Quando um antigo estudante vol
Capítulo Sete – Quando um antigo estudante volta a Hogwarts...
“There rode the Volscian succors:
There, in the dark stern ring,
The Roman exiles gathered close
Around the ancient king”
***
“– Seus pais têm perfeitas condições de cuidar de você, Leah.
– Hum-hum. Eles não pensaram em mim quando mandaram aquela carta para o Dumbledore. Nem perguntaram o que eu queria... não quiseram saber a minha opinião.
– Então como é que você soube da carta?”
– Dindo…
Lupin virara para ela, muito sério, esperando uma resposta.
– Leahnny?
– Eu ouvi eles conversando…
– E por que você não falou com seus pais? – ele perguntou com sua usual calma e sem se sentir convencido com as palavras fracas da afilhada. – Tenho certeza de que eles gostariam de ouvir o que você pensa.
– Não, eles não gostariam, dindo. Se quisessem saber o que eu penso, teriam me perguntado, mas preferiram fazer tudo escondido! – argumentou ela, ressentida, antes de continuar com um pouco de ansiedade na voz: – Vai fazer isso por mim, não vai?
A situação estava incerta demais, suspeita demais para que Lupin pudesse atender ao pedido da afilhada sem questionamentos. Procurando entender a fundo as motivações da garota, ele analisou sua expressão, o tom de voz e até mesmo os gestos por ela feitos. E, ainda assim, restaram-lhe dúvidas.
– Preciso antes falar com os seus pais-
– Não! – Leahnny apressou-se, contrariada. – Eles não sabem que eu sei…
– Por que você não conta para eles, Leah? – insistiu Lupin, tentando buscar alguma justificativa que a convencesse a conversar com os pais.
– Eles vão ficar zangados – a garotinha justificou prontamente, esperando convencer o padrinho a não fazer mais perguntas.
– Quer que eu fale com Harry e Hermione? – tentou.
– Eu prefiro que você fale com Dumbledore, dindo. Você é amigo dele… por favor… - a garotinha insistiu, observando-o esperançosamente.
O homem suspirou. Sabia o que deveria fazer, mas a insistência de Leah o fazia perguntar-se se haveria algo mais naquele pedido além do que ela deixava transparecer.
– Eu não posso e nem pretendo fazer isso sem seus pais saberem, Leah – respondeu Lupin, paciente e, ao mesmo tempo, severo. – Entenda, eles confiaram em mim quando me convidaram para ser seu padrinho.
– É, e eu pensei que também pudesse confiar em você…
Lupin franziu a testa diante daquele comentário.
– Você pode confiar em mim, mas não espere que eu aja pelas costas de seus pais. Você não deveria estar agindo pelas costas deles… - ele replicou, olhando-a seriamente. Havia um leve tom de censura em suas palavras.
– Eu só queria ficar na Sonserina, dindo.
– Você vai ficar, Leah – disse Lupin mais gentilmente.
– Promete, dindo? – Leah encarou-o, em busca de uma confirmação que a assegurasse.
– Sim, eu prometo, mas você também tem que me prometer uma coisa.
– O quê? – questionou, parecendo contrariada.
– Que vai conversar com seus pais sempre que achar que alguma coisa está errada – estabeleceu em um tom firme.
– Hum – respondeu a garotinha, sem dar certeza alguma.
– Incluindo a conversa deles que você ouviu – acrescentou Lupin, pressionando-a um pouco e buscando obrigá-la a fazer o que ele julgava mais correto e apropriado para a situação.
– Ah não, isso não, dindo! – Leah queixou-se.
– Então não posso ajudá-la.
Ficaram em silêncio por alguns instantes. Estava claro para ela que o padrinho não aceitaria de outra forma.
– Ok – rendeu-se Leahnny. – Mas depois que você falar com Dumbledore.
***
– Então, terminaram a conversa ultra-secreta? – perguntou Hermione à filha quando Leahnny saiu do escritório de Lupin.
– Aham. Podemos ir embora? – Leahnny aproximou-se, pegando a mãe pela mão e levando-a até mais perto da lareira.
– Já? – espantou-se Harry, perguntando-se sobre o que Lupin conversara com a filha.
– ‘tô com sono – mentiu ela.
– Não é tão cedo assim, Harry – disse Hermione, levantando-se e parecendo ignorar a estranha atitude de Leahnny. – Podemos voltar outro dia…
– Claro – concordou Lupin.
– Ouça, amor – Harry sussurrou para a esposa –, eu vou ficar mais um pouco, para falar com Dumbledore…
– Tem certeza? – ela sussurrou de volta, observando-o com certa insegurança.
– Coloque Leahnny na cama, eu não devo demorar… - ele a assegurou.
– Ok – sussurrou no ouvido dele e então encarou a filha, falando em voz alta: – Leah, despeça-se de Rony e do seu padrinho.
– Já me despedi do dindo. Boa noite, Sr. Weasley.
– Você pode me chamar só de Rony, Leahnny – disse ele, sorrindo para ela.
– ‘tá bom. Vamos, papai?
– Vá com a sua mãe, Leah. Daqui a pouco eu vou – escusou-se Harry, aguardando o momento em que pudesse conversar abertamente com Rony e Lupin.
– Mas, papai… - a menina tentou contrariá-lo.
Harry, porém, apenas ofereceu um olhar significativo à filha, deixando claro que não aceitaria queixas da garotinha e que esperava ser obedecido. Leah baixou o olhar para os próprios pés.
– Seu pai já vem, Leah – disse Hermione, decidindo interromper a leve tensão entre pai e filha. – Vamos na frente.
Leahnny saiu sem se despedir do pai e seguiu Hermione pela lareira. Harry esperou alguns instantes até que elas desaparecessem. Assim que o fizeram, encarou o rosto curioso de Lupin e disse:
– Rony e eu vamos falar com Dumbledore.
– Vamos? – perguntou Rony, soando surpreso. – Agora?
– Já – disse, sem hesitar. Possuía um ar determinado.
– Harry, eu realmente acho que você não deveria se envolver nisso – disse Lupin, apaziguador.
– Você sabe do que eu estou falando? – Harry perguntou, exasperado, pronto para lançar argumentos suficientes para convencer os presentes.
– Rony me contou que você sabe…
– E espera que eu fique parado? – Harry exclamou de forma agitada. Soava irritado diante da sugestão dos amigos de que ficasse ali sem fazer nada.
– Você não precisa se preocupar, estamos cuidando disso – Lupin disse, ainda tentando acalmá-lo.
– Deixe-me falar com Dumbledore… – insistiu Harry.
– Por que hoje? Já é tarde – disse Rony, decidindo intervir a favor de Lupin.
– Isso é importante, Dumbledore vai querer saber – Harry suspirou. Um pouco mais calmo, continuou: – Eu não vou conseguir dormir hoje se não tirar isso da minha cabeça.
Os outros dois observaram-no por alguns instantes, parecendo julgar a melhor forma de agir sem perturbar ainda mais o amigo. Por fim, Lupin tomou a decisão.
– Tudo bem, eu vou chamá-lo – disse.
Ele jogou o pó de flu e, quando o rosto de Alvo Dumbledore apareceu flutuando entre as chamas, pediu para que o Diretor fosse até o apartamento para que conversassem.
– Olá, Remo – Dumbledore cumprimentou –, Harry, Ronald.
– Precisamos conversar – falou Harry de imediato, sem deixar que perdessem ainda mais tempo. – Já estou sabendo sobre Æthelind e… eu o vi.
O rosto de Dumbledore imediatamente tomou uma expressão séria, enquanto Lupin e Rony trocavam um olhar cheio de suspeitas, perguntando-se o quanto realmente Harry sabia sobre a missão deste.
– Realmente, precisamos conversar, Harry. Por favor, sente-se.
Os quatro acomodaram-se nos dois sofás dispostos em torno da lareira. Entre eles, apenas o diretor de Hogwarts não compartilhava da tensão e ansiedade diante da situação; ele já esperava por uma oportunidade como essa há algum tempo.
“Não achei que Æthelind demoraria a encontrá-lo, Harry,” comentou Dumbledore.
– Por quê? – Harry estranhou, não entendendo o motivo para tal suspeita.
– Os Dursley.
– Os Dursley? Dumbledore, Æthelind estava no trem em que Hermione e eu fomos para a Itália… a mulher que o acompanhava nos atacou.
– A noiva dele? – interveio Rony, depois de trocar um olhar de entendimento com Lupin.
– Noiva? Ele tem uma noiva? – Harry não pôde evitar a pergunta.
– Tinha. Ela foi encontrada morta no final de semana em que você viajou – explicou Lupin.
– Ela nos atacou na madrugada de terça-feira.
– Ela foi encontrada morta no domingo, na Rua dos Alfeneiros, Harry – disse Dumbledore calmamente.
Silêncio.
– Harry? – chamou Lupin.
O bruxo em questão levantara-se, dera a volta no sofá e apoiara as mãos em seu encosto, passando a mirar o chão com um olhar chocado. Não poderia dizer por que se abalara tanto. Os Dursley não haviam significado nada para ele; nada além daquelas pessoas que aceitaram sua presença durante tantos anos, que permitiram que Harry chamasse aquele lar de sua casa. Eram seus parentes, mas somente em sangue… agiam como se ele não passasse de uma inconveniência e, no entanto, nunca o expulsaram de casa.
– Na… Rua dos Alfeneiros? – finalmente se pronunciou, considerando as ramificações daquele acontecimento.
– A casa pegou fogo e dois corpos foram encontrados. Um deles era do seu tio e o outro… a princípio, achamos que fosse de Petúnia, mas…
– Minha tia está viva? – ele levantou os olhos rapidamente, encarando o Diretor. Soava quase ansioso.
– Não sabemos ainda – respondeu Dumbledore, analisando a reação de Harry com atenção, assim como os outros também o faziam.
– Certo – Harry fez uma longa pausa. – Bem… não sei se era a noiva dele, mas era a mesma pessoa que vi com Æthelind em um dos jantares.
– Como soube que era Æthelind? – perguntou Lupin, intrigado com o fato.
– Eu o conheço…
– Além da primeira vez e da ocasião no trem, você o viu outras vezes? – Dumbledore, sendo o único a conhecer as circunstâncias que fizeram Harry encontrar Æthelind pela primeira vez, inquiriu.
Harry olhou de relance os outros bruxos. Poderia parecer ilusão, dar a impressão de que estava fora de si, se confessasse o que realmente estimulara suas suspeitas. Entretanto, estava perante amigos, pessoas que conheciam todas as implicações de visões designadas por magia e, principalmente, que sabiam o quão determinante essas visões já haviam sido na história. Por isso, preferiu não faltar com a verdade.
– Eu o vi em sonho. Ele me atacou…
– Harry…
– Eu esqueceria isso, mas não foi um sonho normal! Hermione está tão assustada quanto eu! Ela tentou me acordar, e Leah… Leah ouviu meus gritos do quarto dela.
– Harry, acalme-se.
– Droga, eu pensei que tinha acabado! – exclamou, dando-lhes às costas nervosamente e aproximando-se da porta da cozinha. Os movimentos rápidos pareciam aguçar o tom de desespero em sua voz.
– Você não tem nenhum tipo de ligação com ele como tinha com Voldemort. Sabe o porquê do pesadelo?
– Claro que não – Harry respondeu rapidamente. Parou um segundo para repensar, mas não mudou a resposta. – Tampouco sei por que ele me seguiu!
– O que você sabe sobre os planos dele?
– Não tenho a mínima idéia. Achei que vocês soubessem, mas, seja lá o que ele tem planejado, está começando a executar.
E, de fato, Harry acreditava que aqueles bruxos pudessem dar-lhe alguma resposta. Acostumara-se a confiar em Dumbledore, a buscar nele as certezas que necessitava, a depositar na Ordem da Fênix – e em todos os seus colaboradores – a esperança de encontrar soluções para os problemas relacionados às Artes das Trevas.
Certamente, essa não era uma tarefa que ele delegaria ao Ministério da Magia. Por mais que confiasse em Amélia Bones, aquela instituição era muito vasta, sujeita demais às más intenções daqueles que buscavam corrompê-la.
Deveria, no decorrer dos anos – e das situações pelas quais passara –, ter aprendido que confiança total é algo que não se deve ter – em pessoas, grupos ou instituições. Fé é algo cego demais para ser depositado em uma coisa tão débil e volúvel quanto o ser humano; algo que ele não fora capaz de depositar nem ao menos em si mesmo durante tantos anos e que agora, pela pura necessidade de sentir-se seguro, necessitava depositá-la em outrem.
– Ele é perigoso… – comentou Rony. – E agora, tem seguidores…
– Como Voldemort – Harry falou, largando as palavras no ar.
– Provavelmente – disse Dumbledore. – Eu pensei em suspender as investigações, por isso liberei você, Ronald, mas esse incidente com os Dursley e as informações que Harry trouxe invertem o quadro. Æthelind deve ser nossa maior preocupação a partir de hoje.
– Como o Ministério pudesse ignorar que foi Æthelind… – como se pensasse somente para si, Harry acabou acrescentando.
– O Ministério não sabe de Æthelind. Oficialmente, quero dizer – falou Rony, olhando para Lupin. – O número de bruxos que conhece a história dele, que conhece o fato de ele estar vivo e o perigo que representa, é bem restrito.
– Bom, sabemos que ele mudou de identidade para estar de volta – raciocinou Harry –, mas por que ele voltaria? O que o Reino Unido tem que ele pode querer?
– Influência – respondeu Rony. – O Ministério daqui se sobrepõe aos demais.
– Não pode ser só isso. Os aliados dele devem estar aqui também, mas onde? Quase todos com Comensais estão presos, Sorrel e Ormand estão mortos…
– Ele não precisa necessariamente ter se aliado ao mesmo tipo de bruxo que Voldemort se aliou… – disse Lupin.
– Está falando da mania de sangue-puro de Riddle?
– Também.
– Então, do que está falando? – Harry insistiu, confuso com a sugestão de homem.
– Harry, eu o persegui esse tempo todo – começou Rony –, descobri algumas coisas e posso dizer que não acho impossível que ele esteja pensando em usar… estudantes… Eles estão acima de qualquer suspeita.
– Voldemort aliou-se a estudantes também, pelo menos no começo… os primeiros Comensais… – comentou Harry. – O Ministério deve saber quando os alunos usam Artes das Trevas… ou o Diretor…
– Mesmo sendo o diretor, nem sempre posso saber tudo que acontece em Hogwarts – pronunciou-se Dumbledore. – Algumas coisas passam por mim, Harry.
– Ainda assim, não teria como ele influenciá-los. Ninguém sabe que Æthelind está de volta.
– Isso é o que supomos – disse Rony. – Então, alguém tem alguma idéia do que devemos fazer?
– Deveríamos alertar o Ministério – Harry sugeriu, sem ter certeza disso, mas querendo expor ao público a ameaça que aquele bruxo representava.
– É muito cedo para isso – respondeu Lupin.
– Podemos reiniciar as investigações agora que temos novas pistas – sugeriu o próprio Rony. – Harry teria de trabalhar conosco…
– Eu gosto da idéia – disse Harry.
– Eu também – falou Lupin.
– Não sei se seria bom, Harry… achei que você quisesse se afastar de tudo isso… - o Diretor comentou, soando ligeiramente hesitante.
– Se tivesse certeza de que conseguiria, mas… o pesadelo dessa madrugada e… e o fato de Æthelind ter me seguido são mais do que suficientes para provar o contrário. Se eu estou envolvido, ao menos quero poder ajudar.
– Tudo bem, mas acho que você deve conversar com Hermione primeiro – Dumbledore alertou-o.
***
Harry e Hermione acordaram cedo na manhã seguinte. Ela foi para a cozinha arrumar o café e ele ficou no quarto, preparando-se para comunicar sua decisão. Sabia que não seria uma conversa agradável, mas Hermione merecia saber a verdade logo; saber que ele estava entrando em mais uma luta contra as trevas e que essa poderia ser ainda mais dolorosa do que a guerra contra Voldemort.
– Amor, podemos conversar? – pediu ele, entrando na cozinha.
– Oi, Har… – ela virou-se, ficando de costas para a pia. – Quer café?
– É, pode ser… - ele hesitou.
Harry observou a mulher enquanto ela voltava a atenção para o que estivera fazendo antes de sua chegada.
– Você disse alguma coisa quando entrou? Desculpe, eu não ouvi.
– Ah, eu… não tem importância – disse ele, olhando o lago pela janela distraidamente.
Hermione entregou-lhe a xícara, mas não pegou seu próprio café. Estava ocupada encarando o marido com uma expressão interrogativa.
– Vai me dizer agora o que o está incomodando desde ontem à noite, ou vai deixar para depois, amor?
– Hum, eu não consigo mesmo esconder nada de você, não é? – Harry comentou, tentando disfarçar seu desconforto.
– Não, Harry. Como foi a conversa com Dumbledore? – Hermione decidiu por fim interrogá-lo, indo direto ao ponto.
– Boa – foi a resposta evasiva que ele deu enquanto concentrava-se em observar a xícara em sua mão.
– Contou sobre Æthelind?
– Sim. E sobre a mulher que nos atacou no trem… e até sobre o pesadelo.
– Que bom que conseguiu contar tudo, amor. E o que ele disse? – perguntou Hermione.
– Que eu deveria conversar com você antes de… de começar a participar das investigações… - Harry explicou, hesitante.
– Participar das investigações – repetiu Hermione, reflexiva. – Contar ao Ministério o que você sabe, você quer dizer.
– Não – disse Harry, com cuidado. – O Ministério ainda não sabe de muita coisa, será uma investigação… por nossa conta…
– Como foi a de Rony esses anos todos? – perguntou Hermione, respirando um pouco mais rápido que o normal.
– Eu vou trabalhar com Rony, mas eu não vou desaparecer que nem ele… - Harry tentou explicar.
– Ah, eu imagino que não, até porque, o truque não funcionaria comigo, eu já estou sabendo, não é? – Hermione perguntou ironicamente, seu tom de voz tornando-se mais seco.
– Luna sempre soube de Rony, amor – falou, procurando acalmá-la e largando a xícara com cuidado sobre a mesa.
– Então é isso o que você está fazendo? Me avisando?
– Amor…
– Foi pra isso que você me trouxe para cá? Para que eu ficasse longe de todos e não contasse a ninguém? – ela o interrompeu, ainda mais agitada.
– Mione, eu já disse que não vou desaparecer – explicou Harry, olhando-a nos olhos. – É só um trabalho. Vou ajudar Rony e Dumbledore a encontrar Æthelind e impedi-lo…
– Só um trabalho, mas você vai atrás de um bruxo das trevas… Harry, esse Æthelind é perigoso!
– Voldemort também era! – replicou, seu tom de voz mais exaltado.
– E quase… – Hermione mirou o chão. – Até parece que você esqueceu tudo o que aconteceu.
– Como se eu pudesse… - Harry suspirou.
– Então? – perguntou Hermione, abrindo os braços.
– E então o quê? Æthelind está de volta, está atrás de nós não sei por que e eu não vou ficar parado enquanto a minha família é ameaçada!
– Claro, fazer o que, então? Se manda…
Harry olhou-a em um misto de surpresa e irritação.
– Vai me dar sermão por eu ficar três meses fora de casa?
– Não gosto das suas ironias, Harry! – Hermione irritou-se. – Há muita diferença entre o que eu faço e o que você pretende fazer!
– Qual a diferença? Pode me dizer? Por que eu não vejo. É apenas um trabalho, como o seu.
Hermione ficou em silêncio durante alguns instantes, parecendo não acreditar nas palavras que acabara de ouvir.
– Não é como o meu – repetiu energicamente.
– Por que não? – Harry insistiu.
– Porque você vai se meter em uma loucura de novo! – ela exclamou, seu tom de voz aumentando. – Voldemort estava ligado a você pela profecia, você era o único que poderia matá-lo, mas… não tem obrigação nenhuma com Æthelind!
– E o sonho que eu tive?
– Não significa nada! – Hermione soava frustrada. – Foi a forma que a sua mente encontrou de assimilar tudo o que aconteceu durante o dia… foram emoções demais desde que Rony voltou, você ficou confuso e…
– E desequilibrado, quem sabe? – Harry comentou ironicamente.
– Eu não disse isso, Harry.
Ele respirou fundo antes de continuar:
– Amor, eu só quero ajudar Dumbledore… eu sei que a culpa é minha por Alana estar morta, mas se Æthelind não estivesse lá…
– Você não precisa vingá-la. Não é a sua obrigação. Você tem uma vida agora, Harry… e pessoas que fazem parte dela! – Hermione insistiu.
– Você não entende que fui eu que a matei? Eu preciso resolver isso!
– O que eu não entendo é essa sua mania de se responsabilizar por absolutamente tudo. Às vezes, você não é o culpado, Harry… às vezes, você não precisa largar tudo para resolver os problemas do mundo bruxo… largar a gente…
– Eu quebrei o feitiço que a mantinha viva, Hermione, e não estarei abandonando vocês. Será só uma investigação, mas eu voltarei para casa todos os dias – Harry falou, olhando-a como se pedisse que ela compreendesse.
– Eu conheço essa história. Ouvi a mesma ladainha antes de você se trancar durante um ano naquela sala do Departamento de Mistérios! – foi a resposta seca de Hermione.
– Preciso pedir desculpas por isso de novo? – Harry exclamou, irritado. – Quem sabe eu peça desculpas também por ter parado Voldemort quando ele estava usando Lúcio Malfoy para torturá-la no Ministério?
– Então é isso? Quer que eu te agradeça? Pois bem, Harry, muito obrigada por ter parado Malfoy enquanto ele torturava a mim e a nossa filha… a nossa filha que você não queria… - ela vociferou rispidamente, seu tom de voz aumentando mais uma vez.
Naquele momento, porém, outra voz intrometeu-se na discussão, fazendo com que os dois parassem imediatamente de gritar.
– Papai? – perguntou a garotinha, parada à porta da cozinha.
– Leahnny… Leahnny, é melhor você voltar para o seu quarto, a mamãe e o papai precisam conversar – disse Harry, tentando adivinhar se ela ouvira a frase de Hermione.
– Eu não quero voltar para o quarto, papai – resmungou ela, esfregando os olhos.
– Agora, Leah – disse Hermione, lançando-lhe um olhar severo.
– Não briga, mamãe.
– Não estou brigando com você, querida. Só quero que volte para a cama, ainda está cedo.
– Está brigando com o papai? – a garotinha perguntou, desconfiada, olhando para os dois.
– Você ouviu sua mãe, Leah – disse Harry. – Pra cama!
– Mas, papai-
– Vem – Harry pegou a garotinha no colo e a carregou até o quarto. – Fique deitada mais um pouco, meu amor.
Harry começou a levantar-se, com a intenção de retornar à cozinha, mas a filha o impediu.
– Papai – Leahnny recusou-se a largar o pescoço do pai -, eu não quero ver você e mamãe desse jeito.
– Preciso falar com a sua mãe, filha… seja boazinha e fique aqui, sim?
– Vai gritar com ela, papai?
O pai olhou-a por alguns instantes, tentando pensar na melhor forma de responder para assegurá-la.
– Não. Sua mãe e eu vamos conversar…
– Promete? – insistiu Leahnny, ainda o segurando perto de si.
Harry suspirou. Tentando evitar a pergunta, ele arrumou os cobertores sobre a filha, não a encarando.
– Leah, eu preciso voltar – fez com que a filha ficasse na cama. – Durma mais um pouco que depois eu trago o café.
– Não tenho mais sono, papai.
– Deite-se um pouco e o sono volta, querida – insistiu, beijando-a na testa com afeição.
– ‘Tá bom, papai.
Harry fechou a porta da filha e passou pela sala, ainda com raiva, mas procurando uma maneira de fazer Hermione parar de brigar. Parou à porta da cozinha, observando a esposa guardar as coisas que tirara para o café.
– Você não vai comer nada? – perguntou ele.
– Perdi a fome – ela respondeu friamente, sem encará-lo.
– E será que eu posso comer?
– Sinta-se à vontade – Hermione passou pelo marido, ainda sem olhá-lo, e foi para a sala.
– Vai me ignorar agora? – perguntou ele, indo atrás da esposa.
– Você que me ignorou e disse que não queria nada que viesse de mim. VOCÊ GRITOU NA MINHA CARA JUSTO NO DIA QUE EU LHE CONTARIA QUE ESTAVA GRÁVIDA DA LEAH! COMO ACHA QUE EU ME SENTI?
– Isso foi há doze anos, Mione – defendeu-se ele.
– E, como sempre, nunca resolvemos isso. A cada briga que temos, não resolvemos nada…
– Eu não queria brigar com você…
– Para não precisar resolver os problemas, não é mesmo? – ela acusou rispidamente.
– Para não sofrer…
– Ah, e eu não sofro nada! Aliás, eu não deveria sofrer por não poder ficar perto do meu marido? – retrucou, irônica.
– Mas eu estarei perto, amor…
– Aham. O corpo comigo e a mente em Æthelind!
Harry suspirou de forma cansada. Aquela discussão parecia piorar a cada instante que passava. Hermione continuou a encará-lo friamente, esperando que se pronunciasse.
– Mione… – tentou começar.
– Vai negar? – Hermione cortou-o.
– Mione…
– VAI NEGAR?
– CHEGA! – ele fez um gesto no ar que pareceria despreocupado, se não tivesse sido seguido por um ruído de vidro quebrando em mil pedacinhos.
Todo o espelho, que ficava na parede atrás da mesa, partira-se diante da magia descontrolada de Harry. Estilhaços caíram no chão, junto à parede, e até sobre a mesa, perigosamente perto da cadeira em que Hermione estava apoiada.
– O que foi, Potter, é demais para você admitir a verdade?
Harry não respondeu. Sequer olhou para a esposa. Com os olhos fechados e as mãos escondendo o rosto, permitiu que seu corpo escorregasse, encostado à parede, até sentar-se no chão, que ainda estava coberto pelos resquícios do vidro.
“Vamos continuar desse jeito, não é mesmo? Você nunca fala nada…”
– O que você quer que eu diga?
– Você quer mesmo continuar com esse casamento, ou Æthelind é uma desculpa para darmos outro tempo?
– O… outro tempo? – Harry perguntou, chocado.
– Talvez…
– N… n… Mione… não…
– Eu também não – ela cedeu, respirando fundo. Passou a mão nos cabelos e continuou. – Mas… eu não quero continuar desse jeito.
– M… mas nós…
– Não quero mesmo – reafirmou ela, apoiando as mãos na cintura.
– Mione…
– É a última vez que eu peço, Harry: vamos resolver esse assunto?
– Eu… não sei… o que dizer, Mione.
– Não fique bancando o “chocado”, Harry.
Ele não respondeu. Não estava “bancando o chocado”. Estava realmente sem palavras diante da sugestão da esposa. Não queria, de forma alguma, ficar longe dela mais uma vez. Em dez anos de casamento, eles só haviam ficado brigados uma vez; durante pouco mais de uma semana, e aquilo fora o suficiente para que, desde então, pensassem duas vezes antes de afastarem-se novamente.
Esperava que isso não acontecesse mais uma vez. Estava disposto até a desistir de ajudar Dumbledore, se aquilo fosse originar uma nova separação. Queria ficar ao lado da esposa, principalmente agora que ela concluíra a pesquisa e não tinha nada mais com que se preocupar a não ser com a família – pelo menos, era isso que Harry esperava.
– Não vai dizer nada?
– Eu não quero dar outro tempo… - foi o que Harry conseguiu dizer.
Hermione suspirou, baixando os olhos e adquirindo um ar de derrota. Parecia tão cansada quanto ele daquela discussão – e igualmente temerosa com relação à possibilidade de afastarem-se mais uma vez.
– Eu… ainda lembro da última vez, amor. Foi horrível… - ela finalmente se pronunciou.
– Hermione… estamos de cabeça quente…
– Preciso de um tempo para pensar. Só… me deixe um pouco sozinha, ‘tá bem?
***
Harry caminhou até a beira do lago com a cabeça estourando de dor. Os gritos e acusações trocados com Hermione ainda ecoavam em sua mente, fazendo-o fechar os olhos e cerrar com força os punhos, controlando a raiva. Acabara cedendo para evitar uma briga ainda mais séria e isso o frustrava.
Sentou no chão, na terra mesmo, e suspirou, cansado. As coisas haviam se resolvido com Hermione – pelo menos, era o que ele esperava –, mas, nesse momento, não conseguia ficar próximo a ela. A única idéia que sua mente aceitava naquela manhã era a de solidão e de silêncio.
Baixou a cabeça até os joelhos, fazendo com que essa latejasse um pouco menos. Deixou de ouvir até mesmo o barulho do vento, obtendo a solidão que tanto precisava. Afastou todos os pensamentos que conseguiu, tentando espairecer os pensamentos; tentando não se importar com ela; tentando evitar que ela o dominasse.
Permaneceu por horas encarando o nada, concentrado apenas em relaxar. Sentiu um leve toque em seu ombro e uma voz gentil sussurrar-lhe no ouvido, trazendo-o de volta à realidade.
– Ocupado, Harry?
– Hum… não, eu estava apenas olhando o lago.
– Posso me sentar ao seu lado?
– Claro, Mione – disse ele, ouvindo a própria voz soar artificialmente gentil.
Depois de sentar-se ao lado do marido, ela voltou os olhos para observá-lo.
– Você ainda está brabo comigo? – perguntou por fim.
– Não – ele respondeu, simplesmente.
– Har…
– Desculpa, amor, eu só estou com dor de cabeça, por isso vim para cá…
– Veio pensar, eu conheço você… olha, Harry, eu não quero que fiquemos brigados.
– Não estamos brigados… a não ser que voc-
Hermione o interrompeu antes que pudesse concluir aquela frase.
– Já disse que não quero. Vim aqui para resolvermos as coisas.
– Já resolvemos – Harry disse e, então, calou-se.
E, com aquelas palavras, um silêncio desconfortável estabeleceu-se entre eles.
– Seus silêncios são excruciantes – Hermione decidiu comentar depois de muito tempo.
– Desculpa.
Um novo silêncio caiu entre eles, permitindo que o vento – e somente o vento – pudesse ser ouvido.
– Está vendo como não resolvemos?
– Hermione…
– Não, Har. Converse comigo…
– Estou frustrado, amor. Eu quero muito trabalhar naquilo… só que não quero contrariar você… não sei o que fazer.
– Ah, Harry…
– Não sei mesmo, Mione. Me ajude… – Ele colocou os dois braços um pouco mais atrás do corpo e apoiou-os no chão.
– Eu já disse tudo que tinha para dizer sobre isso… mas… eu não posso proibi-lo.
– Mas pode brigar comigo se eu for…
– Não – respondeu ela, depois de um longo suspiro.
– Acabou de brigar.
– E já estou arrependida – Hermione mordeu o lábio inferior, encarando Harry nos olhos. – Por isso estou aqui.
– Se você não quiser que eu vá… sério mesmo, eu não vou fazer nada que a magoe… se você realmente acha que nós vamos nos afastar com isso, eu não quero…
– Esse é o problema, Harry. Eu acho sim que vamos acabar nos afastando. Só que… não quero impedi-lo de fazer o que quiser, mesmo sendo sua mulher. Eu não tenho esse direito…
– Você tem, meu amor.
– Não é bem assim. Você esteve tanto tempo afastado do mundo bruxo, talvez seja mesmo a hora de voltar…
– Eu não quero voltar, só quero impedir os planos de Æthelind.
– Você sabe que não vai conseguir isso sem se expor novamente, não sabe? – Hermione o abraçou e sussurrou ao seu lado.
– Eu posso evitar muita coisa, é diferente agora. Não sou mais um garoto…
– Eu sei que não, Har. A decisão é sua.
***
Hermione colocava nas mãos de Harry as decisões pelo próprio destino e, de certa forma, confiaria no que ele estava prestes a escolher. Rony, por outro lado, não possuía base alguma em que pudesse firmar suas decisões além das opiniões de seus amigos. Lupin fora um dos que o apoiaram quando ele veio primeiro com a idéia de procurar Billy e até dera sugerira que ele buscasse Dumbledore e pedisse para ver o garoto durante o Natal.
Rony estava decidido a reencontrar o filho e queria fazê-lo sem muita demora. Vira-o crescer e permanecera afastado por tanto tempo – algo que o fazia temer a reação do garoto de dezessete anos – mas de forma alguma deixava de lado a curiosidade, e a busca por aceitação, com relação ao garoto.
Pela forma com que Luna o tratara quando a procurara novamente, sentia que ela o odiava e temia que Billy também o fizesse com base na influência das opiniões maternas. Por isso, foi com hesitação que ele chegou à escola em que estudara e percorrera seus extensos corredores em direção ao escritório de Dumbledore.
O olhar determinado e a expressão tão mais madura do que aquela apresentada quando era apenas um adolescente ocultavam a insegurança e o receio que o mortificavam. Adentrou à sala após subir a escada ocultada pela gárgula de pedra e cumprimentou o Diretor, que logo o deixou sozinho, esperando; fora buscar o jovem Lovegood.
Minutos de silêncio e tensão se passaram pelo Rony imóvel que se encontrava sentado em uma das poltronas da sala íntima. Ao ouvir a porta abrir, voltou os olhos à entrada e não pode distrair sua atenção do garoto que era tão parecido consigo mesmo em idade mais jovem.
– Olá... Billy... – cumprimentou ele, mal sabendo como agir e temendo forçar uma aproximação não-desejada.
Antes que Dumbledore o intimasse a responder, Billy olhou para o chão e suspirou, sem parecer cansado ou indeciso, somente incomodado. Então, com a voz suave, disse:
– Eu sempre imaginei como você seria... ninguém nunca me disse que éramos parecidos.
– Desculpe... sua mãe- Rony começou a buscar explicações, sendo interrompido por Billy.
– Ela me disse que você tinha morrido – declarou apenas, nenhum tom de acusação sendo demonstrado por sua voz.
Rony assentiu com a cabeça e não foi capaz de recordar metade das palavras e justificativas que planejara dar a seu filho, permitindo que um clima desconfortável surgisse entre os dois – uma situação que nenhum dos dois sabia como mudar.
A interferência de Dumbledore, pedindo gentilmente que sentassem, ajudou um pouco e Billy retomou novamente a palavra.
– Acho que você me deve uma explicação-
– Eu sei – respondeu Rony imediatamente, antes que ele terminasse. – Eu sei que precisamos conversar...
– Uma explicação pelo que você fez minha mãe passar todos esses anos...
***
Próximo Capítulo: (autora se perguntando o que tem no próximo capítulo, porque mal se lembra do nome dos personagens, imagina do plano...) ahhhhh, sim, capítulo muito bom! XDDD Crime e castigo: onde alguém tem de cumprir uma punição muito... hum... exótica em pleno Natal, acontece um revelador ataque e alguém anda não muito bem, deixando Harry um tanto quanto preocupado.
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