O Guardião das Chaves



Ao retumbante som da porta desabando, os Dursley se levantaram. Válter pegou o embrulho fino e retirou o conteúdo, revelando uma espingarda.


- Quem está aí? - perguntou Válter apontando a espingarda para a porta. - Não tenho medo de você! Estou armado!


No entanto, pensaram todos os outros presentes, era muita burrice de Válter ameaçar o cara que estava na porta com uma espingarda.


O tal homem visitante devia ter bem uns três metros de altura e um ou mais de largura. Usava um enorme casaco preto (proporcional ao seu tamanho exagerado) e calçava botas de couro. Trazia na mão esquerda um guarda-chuva rosa florido, quebrando completamente a aparência agressiva e selvagem que sua barba e seus cabelos até no ombros, castanhos e emaranhados lhe proporcionavam. Por baixo de tanto cabelo, viam-se dois olhinhos negros, como pequenos besouros.


Ele entrou na cabana sem a menor cerimônia. Ergueu a porta e a reencaixou no portal, voltando-se em seguida pra os Dursley, e depois para os gêmeos encolhidos perto do sofá, abraçadinhos e gelados de medo.


- Ah, aí estão vocês, Ash, Harry. Poxa, não os vejo desde que cabiam cada um em uma das minhas mãos! - os gêmeos gelaram ainda mais. - E os Dursley.


- Saia da minha casa! - disse Vernon, tremendo mais que vara verde. - VOU CHAMAR A POLÍCIA!


- Ah, cale a boca, seu cara de passa... - e o estranho vergou a espingarda no meio como se fosse de papel, depois a atirou num canto da sala. Os Dursley se encolheram num canto escuro e observaram enquanto o estranho se assentava no sofá. - Vocês dois, porque não se assentam aqui comigo, hein?


Harry e Ash acharam melhor não contrariar o pedido de um homem daquele tamanho e se assentaram cada um de um lado dele, mas o mais afastado possível. Mesmo assim, o homem era tão grande que o sofá dava o tamanho certinho para que os três se assentassem, não cabia mais nem uma mosca sequer.


- Então, como vai a vida? - perguntou o estranho. Ao ver que não recebeu resposta, prosseguiu - Fiz algo para vocês. Talvez eu tenha assentado em cima sem querer, mas o gosto continua bom, eu garanto! - tirou uma caixa de um dos bolsos do casaco e entregou a Harry. O garoto abriu sob o olhar intrigado de Ash e revelou um bolo de chocolate com cobertura cor-de-rosa e as palavras "Happy Birthday Twins!" escritas em verde.


Harry quis agradecer, mas não achou palavras para isso. Enquanto permanecia assentado e mudo, Ash engoliu em seco para fazer a pergunta que todos queriam que fosse feita:


- Quem é você?


- Ah, é mesmo, não me apresentei! Não me surpreende que vocês estejam tão acanhados! Sou Rúbeo Hagrid!


Os gêmeos se entreolharam, continuavam na mesma.


- Bem - prosseguiu Hagrid. Pairava no ambiente a sensação de que todos, à exceção do homem enorme, eram mudos. - que tal um chá hein? Para acompanhar o bolo?


Ninguém se mexeu. Rúbeo respirou fundo, deu uma risadinha ao mirar os pacotes carbonizados de cereal e estendeu o guarda-chuva para a lareira. Então fez alguns movimentos e a lareira acendeu imediatamente.


O queixo dos irmãos caiu.


Hagrid foi tirando toda a sorte de utensílios dos bolsos do casaco e começou a preparar o chá e salsichas fritas na lareira recém acesa. Enquanto ele trabalhava, não soava som algum além do crepitar da lareira e o estômago de Duda, que por mais medroso que fosse, não resistia ao cheiro das salsichas e o bolo de chocolate.


Alguns minutos depois, Hagrid tirou várias salsichas suculentas de um espeto e passou para os gêmeos. Harry parecia meio assustado, mas Ash não fez a menor cerimônia e foi logo comendo tudo, de forma que Harry teve que se apressar caso quisesse comer algo.


Duda se mexeu mais uma vez em direção às salsichas, mas foi impedido pelo braço de sua mãe:


- Não coma nada que ele lhe oferecer, Duda, pode estar envenenado!


Harry e Ash passaram por um segundo de hesitação onde pararam com as salsichas a meio caminho da boca, mas a resposta de Hagrid fez os gêmeos começarem a sentir certa afeição pelo homem:


- Não se preocupe seu grande trouxa, seu filho não precisa comer mais nada para ficar mais pudim de banha do que já é.


O melhor da resposta foi ver os poucos neurônios de Válter lutando para entender a resposta.


Enquanto ainda comiam, Harry resolveu refazer a pergunta que Ash fizera e cuja resposta não fora muito esclarecedora.


- Me desculpe, senhor, mas... - ele olhou para Ash por um instante buscando confirmação. Ela acenou afirmativamente. - Mas ainda não sabemos quem é o senhor.


- Que é isso Harry, menos "senhor" por favor, me sinto velho... Mas como eu disse, sou Hagrid, mas podem me chamar de Rúbeo, guardador das chaves e das terras de Hogwarts.


Harry e Ash ainda estavam na mesma, mas Hagrid não deixou passar desta vez:


- Hora, vocês sabem, Hogwarts. Hogwarts é uma escola, nunca se perguntaram onde seus pais aprenderam tudo?


- Tudo... o que? - perguntou Ash.


- Como disse? - retrucou Hagrid, ainda comendo uma salsicha.


- Tudo o que? - reforçou Harry.


A compreensão perspassou o rosto de Hagrid.


- Ah, espere aí um segundo! - ele se virou aos Dursley. - Estão dizendo que vocês não contaram a eles?


- O que? - perguntou Ash, seu pavio curto prestes a explodir.


- Não. Eles não sabem. Não sabem nada, e nem vão saber. - disse Válter.


- Eiei, sei algo sim! Sei matemática muito bem e...


- Ah Harry, deixe de ser idiota! - retrucou Ash. - Você não sabe matemática coisíssima nenhuma, é muito melhor com educação física.


- Calma aí - disse Hagrid - estou falando de outras coisas, coisas do nosso mundo.


Desta vez os gêmeos perguntaram juntos:


- Que mundo?


- QUE MUNDO? - repetiu Hagrid aterrorizado. - ESCONDERAM TUDO DELES! TUDO! NÃO ACREDITO! - a esta altura Rúbeo estava de pé, e na raiva parecia encher todo o casebre sozinho.


Ele tomou um ar. Assentou-se e se dirgiu aos gêmeos com mais calma.


- É o seguinte: vocês dois são muito famosos, muito mesmo e...


- PARE, PROÍBO VOCÊ DE CONTAR QUALQUER COISA A ELES! - berrou Válter.


- CLARO, QUERO VER UM GRANDE TROUXA COMO VOCÊ ME IMPEDIR!


- Trouxa?


- É quem é diferente de nós. Vocês dois são bruxos.


Silêncio. Dos mais pesados e mórbidos. E então, passados trinta segundos:


- Impossível! - exclamou Ash. - Como pode ser... Como pode...


- Inclusive, acho que já passou da hora de receberem suas cartas. - Hagrid entregou uma carta para cada. À exceção dos nomes, elas continham o mesmo conteúdo: um pergaminho leve, um outro levemente mais pesado e passagens de trem.


Harry pegou sua carta e leu em voz alta. Ash seguiu na sua, uma vez que ambas diziam o mesmo:


ESCOLA DE MAGIA E BRUXARIA HOGWARTS


Diretor: Alvo Dumbledore


(Ordem de Merlin, Primeira Classe, Grande Feiticeiro, Bruxo Chefe Cacique Supremo, Confederação Internacional de Bruxos)


Prezado Sr. Potter,


Temos o prazer de informar que V. Sa. tem uma vaga na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Estamos anexando uma lista dos livros e equipamentos necessários.


O ano letivo começa em 1º de setembro. Aguardamos sua coruja até 31 de julho, no mais tardar.


Atenciosamente,


Minerva McGonagall


Diretora Substituta


Os gêmeos ficaram completamente boquiabertos. Gastaram bem uns três minutos para processar a informação, então Harry se manifestou com a pergunta mais tosca e boba dos milhares que queria fazer:


- O que querem dizer com "aguardam minha coruja"?


- Gárgulas galopantes, isso me lembra uma coisa!


Hagrid tirou do bolso um pergaminho, uma pena e um tinteiro, e então o que surpreendeu ainda mais os presentes: uma coruja, inteira vivinha. Meio amassada, mas viva.


O homem escreveu um bilhete curto no pergaminho:


Caro Dumbledore. Os encontrei. Como está o tempo aí? Aqui está horrível. Espero lhe encontrar logo, Hagrid.


Então amarrou o papel na perna da coruja, a pegou na mão, abriu a janela e a largou na tempestade. Em seguida voltou e se assentou como se tivesse simplesmente feito uma chamada de telefone.


- Bem - prosseguiu Hagrid - como veem, as aulas começam em primeiro de setembro e...


- Eles não vão! - vociferou Válter - Juramos quando o recebemos que íamos por um fim nessa bobajada e...


- Hora, espere aí um segundo! - berrou Ashley - Você sabia! Sabia e nem nos contou!


- Mas é claro que sabíamos! - manifestou-se Petunia pela primeira vez - A minha irmã sendo a estranha que era, ia para aquela escola e voltava carregada de ovas de sapo e dizendo coisas estranhas... Ah, era um orgulho ter uma bruxa na família, para papai e mamãe ela era uma gênia... Então ela conheceu aquele Tiago na escola, eles se casaram e tiveram vocês e eu sabia, sendo o que os dois eram, que vocês iam ser assim também! Mas então, um ano depois de vocês nascerem eles fizeram o favor de se explodir e...


- Se explodir? - agora quem se pôs de pé foi Ash, sua raiva tão grande quanto a de Hagrid, se não fosse maior.


- Ash - o irmão se levantou e pôs a mão no ombro da garota, tentando acalmá-la. - Relaxe, acalme-se.


- Me acalmar? ME ACALMAR? COMO ASSIM? COMO ASSIM, ELES SE EXPLODIRAM? VOCÊS DISSERAM QUE ELES MORRERAM NUM ACIDENTE DE CARRO!


Agora foi a vez de Hagrid explodir:


- ACIDENTE DE CARRO? UM ACIDENTE DE CARRO MATOU LÍLIAN E TIAGO POTTER? Como é que pode... Como é que pode? Quando qualquer garoto no nosso mundo sabe os nomes deles, eles mesmo desconhecem sua história... Eu sabia que enfrentaria problemas, mas jamais imaginei que chegaria a esse ponto! Meu Deus, acidente de carro? Façam-me o favor...


- Ei Hagrid... - chamou Harry que estava calmo o bastante para perguntar algo, e segurando os punhos da irmã apra impedi-la de voar no pescoço dos Dursley - O que você quis dizes com qualquer garoto no nosso mundo saber nossa história?


- Anh? Ah... É, bem... Vocês dois são famosos no nosso mundo Harry. Você e Ash.


- Hein? - finalmente Ash deu algum sinal de paz. - O que quer dizer?


- Que tal se nos assentarmos de novo, hein? - sugeriu Hagrid, ainda chocado com como gêmeos podiam ser diferentes: enquanto Harry se mostrava quieto e aceitava tudo com paciência, Ash se irritava com facilidade, e tentava a todo o custo estrangular os Durley. - Você é geniosa menina... E você Harry, é bem pacífico.


- Gêmeos não são tão iguais assim, Senhor. - respondeu Harry.


- Ah, com certeza. Mas, bem. Vocês me questionaram sobre serem famosos, e isso tem uma ligação direta com a morte de seus pais.


- O que aconteceu... senhor? - perguntou Ash, que estava tentando ser mais gentil, assim como o irmão o era.


- Nem todos os bruxos são bons. Há alguns anos atrás existiu um bruxo que ficou mal, tão mal quanto se pode ficar. Ele matou pessoas, fez outras sofrerem. Foram tempos nebulosos, sim, não houve uma pessoa em seu caminho que sobrevivesse quando ele resolvesse matá-lo, nenhuma. A não ser... Vocês dois.


- Senhor...? - Harry disse isso como um pedido claro de detalhes.


- Quem era ele? - perguntou Ahsley.


- O nome dele era... O nome dele era V...


- Algum problema? - perguntou a garota.


- Bem, não se diz o nome dele se puder evitar, atraí má sorte, é o que dizem.


- E se você escrevesse? - sugeriu Harry.


- Não, não sei soletrar. Está bem: Voldemort!


- O quê? - perguntou Ash.


- Ah, por favor, não me façam repetir. De qualquer forma, este homem, uma noite, resolveu matar seus pais, eu não sei o porque. Ele matou seu pai e sua mãe que tentaram proteger vocês, mas por algum motivo, quando foi enfeitiçar vocês... Assim que o feitiço tocou Harry que estava na frente, ele recuou, e vocês ficaram. Algo nos dois o enfraqueceu para valer. Há quem diga que ele morreu, besteira na minha opinião, não sei se ele tinha humanidade o bastante para morrer. Acho que ainda está por aí, cansado demais para continuar, procurando uma forma de retornar. E é por isso que vocês são famosos. São heróis, tinham um ano e se tornaram heróis.


Ao fim dessa fala, algo perpassou a mente dos gêmeos: uma luz verde muito forte, que eles já haviam visto algumas vezes, mas desta vez algo mais: uma gargalhada cruel, fria e aguda... Os Potter se olharam, com medo. Era como se o tal Voldemort estivesse à espreita, os espiando, procurando a hora para atacá-los.


Houve um espaço de tempo no qual o silêncio pareceu falar mais do que o breve monólogo de Hagrid. O responsável por quebrar isso foi Válter:


- Não faz diferença o mundo está bem melhor sem os dois e...


- Estou lhe avisando Dursley, nem mais uma palavra! - disse Hagrid, apontando para os três com o guarda-chuva.


- Hagrid - pronunciou Harry após um minuto de reflexão. - acho que você se enganou, acho que houve um engano. Ash e eu não podemos ser bruxos, somos só Ash e Harry. Só.


- Não são bruxos? Pensem, nunca fizeram nada estranho? Nada fora do comum, quando estavam magoados ou com raiva?


Uma horda de lembranças de coisas estranhas os tomou. Os Potter se olharam com um meio sorriso.


- Viram só? Vocês são bruxos sim, e de primeira depois de receber algum treinamento!


- Chega disso! - Disse Válter imediatamente. - Não vou pagar e nenhum velho biruta e pateta para ensinar coisas idiotas e inúteis aos dois!


Hagrid se pôs de pé imediatamente. O tom tranquilo que sua voz tomou foi bem mais ameaçador do que se ele tivesse gritado:


- Nunca insulte Alvo Dumbledore na minha frente... - então apontou o guarda-chuva para Duda, um lampejo, e então...


Válter e Petunia davam gritinhos, Duda pulava com a mão na bunda tentando tampar, mas tarde demais: os gêmeos já haviam visto o rabo de porco que saíra da bunda do primo, e caíram na gargalhada.


- Droga, deu errado... - reclamou Hagrid. - Eu queria transformá-lo todo em porco, mas ele já se parece tanto com um que não pude fazer muita coisa. - as gargalhadas dos gêmeos aumentaram ainda mais. - Bem,s e importam de manter isso em segredo? Eu não poso fazer magias...


- Por quê? - perguntou Ash.


- Fui expulso no terceiro ano, partiram minha varinha ao meio e tudo o mais... Mas não vamos falar disso OK? É melhor vocês dois irem dormir, temos comprar para fazer amanhã. Sabem como é o material. Se não se importam, vou ficar com o sofá, mas podem usar o casaco apra se cobrirem, está frio demais.


Os gêmeos se aconchegaram no casaco que dava e sobrava para os dois e era bem quentinhos. Os dois dormiram quase que imediatamente, sonhando com maia, feitiços e um lugar melhor.

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