O último jantar
Capítulo 11
O último jantar
Depois do banquete de fundação, o trabalho se iniciou. Havia muito a organizar em tempo de receber os alunos. Houveram convidados de toda parte da Bretanha, Gales, Escócia e Irlanda e, após o discurso inaugural, Godric propusera a Ordem de Merlin, comenda para aqueles que realizassem grandes feitos em favor da bruxidade.
Arthur não compareceu pois preparava-se para uma batalha. Godric dessa vez não o seguiria. O seu propósito também era muito importante e, para a bruxidade, era vital. Merlin ainda ficou por algum tempo, propondo melhorias no castelo, fazendo encantamentos de proteção juntamente com Rowena, orientando Helga sobre os cuidados com as mandrágoras, aconselhando Godric e Salazar quanto à necessidade de cautela quando da criação do Conselho. Esse conselho fora idéia de Salazar, um primeiro passo para estabelecer um estado paralelo ao de Arthur, que declinava a olhos vistos, mesmo com campanhas vitoriosas. Mas fora vago ao propor o Conselho. Convinha não assustar os amigos.
Tão somente Salazar sabia que Mordred preparara um grande exército, fortalecido pela magia de sua mãe, Morgana, que decidira-se a destruir o que ajudara a construir: Arhur. Merlin desconfiava das intenções de Salazar e advertira-o quanto aos riscos que corria e aos quais expunha seus amigos e a escola. Mas Slytherin não o ouvia. Estava obcecado pela idéia de obter mais poder para os bruxos. Poderiam vir a se tornar o maior poder na Bretanha depois da queda de Arthur, se Mordred não pretendesse isso também. Não importava, pensava Salazar. Se Mordred quisesse poder para os bruxos, seria bem-vindo e receberia apoio.
Chegou a véspera da chegada dos primeiros alunos, vindos de várias partes do país, e os fundadores, Merlin e Maeve jantavam no grande salão, à luz de uma centena de velas que flutuavam no ar. Rowena fizera esse feitiço especialmente para Merlin. O jantar ia a meio quando vieram avisar que Edward estava à porta, acompanhado de quarenta homens. Maeve ficou pálida, mas levantou-se e foi receber o marido. Os outros a seguiram e logo Maeve subia as escadarias para recolher seus pertences. Não que ela precisasse fazê-lo desse modo trouxa, mas queria adiar por meia hora que fosse a partida. Nos seus aposentos, abraçou Rowena demoradamente, beijou-a e secou-lhe uma lágrima no rosto quente.
–Não chore, querida amiga. Logo receberá notícias minhas. Pedirei à deusa pelo bem de Hogwarts e pela sua segurança e felicidade.
Helga entrou nesse momento, em prantos. Abraçou-se a Maeve e recomendou-lhe, entre soluços, muito cuidado, pois Edward não aceitara ficar para cear com os outros. Voltaria para Castlegregory imediatamente.
– Não se preocupem, ficarei bem, eu sei. Eu vi. – disse-lhe Maeve.
Dirigiu-se à porta com o mesmo embrulho que trouxera, voltou-se e disse:
– Despeçam-se de Godric por mim.
Maeve desceu a escadaria e encontrou o marido parado diante da grande porta de carvalho do castelo. As aldravas reluziam sob as luzes. Estendeu-lhe a mão e partiu.
Voltaram à mesa, embora não tivessem mais fome, quando Salazar foi o pimeiro a falar.
– Sabia que esse momento chegaria, mais dia menos dia, e não deveria se tardar muito. Afinal, Maeve é casada com um rei, não pode sair como uma bruxa qualquer e ausentar-se por meses.
– Maeve é uma rainha, sim, Salazar. – disse Rowena. – Mas também é uma bruxa e Edward, rei ou não, sabe o que isso significa. Ela é livre!
– Não, ela não é. Esse não é o costume trouxa. E quando Maeve aceitou unir-se a um trouxa, abdicou desse direito.
Salazar levantou-se de ímpeto.
– Vê porque não podemos nos unir a trouxas? – falou, dirigindo-se a Godric. – Eles tratam nossas mulheres como propriedade!
– Salazar, não comece com isso novamente. Podemos viver pacificamente, bruxos e trouxas. – falou Merlin. Você não está vendo a situação com a razão, deixa-se levar pela paixão e o ressentimento.
– Não, Merlin! Não podemos viver pacificamente! – gritou Salazar. – Morgana entendeu isso e você se mantém cego, por seu amor a Arthur, por sua ambição de torná-lo o maior dos reis, você não vê que nosso povo está sofrendo indignidades! Você, Merlin, traiu sua gente!
Merlin ergueu-se. As chamas das velas apagaram-se, restando apenas algumas tochas nas paredes distantes. A luz da lua escondeu-se atrás de uma nuvem, e as estrelas desapareceram no céu encantado do grande de salão. Subitamente o gentil Merlin tornou-se assustador. Seus olhos brilhavam como fogo e sua voz fez-se grave, como se viesse das profundezas de uma caverna.
– Como ousa? – falou Merlin, com a voz cava e perigosamente calma. – Você crê que sabe o melhor para todos, não é Slytherin? Mas não sabe. Você é jovem e tem o ardor da juventude, mas para comandar um reino é necessário mais que legiões de soldados e uma espada mágica. Mais que uma idéia revolucionária. É preciso mais que informações trocadas na escuridão, meros conchavos entre ladrões. Para comandar um reino, continuou, é preciso um rei e eu fiz esse rei. Arthur é o rei que eu dei aos trouxas e aos bruxos. Você, Slytherin, deseja um mundo repartido, o poder nas mãos de poucos. – Sua voz tornou-se quase um sussurro quando terminou. – Eu sei, Slytherin, o que você faz à noite, quando o mundo dorme.
Salazar fez um gesto como se fosse desembainhar a espada e Godric saltou sobre ele.
Rowena sacou sua varinha e apontou para Slytherin.
– Calma! – gritou Helga. – O que estão fazendo? Brigando como bárbaros! Acalmem-se.
Slytherin soltou o cabo da espada e Godric o deixou livre. Salazar, girou o corpo e saiu do grande salão a passos largos.
Fez-se silêncio, um silêncio pesado, enquanto os corações de todos batiam agitados, que Merlin quebrou abruptamente.
– Peço desculpas, meus amigos, não contive meu gênio e isso foi um erro. Peço perdão a todos.
Baixou os olhos por um momento e depois decidiu-se.
– É hora de partir. Minha estada foi longa demais e percebo que pode ter sido excessiva.
– Não, Merlin. – começou Rowena, apreensiva, mas não pode terminar.
– Longa vida a Hogwarts! – exclamou Merlin. – E adeus, meus queridos.
Com um estalo, desapareceu, deixando no ar um suave perfume de grama fresca ao partir.
Consternados com esses tristes acontecimentos, os amigos se recolheram cedo.
Godric ainda iria procurar por Slytherin pelo castelo e nas áreas próximas, sem sucesso.
"Espero que não tenha partido", pensava Godric. "Seria péssimo para a escola não ter um dos quatro aqui, amanhã".
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