A cabeça sob o chapéu
Capítulo 12
A cabeça sob o chapéu
Slytherin não partira. Estava lá, com os demais, para esperar os alunos. E quando estes chegaram, foi grande a alegria. Dez jovens, meninos e meninas de 11 anos, que receberam cartas da escola informando o que deveriam levar consigo para começar seus estudos, foram levados por seus pais até Hogwarts do jeito tradicional: tapetes voadores planaram sobre os gramados à entrada da escola, e pequenos acampamentos se formaram. Houve um grande almoço de confraternização entre professores, pais e alunos. Mais tarde, os meninos foram organizados no grande salão, próximos a um tablado alto, para a seleção de casas.
Helga explicou a todos como separariam os alunos por casas, para que tivessem assistência mais direta daquele professor com quem mais tivessem afinidades.
Isso não fora totalmente resolvido, pois Merlin ficara de pensar num meio de fazê-lo de forma imparcial. Desse modo, Godric, Helga e Rowena olharam-se, indecisos.
Slytherin achou graça da confusão dos amigos. Não tinha dúvidas de como selecionar seus alunos e afirmara que um juiz imparcial seria bastante difícil de conseguir. Quanto ao que lhe dizia respeito, tinha seus próprios meios mágicos de descobrir, entre aquelas crianças, quais poderiam ingressar em sua casa. Slytherin escolhera as masmorras para colocar os seus. Não acreditava na superproteção de Helga ou nas leituras infindáveis de Rowena, de modo que não lhe importavam acomodações nos andares superiores do castelo. Prezava, antes de tudo, a privacidade e nenhum lugar melhor que as masmorras para isso. Ninguém se aventurava de bom grado pelos corredores lúgubres, onde os fantasmas perambulavam em um sono inquieto, entre a vida dos dias e a morte inacabada. Não lhes faltaria conforto, mas Salazar acreditava que devia preparar os seus para os revezes e as carências, pois só assim estimularia o caráter resistente e irresignado de um verdadeiro Slytherin. De nada valeria tratá-los com mimos, que tão somente os enfraqueceria, como a vida farta fizera com Godric.
Slytherin queria bem ao amigo, mas não concordava com sua postura conformada e conservadora, resultado, certamente, da infância entre amas e a paparicação do pai.
Salazar perdera o pai quando ainda era muito menino, mais jovem do que aqueles que lhe passavam às mãos agora. Tivera de suportar a pobreza e o eloqüente sofrimento da mãe, constantemente lamentando o perdido, amaldiçoando os trouxas que lhes roubaram as posses. Menino, passava seus dias perambulando pelos arredores da aldeia, fazendo as coisas que os meninos apreciam, investigando a floresta cinzenta e procurando tesouros esquecidos. Foi nessa época, quando seus dias se ocupavam em solidão e curiosidade, que descobrira sua habilidade mais especial: podia falar com cobras. Com essa descoberta, que guardou para si apenas e por bastante tempo, não ousando dividir nem com a mãe, Salazar encontrou seus amigos mais constantes. Passou a conversar com as serpentes que rastejavam no chão de cinzas da floresta, com as que desciam da montanha, com as cobras d’água nas lagoas, enquanto pescava. E elas lhe contaram muitas coisas e ensinaram-lhe sobre o mundo dos répteis, como pegar um coelho sem fazer ruído e, dessa forma, Salazar aprendeu a alimentar-se num ambiente hostil e desconhecido. Godric comia da mesa do pai, em banquetes suntuosos, tinha à mão seus desejos realizados, não precisara jamais comer ratos, não conhecia o sentido da palavra sobrevivência. Mas ele, Salazar Slytherin, podia resistir a tudo.
Breve visitaria a mãe, que lhe prometera uma criação digna do que ser Slytherin representava. Seus planos não deveriam morrer sob o peso do idealismo romântico de Godric e sua integridade vacilante. Que Godric apoiasse Arthur já era questionável para um bruxo – e até escolhera a idade de 11 anos para os alunos novos por ser a idade em que o rei sacou a espada da pedra –, mas que também não lutasse pelo poder para os bruxos era intolerável. Salazar não permitiria que isso continuasse por muito mais tempo e as providências já haviam sido iniciadas. A câmara estava quase pronta e breve poderia instaurar em Hogwarts o verdadeiro reinado dos puro-sangue.
As notícias que chegavam eram auspiciosas para Salazar. A batalha, iminente em Salisbury, seria a derrocada de Arthur, ele esperava; isso se Merlin não interferisse. Mas não se tinham notícias do mago desde pouco depois que partira de Hogwarts, o que era um indício de que as informações que Salazar passara para Morgana teriam sido úteis e decisivas.
Mas nesse momento, Slytherin estava rindo-se interiormente do grande Gryffindor, enquanto este se decidia, de improviso, como efetuar a seleção para as casas. Em pé sobre o tablado, Godric parecia perdido como o menino que tinha à sua frente.
Subitamente, Godric pegou pelo braço aquele menino que, assustado, subiu para o tablado também. Godric tirou seu chapéu de caça, que trazia preso no cinto, e o colocou na cabeça do menino. Sacou sua varinha de azevinho e, ao dizer a frase mágica Vitam impendere vero et virtus similiter agendo, o chapéu fremiu, envolto em suave névoa avermelhada, abriu-se um rasgo próximo a aba e ele adquiriu vida. Nada disse, por momentos, e parecia pensar. Então aprumou o bojo e vaticinou: Griffindor!
Godric encheu-se de orgulho, pois o primeiro selecionado seria para si. O chapéu de Godric fora afinal escolhido como o juiz imparcial a fazer a seleção. Ao término da cerimônia, e após a partida dos pais, entre lágrimas e promessas de escrever longas cartas, os meninos foram levados para seus dormitórios pelos fundadores. Griffindor levara o melhor quinhão, pois três crianças, dois meninos e uma menina, foram selecionados para sua casa. Helga teve quatro entregues aos seus cuidados e Salazar, dois. Apenas Rowena teve uma única menina em sua casa. "Haverei de fazer dela uma verdadeira pupila, lhe ensinarei tudo o que sei", pensou Rowena, que sentia a falta de Maeve. "E será minha preferida até que, um dia, nos deixe, para realizar grandes feitos"
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