Essa foi Quase!!!
Gina estava certa de que seria capaz de gritar de raiva se visse mais um corredor à sua frente. Felizmente, isso foi evitado quando Malfoy virou-se para ela:
- Agora, Weasley. Nós vamos entrar na cozinha e passar por uma porta que dá para os jardins internos. Ou seja, alguém que esteja descansando em seu quarto ou fazendo qualquer coisa parecida pode nos ver pela janela. Precisamos caminhar rápido e sem fazer barulho ou qualquer coisa que chame a atenção, pois lá fora não tem porta para entrarmos. Nem armário para nos escondermos.
Gina concordou com a cabeça. Draco estava com a mão na maçaneta da porta da cozinha, quando ela o interrompeu.
- Malfoy?
- O que é?
- Ah... eu... ah, é que eu acho que eu ainda não agradeci pelo que você está fazendo por mim.
O rosto dele exibiu uma expressão que ela não pôde decifrar. Ele olhou para ela um instante, e Gina sentiu-se transparente ao olhar dele. De algum modo parecia que ele podia ver tudo o que ela sentia: o medo, a incerteza, a saudade, e aquele outro sentimento que a acompanhava desde que Malfoy entrara no quarto, o sentimento que ela não sabia dizer o que era.
A menina sentiu-se incômoda ao pensar sobre isso, e o rapaz pareceu notar. Ele desviou o olhar e disse fracamente:
- Não precisa agradecer.
Gina procurou o olhar dele, mas não o encontrou.
Draco abriu a porta da cozinha, espiou para dentro e logo depois fez sinal para ela passar, ainda com a mão sobre a maçaneta, o que fazia com que seu peito ficasse contra a porta.
Ao passar, a menina claramente sentiu um arrepio. Normalmente, ralharia consigo por sentir arrepios perto de Draco Malfoy, mas aquele não era o momento ideal para esse tipo de coisa. Tentou ignorar e concentrar-se no que devia fazer.
O rapaz a conduziu pela porta que dava aos jardins internos.
Ao sair, ela sentiu a brisa noturna acariciar seus cabelos.
- Malfoy... você não disse que o alçapão ficava no corredor da copa?
- E fica. Está vendo aquela porta, do outro lado dos jardins? É lá que precisamos chegar.
- Então... acabamos de passar pela cozinha. Geralmente a copa fica logo após a cozinha, não atravessando um jardim interno...
- Ótimo raciocínio, Weasley. Você só esqueceu uma coisinha: o dono dessa casa é Lúcio Malfoy. Você realmente acha que ele construiria uma copa perto da cozinha, para facilitar a vida dos elfos domésticos?
Gina constatou que aquilo fazia total sentido.
- Quer dizer que foi seu pai quem construiu essa mansão? Ela parece tão antiga...
- É antiga. Foram os meus ancestrais. Tataravôs de meu pai, eu acho. Mas todos eram Malfoys. Também não era de seu feitio tornar coisas fáceis para ninguém em todo o mundo, ainda mais se fossem criaturas escravizadas sob seu comando.
A menina novamente constatou uma linha de raciocínio correta. E surpreendeu-se por não ter pensado nisso antes. Normalmente, a maldade dos Malfoy viria à tona à sua mente, mesmo antes do nome ser pronunciado. Mas agora, seus pensamentos estavam uma bagunça e Gina tinha desistido, de uma vez por todas, de tentar colocá-los em ordem novamente.
Tudo o que pensava que sabia tinha virado de cabeça para ar em poucas horas. Então, o melhor a fazer seria incontestavelmente tentar acompanhar essas novas informações e mudanças que elas acarretavam.
- Agora, Weasley, eu preciso que você preste bem atenção. Como você pode ver, esse jardim não passa de uma estufa ao ar livre. Qualquer um que passe pelos corredores dentro da Mansão que dêem acesso a este local, pode nos ver facilmente.
Gina começava a pensar que não gostaria nem um pouco de atravessar os tais jardins. Seu coração acelerou, e batia tão alto que ela pôde jurar que Malfoy era capaz de escutá-lo também.
- Por isso, caminharemos junto à parede do lado direito, que é o que chega mais rápido à porta. Fique atrás de mim, e não se distancie nem se Potter aparecer e fizer uma declaração de amor, entendeu?
Ela amarrou a cara.
- Primeiro, Malfoy: eu não sou retardada. É claro que eu entendi. E segundo: Harry e supostas declarações de amor que sem dúvida não seriam para mim não têm nada a ver com isso.
Ele ignorou o último comentário, agarrando o pulso da menina e conduzindo-a até a parede da qual falara.
Quando Draco virou-se para encará-la, seus rostos estavam a menos de cinco centímetros de distância.
- Já que você entendeu, apenas mais uma observação: não quero você mais distante de mim do que isso, durante todo o percurso.
Gina apenas fitou o rapaz. Sem proferir palavra, ele voltou-se para os jardins e tomou sue rumo em direção à porta do corredor da copa.
Caminharam em silêncio. Gina percebeu que a grama estava molhada. Chovera enquanto ela estivera trancafiada naquele quarto escuro. Por isso o ventinho noturno estava mais frio do que o habitual: o clima ainda estava úmido.
Quando este soprou novamente, com mais intensidade dessa vez, um arrepio percorreu a espinha dela, fazendo-a soltar um gemido de frio, o que por sua vez, fez Malfoy parar de andar.
- O que houve?- perguntou, virando-se para ela.
- Nada, só estou com um pouco de frio. Só isso.
O rapaz instantaneamente tirou se casaco, passou para trás da menina e colocou-o sobre os ombros dela.
- Melhor assim?- quis saber, voltando para o seu lugar.
- Malfoy... por quê? Por que você está fazendo isso? Eu agradeço muito, já disse isso, mas... não parece... algo que você normalmente faria...
Ele fincou um olhar profundo nos olhos dela, como que procurando alguma coisa dentro dela. Em seguida, disse simplesmente:
- Apenas continue caminhando.
**
A Mansão Malfoy, vista de fora, lembrava um castelo medieval, feito de pedras escuras, que combinadas com o local, conferiam um ar sinistro à construção. Oq eu não era de surpreender, já que era Malfoy que morava ali.
Os três foram em direção ao que parecia ser a entrada principal o mais rápido que suas pernas exaustas permitiram.
Chegando, depararam-se com um grande portão escuro, que estava ocasionalmente aberto. A alguns metros de distância, era visível uma grande porta de madeira. Era, de fato, a entrada principal.
- Vamos procurar outro jeito de entrar. Acho que não ia colar se nós simplesmente batêssemos à porta principal da casa de Malfoy perguntando se lê tem visto a minha irmã seqüestrada ultimamente...
- Rony está certo. Vamos fazer a volta na propriedade. Quem sabe a porta dos fundos...
- Também não vai servir, Harry. Chamaria muita atenção, afinal, deve haver muitos elfos domésticos para manter uma casa tão grande em ordem, e sinceramente não acredito que Lúcio Malfoy permitiria a passagem de elfos pela entrada principal de sua mansão...- disse Mione, querendo com todas as suas forças que estivesse errada de alguma maneira, que realmente fosse possível entrar pela porta dos fundos e que Gina estaria ali esperando por eles.
- Certo. Uma janela, então?
- Acho que seria o jeito mais fácil. Ou mais viável. Encontrar uma janela a uma altura “pulável” e entrar sem que ninguém nos veja... é como Poções: fácil na teoria, mas os livros não dizem nada sobre um professor recalcado de cabelos ensebados... – Rony desanimava-se.
- Mas nós temos que conseguir! É o único jeito!
- Harry tem razão. Não consigo pensar em outra maneira...
- Então... vamos conseguir.- Rony soava mais determinado do que nunca. – Harry, você procura pela nossa esquerda, Hermione pela nossa direita, e eu faço a volta na mansão para ver se encontro alguma coisa interessante. Nos encontramos aqui daqui a... quinze minutos.
Os três dispersaram-se com a mente determinada e o coração pesado, torcendo para que não fosse tarde demais.
**
- Jovem Mestre Malfoy!- uma vozinha esganiçada fez-se audível não muito longe dos dois.- Wally estava procurando pelo senhor! O que o senhor está fazendo aqui fora com este frio?
Gina ficou paralisada. Tudo estava perdido. Sabia que, mesmo um elfo doméstico poderia estragar tudo se a visse ali. Ouvira Hermione falando certa vez, enquanto tentava convencê-la a entrar para o F.AL.E., que os elfos domésticos tinham um certo “senso de dever” muito forte. Sem dúvida, se o tal Wally a enxergasse, Lúcio Malfoy ficaria sabendo em menos de meia hora.
Draco, em menos de meio minuto, pulou na frente da menina, em uma tentativa de esconder a silhueta dela, aproveitando-se da escuridão.
- Não te interessa o que eu estou fazendo ou deixo de fazer, Wally! Se manda!
- Jovem Mestre Malfoy, Wally pode preparar uma xícara de chá quente para o senhor! Se o senhor quiser, Wally pode arrumar a cama do Jovem Mestre Malfoy se o senhor estiver com sono.
- Wally, qual a parte do “se manda” você não entendeu? Você vai embora agora ou preciso fazer um desenho pra ver se você aprende a obedecer da primeira vez que eu mando?
- Sim, senhor, Jovem Mestre Malfoy. – o elfo respondeu, visivelmente com bem menos empolgação na voz.
Ele fez uma reverência e voltou para a cozinha, de onde havia vindo.
- Por Merlin! Essa foi por pouco!
- Foi mesmo. – a voz de Gina estava distante. Ela voltou-se para draco. – Escuta, Malfoy, você precisava mesmo ter sido tão grosso com ele daquele jeito?
- Ah, não... como se já não bastasse a Granger com aqueles distintivos patéticos que ela espalha por toda escola, agora você com lições de como lidar com elfos?
- É sério, Malfoy! Eles podem não ser bruxos, e podem ser seus empregados, mas não significa que não tenham sentimentos. Nisso eu concordo com a Hermione. Tente imaginar-se no lugar deles!
- Eu não preciso, Weasley, porque isso nunca vai acontecer. Eu nunca vou estar no lugar de um elfo doméstico! Nunca nenhum bruxo vai estar!
- Tem certeza?- ela agora parara totalmente de caminhar.
- Absoluta. É impossível.
- Pois não tenha. Eu, por exemplo, sempre te vi como um elfo doméstico.
Ele riu abertamente, com desdém.
- E agora isso! Era só o que me faltava!
- É sério! De uma maneira ou de outra. Não no sentido de fazer serviços pesados, mas no sentido que você os vê: vermes. Seres medíocres, que estão neste mundo apenas por uma questão de volume, porque alguém precisava estar ali. Criaturas sem serventia real, sem valor algum, e desprovidos da capacidade de sentir algo, não importa o que seja: dor, cansaço, tristeza, alegria... amor. Apenas... existem.
O rapaz olhava fixamente para ela. Nunca ninguém havia falado com ele daquele jeito antes, em toda sua vida. Nem mesmo seu pai, que se estivesse ali seria o próximo da fila para dizer coisas desagradáveis sobre o que pensava a seu respeito.
Lúcio sempre o fizera acreditar que as coisas sempre seriam fáceis. Primeiro: era um Malfoy. Segundo: era rico. Tudo mais era supérfluo. Não possuía valor algum.
E ele, Draco, nunca havia deparado-se com alguma situação ou encontrara alguém que o fizesse questionar isso, do modo com Gina o estava fazendo.
Ela estava certa, ele sabia, e segura de si.
- Legal Weasley. Agora, deixe-me dizer pra você o jeito como eu sempre te vi...
- Não precisa.- a voz dela estava seca.- Você fez questão de deixar bem claro o que pensa sobre mim durante todos esses anos.
Mais uma vez, ele ficou sem fala. Apenas deu as costas à garota e seguiu caminhando, controlando-se várias vezes para não explodir e deixar realmente claro o que sentia por ela.
Nenhum dos dois falou até chegarem à porta do corredor.
Como sempre, o rapaz abriu a porta, deu uma espiada no corredor e logo em seguida fez sinal para Gina de que a menina poderia passar.
Um tapete de veludo verde-escuro acompanhava todo esse corredor. Quando finalmente chegaram no fim dele, Draco puxou uma ponta solta do tapete perto de um canto da parede, revelando um alçapão de madeira.
O rapaz levantou a tampa e encarou Gina.
-É aqui. – Draco evitava o olhar dela.
- É.
- Bem... aqui do lado tem uma escada. Você pode descer por ela. Então, é só seguir o túnel que você vai parar em uma saída escondida atrás de uma cerva-viva bem ao lado da entrada principal da mansão.
- Uhum.
A menina olhava fixamente para o chão, parecendo distante.
-Weasley! O que você está esperando?! Quer fugir daqui ou não?!
- Quero! Só não quero entrar nesse lugar sozinha! É isso! Contente?
Ele ficou sem expressão, fitando-a daquele jeito que a fazia sentir-se transparente. A menina queria fisgar no olhar dele algum indício de emoção, qualquer que fosse, mas não conseguia.
Ela odiava não poder decifrar as expressões no rosto dele, sentia-se vulnerável a qualquer coisa que ele fizesse ou dissesse e por mais que tentasse, não conseguia evitar. Aqueles olhos cinzentos tinham alguma coisa que a hipnotizava.
Ele suspirou.
- Desça. Eu vou logo atrás.
Certo, aquilo era previsível. Mas ela foi inteiramente sincera quando transpareceu surpresa.
- Obrigada...
A escada era estreita, dando passagem apenas a uma pessoa de cada vez. Gina desceu devagar o que pareceram ser uns vinte degraus, e encontrou-se em um túnel totalmente escuro, estreito e comprido, com chão arenoso sem calçamento algum.
Draco desceu logo atrás dela.
- Lumos!- disse ele, apontando a varinha para frente. Essa foi a primeira vez que Gina sentiu um pesar por não ter sua varinha por perto.
O rapaz tomou a frente novamente, por estar segurando a única fonte de iluminação de que dispunham. A menina o seguia.
Pelo menos ali, não precisariam esconder-se até da própria sombra. Não deveria haver ninguém por ali.
Draco acabara de “jogar tudo para o alto”. Decidira abandonar a postura que todos esperavam de um Malfoy: o rapaz frio, sarcástico e prepotente. Apenas faria o que sentisse que era a coisa certa a fazer.
Ele sabia que isso estava errado de certa forma, mas tudo o que Gina dissera penetrara em sua mente. Uma Weasley fizera-o pensar sobre coisas que ele nunca dera importância antes. Nunca importara-se com o que os outros pensavam ou sentiam. Seu nome sempre impunha a todos o que ele sentia e pensava. Todos, menos Gina Weasley. Ela deixara isso bem claro.
O que surpreendeu o rapaz, que nunca esperara uma atitude desse feitio dela. A menina mostrara-se muito mais decidida do que sempre pareceu, e isso intrigou o rapaz.
A repulsão habitual a qualquer Weasley que ele sentia parecia agora nunca ter existido, e alguma coisa estranha enchia seu peito. Ele não queria admitir, nunca quis, mas com ela tudo sempre foi diferente. E estava com medo de que fosse o que estava pensando que era.
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