Duelo de amor
Hermione acordou quando escutou os passos de alguém se aproximando e se ergueu do chão. Harry entrou no quarto, mas ficou parado à sua frente, sem dizer-lhe nada.
- Harry? – ela perguntou, pressentindo algo errado em sua conduta.
Ele se aproximou, então, ainda sem falar uma palavra e, com um toque de varinha, libertou-a das algemas.
Hermione esfregou os pulsos marcados pelas algemas, mas ficou contente por Harry a ter libertado.
- Harry! – ela disse feliz, mas seu gracioso sorriso morreu em seus lábios quando ele agarrou um de seus pulsos, puxando-a para ele.
- Harry? – Hermione espalmou com a mão livre o peito de Harry. Ficou com mais medo ainda quando sentiu os batimentos dele. Estavam irregulares, tal qual sua respiração. Era como um aviso de que problemas estavam por vir. – Me largue, por favor, está me machucando!
- Eu vou fazer mais do que isso! – respondeu Harry, por fim, com um tom rouco e sombrio na voz. E antes que Hermione pudesse falar ou fazer qualquer coisa ele a empurrou para a porta.
- Saia!
Hermione começou a andar para trás, esbarrando na soleira da porta, sem, contudo, parar.
Quando chegou ao corredor, percebeu exatamente onde estava. Não estava na casa dos gritos, como imaginou que estivesse. Não era um casebre velho e fétido, entregue à imundice, como Harry disse que ela merecia ter. Não, era sua casa. A casa de seus pais adotivos, e o quarto onde estava, era o SEU quarto. Quantas lembranças aquele lugar trazia. Seu pai, sua mãe... as férias alegres em que se encontrava com eles. Apenas por poucas semanas, pois os dias que a separavam de Harry eram quase insuportáveis, mesmo na presença maravilhosa de seus pais. E pensando neles, uma lagrima se formou em seu olhar. Ela olhou para a porta seguinte: ali, seus pais foram felizes durante muitos anos e ali, naquele lugar, Hermione havia dormido com Harry, na noite da batalha com seu verdadeiro Pai... Lord Voldemort. E pensar em seu verdadeiro pai lhe trouxe outra lágrima no olhar...
- Seu semblante mudou, Hermione! – falou Harry, das sombras, enquanto se aproximava dela. – Acaso isto que vejo em seu olhar é medo? Você está com medo de mim?
- Harry... sei que está bravo, mas isto já está me aborrecendo. Deixa eu explicar... deixa eu explicar...
Mas sua voz emudeceu de rente, na mesma hora que Harry ergueu a varinha. Uma dor perpassou seu corpo, fazendo-a contrair todos os músculos. Ela deixou-se cair e mesmo que quisesse, não conseguiu resistir a dor, até que finalmente cessou.
- Dor... foi isso que os Weasleys sentiram até enlouquecerem... – disse Harry, num tom ameaçador. – Você os viu sofrendo, implorando para que a dor parasse, mas não mexeu um músculo para impedir essa atrocidade contra as pessoas mais amáveis que já conheci.
- Eu... p-posso e-explic-car... – começou Hermione a falar quando a dor novamente a invadiu.
Ela sentiu como se seu ser fosse se partir em dois se não acabasse com aquilo e fez a única coisa que podia fazer naquele instante.
- Legitimens! – gritou ela, juntando as forcas.
Harry parou com o feitiço crucios imediatamente, mas, se Hermione pensou que a dor fosse parar, enganou-se redondamente. Não era uma dor física, mas sim, moral e emocional, ao ver todos o que ela amava odiarem-na impiedosamente.
Os vultos foram passando em sua mente até que ela viu Macgonagal, debruçada sobre Dumbledore que definhava na cama: “É Hermione quem tem culpa. Se eu colocasse minhas mão nela... eu a mataria... com certeza... mas dizem que ela fugiu. Menina ingrata!”, dizia a professora por quem Hermione dedicava o maior apreço. “Não, Minerva, não! Ela é como minha mãe”, pensou Mione, vendo a decepção de Minerva, mas não terminou por ali. De repente, a face macilenta de Snape apareceu com um agouro: “O que precisamos é matar Hermione e tudo ficará bem.”, dizia o professor a Harry que escutava tudo, dolorosamente. Depois foi Rony, Gina e os Gêmeos e o que viu a entristeceu mais do que qualquer coisa: “– Eu a mataria pessoalmente se tivesse a oportunidade, nem que eu passasse os meus últimos dias em Azkaban.”. Fora pelos lábios de um dos gemeos que ouvira aquela ameaça, “mas eles não são tão apegados a mim, nunca foram”, o pensamento de Hermione misturava-se aos de Harry, “Rony vai me defender, juro que vai”. Contudo, não foi isso que aconteceu: “Sinceramente... se Hermione morresse agora, eu não ficaria triste...”.
Hermione sentia quase mais dor do que Harry, parte dela não queria ver mais. Aquilo era demais para ela, era pior do que a tortura Crucios, mas a outra metade precisa ver, tinha que ver e ela continuou. Foi Hagrid quem aparecera dessa vez. Com a aparência bruta e um coração gentil, Rubeo Hagrid seria seu defensor. Tantas vezes ela o ajudara, quando ninguém mais queria ajuda-lo. Com certeza, Hagrid saberia que ela não era o monstro que todos pintavam ser.
“Eu juro que socaria aquela menina mais de mil vezes se eu a encontrasse! Tudo o que aconteceu de errado é culpa dela!”
Hermione sabia que era verdade, mas não podia mais voltar atrás. “É minha culpa, sim!”, sua mente gritou, quase tão alto quanto seu coração que batia descontroladamente, “uma culpa que escolhi ter...”.
Quando estava totalmente abatida, a face estranha e simpática de Dobby apareceu em seus pensamentos “Harry Potter tem que acreditar na menina Granger. Ela é boa com os elfos... quer nos libertar... a todos...”.
Hermione quebrou a ligação com Harry, deixando o garoto desabar no chão a sua frente. Mesmo ela estava acabada e deslizando pela parede às minguas, ficou parada e quieta, refletindo tudo o que vira nos pensamentos de Harry. De todos, somente uma criatura a defendeu: um elfo...
Uma criatura a que poucos davam importância.
Harry lutou para ficar de pé. Hermione o atingiu de cheio e insistiu até ver todos os recentes pensamentos. O estranho é que ela podia ter aproveitado a chance para fugir. Harry jamais conseguiria detê-la, mas Hermione escolheu ficar ali, encostada na parede, deixando as lágrimas escorrerem por seu rosto silenciosamente, enquanto seu pensamento estava distante. E naquele momento, Harry nunca desejou tanto saber legitimentação. Daria tudo para ver seus pensamentos.
- Hermione...- ele disse, caminhando tropegamente até ela. – Se viu os meus pensamentos... então sabe o que devo fazer!
Hermione levantou os olhos para ele. Estavam vermelhos pelo choro.
- Matar-me! – disse ela, por fim, torcendo o canto dos lábios num sorriso triste. – Faça isso, Harry, se acha que deve fazer... eu não posso explicar, como achei que podia. Mas se me matar, nunca saberá da verdade!
- Que verdade? – indagou Harry, sentindo seu sangue ferver – QUE TRUQUE AGORA VAI USAR, GRANGER? QUANTAS VEZES IMPLOREI PARA QUE DISSESSE A VERDADE. EU FICARIA NO SEU LADO, FOSSE O QUE FOSSE E TE AJUDARIA. AGORA É TARDE DEMAIS! TARDE DEMAIS PARA NOVOS TRUQUES. SEU TEMPO ACABOU! PESSOAS MORRERAM... E OS WEASLEYS...
- Não é truque nenhum! – disse ela, firmemente, apesar de sentir medo da reação de Harry. – Você acha que sabe o que está acontecendo, mas não sabe! É fácil todos me julgarem... Mate Hermione, ela é a culpada! Bruxos costumam ser tão cegos que não olham para seu próprio nariz. E não digo isso só por mim. Veja os duendes. Só não são escravos agora por que tiveram que lutar e muito. Só porque os bruxos se julgam superiores, isto não quer dizer que é verdade. Os elfos são mais nobres do que os bruxos jamais serão..
- Do que está falando agora? Você está louca? – perguntou Harry, sentindo que a qualquer momento poderia explodir. Hermione não dizia coisa com coisa. O que duendes e elfos tinham a ver com a estória? E para começo de conversa, os duendes haviam mudado de lado.
- ESTOU FALANDO QUE AS COISAS VÃO MUDAR... E MUDAR REALMENTE! – gritou Hermione, por fim, sentindo-se exausta.
- Sim, estou vendo! – disse Harry, carregando a frase com todo o sarcasmo que pudesse produzir. – Dementadores, Duendes... você! Está me dizendo agora que os elfos também vão mudar de lado?
Hermione começou a chorar copiosamente, deixando Harry sem ação. Seria mais um truque? Harry não sabia, mas não cairia tão fácil assim.
- Suas lágrimas não vão evitar a sua morte, Hermione. Somente a verdade o fará, mas creio que você não irá revelar nada que não seja mentira, não é? Se ainda está viva é porque está sob a minha custódia. As pessoas que mais amamos e que foram nossos amigos durante todos esses anos querem a sua morte, Hermione. E se eu fosse mais forte, talvez você já estivesse morta.
- Você é forte, Harry! Mais forte do que todos. É por isso que ainda se recusa a acreditar que eu sou o mandante por trás de tudo... prefere acreditar que meu pai está vivo!
Harry se assustou com o que Hermione disse. Realmente, era exatamente o que Harry pensava.
- Você esqueceu que eu acabei de invadir a sua mente? – lembrou-o Hermione. – Você está certo, Harry, ao mesmo tempo que está errado. Este jogo não é como um jogo de xadrez em que só existem peças brancas e negras. Este jogo é mais complexo do que você ou mesmo eu possa compreender. Existem diversos lados neste jogo. Nós dois estamos em lados diferentes, contudo, isto não quer dizer que eu esteja no lado negro. Você consegue entender, Harry...? Espero que sim, por que eu não posso lhe dizer mais do que isso...
Harry ficou calado, refletindo as palavras de Hermione. Ele compreendia o que ela queria dizer, embora estivesse confuso. Mas, disse em seguida, uma verdade tão profunda que mesmo Hermione seria incapaz de refutar.
- No final, Hermione... todos os lados se unem em dois, não é? – sua voz parecia diferente quando disse isso. Era mais do que seu pensamento que se exprimia naquela frase. Era a sua alma, uma alma consciente de tudo o que aconteceria. – Então veremos em que lado você ficará! Até então, não seremos inimigos, mas quando o momento chegar... eu varrerei da face da terra todo aquele que ficar entre eu e meu verdadeiro inimigo e isso incluirá você!
Hermione se deixou emudecer. E ficou assim, por horas. As lágrimas eram sua única companhia quando Harry passou por ela e sumiu escadas abaixo.
Ela podia correr e fugir, pois sabia que Harry não a prenderia mais. Contudo, por mais que desejasse fugir, não tinha coragem. As palavras de Harry tiveram mais impacto do que ele jamais imaginara que tivesse. Ela ficou ali, deixando que as luzes que penetravam a janela no final do corredor, desaparecessem com o cair da noite. E quando anoiteceu, trazendo consigo os barulhos de uma sirene (de polícia ou de uma ambulância, Hermione não poderia dizer) e os pios de uma coruja ao longe, Hermione deixou a cabeça escorregar e dormiu aconchegando-se no piso frio e gelado.
Harry havia tomado varias doses de uísque envelhecido que encontrara no porão da casa dos pais adotivos de Hermione, quando sentiu as pálpebras mais cansadas do que nunca. Imaginou se Hermione havia fugido ou não, embora não se importasse muito. O que ela lhe revelara tivera o efeito desejado. Ele não a condenava mais, pois sabia que, estando no lado que estivesse, devia ter seus próprios motivos para isso, mesmo porque, Hermione, em toda a sua vida, demonstrara ser uma garota prudente, sensata e justa que tinha como principal objetivo, a verdade e o bem-estar dos outros, mas apesar de ter essa consciência mais aflorada em seu coração, sentia também um peso em seus ombros. Hermione poderia ter seus próprios planos, mas não poderia cruzar no caminho de Harry quando a batalha finalmente explodisse. Ambos sabiam o que iria acontecer se isso acontecesse.
O problema é que agora, Harry sabia o que fazer o que não significava que seria fácil. Muitos lados! Hermione lhe dera a dica. Até agora estava jogando do lado de Dumbledore, lado em que também estava o Ministério. Mas se quisesse avançar no jogo teria que fazer outras escolhas. Primeiro, por que Dumbledore havia caído em jogo e segundo porque, com o Ministério sendo liderado por Severo Snape, o objetivo principal seria caçar Hermione, coisa que Harry queria evitar, por hora. Agora, Harry teria que tomar seu próprio rumo, seu próprio jogo e tentar descobrir a verdade através das poucas pistas que tinha. Uma pista já tinha: Dobby, o elfo a quem poucos davam importância, aparentava saber mais coisa do que revelara. Mesmo Hermione o havia mencionado. Algo também a respeito dos Duendes.
Fosse o que fosse, tudo parecia um tremendo tufão em sua mente e que continuar a pensar assim não o levaria a nada. O que precisava fazer era relaxar e dormir um pouco, tentar ordenar as idéias depois.
Pensando nisso, esvaziou a última dose do copo e começou a subir as escadas. Quando alcançou o corredor do andar acima, viu uma imagem que enterneceu seu coração. A luz do luar iluminava o rosto meigo de Hermione, que jazia no chão, dormindo no piso frio.
Harry sorriu e ficou alguns segundos ali, vendo-a dormir, parecendo tão frágil e inocente. Antes que pudesse se refrear, Harry se aproximou e ergueu nos braços carinhosamente.
- Harry...? – ela disse, despertando de seu sono para abraçá-lo, enquanto as lágrimas ainda rolavam em seu rosto. – Está tão frio...
Harry a levou para o quarto dos pais de Mione e a deitou na cama, cobrindo-a com um cobertor felpudo e depois, ele mesmo deitou-se ao lado dela. Ali, naquela cama, os dois passaram uma noite juntos no ano passado, algumas horas antes de enfrentarem Voldemort. Não havia acontecido nada entre eles, na verdade, nunca acontecera, apesar do desejo que havia em ambos. Harry ainda sonhava com esse dia: o dia em que ambos se entregassem numa noite de amor e paixão, embora parecesse mais do que nunca, uma coisa distante.
Contentou-se por poder contemplá-la enquanto ela ainda dormia, enxugando as últimas gotas que brilhavam em seu rosto.
Hermione acordou no meio da noite, percebendo que estava aconchegada nos braços de Harry que a envolviam.
Ela deixou-se ficar assim, por alguns segundos, deitada sobre o peito de Harry e sentindo a sua pulsação. Ele estava tranqüilo agora e gentilmente a abraçava, diferente de como estava há algumas horas atrás. O duelo que ambos tiveram a pouco os havia exaurido as forças. Por que teimavam em lutar tanto quando se amavam?, Hermione pensou, embora soubesse a resposta: “Por que eu escolhi ser assim”. Nunca o peso de suas escolhas se abateram tanto sobre seu ombros. Quanto aos Weasley, sabia o que fazia e o fizera calculadamente, embora sofresse muito consigo. Contudo, ver a decepção, a raiva, o ódio, a confusão... enfim, todos esses sentimentos no rosto de Harry, era uma coisa que não previra. Conhecendo-o tão bem, sabia que ele se irritaria. Sabia que ele tentaria descobrir a verdade, sabia que ele defenderia seus amigos, sabia que ele tomaria outro rumo, diferente do seu. Mas tudo isso em teoria era uma coisa. A prática, era bem mais cruel. Calculou, planejou, arquitetou tudo previamente. E agora, seu jogo caía-lhe sobre a cabeça. “O que vou fazer, agora”, pensou Hermione, sentindo o desespero embargar-lhe a garganta. E de novo, sabia a resposta: “Agora é tarde demais para desistir”.
Imaginou-se no lugar daqueles que eram condenados a morte por uma causa. Era a mesma agonia. Muitos enfrentaram a morte de cabeças erguidas, quando sabiam que lutavam por uma boa causa. Mas a morte, neste caso, seria bem vinda se comparada ao destino que teria nas mãos de Harry quando ele descobrisse toda a verdade. As palavras de ameaça que ele lhe dissera a poucas horas lembravam-na disso. “Quando Harry souber de toda a verdade... será o meu fim”.
E pensando nisso, apertou ainda mais Harry desejando perpetuar aquele momento singelo para sempre.
- Hermione, você está bem?Você está branca... e está tremendo? – disse Harry, que acordou quando Hermione se mexeu em seus braços.
- Me abrace, Harry. – disse ela, sem controlar as lágrimas. – Me abrace forte, como nunca me abraçou antes.
Ele a abraçou, puxando-a mais para si, mas ver o desespero na face de quem se ama, não é fácil e Harry sentiu o coração apertado.
- O que foi, Mione? Por que está tão desesperada? – ele perguntou, segurando a cabeça de Hermione com uma das mãos e acariciando seu rosto com a outra. – Fale, meu amor... por favor... conte-me algo... diga-me que ainda posso ajudá-la.
- Eu... eu... n-não... p-posso... apenas me abrace, Harry... e tente me perdoar... meu amor...
Harry não entendia o desespero de Hermione, agora que finalmente os dois haviam se entendido e soube no mesmo instante que aquilo era um mal agouro.
Claro que ele a perdoaria. Fosse o que fosse. O que aconteceu com os Weasleys fora um infortúnio. Mais numa batalha, vidas se perdiam. Harry achava que poderia perdoar Hermione não importando o que ela fizesse. Se soubesse que fora por uma boa razão.
Mas, o que Hermione faria era muito mais do que um bom motivo. Era uma filosofia de vida, a sua filosofia de vida que mudaria a vida de todas as criaturas da face da terra para todo o sempre, mesmo daqueles que não queriam mudar...
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