Veja Bem, Meu Bem - Harry/Gina
Participação especial *-*
Veja Bem, Meu Bem
Por Gabrielle L.
Calor, fogo. Em lençóis quase incendiando, seu corpo parecia se incomodar com a mais ínfima regularidade no tecido. Seu pés e mãos empurravam e puxavam sôfregos o algodão, e sua roupa ia parecendo cada vez mais incômoda, excessiva. Mãos invadiram, queimando sua pele. Dedos trêmulos pressionavam suas coxas, seu ventre, seus seios, sua virilha, sua boca, seu sexo...
Não podia sustentar a respiração cada vez mais pesada, os gemidos que escapavam de sua boca mordida, quando a série de movimentos se intensificou, invadindo-a, e seqüências de pensamentos cada vez mais alucinadas e descabidas penetravam seu ser, chutando com o pé, escancarando sua alma.
Sentia o suor molhar sua testa, escorregar em sua nuca. Pela janela via-se o orvalho que anunciava timidamente a manhã. Mas em seu quarto, o sol já estava a pino. Mil mãos, mil. Ela seria de qualquer um, só pra que ele soubesse que nunca poderia deixá-la assim, ali.
O sussurro rouco escapou incontrolado de sua garganta no ultimo instante, enquanto arqueava os quadris e perdia definitivamente o ultimo fio de sanidade que ainda possuía : “Harry”.
Afundou nos travesseiros alvos, desejando que fossem água, e mordeu o lábio até sentir o gosto férrico de sangue. Sentiu uma onda incontrolável de ódio tomá-la por completo, odiando-se. Ergueu-se de súbito da cama, apanhando um robe próximo e deixando o cômodo, sem se voltar uma vez sequer para o leito ou para a companhia que acabara de abandonar.
Veja bem, meu bem
Sinto te informar que arranjei alguém
pra me confortar.
Este alguém está quando você sai
E eu só posso crer, pois, sem ter você
nestes braços tais.
Não eram tempos fáceis, ninguém disse que seriam. Mas ela tinha de ter esperado mais dele. E ele tinha de deixá-la, como se ela fosse uma criança! Tinha de ter feito a escolha por ela, sem ao menos consultá-la. Imobilizando-a completamente. Então, ele não poderia esperar que algumas palavras e um bilhete idiota pudessem fazer com que ela não o odiasse. Odiasse com tudo o que podia, por se sentir abandonada, ultrajada, submetida.
Odiava que ele a fizesse se sentir preocupada, aflita e tão odiosamente impotente. E qualquer coisa dentro dela ardia pra se vingar. Porque ela sabia. Apesar de tudo, ela sabia plenamente que era a única pessoa que podia ferí-lo de alguma forma. Porque era exatamente assim que se sentia.
Ela sabia nitidamente o que mais o feriria, como nada igual. Era jogo baixo, também sabia. Mas simplesmente não podia evitar. Não podia conter o ímpeto de se comprazer em pensar que o atingiria. Que o feriria tal qual ele fazia com ela agora. Aquele estanha automutilação tinha uma finalidade racional, se procurasse. E o fato de sofrer pela falta que ele fazia, só a impelia a ir mais longe... dele, do compromisso de ambos, e dela mesma.
No fundo, doía desesperadamente pensar em ser de mais alguém depois que finalmente era dele. Doía de um modo completamente irracional. Então, era exatamente por isso que o faria.
Veja bem, amor.
Onde está você?
Somos no papel, mas não no viver.
Viajar sem mim, me deixar assim.
Tive que arranjar alguém pra passar os dias ruins.
A noite parecia tão clara quanto o dia, enquanto as pessoas demonstravam quem realmente eram nos cantos escuros dos pub's. Àquela altura, era fácil perceber que não era exatamente apropriado para uma garota de família estar a solta à noite. Não eram de todo pessoas decentes que em tempos de guerra procuravam mulheres e bebidas e vadiavam noite à dentro. Mas quem podia culpá-los? No fundo, não somos tão altruístas e escrupulosos quanto tentamos transparecer todo o tempo... Sempre há algo de negro e repugnante pulsando fundo, como uma besta enjaulada no subconsciente, esperando a hora em que o cadeado gasto finalmente se romperá.
Se você acredita que talvez amanhã seja seu ultimo dia, o que o impediria de procurar diversão à noite? Então, nesses tempo, a noite era o lugar dos desesperados. De outro modo, você nunca deve confiar em ninguém, mesmo que o conheça numa igreja à claro dia. Porque mesmo quem você mais ama pode lhe virar as costas, lhe machucar mais profundamente do que marcas superficiais poderiam mostrar.
Gina Weasley acreditava que não tinha muito o que perder, enquanto caminhava friamente entre mesas, os olhos pesadamente maquiados de negro analisando calculadamente os rostos a sua volta. Ignorava os chamados e contatos asquerosos que faziam, segurando seu pulso em convites um pouco mais ousados. Era incrível o efeito que tinha uma garota de apenas 16 anos. Ou talvez fosse exatamente essa a explicação. Mas ela tampouco se sentia jovem. Perdia a noção de preservação quando sentia-se tão completamente devastada. Absolutamente ninguém ali poderia machucá-la. Não mais do que já estava.
Aquela noite, ela seduziria um estranho qualquer. De alguma forma, o medo que tão bem escondia, o frio incômodo que empurrava firmemente para o fundo do estômago, a tensão, a adrenalina circulando insanamente em suas veias... tudo isso fazia com que se sentisse de alguma forma viva.
Enquanto isso, navegando vou sem paz.
Sem ter um porto, quase morto, sem um cais.
E eu nunca vou te esquecer amor,
Mas a solidão deixa o coração neste leva e traz.
Sem pensar muito mais, sentou-se ao balcão e solicitou a bebida mais forte que tinham naquele bar medíocre. O garçom a olhava intrigado, era jovem e lhe pareceu curiosamente uma boa possibilidade. Os cabelos negros e desgrenhados não lhe deixaram muitas dúvidas, embora os olhos... Ah, os olhos eram ordinários, negros e sagazes, como olhos de gato de rua maltratado.
Ele serviu um líquido levemente fumegante em um pequeno copo. Ela o olhou com ar de riso, debochando da quantidade antes de virá-lo garganta abaixo. Com a cabeça dando leves voltas, mirou firme o rapaz a frente, devolvendo o copo ao balcão sugestivamente. Ele já estava com a garrafa à mão.
Não soube exatamente por quantas vezes esse ritual se repetiu. Só sabia que agora ele a havia deixado com uma nova garrafa, enquanto atendia outras pessoas que o solicitavam. Mas vez por outra retornava, para perguntar se ela estava bem e se estava precisando de algo. Sempre muito solícito, e ela se perguntou se aquilo tudo era apenas bom profissionalismo.
Não percebeu enquanto as mesas a suas costas iam se esvaziando, em sua cabeça havia sempre um zunido incômodo, uma confusão sem precedentes, pra que ela pudesse notar o barulho externo.
Ele voltou pela ultima vez, e perguntou novamente do que ela precisava. No fim das contas, ela não lembrava exatamente como tinha ido parar ali, nem o resto dos passos que havia planejado. Mas reparou novamente nos cabelos do rapaz, e sem poder se conter, segurou a frente de suas vestes, como se fosse socá-lo. Aproximou bem o rosto do dele, observando divertida sua surpresa, e disse, calculadamente provocante:
“Você. Eu preciso de você.”
Então soltou as vestes do rapaz, que mantiveram ainda o formato do seu punho invisível, enquanto as pupilas dele dilatavam diante da proposta. Ela cruzou as pernas levianamente, apanhando o copo para esvaziá-lo pela ultima vez, medindo a reação do rapaz.
“Venho em um instante.”
Ele disse apressado, depois de engolir em seco. E saiu pelo bar, agora praticamente vazio, expulsando os derradeiros fregueses.
Ela quase riu, suplantando o igual impulso de gritar, forçando o nó que havia subido à garganta. Agora não tinha mais volta.
“Senhorita...” ele começou cautelosamente, ao se reaproximar, escolhendo minuciosamente as palavras. “Devo admitir que sua proposta é realmente tentadora. Mas receio que esteja em lugar e estado inapropriados para que eu possa aceitar. Vi isso desde que chegou aqui...” disse abaixando os olhos para ficar ao nível dos dela, fazendo-a finalmente se sentir com 16 anos. “Por favor, não me interprete mal...” ele acrescentou pressuroso, desconfortável ao reparar na crescente umidade nos olhos castanhos dela. “Tudo o que mais gostaria era de aceitar, mas não acho que a senhorita deva...”
“Não diga o que devo ou não fazer!” ela explodiu, interrompendo-o, se levantando, “EU sei exatamente o que quero e o que posso!”
E saiu tropeçando nos saltos, após largar alguns galeões sobre o balcão, com o máximo de dignidade que conseguiu reunir. Um assomo de sensações condensava-se em grossas e negras lágrimas. Ela decidiu-se pelo ódio, enquanto se apressava pelas ruas escuras, em direção À Toca. ELE! Ele a rejeitava mesmo longe! E ela, mesmo longe, estaria sempre e sempre submetida à ele.
“Não encoste em mim!” Ela gritava quando algum imbecil bêbado ainda na rua tentava se aproximar. Ela realmente seria capaz de uma azaração imperdoável.
O que diria, afinal, se o rapaz no bar tivesse respondido de outro modo? Não sentiu qualquer atração em seus olhos vulgares e cobiçosos. Sentia-se completamente vazia, enquanto vencia pouco a pouco a distância que ainda tinha pela frente. Sentia, mais do que nunca, falta dos braços, e do peito, e do cheiro, e de tudo o que ele representava. E confundia-se entre querer machuca-lo fisicamente e beijá-lo e se entregar, se fundir... E ser de novo completa.
Sabia. Estaria de volta ao seu quarto. Em uma cama artificialmente quente. Com olhos apertados e molhados. Em companhia de toda a falta que ele fazia.
Veja bem além destes fatos vis.
Saiba, traições são bem mais sutis.
Se eu te troquei não foi por maldade
Amor, veja bem, arranjei alguém
chamado "Saudade'.
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