Do Lado Errado dos Black



Julho de 1995.


Severus Snape não dava muito por ela então. E ele a conhecia muito bem: havia sido seu professor de Poções por sete longos anos. Tonks não tinha mudado quase nada. Continuava espalhafatosa, curiosa e levemente irritante. Às vezes, bem mais que levemente. Como se não bastasse falar demais, ela ainda era, com louvor, a aluna mais desastrada que ele já havia tido; o número de frascos quebrados, caldeirões derretidos e outros acidentes superava em muito os de Weasley, Potter e Longbottom juntos. Para coroar tudo, ela se vestia como um rapaz, com aquelas calças remendadas e os cabelos curtos. Rosas, roxos, verdes. Qualquer que fosse a cor, era ultrajante, uma aberração. Nem parecia uma Black (uma meio-Black, que fosse), famosos por sua elegância, tradição e beleza. Bem... bonita ele não saberia dizer se ela era, sempre escondida debaixo de todo aquele carnaval de remendos. Mas, elegante e tradicional, definitivamente... não. Era o lado errado dos Black. Sempre confabulando com aquele... aquele maldito Sirius. E com o lobisomem, também.

E era Auror. Ele sempre erguia uma sobrancelha e balançava a cabeça nessa hora, incrédulo. Auror. Não era de se surpreender que o Ministério da Magia estivesse tão decadente, tão incapaz de dar conta dos problemas do mundo bruxo se contratava pessoas como ela. Snape, porém, teve que dobrar a língua quanto às habilidades dela muito cedo. Ela não era excepcional, mas era muito competente. E como boa Grifinória que havia sido, era sempre muito impetuosa... defeito que até podia ser relevado com os bons resultados que conseguia para os negócios da Ordem.

Tonks só não havia ainda ganho o respeito de Severus Snape. Isso, porém, iria mudar muito em breve.



*

25 de Agosto de 1999.


Não havia sido difícil se decidir. Aquela proposta de ensinar em Hogwarts, por mais que soasse absurda, parecia ter caído do céu. Bem, a escola estava igualmente cheia de lembranças, mas cheia também de pessoas que a compreenderiam. Desde o fim da Guerra, todos os membros da Ordem pareciam, inconscientemente, buscar algum conforto uns nos outros. Haviam sido muitos os momentos de pesadelo a que sobreviveram juntos... e Harry, Ron, McGonagall e tantos mais também tinham perdido alguém, de uma ou outra forma.

Ela ia sentir falta da divisão dos aurores, não dava para negar. Tinha sido difícil segurar as lágrimas na pequena festa de despedida que haviam preparado para ela na semana anterior. Não tinham sido tantos os anos ali, afinal, mas tinham sido dos melhores. Ela era jovem, cheia de sonhos e entusiasmo nos seus primeiros dias. Ia salvar o mundo...! Agora, parecia estar além das suas forças sequer salvar a si mesma. Tonks trancou a porta devagar, fitando a casa já quase vazia por trás das janelas empoeiradas. Não ia sentir um pingo de falta daquele lugar; já tinha perdido o seu item mais importante há muito, muito tempo. Ela abotoou os últimos botões do casaco, da mesma forma como vinha fazendo tudo nas últimas semanas: vendo de fora, como se fossem os dedos de outra pessoa. O seu verdadeiro eu estava escondido bem lá no fundo daquela casca tão cheia de auto-controle; só assim ela conseguiria seguir em frente. A casca que agora se preparava para aparatar até Hogsmeade, levando consigo dois malões, a coruja de penas avermelhadas, a vassoura e os seus bens mais preciosos: algumas cartas e fotografias. Cartas sensíveis, poéticas, mesmo quando eram um simples bilhete de três frases; escritas naquela caligrafia clara e caprichada, às vezes, uma gotinha de chá aqui e ali. Fotografias mostrando o Remus tão feliz que ele havia sido naqueles últimos meses.

Ela ainda apertava o maço de papéis no bolso quando chegou ao portão principal da escola.

_ Está atrasada _ ele lhe disse, saindo das sombras e erguendo uma sobrancelha.

_ Dá um tempo, Snape. Tinha coisa demais pra arrumar. E cinco minutos não é nada _ ela disse lhe dando um abraço rápido.

_ Sinto lhe informar que, para um professor, cinco minutos são muita coisa _ ele disse suavemente enquanto a abraçava de volta; depois murmurou um feitiço locomotor e a bagagem dela os seguiu pela estradinha que levava até a escadaria da escola e por dentro do castelo.

_ E então, por onde eu começo? _ ela perguntou, com uma sombra de sua antiga vivacidade.

_ A diretora está lhe esperando em sua sala; e vai lhe dar todas informações quanto às aulas e o nosso sistema de ensino. Mas antes, vou levá-la até seu quarto.

Ele a guiou por incontáveis corredores e escadazinhas, muitos dos quais ela simplesmente morria para conhecer quando era apenas uma estudante curiosa. Era tão confortante estar ali outra vez... o castelo continuava exatamente o mesmo que havia sido por séculos sem fim. Sólido, seguro. Ela só emergiu de seus pensamentos quando sentiu os dedos longos pousando suavemente em seus ombros e permanecendo por ali durante alguns segundos, numa passagem particularmente mais estreita.

Por fim, chegaram a um quarto situado no alto de uma torre, com duas grandes janelas, através das quais ela via uma parte do campo de quadribol, o lago e o sol quase baixinho no horizonte. A vista ali era linda, de tirar o fôlego.

_ O jantar é às sete e meia, acho que ainda se lembra. E... eu sugeriria que adiantasse o seu relógio alguns minutos para não se atrasar mais _ Snape concluiu, com um sorriso quase invisível nos lábios. Ela o olhou se fingido exasperada; e se voltou para contemplar o resto do quarto. Um tapete felpudo sob os pés, uma cama grande e que parecia ser muito fofa, um armário de madeira escura, uma mesa de estudos e a lareira. Não podia ser mais aconchegante.

_ Sabe... _ e ela se voltou para Severo outra vez, com um sorriso breve nos lábios e os olhos carregando uma tristeza, para ele, indisfarçável _ Acho que vou me dar muito bem aqui... mesmo tendo um certo morcego velho e implicante como colega.

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muuuuuito obrigada pelos comentários, morgana black e carina snape!! =)

bem, esse capítulo teve poucas revelações, eu sei, mas precisava situar direito a história. agora... ahn? de onde surgiu toda essa intimidade entre o snape e a tonks? porque ele se preocupa *tanto* com ela? e como assim ela conhece os mínimos detalhes e reações dele? e cadê o lupin? para essas e mais respostas, não percam os próximos capítulos =D

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