Consequências
Draco acordara com os primeiros raios de sol da manhã que entravam pela janela, mas não abriu os olhos. a idéia de cobrir-se com a capa realmente funcionara, pois ele não sentira nem um pouco de frio durante a noite inteira. Seu relógio biológico lhe dizia que ainda era muito cedo, sendo que a biblioteca abria apenas no segundo período de aula, ou seja, às sete e meia.
Ele pensava na noite anterior. Nunca, em sã consciência, imaginara-se em uma situação semelhante. Certo, a situação era louca. Mas o fato de Ter dormido na biblioteca não era o que ocupava a mente de Draco. Ele oferecera sua capa para Gina Weasley, simplesmente por não conseguir vê-la passando frio. Definitivamente, ele estava ficando louco!
Mas a reação dela foi o que, de fato, o deixara boquiaberto. Quer dizer, ela tinha, claramente, feito questão de dormirem o mais longe um do outro possível. Mas não deu dois minutos e lá estava Gina, deitando-se a seu lado, oferecendo um canto da capa e sorrindo, como se o conhecesse há séculos, como se fossem velhos amigos.
"Isso vai além da minha capacidade de compreensão." Ele pensou, enquanto abria os olhos, para deparar-se com a cena mais bizarra até agora.
A cabeça de Gina descansava confortavelmente em seu peito, e os braços dele envolviam os ombros da menina.
O calor do corpo dela devia Ter procurado o calor do corpo dele durante a noite.
Sentindo-se extremamente constrangido, ele achou melhor não acordá-la. Afinal, isso apenas o deixaria mais constrangido ainda.
Delicadamente, ele retirou os braços de debaixo do pescoço dela, e pousou a cabeça de Gina no chão, para acordá-la depois.
Mas então, quando estendia a mão para sacudi-la, ele deteve-se por um momento. O peito dela subia e descia delicadamente, acompanhando sua respiração. Ele nunca realmente olhara para ela. Começava a pensar que grande parte dos insultos que ele lhe dirigira (a maioria, na verdade), não eram verdadeiros.
A menina tinha um ar gracioso e feminino, que atraiu seu olhar.
Ele nunca conseguira entender o que Potter vira nela e vice-versa, quando namoravam. Mas agora ele descobria a maior beleza que uma mulher pode Ter: a beleza interna, que reflete no lado externo. Quando começara a vê-la de uma maneira diferente, Draco percebia o quão delicado o rosto dela era, o quão intrigante ela parecia ali, indefesa.
O que ele estava pensando? Aquela era Gina Weasley! Aquela menininha mirradinha e sem graça, que parecia não saber para que lado correr quando Draco a insultava.
"Estou ficando louco..." ele pensava, sem desgrudar o olhar dela, um segundo sequer. "Eu sem dúvida alguma estou ficando louco. Devo estar cansado. Dormi pouco, é isso. É melhor acordá-la de uma vez, para podermos sair daqui."
Delicadamente, ele começou a sacudi-la e falar baixinho em seu ouvido, para não assustá-la:
- Weasley, acorde. Vamos, acorde. Não podemos deixar que a Pince nos veja.
- Hum?
- Vamos, levante.
Ela pareceu levar um sustinho ao acordar ali, daquele jeito, mas depois voltou ao normal.
Draco riu-se discretamente, de modo que ela não pudesse ver. Se levara um pequeno susto com ele a despertando, como não haveria de acordar abraçada nele?
Sacudindo a cabeça, ele decidiu mandar esse pensamentos para longe. Sem dúvida, a situação influíra sobre eles. Era só isso. Ele voltaria a ser o Draco Malfoy de sempre, e ela voltaria a ser o que ela quisesse. Pronto!
Os dois decidiram esperar ao lado da porta até Madame Pince abrir a biblioteca, de modo que ficassem escondidos pelo ângulo que a porta formava, saindo silenciosamente quando ela estivesse de costas.
Foi o que sucedeu, sem complicações. Na verdade, Madame Pince não parecia ser a pessoa mais "antenada" do mundo...
No corredor, Gina pôde respirar aliviada. Aquela função toda tinha acabado. Agora, ela podia ir ao seu dormitório, se arrumar, tomar café da manhã correndo se sobrasse um tempinho, e ainda por cima, chegar a tempo para assistir a primeira aula do dia.
- Então. Weasley, acho que ela não nos viu.
- É, acho que não. Obrigada novamente por ontem. Se não estivesse coberta pela sua capa, sem dúvida, não teria conseguido dormir.
Aquela expressão amigável da noite anterior sumira repentinamente do rosto dele, dando lugar ao desdém rotineiro.
- Não pense que vai ficar minha amiguinha só porque eu te emprestei uma droga de capa.
Ela foi pega de surpresa, e não conseguiu responder.
- Este é um bom começo. Não fale mais comigo. Não me dirija a palavra. Aliás, você está andando muito perto de mim.
- Qual o problema, Malfoy? Tem vergonha de ser visto comigo? Pois fique sabendo que eu também não fico nem um pouco contente com a idéia de toda Hogwarts me ver com você. Eu costumo andar com pessoas decentes, que têm caráter, sabe? - ela explodiu.
- Eu não estou andando com você, Weasley, estou indo para o meu dormitório, que por sinal está cheio de pessoas com um nível de convivência que você jamais vai conhecer!
- E para o seu governo, eu também estou indo para o meu dormitório!
- Então valha o ar que você respira e aperte o passo, para chegarmos logo e eu não precisar mais olhas para você.
- E você veja se cale a boca durante todo o caminho, porque essa sua voz de taquara rachada é simplesmente insuportável!
- Ótimo!
- Ótimo! - ela falou.
- Ótimo!- ele gritou, encerrando a discussão.
Os dois seguiram em silêncio pelo corredor, até chegarem em uma parte em que o mesmo se dividia. Draco seguiu para a esquerda e Gina para a direita; sem dizerem uma palavra um ao outro.
Após alguns passos Gina, mesmo sem acreditar no que estava fazendo, parou de caminhar por um instante, olhando a nuca de Draco. Nada em sua mente. Seu coração cheio. Não sabia de quê, mas estava cheio.
Com medo de que ele percebesse o que estava fazendo, ela continuou a andar em direção a seu dormitório, sem saber que agora, quem admirava seus cabelos cor de fogo sem muita certeza do que estava sentindo era Malfoy.
**
Draco não conseguia se concentrar em aula nenhuma. O episódio da biblioteca não saía de sua cabeça, por mais que tentasse afastar esse pensamento.
E o que mais o intrigava era não saber o motivo disso. Claro, passar a noite na biblioteca da escola com uma garota para a qual ele nunca dissera nada mais delicado do que "pobretona" não era a coisa mais comum do mundo, mas ainda assim, estava intrigado.
Alguma coisa acontecera na biblioteca que não o deixava em paz. O rapaz só não conseguia identificar o que era.
Gina invadiu sua mente, e foi então que ele surpreendeu-se consigo mesmo: não sentiu o nojo costumeiro da menina. Pensou em Gina e permaneceu indiferente. Não estava se reconhecendo. Não era ele quem estava ali. Ele sempre tinha uma opinião formada sobre todas as pessoas, mas agora, pensando em Gina, percebeu que não saberia dizer nada sobre ela. Viu que ela era muito mais do que parecia ser. Apenas não sabia o que ela era. E sabia que não havia jeito de saber, se não conhecê-la melhor.
Não que quisesse conhecê-la melhor, estava apenas refletindo sobre ela.
Mas por que raios estaria refletindo sobre Gina Weasley? Normalmente, ele nunca perderia seu tempo, nem mesmo pensando sobre ela. Mas agora estava, e não sabia porquê.
Draco estava realmente confuso. Não entendia nada. Não entendia porque havia oferecido a capa para ela, o que o impulsionara a fazer isso; não entendia porque ela havia oferecido um canto a ele, e também não entendia porque voltara a tratá-la mal repentinamente, e porque ela e a biblioteca não saíam de sua mente.
Após o jantar, ele achou que o mínimo que poderia fazer depois de uma aula improdutiva era tentar enfiar pelo menos um quarto da matéria do dia na cabeça.
Pensou na biblioteca, mas logo viu que não se concentraria lá. A única alternativa que sobrara fora a Sala Comunal da Sonserina.
Passou uma hora estudando em frente à lareira, antes de sentir-se sonolento e ir dormir. Imaginando se Gina poderia estar tão encucada quanto ele.
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