Capítulo 3



Depois do almoço, todos foram para o quintal da casa, tentar abrir um espaço para o ensaio do casamento no meio de todas as peças de decoração que Fleur e Valentine haviam conjurado. A confusão de tules, veludos, sedas, flores, estátuas, colunas e laços era tão grande que ficava difícil imaginar que até o próximo sábado tudo aquilo tivesse se transformado em um cenário romântico para um casamento.

Enquanto a Sra Weasley, com um leve movimento de varinha, arrastava o altar para o centro do gramado, Hermione, que fazia as capas das cadeiras se dobrarem e se empilharem na mesa do canto, discutia com Fred e George:

- Mas é só usar um feitiço Mobilis e direcionar pra onde você quer colocar as caixas! Fala sério! Como vocês conseguiram chegar até o sexto ano sem ter aprendido nem isso?

- A gente não precisa aprender!

- A gente paga pra alguém fazer pra gente!

- É! Nesse caso, você!

- Ok, ok, eu ajudo vocês... Amanhã cedo eu passo na loja pra ver o que eu posso fazer – disse ela, se juntando a Harry e Ron que espantavam as galinhas do gramado.

- Deixa isso comigo... – e, disfarçadamente, ela sussurou “Opugno”, e fez todas as galinhas dispararem em direção a Gabrielle, como havia feito com um bando de pássaros amarelos sobre o Ron no ano anterior.

Os ensaios, os discursos e as eventuais crises de choro da Sra Weasley, que não conseguia se conter de orgulho ao ver seu filho mais velho se casando, mantiveram todos tão ocupados que a tarde parecia ter passado mais rápido do que o normal. No final do dia, depois de mais uma refeição farta na cozinha da Toca, George e Fred voltaram para seu apartamento em cima da “Gemialidades Weasley”, e Harry, Ron, Hermione e Ginny sumiram no meio das chamas verdes da lareira em direção à nova sede da Ordem da Fênix.

O lugar era impressionantemente aconchegante, e estranhamente familiar, pensou Harry, assim que entrou pela lareira da pequena sala de estar. Tonks e Lupin estavam de pé, à porta do cômodo, esperando por eles. Tonks, com longos cabelos vermelhos, não se parecia em nada com a pessoa de aparência doentia e malcuidada que ela havia sido no último ano. Lupin também tinha uma cara muito mais saudável e feliz. Provavelmente tinha se afastado de Grayback e dos outros lobisomens, e isso claramente lhe fez um bem enorme.

A casa, por sua vez, lembrava um pouco a Toca, com suas paredes meio tortas, que pareciam equilibradas por mágica. Com certeza não era nova e havia ficado muito tempo sem uso, assim como a antiga casa dos Black. Mas, ao contrário do Largo Grimauld, esta parecia ter sido bem mais receptiva à limpeza e à nova decoração, e estava realmente agradável, a não ser pelos os eventuais gritos assustados que pareciam vir do lado de fora. As janelas estavam fechadas e Harry não conseguia ver quem gritava, mas como nem Tonks nem Lupin pareciam incomodados, ele achou que não devia se preocupar também.

A pequena sala, composta pela lareira, um sofá e duas poltronas, colocados sobre um tapete florido, era ligada a uma também pequena cozinha, na qual havia apenas um fogareiro e uma mesa com quatro cadeiras. Algumas panelas estavam penduradas na parede, e uma prateleira no alto acomodava uma pilha de pratos, copos e talheres. No canto havia uma escada que levava ao andar de cima, por onde Tonks, Hermione, Ginny e Ron iam subindo para os quartos.

Harry se deteve na sala por alguns momentos a mais que o necessário, tentando ficar a sós com Lupin. A tempos tinha decidido que, depois de morte de Dumbledore, ele teria que partir para recuperar as horcruxes que faltavam. Sabia que começaria a busca por Godric Hollow, mas não sabia o que encontraria lá. Não sabia nem mesmo exatamente o que estava procurando. E se ainda havia alguém na Ordem que podia dar uma dica, era ele.

Como se adivinhasse que estava para entrar em um assunto que ele preferia evitar, Lupin puxou conversa o mais casualmente que conseguiu:

- E então, Harry, já recebeu a lista de materiais para o próximo ano letivo? Quem será que vai estar dessa vez no cargo de professor de Defesa contra as Artes das Trevas?

- Não sei. Também não estou muito preocupado em descobrir. Acho que não vou mais voltar pra Hogwarts...

- Não? Como não?! É o seu último ano! Você disse que queria ser auror, tem todos os O.W.L.s que precisa, por que essa mudança de planos?

- Acho que salvar a comunidade bruxa do Lord Voldemort é um pouco mais importante do que me tornar um auror, não é? – ele respondeu, enquanto brincava com uma almofada do sofá.

- Você acha isso mesmo, Harry? Não sei se concordo com você. Afinal, se não fosse pelos aurores que temos na Ordem, acho que seria bem difícil termos sobrevivido até aqui. Acho que, de certa forma, o treinamento para ser um auror pode ser considerado parte de “salvar a comunidade bruxa do Lord Voldemort”.

- Mas eu não posso ficar trancado na escola enquanto tanta coisa acontece aqui fora. Enquanto vocês resolvem tudo, enquanto os comensais da morte ficam livres pra trabalhar, enquanto todo mundo corre perigo de vida – Harry procurava argumentos para convencer Lupin de que ele não devia mesmo voltar pra Hogwarts sem ter que falar nas horcruxes, sobre as quais ele havia prometido a Dumbledore que só contaria para Ron e Hermione.

- Escute uma coisa, Harry: nós, e eu tenho certeza de que falo em nome de todos os membros da Ordem quando digo isso, estamos aqui porque escolhemos estar. Nós nos arriscamos porque escolhemos assim, porque sabemos que manter você vivo e são era a única coisa que importava nesses últimos dezesseis anos. Foi por isso que Sirius não pensou duas vezes antes de sair do esconderijo e ir atrás de você no ministério, foi por isso que Dumbledore se preocupou em escondê-lo dos comensais da morte na torre mesmo que isso tenha custado sua vida, é por isso que mesmo depois de tantas perdas e tanto sofrimento todos nós continuamos aqui do seu lado, dispostos a passar por tudo de novo.
Nós sabemos do perigo que você corre. Nem todos sabem do conteúdo da profecia, mas todos acreditam que ela, de alguma forma, liga você a Voldemort de uma maneira muito mais forte e profunda do que ele mesmo imagina, e sabemos que se alguém pode, algum dia, derrotá-lo, esse alguém é você. E é por isso que, até que esse dia chegue, não queremos que você se arrisque nada além do estritamente necessário.

- Mas eu não acredito que esta seja uma opção, Lupin. Me proteger de Voldemort não vai resolver nada. Se eu passar o resto da minha vida fechado em Hogwarts, pode ser que esse dia não chegue nunca. E enquanto isso as pessoas que se preocupam comigo vão sofrendo por minha causa. Vão morrendo... este peso é muito pior para eu carregar do que a responsabilidade que a profecia me deu. Eu preciso sair, preciso buscar Voldemort onde quer que ele esteja, preciso achá-lo, preciso destruí-lo. Só assim é que algum dia essa história vai acabar, para o bem ou para o mal.

- Mas Harry, sair pelo mundo procurando Voldemort é uma idéia louca...

- Não é só uma idéia. É uma decisão que já está tomada. Daqui a poucos dias eu completo dezessete anos, e a partir daí eu sou maior de idade, livre pra fazer o que eu quiser. Eu só acho que seria mais fácil fazer isso se eu pudesse contar com a sua ajuda.

- E por onde você pretende começar? - suspirou Lupin, vencido pelo cansaço.

- Godric Hollow. Vou visitar a casa dos meus pais, onde toda essa história começou. Você já esteve lá?

- Na cidade sim, na casa deles não. Eu não era o fiel do segredo, não tinha como saber qual era a casa deles. Por várias vezes eu passei dias rodando pela cidade, tentando encontrar uma pista de onde eles poderiam estar. Queria visitar vocês, ver a família que vocês estavam construindo. Mesmo em uma época de guerra, esse tipo de coisa acalma o coração da gente. Mas eu nunca achei nada. O segredo estava muito bem guardado com um grande amigo. Ninguém imaginava...

- Mas depois de tudo, depois que eles morreram, que o segredo foi revelado, mesmo assim não era possível achar a casa deles... a nossa casa?

- Pode ser que fosse, mas eu nunca mais tentei. Nunca mais pisei em Godric Hollow desde aquele dia. Ficou claro que os membros da Ordem continuavam em perigo, mesmo com a queda de Voldemort... Você sabe... Frank e Alice Longbotton torturados até a loucura... Eu precisei me esconder, e me mantive longe de tudo até quatro anos atrás, quando Dumbledore me convidou a voltar a Hogwarts.

- Você aceitaria tentar? Você iria até lá comigo?

- Ah, Harry, que coisa mais complicada de se pedir... Pedir a um homem que volte ao lugar onde ele perdeu seus três melhores amigos: um para a morte, um para Azkaban e um para as artes das trevas... – a expressão triste no rosto de Lupin fez Harry quase se arrepender da pergunta que acabara de fazer.

- Tudo bem, se você acha que não dá...

Lupin deu mais um longo e triste suspiro, como se travasse uma batalha interna na sua mente, a razão dizendo que ele devia seguir e proteger Harry, mas o coração se recusando a voltar ao lugar que lhe causou tanto sofrimento.

- Quando você pretende partir?

- Depois do casamento de Fleur e Bill. Podemos sair na segunda de manhã.

- E quanto tempo você pretende ficar?

- Nâo sei. Quanto tempo for necessário. Até eu achar...

- Remus... Você não vem dormir? Já está tarde! – a voz de Tonks ecoou no andar de cima.

- Depois pensamos nisso com mais calma, ok, Harry? Ela tem razão, já está tarde, vamos dormir.

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