Capítulo IV
Capítulo quatro
Paula encostou a porta com suavidade e
já pôde ouvir a voz grossa vinda da sala; seu coração acelerou de medo mas
rapidamente desacelerou de tristeza; tantas mulheres conseguiam ser felizes com
seus maridos carinhosos e amorosos. Por que ela não podia ser mais uma
daquelas; por que ela também não podia vestir um vestido longo de seda rosa e
posar para fotos sorridente, ao lado de um homem lindo e bem vestido, com um
terno preto e gravata escarlate, como via em revistas?
- Chegou, vadia?
- Era a voz dele... por que insistia em chamá-la assim? Ela tinha nome e
gostaria de ser chamada por ele.
- Cheguei sim, Emanuel - disse, com a
voz ríspida. -, será que pode me chamar pelo nome? Agradeço.
A cabeça dele emergiu pela porta; um
homem másculo e corpanzil, os cabelos ralos castanhos, olhos protuberantes e
castanhos e uma barriga imensa, cheia de cerveja. Uma camiseta branca
retesava-se em seu corpo, apertada e deixando à mostra um umbigo grande, que
mais parecia um buraco na rua.
- Será que a porrada de ontem não
adiantou? - ele disse, com selvageria. - Acho que está precisando de mais, não?
- Não, Emanuel - disse ela, irritada.
-, não estou!
- Você está ficando muito abusada,
piranha - murmurou Emanuel, levantando-se com esforço e encaminhando-se em sua
direção. -, tenho que ensiná-la como uma dama trata o marido.
- Uma dama ou uma escrava, você quer
dizer?
Ele aproximou-se dela, o hálito de
cerveja bofejando em seu nariz e cerrou os punhos raivosamente.
- É... - murmurou, suavemente. -, você
precisa de outro olho roxo...
- Você não seria capaz - começou
ela, mas foi interrompida pela dor instantânea no cabelo loiro. Pelo o que
percebeu, ele puxara-o, retesando-o para longe e arrancando um chumaço pequeno
de cabelos dourados. No segundo seguinte, a respiração pesada, ela viu aquela
manopla erguendo-se sobre si e descendo para o seu olho direito, uma dor
latejante envolvendo-a.
- Por que faz isso? - sussurrou Paula,
a voz quase sumindo. - Por quê?
Fechou os olhos que lacrimejavam,
esperrando o próximo golpe, mas este não veio e ela sentiu que ele afastara-se
e caíra pesadamente em sua poltrona, defronte à televisão.
- Me traga mais cerveja, por favor -
disse Emanuel, cuspindo as palavras com desprezo. -, agora.
Uma onda de calor perpassou toda a sua
espinhas e então ela segurou as mãos em frente aos seios, demonstrando uma
vulnerabilidade feminina; jogou a bolsa para o lado e encaminhou-se para a
geladeira, abrindo-a e perscrutando-a rapidamente. Uma simples passada do olhar
já conseguia identificar meia dúzia de garrafas de cerveja brilhando à luz
dourada que irradiava de uma lâmpada presa ao teto da geladeira.
Puxou uma e depois entregou-a a
Emanuel, sussurrando um "aqui, senhor" e depois foi para a cozinha preparar o jantar.
Por que tudo tinha que ser tão complicado para ela? Por quê? As lágrimas
vieram-lhe aos olhos novamente e então, em um misto de desespero e tristeza,
ela precipitou-se para fora, batendo ruidosamente a porta ao passar. Ainda pôde
ouvir a voz do marido chamando-a, mas suas pernas curtas levaram-na rapidamente
para a rua, onde uma chuva violenta castigava-a. Seus cabelos dourados
encharcaram de água, mas ela simplesmente continuou andando, as lágrimas
misturando-se à chuva, os soluços cada vez mais altos, as mãos agitando-se
freneticamente ao correr e então, quando finalmente viu que estava o mais longe
possível, entrou em um pub cheio de
pessoas rindo e contando piadas umas as outras; ainda haviam alguns casais se
beijando com calidez, o que apenas entristecia-a mais.
Ao lado de uma moça havia um banco
vazio e ela logo encarapitou-se nele, afastando os cabelos do rosto e pedindo
uma tequila ao barman. Um copo minúsculo cheio de uma bebida amarelada foi
entregue e ela sorveu tudo de uma vez, apoiando o rosto nas mãos.
- Problemas, moça?
Era a mulher ao seu lado.
- Hum... sim... - murmurou Paula, a
voz baixinha.
- Meu nome é Lindsay - disse ela,
sorrindo com ternura. -, prazer...
- O meu é Paula Rice - disse a outra,
os olhos secando das lágrimas e um sorriso brotando em seus lábios. -, o
prazer é meu...
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