Capítulo VIII
Kimberly corria pelo corredor com um volume obscecnamente grande debaixo do braço, tornando a sua corrida numa tentativa cômica de chegar rapidamente ao refeitório. Parando no meio da entrada passou os olhos pelo mar de estudantes que raspavam loiça, titlintando um som arrastado pelo sono.
-Lucy! Achei uma coisa nova – acenou ao avistar a amiga.
-Hum? – Lucy começou por se levantar mas com o gesto da outra deixou-se cair no banco com peso.
-Aqui – largou o livro que estremeceu a mesa em seus pés, bolinhos e torradas em seus pratos e líquidos em seus copos, arrancando dos colegas resmungos algo submissos, – na sessão de Abjuração, claro, encontrei isto. – Se debruçou com Lucy por um par de páginas soltas e clandestinas escritas à mão em letra deitada e angulosa, uma delas completamente preenchida por um conjunto de símbolos concêntricos e compexos – agora, isso é bom e mau. É bom, obviamente, por sabermos que feitiço é, mas é mau porque, bem pra ser sincera nem sei se esse feitiço é possível porque eu acho que é de duas escolas de magia que se excluem mutuamente, Abjuração e Evocação, se bem que isto pode até ter outros efeitos e se tratar de uma coisa de Conjuração e simplesmente estar no lugar errado...
-Kim, Kim, Kim – Lucy interrompeu. – Não. Eu já tô no lucro que sei que Adivinhação é sobre adivinhar coisas, não consigo decorar o que cada escola tem.
Kimberly respirou fundo e manteve o ritmo apressado com que debitava definições e comentários.
-Abjuração é magia defensiva, Evocação é magia ofensiva, Conjuração é a arte de invocar seres ou coisas.
-Então como você não sabe de que escola aquele feitiço é...?
-Bom o feitiço me pareceu claramente ser abjurativo, pensei nisso no próprio dia em que estivémos lá porque a porta se protegia dos nossos feitiços e não parecia trancada nem emperrada. Eu não me lembro de nada ofensivo, mas a verdade é que não conseguimos abrir a porta portanto talvez aquilo que vimos seja apenas parte dos efeitos do feitiço.
-Que confusão. E esse negócio das escolas se excluírem?
-Pois é, nem sei se uma coisa desse gênero seria possível, isso aqui se parece muito com aquele livro de poções que a sua mãe contou ter sido achado pelo Harry, você sabe, uma extrapolação das regras por alguém que as entende tão bem que percebeu como as coisas funcionam, e achou o jeito de as usar como quiser, no caso para fazer feitiços. Ou como a Mandy diria, descobrir feitiços.
-O que a Mandy tem a ver com isso?
-Eu e ela entendemos muito bem essas regras, não a ponto de ter inventado algum feitiço mas o suficiente para entender do assunto.
-Ok não é tão importante. O que interessa é porque você acha que esse é o feitiço usado lá em cima se ele parece tão complicado e improvável.
-Por causa disso – apontou para o símbolo redondo que preenchia uma página sozinho. – Eu já vi esse negócio aqui, em Hogwarts. Este ano. Não vi de perto o suficiente pra poder confirmar mas é como se fosse óbvio – e pelo olhar em espectativa de Lucy, completou – há umas semanas eu o vi na parede, de longe, e quando cheguei perto tinha sumido.
-Bom se a Mandy também entende desse tipo de feitiços inventados ela deve ter uma opinião sobre isso.
-Sim, quando ela acordar... – Kimberly comentou, relaxando o discurso e as costas, sendo interrompida por uma coruja que largava uma carta no espaço entre as duas meninas.
-Ué, está endereçado à Mandy, porque a coruja nos deu a nós?
-Não sei mas acontece às vezes quando ela não tá aqui e eu sim. Oh não...
-Oh meu Merlim, é um gritador. E sem remetente... coisa boa não deve ser. Vamos ouvir num lugar mais calmo...
Nem teve tempo de se pôr de pé, a carta já se abrira em forma de boca de mulher mas o som que fez alunos e professores levarem as mãos aos ouvidos era a agonia de um porco sendo chacinado lentamente. Lucy, com medo de sequer tocar no pedaço de papel que berrava a escassos centímetros de seu nariz, corava violentamente ao ter aquela quantidade de olhares raivosos em cima de si. Decidiu deixar as mãos suarem para se concentrar em dissipar a vermelhidão, mirando Kimberly de soslaio e observando como ela lançava olhares chateados a quem lhes gritava. Mal a rouquidão do porco se tornou suficiente para o chinfrim acabar, Lucy agarrou Kimberly pelo braço para sair daqule lugar o mais rapidamnte possível. Mas a carta era insistente. E em vez de se destruir com violência começou a se dobrar de forma tosca, acabando por formar um grosseiro origami que se assemelhava a uma colcheia ou a uma rosa (não era fácil distinguir), caindo com graciosidade.
-Manter distância da correspondência da Mandy – Kimberly resmugou quando se sentiu longe o suficiente.
-Ótima idéia – Lucy igualou o resmungo. – Se ela nãe estivesse como está eu...
-Lucy você tem sempre uma desculpa. Você é só garganta.
-Não sou nada!
-Todo mundo sabe que você é a maior santinha. Você nunca faria nada.
-Ah é? Então vou mostrar a você. Assim que vir o Knight pela frente vocês vão ver o quão santinha eu sou – reclamou, abrindo a porta da enfermaria.
Madison se encontrava no mesmo estado perturbador desde poucas horas após ter embatido contra a parede: de olhos fechados com força e irreativa ao toque, tremendo incessante e incontrolavelmente.
-Acho que é dessa, meninas – madame Pomfrey se aproximou da cama com um livro na mão, e antes de recitar um encantamento pediu que torcessem por Madison – se isto não funcionar não sei o que fazer.
Mas o feitiço pareceu dar bons resultados pois em pouco tempo os espasmos pararam e as pálpebras relaxaram. Contudo, foi tudo o que conseguiu.
-Bom, já é um começo – Kimberly se aproximou, ainda com preocupação nos olhos.
-Sim, finalmente consegui alguma coisa. E pra isto ter funcionado é porque... bem, vocês deviam ficar com ela por um bocado, é capaz de dar continuidade ao feitiço.
E permitiram que a enfermeira se retirasse sem mais questões, por medo do que ela pudesse dizer.
Se sentaram na beirada da cama, uma de cada lado. Após breves instantes de contemplação da amiga, Kimberly abriu novamente o livro no colo para reler o feitiço. Lucy, por sua vez, manteve os olhos em Mandy mas não deixou que a mente se ficasse por ali. Voltar à enfermaria a lembrava da última vez que ali estivera, por causa de Daniel. E o transtorno sentido pela colega logo se transferiu para o amigo que desde o incidente não dera sinais de vida. Talvez a estivesse evitando, com medo de a ver pela frente depois de a ter presenteado com detenção não merecida, e se fosse o caso, pensou, fazia ele muito bem em fugir pois ela não o desculpara ainda. Na verdade ela nem sabia porque insistia em descupar, ele sempre acabava por encrencá-la novamente, mais cedo ou mais tarde... porque ela ainda se dava com aqule menino que só trazia problemas era para além da sua compreenção. Mas não era segredo nenhum. Gostava da companhia dele, o suficiente para deixar passar os incidentes com uma esperança sincera de que eventualmente crescesse juízo naquela cabeça dura. E foi visualizando a cabeça do rapaz que se deu conta do movimento nos olhos da enferma.
-Mandy? – Colocou a mão sobre o braço dormente de Madison, chamando a atenção da outra.
-Não a pressionem – madame Pomfrey ecoou por detrás de uma cortina. – Ela tem que descansar.
Mas Mandy parecia interessada em grunhir.
-Devagar, Mandy – Kimberly aconselhou num tom de voz baixo.
-Que f... ‘quilo...? – Conseguiu pronunciar.
-Nós esperávamos que você soubesse dizer – Lucy começou, continuando ao ver a amiga se esforçar para contrair a boca em jeito de quem procura fôlego, – mas não tem pressa, vai com calma.
-Hm... e aí...?
-Bom a Lucy aqui acha que não fui justa quando disse que ela era santinha.
Mandy pareceu se engasgar com a própria saliva, constrangindo Lucy.
-Eu não sou assim tão certinha! – Se indignou, logo se desculpando aos olhos de Mandy que se contraíam de dor com o tom alto que Lucy usara.
-Quan... temp...?
-Hoje é quarta – disse Kimberly.
-Porqu... porque a s’ varin... hm funcionh?
-Você estava lúcida o tempo todo? – Kimberly achou estranho, recebendo em resposta um aceno que não dizia nem que sim nem que não.
-V’rinha...
Lucy inspirou fundo, não podendo evitar a lembrança de testar já desfeita em lágrimas a última varinha de Olivaras.
-Eu e a minha varinha não nos entendemos totalmente... e mesmo assim foi a que menos se importou de ficar comigo em toda a loja. Nem o senhor Olivaras soube que varinha funcionaria melhor para mim, teve que chamar um especialista de Itália; todo mundo já treinando feitiços e eu sem varinha... eventualmente o especialista chegou, viu como as varinhas costumavam responder aos meus pedidos, usou alguns encantamentos, até mediu o meu braço, eu não sabia se ficava mais envergonhada ou triste, eu sentia que me tratavam como se tivesse uma doença terrível – contraiu os lábios escondendo a réstia de mágoa. – Lá descobriu o homem que nenhuma varinha de madeira serviria pra mim. Varinha só de núcleo mágico não seria suficiente, o homem me disse, a única varinha que me responderia como minha seria a feita de osso de braço de feiticeiro.
-Grum...?
-Feiticeiro, ao contrário do bruxo, não precisa de varinha nem de estudar para conseguir saber e lançar feitiços-
-Ela sabe o que é um feiticeiro, Lucy.
-Ah, desculpa, é que a maior parte das pessoas não sabe.
-Hm, não... eu ia era... porquê que voc... todo mundo pode usar braço de feiticeiro...
-Sim mas por mais poderoso que tenha sido o feiticeiro, a varinha só cataliza o poder do bruxo que a usa. Resumindo e descomplicando, a Lucy conseguiria se manifestar com a magia de outra pessoa por conseguir se ligar à alma de qualquer um.
A muito custo Mandy esboçou um sorriso, e de tão fraca que estava que as gargalhadas pareceram uma tosse sem força.
-O que foi? – Lucy contraiu a testa.
-Iss... é um atestado de santa... – disse Mandy sem parar de rir.
-Oh! Não é nada! – Lucy endireitou as costas e colocou as mãos na cintura.
-É sim... – Mandy insistiu entredentes.
Lucy bateu ao de leve com a varinha na testa de Madison em protesto, causando nessa última uma reação assustada, abrindo os olhos e agarrando o braço que empunhava a varinha com brusquidão. As duas se entreolharam constrangidas até Mandy, se desculpando, largar Lucy que contorcia o rosto.
Ao pedir desculpas ela própria, Lucy reparou em Snape, que ainda se aproximava das meninas com uma expressão absorta, como se aquela cena o lembrasse de alguma coisa.
-Professor? – Kimberly chamou.
-Hum? Oh, Malfoy?
-Hum...
-Soube que acordara. Lembra-se de alguma coisa?
-Tudo.
-Controlo mental?
-Mais... intrínseco, simbiótico...
Na boca de Snape se desenhou um trejeito de desagrado.
-Foi usado legilimens, ou algo parecido?
-Mais ou menos... eu explico depois.
-Claro, claro. A pergunta que interessa pode ser respondida com um sim ou um não. Sabe quem era?
-Não.
-Mas pode ter sido...?
-Provavelmente.
Snape suspirou. Lucy e Kimberly se entreolharam sem entender nada.
-Dado o seu estado, convenci a Granger a não incluí-la na detenção.
-Hum...?
Um estalido seco ecoou, vindo da porta.
Daniel saiu apressado, se sentindo idiota por ter ponderado pedir desculpas a uma metida de arranjinho com Snape. Dava passos calmos e largos em direção à cabana do velho professor Hagrid, constantemente tirando o cabelo dos olhos. Estranhou não ter pensado no assunto há mais tempo, ao se lidar com sonserinos todo cuidado era pouco afinal. Achando melhor recolher mais informação antes de algum confronto ou mudança de atitude chegou cansado e atrasado à aula, oportunamente tida em conjunto com seus colegas sonserinos.
-Foi... satisfatório expulsar Vanglor. Se eu pudesse já teria expulsado muito mais gente. Escória, como aquele maldito Potter júnior. Eu tentei expulsá-lo junto com a corja que andava grudada com ele mas claro, a Grifinória sempre teve uma forte tendência a ter diretores... moles. – Completou com uma careta enojada.
Em comum ocasião Lucy se encolheria e ficaria quieta, esperando passivamente que os arrepios que o fantasma causava passassem sozinhos ou fossem com ele aquando da sua retirada. Mas não se tratava de uma ocasião qualquer; tratava-se de uma oportunidade.
-O professor não devia falar assim – Lucy falou num tom baixo mas firme.
-Não se trata daquilo que alguém diz ou deixa de dizer. Tivesse sido qualquer outro aluno e a McGonagal teria pelo menos pensado em suspensão. Mas não, pobrezinho do Potter não fez de propósito, não tinha culpa – Snape escarneeou, em seguida desacelerando em tom irritado, – se o rapaz não era capaz de acatar com regras simples como poderia alguma vez fazer frente ao senhor das trevas? – E tornou a acelerar o discurso num crescendo encolerado –como um menino tão impetuoso, irresponsável e ignorante iria sobreviver ao que lhe era esperado? Devíamos ter jogado o guri na rua aquele mesmo ano, ou ele se virava, ou...
-Não fale assim de Harry Potter! – Lucy interrompeu de punhos cerrados escondidos atrás das costas, para não ter que se preocupar com quem reparasse na quantidade de suor que brotava em suas palmas.
Snape fitou Lucy por alguns instantes com uma expressão assimétrica, enfim rolando os olhos e fechando a boca em áscuo.
-Uf... mas que mania é essa de defender incompetentes só porque viram pai de alguém? – Snape começou a se virar para ir embora – deviam ser impedidos de ter prole, esse tipo de gente...
-Pai? – Lucy perguntou a medo.
Snape a olhou por cima do ombro, indeciso se se admirava ou tinha pena.
-Não achei que tivesse escolhido o sobrenome por moda ou para cair nas boas graças de quem resolvesse extorquir alguma coisa, mas... parece que não existem limites nessas famílias... – e saiu antes que mais pudesse ser dito.
Limpou as mãos às calças mas por hábito, pois já tinham começado a secar algum tempo antes. Estava vermelha e tinha os olhos úmidos, e o turbilhão de pensamentos intraduzíveis para frases lógicas e mesmo estruturadas faziam corridas em seu cérebro. Ainda não sabia o que fazer com o fato de não saber, não conseguia se decidir se acreditava e resolvia a questão para si, colocando a mãe numa situação estranha pois implicava que tivesse mentido, ou desacreditava e lidava com a questão de, a nível prático, não ter pai. A segunda opção era-lhe irracionalmente inaceitável; grande parte dela queria acreditar. Era, portanto, difícil reagir em situações deste gênero, situações que implicassem defender um ponto de vista ou o outro.
-Viram? Uma santinha teria falado assim com o Snape? – E vendo que transferindo o que sentia em raiva dava resultados satisfatórios, prosseguiu.
-Gabriella – cumprimentou a menina por trás, baixo o suficiente para o professor não ouvir.
-Ah oi Daniel. A Lianora não tá aqui. – Gabriella se voltou para trás com um sorriso educado.
-Não faz mal, não queria falar com ela especificamente. Só queria saber... se você sabe... eu tive a impressão de que a Mandy está nas boas graças do Snape...
-Sim, e bom pra ela não é? E pra nós, ela nos ajuda quando precisamos de alguma coisa com ele.
-Meninos! – Hagrid se aproximou dando um pescotapa em Daniel. Ou pelo menos teria sido um simples pescotapa, não fosse a mão de Hagrid quase tão ou mais pesada que a cabeça do rapaz e capaz de deixá-lo sem equilíbrio.
-Ai, professor, tenha calma – Daniel pediu ao homem de cabelos grisalhos que o ajudava a se recompor sem empenho, não tão envergonhado como estaria em igual situação década e meia atrás.
-Sim, ter calma é a primeira coisa a se fazer quando se encontra um glashtin. Qual é a segunda, meninos? – Hagrid tornou a endireitar seus quase três metros, lançando um olhar comprido à turma que evitava contato visual.
– Minha mãe me disse que os mortos só vão ou ficam se quiserem mas não consigo imaginar o que xongas esse homem pode ter aqui que o prende tanto.
-Luc... – Mandy começou ainda de olhos fechados mas sorriso nos lábios – ele agora pode assustar criancinhas em suas camas... consegue imaginar um estado mais idílico para aquele homem?
Kimberly riu e até Lucy soltou uma risadinha, limpando o rosto.
-Lucy...? – Kimberly chamou em tom tenro.
-O que eu não dava pra ter uma Hermione aqui... – Hagrid resmungou. – Ela já teria não só dito o procedimento todo como onde eles costumam aparecer, quais costumam ser os principais alvos, o nome mais comum pelo qual são conhecidos e se estivesse inspirada até diria cada nome dado em cada lugar, incluindo como o nome que os trouxas deram a eles.
-Hum, não é nada – Lucy abanou a mão, e já não estando corada foi mais fácil fazer acreditar que fora um cisco. – Mesmo assim, não acho que seja suficiente...
-Bom... ele é um homem ressentido c’a vida, amargurado... morf... psico’ogicamen’ é claro que teve um desgosto afetivo... não deve ter deixado ninguém para trás... talvez tenha ficado por vício de d’scarregar as frustrações n’s outros... – Mandy opinou.
-Morfo quê? – Lucy esperou que Madison parasse para perguntar.
-Aquela ruga enorme que ele tem de cada lado da boca, que vem do nariz... – Mandy passou o dedo pelo rosto demonstrando.
-É uma criatura conhecida pelos trouxas? – Daniel demonstrou interesse, tentado salvar o filme que ainda não fora queimado.
-Os celtas eram mais sensíveis a criaturas mágicas que os trouxas de hoje em dia – Hagrid explicou, tentando contagiar o interesse sem resultados; – tanto que alguns deles devem ter visto bruxos lidando com um e falando sobre isso. No mundo bruxo são kalpies, os surdos deram-lhe o nome de kelpie.
-Mandy sem opinião não é Mandy... – Kimberly sorriu à amiga que, mesmo sem ver, sorriu de volta.
-Ah é. Mandy, a Kim achou um feitiço que pode ter sido o usado lá em cima mas não tem certeza porque é complicado e nem todos os efeitos-
-Se a Kim não tem certeza é porque não é simples – Mandy deixou cair a mão na cintura de Lucy para que parasse de falar por não ter força na voz o suficiente para interromper. – Não me obriguem a pensar, tô muito cansada...
-Credo ao menos abram os livros! – Hagrid se exaltou abrindo os braços e fazendo os alunos mais próximos pularem, seguidamente desistindo de esperar cooperação e foleando o livro com violência em busca da página que interessava.
-O Daniel já acabou na enfermaria esse ano, e agora você. Vamos ver qual de nós as duas será a próxima – Kimberly disse com um meio sorriso.
-Eu me abstenho de comentar pra não azarar ninugém... – disse Mandy de olhos cerrados e um sorriso satisfeito.
-Sim sim – Lucy arqueou as sobrancelhas e fez um carinho no braço de Mandy, genuinamente preocupada, – acho que você faz bem.
-Página 364 – o professor cuspiu, continuando num tom mais calmo. – Alguém quer... – mas apenas grunhiu mais um pouco, fechando o livro com um misto de tristeza e tédio – bom vejam aí mais ou menos como eles se parecem. Sim, porque aí ele parece um cavalo molhado mas acreditem, uma criatura dessas, ao vivo, é a coisa mais deslumbrante que alguma vez verão.
-Que dobra você disse que era mesmo...? – Lucy perguntou.
-Nasolabial...
-Credo as coisas que você sabe – Lucy comentou.
-Como eu disse, o Sherlock de Hogwarts sou eu.
-Ah então é assim que se pronuncia? – Lucy inclinou a cabeça – achei que quisesse dizer fechadura fêmea na mensagem – explicou, fazendo a amiga tossir na sua tentativa de riso.
-Porquê o súbito interesse na Mandy? – Gabriella sussurrou.
-Não é súbito – Daniel se inclinou para a frente, encostando o queixo no ombro da menina; – mas que eu saiba o Snape não é pessoa de livrar as pessoas de detenções, antes pelo contrário.
-Que detenção? – Gabriella se voltou para encarar o rapaz.
-A que estou prestes a dar a vocês dois! – Hagrid gritou com os meninos, ganhando a atenção dos dois assustados – não entendem que estas são criaturas perigosíssimas? Eu estou me estendendo para além do programa para vocês estarem bem preparados caso se percam numa floresta algum dia.
-Sim porque se perder numa floresta é a coisa mais normal de-
-Detenção para todo o sexto ano da Sonserina! – Hagrid interrompeu uma garota loira cujo ar de deboche rapidamente passou a descrença – esta noite virá comigo à Floresta Proibida. Eu tinha combinado com um metamorfo para ele mostrar para vocês como se parece um glashtin porque essa imagem é quase irreconhecível, mas isso era só se vocês se comportassem. O metamorfo virá de qualquer jeito connosco para a floresta mas sem vocês saberem no que ele se vai transformar – e pelo que a multidão de preto e verde o fitava estática e irreativa, acrescentou num tom mais alto e irritado. – E menos dez pontos se ninguém reconhecer o glashtin e menos cinquenta pontos se alguém morrer!
-Não, não... Sherlock é um nome – Madison explicou, divertida.
-Não conhecia.
-É natural, é de um trouxa.
O sangue de tanto sonserinos como lufa-lufas desapareceu dos rostos aquecendo e alimentando as pernas para que pudessem correr mais depressa.
-Professor desculpe, mas não estará sendo duro demais...? – Uma lufa-lufa tentou proteger os colegas com um fio de voz.
-Duro demais? Eu devia fazer isso a todos os alunos! Todos deviam saber como é encarar um bicho desses! Deviam saber o que fazer e... e...
-Mas professor, não pode esperar que consigamos escapar a um animal que diz ser tão terrível logo da primeira vez – a mesma aluna continuou.
-O metamorfo não vai devorar nenhum de vocês! – Hagrid olhou para a garota como se tivesse dito a maior barbaridade.
-Mesmo assim não entendo o que tem esse tal de Sherlock – Lucy baixou os olhos, pousando-os em Mandy.
-Era um investigador que conseguia resolver mistérios que nem a polícia conseguia – Mandy explicou.
-Mas mesmo assim, a floresta tem outros perigos... – a aluna insistiu.
-Se não quer que seus colegas vão por ter inveja não seja por isso! Detenção igual ao sexto ano da Lufa-Lufa!
-Alguém devia ficar quieta... – Daniel resmungou no ouvido da colega.
-Dispensados! Antes que a detenção fique pior! – O professor parecia estar prestes a espancar alguém, deixando os alunos sozinhos no meio do gramado como se estivesse se contendo para não o fazer.
-Uau. – Lucy arqueeou os olhos – deve ter sido um investigador e tanto.
-Eh, não, ele – Kimberly começou, sendo interrompida pela amiga que ria.
-Sim, um investigador e tanto realmente. O melhor que alguma vez existiu.
-Boba – Kimberly deu um empurrãozinho em Mandy.
-Afinal, era ou não era? – Lucy recorreu a Kim com os olhos.
-Alguém tem que pelo menos avisar a Diretora do que vai acontecer – Daniel falou, se concentrando para não reagir imediatamente ao que acontecera; e ao que estava para acontecer. – Eu vou tentar descobrir o que deu no homem.
-Era, era – Kimberly concedeu sob o olhar de Mandy, as duas se contendo para não rir mais.
-Acho que vocês tão inventando.
-Não estamos nada. Aliás, devíamos mudar de Exército de Dumbledore para Sherlock – Mandy inclinou o rosto.
-Professor – Daniel chamou, obtendo resposta à segunda tentativa apenas – Hagrid! – O professor olhou para trás sem interromper o passo, desacelerando-o apenas o suficiente para o rapaz poder pousar a mão em seu braço e acompanhar sem ter que correr – professor, está tudo bem com o senhor? – procurou os olhos do homem que se perdiam na altura e na barba.
-Hum. Parece um nome-código. Como “operação Sherlock” – Lucy gostou.
Hagrid ainda manteve o passo alguns metros até chegar perto de sua casa, parando bruscamente com o olhar perdido no horizonte. Daniel pensou no que dizer mas antes de ter oportunidade o enorme homem começou a soluçar, contraindo os olhos.
-Professor, o que foi? – Daniel se aproximou.
-Canino II... – o homem disse entre soluços – morreu...
-Foi um glashtin? – Daniel perguntou baixo, recebendo em resposta um aceno veemente – porque o senhor não vai até Hogsmeade para relaxar? Talvez pedir à Diretora que o dê alguns dias...
-Não, não! Não posso deixar a Hermione mal. – Hagrid abanou a cabeça e limpou os olhos – eu vou a Hogsmeade, vou... provavelmente vou voltar tarde... esqueçam a detenção...
-Ei... cadê o mané do Danny...? – Mandy perguntou.
-Aquele infeliz inútil que só faz porcaria? Não sei e não quero saber!
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!