Segredo Revelado
Não pude deixar de ficar satisfeita quando embarquei no Expresso de Hogwarts. Sev parecia igualmente animado.
- Não foi bom o natal na sua casa? – perguntei, enquanto entrávamos num compartimento desocupado.
- Mais ou menos. – ele respondeu suspirando. – Foi realmente bom meu pai não estar lá em casa, só que apesar de tudo minha mãe está triste com isso e então fica chorando pelos cantos.
- Sinto muito. – falei baixinho. Felix ronronou no meu colo.
A neve continuava forte e insistente. Pelo que eu me lembre, esse foi um dos anos que mais nevou.
Sev continuava a conversar comigo animadamente, e fiquei feliz de ele não tocar mais no assunto do Tiago.
Porém, quando a habitual mulher do carrinho de doces chegara, e eu comprei grandes quantidades de doces, eu deixei cair um sapo de chocolate no chão. Me abaixei pra pegar, deixando a mostra meu colar que brilhava intensamente à claridade.
- Bonito colar. – Sev comentou. – Quem te deu?
Fingi que estava ocupada demais tentando abrir uma caixa de tortinha de abóbora.
- É... foi o... Tiago. – eu disse insegura, quando não dava mais para ignorar a pergunta. Afinal, porque eu deveria mentir?
Sev fez uma careta e tornou a olhar pro colar, com cara de desdém.
- Sem graça igual a ele.
- Mas você acabou de falar que é bonito!
- É sempre assim. – disse Sev, ignorando meu comentário. – Os garotos têm as garotas que eles querem dando-lhes presentes.
Eu franzi a testa.
- Tiago não me comprou com esse colar! – reclamei.
- Com certeza essa foi a intenção dele.
- Não, não foi!
- Quem garante?
- Eu garanto! Não estou com ele por causa do colar! – protestei, mas acabei me arrependendo.
- O que quer dizer com estar com ele? – Sev perguntou de olhos arregalados. – Vocês... vocês...
Olhei instintivamente para a janela.
- Vocês estão juntos? – ele perguntou com a voz alta e enfurecida.
- Vai começar a gritar comigo de novo? – retruquei. – Qual vai ser a ofensa dessa vez?
Ele não respondeu. Suas narinas estavam infladas.
- Vocês estão juntos? – perguntou de novo, com a voz cautelosa.
- E se estivermos? – falei baixinho. Sua expressão endureceu.
- Eu não acredito. – ele murmurou, mais pra ele mesmo do que pra mim. – Não acredito que você... vai ficar com aquele... desgraçado... você...
Eu não sabia o que dizer. Estava preparada pelos gritos e acusações.
Ele respirou fundo três vezes antes de voltar a falar, se bem que seus punhos estavam fechados sobre o banco no compartimento.
- Você não pode ficar com ele.
- Porque não? – indaguei confusa.
- Ele mente pra você. – ele disse. Eu me esqueci totalmente deste assunto e agora me curvei pra ele, curiosa.
- Sobre o quê?
- Primeiro me diga. – um sorriso perverso apareceu no seu rosto. Ele estava com prazer de denunciar Tiago. – Qual foi o motivo que você se tornou amiga do Potter?
Eu pensei um pouco, tentando entender onde ele queria chegar.
- Porque ele mudou. – respondi.
- Mudou como?
- Mudou. Ele não azara mais os outros, não fica exibindo...
- Ah! – ele exclamou, seus olhos se estreitando. – Aí está. Ele não parou de azarar os outros.
- Parou sim, ele nunca...
- Não, não parou. Ele ainda azara a mim.
Houve um silêncio. O que só se ouvia era o trem batendo contra o trilho.
- O quê? – exclamei.
- Ele ainda azara a mim. – ele disse, crispando os lábios. – Sempre que ele me encontra e você não está por perto.
- Como assim? Porque voce nunca me contou isso?
- Porque simplesmente eu não queria passar a imagem de um pobre coitado, Lílian! Não queria correr até você e me humilhar, denunciando aquele desprezível! Agora pare e pense! É com esse tipo de pessoa que você vai namorar?
Eu estava simplesmente em estado de choque. Seria isso verdade? Algo no fundo da minha consciência dizia que sim, pois eu sabia como Tiago era em relação à Sev. Eu sabia. Mas ele me prometera, e foi assim que eu acabei me aproximando dele. Fora por esse motivo que eu passei a tratá-lo melhor, porque ele não azarava mais ninguém, nem mesmo o Sev! Ele não cumpriu sua promessa. E eu fui tão burra a ponto de acreditar nisso.
Eu não falei mais nada a caminho da escola.
Quando adentrei na escola, ela estava ainda com a decoração de natal. A neve ainda cobria as milhares de torrinhas da escola e a grama em volta do castelo.
Chegando ao Saguão de Entrada, um barulho de pratos e talheres informava que os alunos estavam jantando.
Caminhei pelo centro das duas mesas. Encontrei Tiago, Dougie, Maria, Sirius, Aluado e Rabicho sentados na mesa, todos conversando entusiasmados.
- Olá! – falei feliz, em reencontrá-los. Decidi falar com Tiago sobre Sev mais tarde.
- Lílian! – Maria exclamou, deixando um espaço para eu sentar. Os outros sorriam radiantes para mim. – Como foi seu natal?
- Tirando o fato de a minha irmã só querer falar sobre o casamento dela, foi bom.
- Eu falei que você ganharia mais se ficasse aqui com a gente.
- Eu precisava ver meus pais.
- Sentimos sua falta, Lílian. – disse Sirius rindo. – Especialmente o Pontas aqui.
Tiago riu, meio sem-graça.
Maria e os outros passaram maior parte da refeição me contando como fora o natal deles.
Assim que os pratos se esvaziaram todos se dirigiram para o Saguão de Entrada.
- Tiago. – chamei ele, puxando seu braço.
Ele sorriu.
- O quê?
- Quero falar com você.
Eu o puxei para onde não tinha tanto tumulto.
- O quê? – ele repetiu, curioso.
- Posso saber por que é que você mentiu pra mim?
Ele franziu a testa.
- Como assim?
- Sev me contou, não adianta mais você fingir. Eu já sei que esse tempo todo você andou azarando ele pelas minhas costas! Você tinha prometido pra mim, você tinha!
Sua expressão era incrédula.
- Não adianta mentir! – falei irritada. – Eu já sei. Dá pra você falar a verdade de uma vez?
Ele suspirou.
- Tudo bem, Lílian. Eu confesso. Eu azarava ele. É claro que azarava. E vou azarar até a morte.
- Eu me aproximei de você porque você tinha mudado! Porque você tinha parado com essa mania idiota de sair atingindo os outros!
- Eu parei de azarar os outros, Lílian! Claro que parei! – ele disse indignado. – Mas o Ranhoso eu faço questão de azarar. Porque ele me azara, e eu não vou ficar parado, não é? Porque você não vai lá e pede pra ele parar com isso? Ele pararia? Não!
Eu não respondi.
- Você só julga a mim! – ele continuava. – Você nunca julgou o seu amiguinho Snape!
Dessa vez eu suspirei.
- Eu queria que vocês parassem com isso. – murmurei.
- Eu paro. Mas só se ele parar também.
Eu cocei a cabeça, desajeitada. Suspirei de novo.
- Ok, então. – falei por fim. – Me desculpe. E vou ver se falo com ele.
- Tá. – ele falou simplesmente.
Ficamos um bom tempo encarando um ao outro.
Eu o abracei.
- Senti sua falta.
Eu senti ele rir no meu pescoço.
- Eu também.
Acho que naquele instante, nenhuma acusação feita por Sev faria eu mudar de opinião em relação ao Tiago. E eu sentia que já estava na hora de ele aceitar isso.
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