de Magid?

Ela sentiu Harry rir suavemente.

- Não exatamente. – ele disse, apoiando-se em seus cotovelos e olhando para ela. - Você derrubou um peso de papel da mesa.

- Oh – Hermione disse, ficando rosa. – Eu acho que eu fiquei um pouco entusiasmada demais. Desculpa.

- Eu tenho esse efeito nas mulheres. – Harry disse, parecendo modesto.

- Você certamente tem esse efeito em mim.

Harry ruborizou. Essa era a diferença entre ele e Draco, Hermione pensou, não criticamente, mas com interesse. Draco não teria ruborizado.

- Aquilo não foi nem mesmo meu melhor esforço. – Harry disse.

- Isso é um fato? – Hermione replicou. Ela gentilmente removeu os óculos dele, colocando-os cuidadosamente no lado da mesa. – Então vamos ver você dar o melhor de si, não vamos?

****

Narcisa fechou a porta da biblioteca apressadamente e virou-se para a Sra. e o Sr. Weasley, Rony e Gina, que a estavam fitando com uma curiosidade educada.

- Er... – ela disse – Acho que é melhor voltarmos mais tarde.

- O Harry não está lá? – perguntou a Sra. Weasley, rosa de preocupação maternal – Eu queria ver ele...

- Eles estão conversando – disse Narcisa, saindo da frente porta e caminhando pelo corredor – Melhor dar-lhes um pouco de privacidade. – ela olhou novamente e viu o Sr. e a Sra. Weasley seguindo-a, curiosos. – Eles parecem ter discutido. – Narcisa explicou – Vocês sabem como os casais adolescentes são. Eles brigam, eles reatam; é melhor deixá-los discutir o assunto e depois nós podemos voltar mais tarde e ver como eles se ajeitaram.

Ela ouviu uma gargalhada de trás deles que era provavelmente Rony, e sentiu suas bochechas ficarem rosadas. Oh, Deus, ela pensou, Isso não soou nada bem.

*******

- Quanto tempo nós temos? – a forma gasosa de Dumbledore perguntou a Snape, parecendo educadamente curioso.

- A poção deverá permitir que você converse conosco por aproximadamente 10 minutos – disse Snape – Talvez um pouco mais que isso. E só pode ser usada uma vez.

Sirius podia jurar que viu os olhos de Dumbledore brilharem.

- Então é melhor começarmos logo.

- Diretor, - Sirius perguntou, urgentemente – Você sabe quem os atacou?

- Um bruxo das trevas muito poderoso – disse Dumbledore – Não, eu suponho, Voldemort.

- Você acha que foi Slytherin? – perguntou Sirius, ciente do olhar incrédulo que Snape lançou-lhe, e mais incrédulo ainda quando Dumbledore disse:

- Poderia ter sido. Sabe-se tão pouco sobre Slytherin que é difícil dizer. O nosso agressor estava vestindo uma capa, parecendo um dementador. Era certamente muito poderoso, mas acredito que eu agüentaria o choque se Cornélio não tivesse tentado bancar o herói – A voz de Dumbledore soava arrependida – Pobre Cornélio.

- Ele era um idiota. – sibilou Snape – E quase o matou, Diretor.

- Agora, Severo – disse Dumbledore em um tom de reprimenda e Snape se aquietou – Eu não vi o rosto do bruxo – Dumbledore continuou – O que não importaria, já que ele é certamente poderoso o bastante para disfarçar-se, e além do mais, ninguém exceto Draco e Hermione o reconheceria, não é mesmo?

- Sim, isso mesmo.

Snape estava olhando de Dumbledore para Sirius com uma luz intensa e amarga nos olhos.

- Suponho que seria uma total perda de tempo se eu perguntasse do que isso se trata.

- Salazar Slytherin retornou. – disse Dumbledore, simples – Isso é tudo o que sabemos com certeza. Há também o problema de uma espada encantada. Uma das quatro Lâminas Viventes criadas. Duas foram destruídas. Uma está em meu escritório, em uma caixa de adamantina. A outra está na posse do jovem Mestre Malfoy. Eu não posso enfatizar o quão importante ela é.

Snape piscou, surpreso.

- Draco Malfoy? – ele ecoou.

A porta do quarto abriu, e o Dr. Branford enfiou a cabeça através da fresta. Seus olhos arregalaram-se ao ver a forma flutuante do professor Dumbledore acima da cama, mas ele permaneceu como estava.

- Professor Snape – ele disse, nervoso – Algo aconteceu... você poderia vir aqui fora por um minuto?

Snape estava histérico.

- Não pode esperar?

- Bem – disse o médico – na verdade, não.

- Está perfeitamente bem. – disse Dumbledore – Deixe-nos, Severo. Você fez o que veio aqui para fazer.

Parecendo raivoso o bastante para cuspir pregos, Snape saiu do quarto atrás do médico. Lupin não lamentava sua saída. Quando ele saiu, Sirius virou-se para Dumbledore.

- Draco fugiu. – ele disse

Dumbledore ficou sério.

- Eu achei que ele o faria. – ele disse

- Você acha que ele está bem?

- Eu realmente não sei. – Dumbledore ainda estava sério – Ele é um garoto forte; tão forte quanto Harry, e poderoso em sua própria maneira. Mas aquela espada é um dos mais poderosos objetos mágicos já criados. E nós não sabemos seu real objetivo.

- Bem – disse Lupin – É um objeto de Slytherin, não é? Faz o seu feitio?

- Essas são as perguntas para as quais eu não tenho as respostas. Eu estava até esperando que o jovem Mestre Malfoy pudesse me dar as respostas. Será a espada um objeto de Slytherin, ou seu inimigo? Estará ele trabalhando através dela, ou serão os dois opostos, batalhando um com o outro?

- Mas a espada trouxe Slytherin de volta à vida. – Lupin apontou.

- Sim. Mas talvez não como uma recompensa. Talvez como uma punição. Ele tem uma grande dívida com as forças que fizeram daquela espada o que ela é. Se o trouxeram de volta, pode ser para pagar o que deve.

- E ele não quer pagar? – perguntou Sirius.

- Não – disse Dumbledore – se ele conseguir que Draco pague por ele. Tudo o que ele tem que fazer é se sentar e ver a espada fazer o seu trabalho.

Lupin estreitou os olhos.

- Mas qual é o seu trabalho?

- A espada foi feita para realizar desejos. É o que ela faz, esse é o poder que a tornou tão cobiçada por Slytherin, em primeiro lugar. Ela está tentando mostrar a Draco que ela pode lhe dar tudo que ele sempre quis. Triunfar onde Harry falha. Conseguiu o amor, através da poção...

- Mas foi tudo um acidente. – interrompeu Lupin – Ele só estava lá; ela o viu...

- Há forças que não consigo compreender completamente trabalhando – disse Dumbledore – Eu imagino que a espada, com sua conexão com Slytherin, sabia da poção do amor e arranjou para que Draco estivesse lá no momento. Certamente, teria muitos aspectos para considerar e a situação poderia ter ido de um jeito ou de outro. E eu posso estar errado sobre a tentativa da espada de realizar os seus desejos com a poção do amor e seus resultados. Talvez ela estivesse simplesmente tentando atormentá-lo. Talvez estivesse simplesmente se divertindo. A espada é um demônio, afinal de contas. Tem um senso de humor, apesar de ser um que muitos não apreciariam.

- Agora ela o ama. – disse Sirius lentamente – Mas eu não diria que isso o fez feliz.

- O que pensamos querer não é sempre o que realmente queremos. – disse Dumbledore – E lembre-se, a força que está tentando realizar os seus desejos é maligna. Ela vê que ele quer que Hermione o ame... Desejo concedido: ela o ama. A espada não sabe que há mais no desejo do que a aparência superficial de devoção; não sabe que o amor induzido não é e não pode ser satisfatório.

- O que a espada quer?

- Uma vida. – disse Dumbledore, simplesmente – O que foi tirado dela quando Slytherin fez a magia que o tornou imortal. Especificamente, a vida de um Magid. Mais especificamente ainda, a vida de um Magid com o sangue de Slytherin. Esse foi o trato original. Se a espada não puder ter a vida do próprio Slytherin, tirará a vida de um de seus descendentes.

- A vida de Draco – disse Sirius, ficando pálido.

- Não necessariamente a de Draco – disse Dumbledore, ficando muito sério – Poderia muito bem ser o Harry.

Sirius arregalou os olhos.

- Harry? Mas o Harry é o descendente de Gryffindor.

- Godrico Gryffindor e Salazar Slytherin eram primos. – disse Dumbledore, parecendo muito calmo. Tudo muito bem para ele estar tão calmo, pensou Sirius irracionalmente, Ele nem mesmo está aqui. – O sangue de Harry funcionará tão bem quanto o de Draco para realizar o trato.

De repente, Lupin pulou da cadeira e começou a andar de um lado para o outro.

- Isso explica tanta coisa – ele disso, excitado.

- Explica? – disse Sirius, na esperança de que não parecesse tão perdido quanto estava. Toda essa conversa sobre o sangue e a vida de Harry estava começando a deixá-lo em pânico, e ele raramente agia bem quando estava em pânico. Ele superou um pouco o sentimento e olhou para Lupin. – O que isso explica?

- Eu estive tentando saber o que reanimou a espada em primeiro lugar; isto é, o que a trouxe de volta a vida. A profecia diz que a espada deve ser empunhada por um descendente de Slytherin para que o seu poder retorne, mas você me disse que Draco nunca a usou, só a carregou por aí. Mas Harry usou a espada; Harry atacou Lúcio Malfoy com ela. Tirou seu sangue.

- Correto – disse Dumbledore.

- Então por que a espada não persegue o Harry? – perguntou Sirius, esperando que a pergunta fizesse sentido. – Por que parece que ela está ligada a Draco?

- Ela se ligaria ao mais fácil de manipular – disse Dumbledore – A espada está no negócio de realizar desejos. O que mais Harry precisa? Certamente ele quer os pais de volta, mas a espada não pode reviver os mortos. Ao contrário dos desejos de Draco. Bem mais simples. Tornam-no mais fácil de controlar.

- Então, o Harry, ele está em perigo assim como Draco?

Dumbledore ficou sério.

- Ele está em perigo por causa de Draco. Se Draco, como você diz, fugiu, eu imagino que ele o fez para, de alguma maneira, proteger Harry. Ele deve saber o que é pedido dele.

O queixo de Sirius caiu.

- Você não está dizendo que ele está com medo de que possa matar Harry, está?

Dumbledore só olhou para ele. Apesar de translúcido, seu olhar ainda era penetrante.

Sirius xingou.

- Ele até que disse que não prometia que não podia ser perigoso. – disse Lupin, suavemente.

- Nós temos que achá-lo. – disse Sirius.

- Concordo – disse Dumbledore, tranqüilamente – É imperativo.

Lupin limpou a garganta.

- Creio que a espada permita-o dificultar sua localização, em algum grau. Eu tentaria um Feitiço Localizador, mas tenho quase certeza que não funcionaria.

- Não – disse Dumbledore. Sua voz estava fraca. Olhando para cima, Sirius viu que sua forma estava começando a embaçar nas pontas – Não, isso não resultaria em nada. E ele levou o Feitiço Essencial com ele, não levou? Um jovem meticuloso... – a voz de Dumbledore ondulou e tornou-se inaudível, como se fosse sufocado em névoa. Ele parecia estar ficando mais e mais transparente... Sirius pensou ter visto as pedras da parede oposta através da forma ondulante do diretor. Nós estamos perdendo-o.

Sirius inclinou-se para frente, apertando os braços da cadeira.

- Professor...

Por um momento, a ondulação da projeção do diretor ficou mais clara.

- Harry – ele disse – Harry pode achá-lo. Eles podem ter escolhido fechar a conexão que existe entre eles, mas ainda está lá. Harry pode reabri-la, se quiser.

Sirius ouviu sua própria voz quebrar-se.

- Como ele pode fazer isso?

Mas quando Dumbledore falou novamente, sua voz saiu como a de uma pessoa debaixo d’água, irreconhecível. Sirius lutou contra a vontade de ficar de pé e tentar pegar a forma gasosa do diretor... Ele pensou ter visto Dumbledore olhar pra ele e piscar antes que o que restou da névoa se dissolvesse no ar.

Os olhos de Sirius caíram e olharam a forma do homem na cama, cujo peito subia e descia de acordo com sua respiração. Ele sentiu a mão de Lupin em seu ombro novamente, agora mais como um gesto de simpatia do que de restrição.

- Eu não tenho a menor idéia do que fazer, Aluado. – Sirius disse, com a voz baixa – Diga-me o que fazer.

- Eu suponho que a primeira coisa que deveríamos fazer é falar com Harry. Ele precisa saber o que está acontecendo. Se ele quiser nos ajudar a achar uma pessoa que esteja ou não esteja impelida de matá-lo... E eu sei que você vai dizer que não é culpa de Draco, mas aí é que está... Eu acho que a decisão deveria ser do Harry. Não concorda?

Sirius não respondeu.

- Você acha que o Ministério deveria ser avisado sobre o desaparecimento de Draco?

Lupin hesitou. Sirius sabia que ele desconfiava bastante do Ministério e seus burocratas, que até 1950 tinha a política de “matar primeiro e perguntar depois” quando se tratava de lobisomens.

- Eu acharia melhor ver se Harry pode localizá-lo.

Os dois viraram quando a porta abriu, e Snape entrou. Sirius sentiu a guinada familiar e incontrolável de desgosto em seu estômago que sempre sentia quando o via. Snape parecia indiferente ao constatar que Dumbledore não estava mais lá; ele foi até a mesinha-de-cabeceira e começou a recolher seus pertences – morteiro, pilão e fracos –, colocando-os em seu bolso.

Sirius fitou-o, um olhar confuso em seu rosto.

- Está silencioso, de repente – ele disse

Lupin limpou sua garganta, olhando para Snape.

- Parece que os repórteres foram embora – ele disse – Você.. er.. se livrou deles?

O Mestre de Poções balançou sua cabeleira oleosa, em sinal negativo.

- Não. Não me livrei. Eles acharam uma matéria mais interessante no final do corredor.

Lupin piscou.

- Uma matéria mais interessante...?

Snape endireitou-se e deu-lhes um sorriso amarelado.

- No final do corredor, é a ala onde ficam os loucos criminosos. Nesta manhã, há um a menos.

Sirius olhou-o, sem expressão.

- Lúcio Malfoy está morto. – disse Snape – Assassinado em sua própria cela.

*******

- Sai pra lá e deixe de me seguir, Black.

Sirius estava seguindo o corredor até a ala do St. Mungos onde ficavam os loucos criminosos. Snape estava ao seu lado, o fogo abafado em seus olhos pretos traindo a sua fúria. Ele se virou, andando de costas, mirando Sirius com um olhar de puro ódio.

- Vá para casa. Isso é assunto do Ministério.

Sirius balançou a cabeça negativamente, ainda andando.

- Eu não vou para casa. Eu tenho que ver o que aconteceu com Lúcio Malfoy. Tenho esse direito.

- Você não tem nenhum direito. Os guardas nunca o deixarão entrar. A morte de Lúcio Malfoy não é do seu interesse.

- É do meu interesse, sim! – Sirius sentiu a fúria borbulhar em seu peito. – Ele é pai do meu filho. Quero dizer, ele é o pai do meu filho adotivo. Olhe, isso não é nem um pouco do seu interesse, seu cara de fuinha com peito de pavão. Por que você não sai daqui e volta para o buraco do inferno do qual surgiu?

Eles estavam chegando ao fim do corredor, agora; Sirius pôde ver um grupo de bruxos do Ministério apertados em frente à porta de uma cela numerada. Snape fitou-os, e depois olhou friamente para Sirius.

- Eu estou aqui representando o Ministério. Informar-me sobre a morte de Lúcio Malfoy é parte do meu trabalho aqui. Você, ao contrário, é um mero ponto na paisagem, não contribuindo em nada.

Sirius não fazia idéia de quando ele tinha perdido a paciência, mas ela havia definitivamente sumido.

- Como um Auror, eu tenho muito mais lugar aqui do que você. Por que você não volta para sua masmorra de Poções para punir injustamente garotinhos, porque você gosta tanto disso que parece até ser bom nisso.

- Não é que eu não goste. Eu sou um professor. Eu faço o meu trabalho.

- Que bom para você que o seu trabalho também seja seu hobby.

Snape sorriu desdenhosamente.

- Eu só gostaria de lhe dizer que aqueles doze anos que você passou em Azkaban foram os melhores da minha vida. Toda manhã eu acordava com um sorriso no rosto e uma música em meu coração só em saber que você estava lá.

- E qual seria a música? “Eu Posso Ser Um Cara-de-Fuinha Mas Tenho Uma Vassoura Enorme Enfiada No Meu...

- Foda-se, Black.

- Olhe, Snape. Eu lhe espanquei na escola e ficaria mais do que feliz em fazê-lo de novo. Se você pensar em tentar me impedir de ir naquela cela, se você falar para aqueles guardas para não me deixarem entrar, eu vou arrancar a sua traquéia e lhe bater até a morte com a ponta da amídala. E eu não me importo se me mandarem de volta para Azkaban, porque valeria a pena. Entendeu?

Snape fitou-o, e Sirius sentiu-se desconfortável ao ver um sorriso frio formar-se no rosto de dele.

- Tudo bem – ele disse – Espero que você goste do que verá.

*******

Ao Aparatar para a biblioteca da Mansão Malfoy, Lupin viu algo bem inesperado.

- Caralho.– ele xingou, involuntariamente.

Com uma exclamação alarmada e um baque alto, Harry e Hermione caíram da mesa de Lúcio e desapareceram de vista, para o alívio de Lupin.

Um momento depois, Harry apareceu do outro lado da mesa, endireitando a camisa e ficando bem rosado no rosto. Ele tateou sobre a mesa pelos seus óculos, colocou-os, e olhou para Lupin com um sentimento de culpa.

- Er... Olá, professor. – ele disse – Nós não estávamos esperando...

- É. Isso é bem óbvio.

Hermione apareceu ao lado de Harry, abotoando o suéter, suas bochechas vermelhas.

- Professor, olá, como vai?

- Tudo bem, exceto que eu quase me parti em pedaços – disse Lupin, sério, tentando não sorrir frente a expressão de culpa dos dois jovens. – graças a vocês.

- Nós só estávamos nos beijando – disse Harry, um pouco defensivamente.

- Sim, e estou muito feliz que você fizeram as pazes. Embora essa mesa não seja nem um pouco sólida. Tentem não se machucar. Enquanto isso, eu preciso falar com Narcisa, se vocês me derem licença...

- Professor, espere – interrompeu Hermione, puxando nervosamente os cabelos para trás das orelhas. – O senhor pode ficar por um momento?

- Claro! – disse Harry, então ele piscou, confuso. – Digo, não. Não fique! Espere, não foi isso que eu quis dizer, digo...

- Pare de falar bobagem, Harry. – disse Lupin, sem parecer rude, e virou-se para Hermione que, ainda com as orelhas rosadas, estava mexendo nos livros espalhados na mesa. – Está tudo bem, Hermione, eu não quero atrapalhar. Eu estou atrapalhando? – ele adicionou, virando-se para Harry.

- Só no sentido literal. – murmurou Harry.

- Oh, shh. – disse Hermione, passando pela mesa. Lupin viu que ela estava segurando o livro do centauro em suas mãos. Ela foi até Harry e o deu. – Olhe aqui, Harry.

Harry olhou.

- É um livro.

- Sim – disse Hermione, com um pouco de impaciência em sua voz.

- E daí?

- E daí, em que língua está escrito?

- Você não me disse que queria que eu lesse. – Harry abriu o livro, passou umas páginas ao acaso e deu de ombros – É inglês.

Lupin pulou.

- É o quê?

Harry olhou, confuso.

- Inglês.

Lupin não sabia se gaguejava ou gritava. Ele quase correu até Harry, postou-se atrás dele, e olhou para as páginas por cima de seus ombros, vendo os mesmos rabiscos incompreensíveis que ele se lembrava. Ele apontou um dedo na página.

- Leia essa parte para mim, Harry. – ele disse.

Harry deu-lhe um olhar que dizia claramente “Certo, você está louco, não está, mas eu vou ler pra você de qualquer maneira porque você parece basicamente indefeso.”

Lupin insistiu, ainda com o dedo na página enquanto Harry lia:

Sábado, catorze de outubro. Bebi muito, noite passada. Acordei com uma terrível dor de cabeça só para achar o maldito do Godrico marchando por aí e gritando. Deus, ele nunca pára de gritar. É ótimo para assustar os camponeses, mas nem um pouco agradável se você está tentando somente comer o seu desjejum. Então, na reunião hoje, ele não gostou da idéia de deixar a escola fechada para os estudantes que não têm sangue puro. Não escutaria nenhum dos meus argumentos. Toda vez que eu tenho uma decisão própria, Godrico faz um escândalo. Idiota detestável. E ele se sentou muito perto de Rowena no jantar de hoje, novamente. Se ele continuar...

Harry parou de ler e olhou para Lupin.

- O que diabos é isso? O que está acontecendo?

Lupin indicou com um movimento de seu queixo que Harry devia continuar lendo.

Harry passou mais algumas páginas e leu:

Disse para Godrico essa manhã, em confidência, que estava pensando em vender minha alma para ganhar poder e governar o mundo dos bruxos. Ele disse: “Eu não acho que essa seja uma boa idéia, Sly”. Eu lhe disse que era um ótimo plano. Na verdade, sem falhas, mas ele ficou com raiva e me chamou de baixinho deplorável. Eu realmente não sei o que Rowena vê nele.
Estou muito ansioso é para matá-lo. Muito.

Harry parou de ler novamente e olhou para Lupin com os olhos arregalados.

- Esse é o diário de Salazar Slytherin?

- Bem – disse Lupin – como um historiador profissional e acadêmico, eu diria que teríamos de fazer testes para confirmar isso, talvez um Feitiço Verificarum, mas, bem... – ele parou, então sorriu para Harry e Hermione, certo de que o alívio em seus olhos era evidente. – Certamente, parece que sim.

- Bem, ele parece tão idiota e deplorável que dá até vontade de rir, não acham? – disse Harry, olhando para o livro em descrença.

Lupin deu de ombros.

- É muito difícil dizer o que motiva as pessoas a fazerem o que fazem. – ele disse,
diplomaticamente.

- Quando vocês olham para esse livro – Harry disse, indicando a página com o dedo – não parece ser inglês para vocês?

- Não é inglês, Harry. – disse Hermione, parecendo pouco afetada – É a língua das cobras.

Lupin sorriu para ela.

- Nem me ocorreu que podia ser uma linguagem escrita. Provavelmente não é, na verdade, mas o livro poderia ser facilmente encantado para que somente alguém que sabe a língua das cobras pudesse ler. Muito bom, Hermione, muito bom mesmo.

Hermione sorriu alegremente como se ela tivesse tirado a maior nota em um exame, enquanto Harry, atingido por um pensamento, franziu as sobrancelhas exageradamente.

- Quer dizer que vou ter que ler o livro todo em voz alta? – ele exclamou, olhando para Lupin, angustiado. – Porra!!

*******

Se alguém tivesse me dito essa manhã, Sirius pensou sombriamente, que à meia-noite eu estaria num asilo para loucos com Severo Snape, tentanto juntar os pedacinhos de Lúcio Malfoy, eu o teria batido na cabeça e chamado-o de cretino idiota.

Mostra o que eu sei.

Os guardas do Ministério estavam surpreendentemente dispostos – na verdade, mas que dispostos – a deixarem Sirius e Snape entrarem na cela e ver o que restou de Lúcio Malfoy. Uma parte disso havia sido por causa da reputação de Sirius como um Auror de primeira classe e outra havia sido por causa da posição de Snape no Ministério e outra porque ninguém queria entrar lá.

Foi fácil ver o porquê. Ao entrar no aposento, Sirius, que havia visto pouquíssimas coisas nojentas em seu mandato de Auror, quase sentiu suas pernas pararem de funcionar. Não havia nenhum corpo... ou pelo menos nada de Lúcio Malfoy que poderia ser determinado como um corpo. O sangue ensopava os móveis, manchava as paredes e fazia poças no chão. O fino círculo que Lúcio havia desenhado no chão, usando o sangue do corte de seu pulso, estava quase obscurecido por longas tiras de sangue e carne, e havia também outras... coisas... espalhadas pelo chão, misturadas com o sangue e alguns pedacinhos brancos do osso: coisas que Sirius não queria olhar de perto. Coisas que pareciam com órgãos e membros mutilados.

- Bem,– disse Sirius, sentindo-se tonto – eu acho que podemos excluir ‘suicídio’ da lista.

- Não necessariamente – disse Snape, que não mudou muito de expressão desde que entraram na cela.

- O quê? Você acha que ele ficou tão deprimido que se mutilou todo?

- Não exatamente – disse Snape, friamente. Ele apontou para uma das paredes com sua varinha – Você olhou aquilo?

- Mancha de sangue. – disse Sirius – E daí?

- Suponho que fui otimista ao esperar que não suspeitasse nada, Black. Olhe para as manchas de sangue. Elas parecem...

- Escrita – disse Sirius, finalmente entendendo. Ele olhou a parede com os olhos contraídos. – Olhe, continua até o chão.

- Parece ser algum tipo de linguagem rúnica – disse Snape, que tinha tirado um bloco de notas e uma Pena de Repetição Rápida e parecia estar copiando que estava escrito. – Talvez um tipo de código.

- Você acha que Lúcio escreveu isso com seu próprio sangue?

Snape deu de ombros.

- Quem mais estaria escrevendo com sangue na parede de sua cela?

- Alguém precisando desesperadamente de uma caneta? – sugeriu Sirius.

Snape ignorou-o.

- Elas parecem com letras-de-fogo. – ele murmurou para si mesmo – Talvez, uma conseqüência do Feitiço Convocador... Imagino o que ele estaria querendo convocar... Pena que está tão difícil de ler.

- É, parece mesmo ser meio rabiscada. – concordou Sirius – Se ele tivesse sido um pouco mais prestativo, ele teria usado os intestinos como pontuação. Talvez ele devesse ter usado o baço como o ponto final. Olhe, ali está.

- Não tente ser engraçado, Black. Você não é divertido. E aquilo não é um baço, e sim um rim.

- Eu estava tentando evitar vomitar aqui. Você provavelmente está acostumado com esse tipo de carnificina dos seus dias super-divertidos de Comensal da Morte, mas eu... – ele parou, de repente, e olhou para Snape. – Você está, não está?

- Estou o quê?

- Acostumado com isso. Você sabe o que é.

Snape fitou-o com olhos sombrios.

- Eu me lembro muito bem do Lorde das Trevas dando uma punição naqueles que o desobedecessem. – ele disse – O Feitiço Irruptus. Ele...

- Explode pessoas – Sirius disse, numa voz oca.

- Exato.

- E é difícil de fazer?

- Muito.

- Algo a acrescentar nesse assunto?

- Na verdade, não.

- Isso não te enoja?

Snape olhou para ele.

- Como disse?

- Lembrar o que você foi. – disse Sirius, duramente, e estava grato por ver a expressão de Snape ficar tensa. – Eu sei que Dumbledore me disse que você deixou de trabalhar para o Lorde das Trevas, um grande risco para você mesmo. Ele parece confiar muito em você. Mas eu lhe direi, o resto de nós não confia. Sem ele para falar por você, quem na comunidade mágica vai conseguir acreditar em um Comensal da Morte fracassado que não conseguiu manter sua lealdade nem ao Lorde das Trevas?

- Melhor um Comensal da Morte fracassado – disse Snape – do que um Fiel do Segredo fracassado!

Sirius sentiu uma guinada em seu estômago e sentiu uma vontade incontrolável de bater em Snape. Ele deixou o sentimento de lado.

- Você é tão assassino quanto eu – ele disse, sua voz determinada.
Snape fechou o bloco violentamente. O bloco e a pena desapareceram nas mangas de seu robe enquanto ele andava para a porta, passando por Sirius, que não se moveu. Na porta, Snape virou-se e olhou para ele com seus olhos de besouro cheios de raiva, e algo mais.

- Todos somos culpados. – ele disse – Todos somos cúmplices.

Ele saiu, a porta fechando-se atrás dele.

Sirius, sentindo que iria vomitar e um pouco tonto, passou as costas das mão sobre os olhos e xingou em voz baixa. Eu perdi a discussão?, ele pensou, Isso era mesmo uma discussão? Ele ouviu a voz de Snape novamente em sua cabeça, Fiel do Segredo fracassado, ela dizia. Ele empurrou os pensamentos de Lílian e Tiago para o fundo de sua mente, porque aquele era o caminho para a escuridão, e para o Abismo e as dores de cabeça que durariam horas e horas. O cheiro de cobre do sangue já estava deixando-o nauseado. Ele andou uns passos para trás e sentiu seu pé pisar em algo que fez um barulhinho não muito agradável. Meu Deus, ele pensou, olhando para baixo, isso é... um dedo?

Sirius saiu correndo.

*******

Gina olhou tristemente para o fogo que crepitava na lareira. Embora fosse junho, a Mansão Malfoy podia ser tão fria que o calor do fogo estava longe de ser inoportuno. Rony, sentado próximo a ela de braços cruzados, parecia pensativo e, ao mesmo tempo, levemente irritado.

- Sobre o que você acha que eles estão conversando? – ele disse.

Gina sabia imediatamente sobre quem ele estava falando: os pais deles, que foram com Narcisa para outro aposento para terem uma "conversa de adultos". Rony estava mais irritado por ter sido ignorado dessa conversa do que Gina. Gina sentiu um frio na espinha quem nem o calor do fogo parecia ser capaz de dissipar. Ela ainda via Draco em sua mente, no jardim, aquele olhar de angústia terrível em seu rosto. Ele não queria ir. Por que ele foi?

- Eu disse, - Rony repetiu com irritação, - sobre o que você acha que eles estão conversando ali dentro?

Gina olhou para seu irmão sem expressão, ainda vendo o rosto de Draco em sua mente.

- O quê?

Rony balançou a cabeça.

- Eu disse que eu estou me divertindo muito aqui na Terra. Como é aí, onde você está?

Gina sentiu seu lábio tremer.

- Eu estou tão preocupada, Rony – ela disse. – Acho que ele está em grande perigo.

Rony sentiu-se meio confuso.

- Quem, Harry? – ele perguntou, ainda soando um pouco irritado. – O único perigo em que Harry está é de sufocar até a morte com a Hermione pregada no seu rosto.

- Não o Harry. Draco. Eu acho que ele está em perigo.

Rony parecia estar lutando para não dizer ‘E daí?’

- Não diga 'E daí?' – adicionou Gina sobriamente.

- Eu não ia dizer - mentiu Rony. - Olhe, o Malfoy tem o Sirius e a Narcisa para cuidarem dele. Eu tenho certeza de que eles encontrarão algum jeito de achá-lo, mesmo que tenham que usar dinheiro, o nome Malfoy ou as conexões com o Ministério para isso.

- Não vão achá-lo. Não se ele não quiser ser achado.

- Pare de ser tão pessimista. É irritante. Aliás, por que você se importa com o que aconteça com o Malfoy?

- Porque... – começou Gina, e parou.

Rony olhou para ela, seus olhos azuis, de repente, se arregalaram.

- Gina, - ele disse, - você não está. Com o Malfoy? O que foi que eu lhe disse...

Gina olhou teimosamente para ele.

- Não é da sua conta, é?

Rony estava exasperado.

- O que há entre você e rapazes emocionalmente indisponíveis? Primeiro o Harry, e isso já era o ruim o suficiente. Agora o Malfoy, que não está só gostando de outra pessoa, mas é o lixo moral em pessoa. Eu suponho que o melhor que se pode dizer sobre ele nesse assunto é que pelo menos ele não é gay. – As sobrancelhas de Rony juntaram-se pensativamente. - Que nós saibamos – ele adicionou.

Gina fez um som parecido com um rosnado.

- Você – ela disse friamente,– é o único entre nós que ainda o odeia.

- Entre nós? Quem é 'nós'?

- Bem, Hermione...

- Hermione está sob um feitiço – disse Rony firmemente.

- O Harry gosta dele.

- Harry me disse que ele não considera Malfoy um amigo – disse Rony, o que era bastante verdade.

Ginny surpreendeu-se, mas se recuperou rapidamente.

- Sirius – ela disse, triunfantemente. – O Sirius gosta dele.

Rony parecia solene.

- Sirius era doidão quando era da nossa idade.

- Rony!


Rony sorriu.

- Tudo bem, talvez não. Mas ele definitivamente tinha um lado maluco, talvez seja por isso que ele se identifique tanto com Malfoy. Me lembro que papai me falou que Sirius foi para a formatura de Hogwarts dele usando nada além de um par de óculos de natação e luvas de couro.

Gina esqueceu momentaneamente que estavam falando sobre Draco.

- Isso é verdade?

- Sei lá. Harry e eu procuramos as fotos de velhos álbuns de formatura na biblioteca, mas aquele ano está faltando. Aposto que alguma garota o roubou.


- Bem, ele ainda gosta do Draco – disse Gina firmemente. – Pronto.

- Gina – Rony disse igualmente firme. - Você é melhor que o Malfoy. Tudo bem?


Naquele momento, Gina fez algo que não havia feito em anos, e pisou, bem forte, no pé de Rony.

- Aaaai!!! – ele gritou, pulando e dando-lhe um olhar ofendido. – Por que você fez isso?

- Você não pode esquecê-lo por um segundo? – Gina disse, quase chorando. - Você não consegue pensar em uma coisa boa para dizer sobre ele?


- Uma coisa boa sobre Malfoy? Bem, de vez em quando, ele sai do aposento. Vendo a expressão furiosa de Gina, ele suspirou e pegou sua mão. – Olhe, Gin. Eu não posso evitar. Admito que o Malfoy realmente parece se importar com Hermione, e, até certo ponto, isso o torna humano. Mas eu não consigo confiar nele, e mais do que qualquer coisa, eu não quero que você se machuque. Entendido?


- Eu entendo, mas não sou eu quem está correndo perigo no momento – Gina disse, em voz baixa. - Ele, sim. – Ela olhou para seu irmão. – Ele está em perigo, Rony. Eu ainda posso sentir Magia Negra, sabe, e eu a senti vindo dele da última vez que o vi. Como ondas geladas. Vindo não dele, mas dos arredores dele. Tem alguma coisa acontecendo com Draco, ou alguém o manipulando, como eu com aquele diário...

Ela parou assim que a porta abriu e seus pais entraram. Molly e Artur Weasley pareciam um pouco mais do que só "chocados", e quando Molly abraçou Gina, foi com uma intensidade inesperada.

- O que está acontecendo, mãe? – perguntou Ginny, desvencilhando-se do abraço.


- Sirius acabou de chegar do hospital – disse o Sr. Weasley.


Os olhos de Rony estavam arregalados.

- Dumbledore está bem?

- Ele está em condição estável – disse o Sr. Weasley. - Mas Lúcio Malfoy está morto.

Gina arregalou os olhos.

- O pai de Draco? – ela sussurrou. – Ele morreu?

- Assassinado na própria cela – disse o Sr. Weasley. – Extremamente desagradável.

- Eu acho que é hora de irmos para casa – disse a Sra. Weasley. – Essa é uma hora para a família e eu não consigo parar de achar que estamos nos intrometendo.

- Sem mencionar que eu tenho que ir ao Ministério – adicionou o Sr. Weasley. – Já recebi várias corujas de Percy...

- Nós já vamos? – perguntou Rony, ainda com os olhos arregalados. – Mas e o Harry? E a Hermione?

- Essa é a casa de Harry agora, querido – disse a Sra. Weasley firmemente. - É aqui que ele pertence e deve ficar. E eu já perguntei para Hermione se ela gostaria de voltar conosco, mas ela disse que preferiria ficar com Harry.

- Já fizeram as pazes, hein? – perguntou Rony.

- Parece que sim.

Rony olhou para Gina. Gina olhou para ele, tristemente.

- A gente pode se despedir do Harry e da Hermione? – ela perguntou.

A Sra. Weasley suspirou.

- Estou certa de que vocês irão vê-los de novo em breve – ela disse. – Mas vão, e digam 'tchau'. Pelo que parece, nós não chegaremos em casa antes de amanhecer.

*******


A atmosfera na biblioteca estava deprimente. A partida dos Weasleys deixara Harry e Hermione confusos, como se eles não acreditassem que seus amigos haviam ido embora. A Sra. Weasley abraçou Harry dúzias de vezes e convidou os dois para irem para A Toca, mas Harry recusou firmemente e disse que queria ficar com Sirius, e Hermione disse que ficaria com Harry. E foi isso o que aconteceu. Agora os dois estavam sentados, de mãos dadas, na mesa, parecendo, Lupin achou, uma pintura de duas crianças órfãs com olhos grandes e tristes. Sirius levara Narcisa para a sala de visitas para falar sobre a morte de Lúcio e o que Dumbledore havia dito sobre Draco, mas eles ainda não haviam retornado.


Lupin, enquanto isso, estava folheando o livro que começara a achar que era o diário de Slytherin, embora não houvesse como provar tal fato. Agora que ele sabia que estava escrito em língua das cobras, ele tinha certeza que seria capaz de traduzi-lo. Era o único ponto positivo entre as circunstâncias atuais.


- Você precisa de ajuda com o livro, professor?


Foi Harry quem perguntou. Ele parecia cansado e um pouco perdido e ansioso.


- Obrigado, Harry. Eu talvez precise daqui a pouco. Estou considerando alguns feitiços de tradução. Até agora eu só consegui transformar poucos parágrafos em uma forma que desse para ler.


Hermione olhou para Lupin.

- Alguma coisa interessante?

- Não, na maioria são apenas reclamações sobre Godrico e, er, observações sobre Rowena. Ele reclama muito.


- Ah, eu não sei, - disse Harry, inesperadamente. - Quero dizer, não parece que Godrico foi assim, tão legal, com ele. Parece que ele estava sempre atormentando ele como... como Snape.


Lupin e Hermione olharam para Harry, com assombro.

- Isso me lembra, – disse Lupin, lembrando-se, de repente. – Você obteve uma resposta de Snape sobre a poção do amor?


Hermione e Harry coraram.

- Sim, recebemos. – disse Hermione, um pouco contra sua vontade. – Ele disse que não tinha como reverter o feitiço... que ele saiba, – ela adicionou apressadamente.


- Ah – disse Lupin, embora seu coração estivesse apertado. – Bem, ele não sabe de tudo.


- Ele disse que só podia ser revertido pela morte. – adicionou Harry.


- Bem, a maioria dos feitiços é. – Lupin disse – Até ser um lobisomem pode ser curado pela morte. Eu dificilmente chamaria isso de útil.


Hermione ergueu o queixo.

- Eu acho que ele só estava tentando nos desencorajar.


- Ele gosta de ser 'do contra' – disse Lupin neutralmente, embora intimamente ele discordasse. Se tem uma coisa que sobre a qual Snape nunca mentiria, seria sobre suas amadas poções. – Agora – ele disse, querendo mudar de assunto. – seria melhor nos concentramos em achar Draco. Quando o acharmos, eu ficarei feliz de escrever para os professores de Poções em Beauxbatons e Durmstrang. Eles poderiam ajudar.


- Eu estava pensando, professor... – disse Harry, de repente. – Se Narcisa tiver alguma coisa de Draco de quando ele foi um bebê - como cabelo, ou alguns dos dentes-de-leite dele, ou qualquer coisa assim - nós poderíamos fazer outro Feitiço Essencial e usá-lo para achar o Draco?


- É uma boa idéia, Harry. Eu sugeri isso ao Sirius. Mas dado o apego de Lúcio pelas Artes das Trevas, ele achou que era pouco provável que Narcisa tivesse guardado algo assim. Seria facilmente usado contra Draco. Não, eu acho que teremos que usar outros meios para achá-lo.

- Outros meios? – ecoou Hermione. – Como o Ministério?


- Não – disse Lupin, desejando que Sirius voltasse logo para ajudá-lo a explicar. – Para falar a verdade, nós estávamos achando que você poderia nos ajudar com isso, Harry


Harry piscou os olhos.

- O que eu posso fazer?


- Bem, só você pode decidir isso, Harry, mas...


A porta da biblioteca abriu e Sirius entrou com Narcisa. Ele olhou para Lupin; seus olhos diziam: você já lhe disse?


Lupin olhou de volta. Bem no meio da explicação. Pode me ajudar?


Sirius atravessou o aposento e sentou-se na mesa, de frente para Harry. Ele olhou para Harry intencionalmente. Sem nenhum preâmbulo, ele disse:

- Você se lembra que, depois que você e Draco tomaram a Poção Polissuco, você, até certo ponto, sabia o que ele estava pensando?


- Sim – disse Harry, arqueando as sobrancelhas.


- Mas isso acabou quando o efeito da poção passou, não foi? – disse Hermione, que, como sempre, soube sobre o que Sirius estava falando antes de Harry. – Não foi?


Agora Harry parecia um pouco desconfortável.

- Bem – ele disse – não exatamente.


Todos olharam para ele.


Harry tirou seus óculos e pressionou a ponte de seu nariz, cansado.

- Olhem – ele disse. – Eu não sei o que Malfoy está pensando, se é isso que estão perguntando. E eu certamente não sei onde ele está. Mas, de vez em quando, eu posso sentir o que ele está sentindo e, er, às vezes, eu posso ver o que ele está sonhando. O que ultimamente tem sido bem ruim, isso eu posso dizer.


Hermione estava atônita.

- Por que você não disse isso antes?


- Porque eu acho que isso é estranho e perturbador. E porque está acabando. Está mais fraca a cada dia.


- Mas podemos reverter isso – disse Sirius. Ele olhou para Lupin. - não podemos?


Lupin estava pensativo.

- Essa conexão que vocês dois tiveram através da Poção Polissuco. Não é a primeira vez que isso acontece, historicamente. É bem parecida com a conexão entre um Magid e sua Fonte. O que quer que tenha ligado vocês dois, não foi inteiramente dissipado, somente fechado. Você pode abrir a linha novamente, eu acho. Se você quiser. Todos entenderíamos se você não quisesse, porque-


- Por que ele é perigoso? – disse Harry. – É, eu sei que ele acha que é.


- É mais do que isso, Harry – disse Sirius. – Ele não é apenas perigoso a qualquer um, mas especificamente a você. Você pode localizá-lo para nós, mas você não poderá ir conosco atrás dele. Nós teremos que fazer isso.


Harry estava meio confuso.

- Por quê?


Sirius suspirou, e explicou. Os olhos de Harry se arregalaram, mas ele não parecia tão surpreso quanto Lupin havia esperado.

- Sangue de Slytherin – ele disse, finalmente parecendo sério. – Então é por isso que o Chapéu Seletor queria me colocar na Sonserina.


- Você não é um sonserino, Harry – disse Hermione firmemente – Qualquer que seja a sua... herança genética.


- É, eu sei – disse Harry calmamente.


Lupin olhou para ele por algum tempo, achando que Harry parecia ser, em muitos aspectos, surpreendentemente confiante na sua idade; ele se perguntou se aquele seria uma revelação recente, e o quanto disso veio de sua relação com Hermione - a qual, ironicamente, parecia ser a única coisa em que ele não era confiante.


- Eu acho que essa é umas das desvantagens de ser um Magid – Harry disse – Quero dizer, a espada nunca teria interesse em mim se eu não fosse um, teria?


- Com o poder sempre vêm desvantagens – disse Lupin. – É bom saber.


- Não dê ouvidos à ele sobre ser poderoso – disse Hermione, cutucando o lado de Harry com o dedo. - Você já tem uma cabeça grande o suficiente.


Harry parecia solene.

- Poder? Ambição? Os Jedi essas coisas não buscam.


Hermione riu. Sirius e Lupin olharam para Harry como se ele estivesse doido.
Harry forçou seu rosto a voltar a uma expressão séria.

- Esqueçam. Vamos começar.


******

Já estava amanhecendo quando Severo Snape chegou em casa. Ele teve que ficar por mais um tempo no St. Mungos, falando como os medibruxos sobre o tratamento de Dumbledore, e mais tempo ainda com suas ocupações no Ministério. Ele subiu os degraus para sua casa lentamente, vendo a luz vermelha do sol nascente encobrindo a escuridão acima de umas árvores à distância. Era manhã, e como normalmente acontecia quando ele estava muito cansado, a Marca Negra em seu braço doía como uma ferida que ainda precisava sarar por completo.


Ele sentiu algo levemente estranha no momento em que ele atravessou o umbral. Sua casa ainda estava como ele a havia deixado: escura, sem luz - mas havia algo sutilmente errado.


Snape tirou sua varinha de sua manga e andou silenciosamente pelo corredor, suas orelhas atentas a qualquer barulho.


Ainda no corredor, ele ouviu um barulho. Mas não era nenhum tipo de barulho que ele esperava.


Era música.


E estava vindo da sala de estar.


Curiosidade e indignação enterraram seu cuidado característico, e Snape atravessou o corredor em poucas passadas, não se importando em tentar abafar o som dos passos. No final do corredor, ele virou à esquerda e abriu a porta.


Uma visão bizarra encontrou seus olhos. O aposento estava do jeito que ele havia deixado – mobiliado com cadeiras de madeira pesadas, rígidas e desconfortáveis; as paredes cheias de livros, o chão cheio de poeira, qualquer raio de luz que conseguisse passar das janelas, bloqueado por pesadas cortinas. A única diferença era que no meio do aposento, no centro do pequeno tapete persa, que ele gostava bastante, estava Draco Malfoy.


Levou um momento para Snape reconhecer seu aluno preferido sem suas vestimentas pretas de Hogwarts, vestindo apenas um jeans e uma camiseta, os dois um pouco grande nele. Ele parecia calmo e nem um pouco surpreso em ver Snape. Ele tinha uma mão à sua frente, e, por causa da pouca luz que havia no quarto, Snape levou um momento para decifrar o que ele estava fazendo – e então, ele entendeu. Draco estava com a palma da mão para cima, e flutuando a alguns centímetros acima de seus dedos encontrava-se um disco preto – um disco de vinil. O disco estava girando rapidamente, como se estivesse numa vitrola, e música estava saindo dele.


Snape não podia evitar. Ele olhou fixamente para o disco.


- Bach – disse Draco, olhando calmamente para Snape. – As Variações de Goldberg. Você tem uma boa coleção de música trouxa. Eu nunca adivinharia que você é um grande fã dos Bay City Rollers.


Snape olhou para o seu aluno favorito e balançou a cabeça.

- Sr. Malfoy, – ele disse friamente. – Você poderia me dizer o que você está fazendo aqui? Desesperado em pesquisar mais sobre poções do amor? Ou você estava simplesmente curioso sobre a minha coleção de discos?


Draco ficou sem expressão por um momento, então sorriu. Tem alguma coisa estranha sobre esse sorriso, Snape pensou. Não era o sorriso de um adolescente. Não era nem o sorriso normal de Draco. Era algo mais, novamente.

- Achei que você poderia me ajudar. – Draco disse.


Snape balançou a cabeça de novo.

- Ajudá-lo? Por que eu iria querer ajudá-lo? Como você conseguiu entrar?


Draco sorriu.

- Eu posso fazer muitas coisas – ele disse, olhando para o disco em sua mão, que ainda estava girando. – Muitas coisas que eu nunca sabia que podia fazer. Como com esse disco, por exemplo. – Ele olhou para Snape pelo canto dos olhos. – Eu quebrei a fechadura na sua porta da frente. Depois eu a consertei. Está tão boa como sempre esteve. Não fiz dano algum.


- Essa não é a questão. A questão é que você não deveria estar aqui. Não consigo imaginar o que você está fazendo aqui, mas não me importo. Você pode ser um dos alunos da minha Casa, mas isso já é demais, você não acha? Eu sugiro que você volte para casa.


- Eu não posso voltar pra casa – disse Draco, que parecia ter arranjado a 'sem-vergonhice' do real desespero. – Você tem que me ajudar.


- Por que você quer a minha ajuda?


- Porque – disse Draco, simplesmente – você não vai contar a Sirius Black onde eu estou.


- Black estava preocupado com você hoje – disse Snape, em um tom nada gentil. – Eu acho que ele e o resto de sua família estariam perfeitamente felizes em ajudá-lo. Por que você não os procura?


- Porque eles não entendem. – disse Draco, ajoelhando-se. – São todos iguais, Sirius, Harry, e o resto, são todos bonzinhos, sempre foram. Eles não sabem outra maneira de ser. Para eles, o mal é algo que deve ser desprezado e ficar a distância, não algo que anda ao seu lado todo dia e toda noite da sua vida. Eles não sabem como lutar contra isso porque eles nunca tiveram que lutar. Mas você sabe – e quando ele olhou para cima Snape viu seu rosto ficar mais jovem por causa do choque e da exaustão. Snape lembrou do bebê que Draco foi, quinze anos atrás, quando seu pai o havia levado enrolado em cobertores para as reuniões de Comensais da Morte, e até Voldemort havia falado da cor peculiar do cabelo do garoto, e da cor prateada de seus olhos. Este aqui está marcado para algo especial. Não tão especial, Snape pensou, pois um termo usado pelo Lorde das Trevas, necessariamente nunca significava algo bom. – Você era mal, mas voltou pro lado do bem. – disse Draco. – Achei que você entenderia. Achei que você me diria como fez isso.


Snape olhou para ele. Seu aluno favorito, um garoto que ele sempre havia gostado, por nenhuma razão que ele podia decifrar dado que ele odiava o pai de Draco. Mas ali estava ele. Talvez era porque Draco o lembrava dele mesmo naquela idade, assim como Harry o lembrava de Tiago. Mas talvez isso fosse só um desejo de sua mente; Draco não parecia nem um pouco com ele aos quinze anos. Eu não era um guerreiro, ele pensou. Levei anos para aprender que deve haver algo no mundo pelo qual valha a pena lutar.


Draco ficou em silêncio, olhando o disco de vinil girar preguiçosamente acima de sua mão, uma luz escura e meio inquietante em seus olhos. Ele tinha um meio-sorriso sonhador em seu rosto, como se estivesse pensando em algo mais agora, em algum lugar que ele gostaria de estar. Era o mesmo sorriso que causaria pesadelos em Carlinhos Weasley, mas meramente deu a Snape uma pausa para pensar.

- Talvez eu possa ajudá-lo. Mas primeiro há uma coisa que você deve saber.


- O quê?


Com uma calma brutal, Snape disse:

- Seu pai está morto. Morreu ontem à noite.


Draco não se moveu, mas ficou muito branco repentinamente. A luz negra em seus olhos que tinha inquietado Snape pareceu dissipar por um momento, deixando seus olhos limpos, janelas do choque e da perda. O disco de vinil partiu-se em dois, com o som de um osso se quebrando, e os pedaços caíram no carpete.


Draco olhou para Snape, seu rosto parecendo o de uma criança, novamente, com uma desolação surpreendente.

- Você tem certeza?


- Sim – disse Snape, pronto para sair do aposento. – Fique onde está, Sr. Malfoy. Eu vou lhe trazer um café.


(Continua...)

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