Tártaro
Draco acordou com o cheiro de tomates fritos.
Sentou-se no colchão ao ver Hermione se aproximar com um pequeno prato plástico. Estava certo: tomates fritos. Tomates, ovos e salsichas.
- Como...? – perguntou, ainda meio sonolento.
- Já tive que fugir durante a guerra, lembra? – a garota explicou, sentando-se ao seu lado – Sei muito bem o que é ter pouca coisa para comer. Como você e os licans são os únicos que comem, decidi que não seria má idéia trazer um estoque de comida.
- Mochila? – o loiro perguntou, comendo, faminto.
- Uhum. – ela assentiu, pacientemente – Miniatura. Dá pra cerca de um mês.
Draco comeu por uns instantes, sem nada dizer. Hermione continuou ao seu lado, observando-o.
- Você dorme. – ele disse, engolindo uma salsicha quase inteira – Come?
Hermione negou com a cabeça, sorrindo baixinho.
- Posso comer comida, claro. – disse, dando de ombros – Mas é inútil pra mim. Bebo sangue. – explicou, vendo-o arregalar os olhos – Mas já tomei meu café, pode ficar tranqüilo.
Draco conteve o ímpeto de checar seu pescoço, para ver se haviam dois furos ou algo parecido.
- Como? – quis saber, sendo precavido.
- Bolsas de sangue. – a morena disse, indicando a mochila de Dean – Tem o suficiente para nós dois por um mês também.
- E se ficarmos aqui mais de um mês? – o loiro perguntou, sem se conter.
- Bom... – a morena riu – Teremos que torcer para que haja animais na terra dos mortos.
Um arrepio percorreu a espinha de Draco de cima a baixo.
O loiro terminou sua refeição em poucos minutos. Hermione nada disse. Sabendo que ela estava esperando que ele perguntasse, e ele mesmo se matando de vontade de perguntar, Draco repetiu a pergunta que fizera à grifinória na noite anterior.
- Como você se tornou um vampiro?
Hermione respirou fundo e recostou-se na parede atrás de si.
- Foi no finzinho da grande guerra. Quando o Ministério já havia se recuperado e estava caçando os últimos seguidores que restavam do Lorde das Trevas. – disse, pausadamente, olhando para cima, para o alto do abismo – Restavam poucos seguidores e eu e Harry estávamos ajudando os aurores na caçada.
Uma pausa para respirar.
- Numa noite, fomos pegos por um grupo de vampiros. O líder se chamava Alec. – disse, engolindo em seco – Ele era o irmão mais novo do Dean.
Draco olhou imediatamente para o vampiro. Sabendo que ele podia lhe ouvir, Hermione sorriu para o amigo. Dean retribuiu o sorriso e voltou a arrumar as coisas dentro das mochilas, enquanto Zach fazia o mesmo e Sarah terminava de tomar o seu café.
- Ele...?
- Não. – a morena disse, sabendo o que o loiro queria saber – Dean nunca simpatizou com o lado das trevas. Acho que esse foi um dos motivos por ele ter me adotado.
- ‘Adotado’? – Draco repetiu, sem entender.
- Depois, você entenderá. – Hermione garantiu – Bom... Depois que fomos pegos, fomos torturados e tudo o mais até que Remo, Minerva e o Arthur Weasley conseguissem chegar para nos resgatar.
- Houve essa batalha dentro da casa, eu não consigo me lembrar direito, pois eu havia acabado de ser torturada. – a morena franziu o cenho, e Draco entendeu que ela deveria ter feito isso dezenas de vezes, tentando se lembrar pelo que passara – Quando eu vi, realmente vi, dois dos vampiros já estavam secos... mortos no chão. Um outro lutava contra o senhor Weasley... Eu não tinha visto o Harry...
- Foi quando Alec me puxou e me arrastou para uma floresta que havia do lado de fora. – novamente, ela franziu o cenho – Chegamos numa clareira e Harry estava lá. Foi então que eu reconheci a Gina. Eu não sabia que ela estava lá. – Hermione disse, e Draco acreditou nela. Suas palavras eram sinceras demais para que alguém duvidasse...
- Fui jogada de encontro a uma árvore, quebrei uma costela com o baque. – informou – Alec, então, se dirigiu a Harry e perguntou se ele já havia feito a sua escolha. Eu não entendi direito, estava com muita dor e minha nuca sangrava.
Uma nova pausa. Draco sentiu o corpo da morena enrijecer.
- Lembro de ele assentir com a cabeça. Em seguida, olhou para mim...
O queixo de Draco caiu alguns centímetros e ele sentiu uma revolta crescer em seu interior. Então fora ele. Harry Potter definitivamente fora o culpado pela transformação de Hermione Granger em um vampiro.
- Alec voou até mim, ergueu-me do chão e me imprensou contra a árvore em que eu havia batido. Senti por um segundo os dentes dele em meu pescoço. Em seguida, uma dor excruciante tomou conta do meu corpo. – a morena se encolheu, instintivamente – Era como se eu estivesse pegando fogo... Minha cabeça latejava... Eu não conseguia ver nada, só gritava...
- “Acordei”... – Hermione fez as aspas com os dedos - ... três dias depois. De início, fiquei surpresa. Não tinha mais cortes, hematomas, machucados... Eu estava perfeitamente... bem! – riu, baixinho – Me disseram que eu estava numa ala restrita do St. Mungus. – riu novamente, de descaso – Burrice. Eu reconheceria a ala hospitalar de Hogwarts mesmo depois de milhares de anos... Mesmo ela estando em ruínas, como estava... Enfim... – deu de ombros, indiferente – A senhora Weasley perguntou como eu estava e eu disse a primeira coisa que veio a minha mente...
- Com fome. – Draco respondeu, no que ela assentiu.
- A senhora Weasley me pede perdão até hoje por ter corrido do jeito que correu. – lembrou-se, com carinho, da mãe de seu melhor amigo – Em seguida, Minerva entrou, junto com Dean. Eles me explicaram o que havia acontecido, no que eu havia me transformado... Sei que é egoísmo meu, mas ainda hoje sinto raiva do Harry pelo que ele fez. Ele tinha que optar entre um de nós três. Eu, ele ou Gina.
- Você teria se sacrificado. – o loiro disse, firme – Você é... altruísta demais! – disse, porém, tendo raiva dela por ela ter acreditado em Harry – Jamais confie nos outros. Você pensou que o babaca do Potter fosse se sacrificar por você. Bem feito! – disse, sem se conter.
Hermione fitou o chão, calada.
- Desculpa. – Draco disse, sem jeito – Mas... Por Merlin, Granger, você é inteligente! – argumentou – Deveria saber que o Potter ama a si mesmo acima de tudo e, depois dele, a ruiva Weasley!
Hermione não conseguiu esconder o sorriso.
- O que você quis dizer com ‘acho que esse foi um dos motivos por ele ter me adotado’? – o loiro perguntou, depois de um tempo.
- Todo vampiro iniciante precisa de um guia. – ela explicou, paciente – Do contrário, viramos assassinos sem nem mesmo querermos. Claro, sempre tem aqueles que se tornam assassinos por quererem, mas, eu não. Bom, já... fiz muita coisa que não me orgulho... – confessou, sem jeito – Especialmente durante a guerra... Mas fico honrada em dizer que nunca matei alguém nesse um ano e meio como vampira.
- Como você se alimenta? – Draco quis saber.
- Há bancos de sangue especializados. – disse, pacientemente – Assim, não temos que roubar hospitais ou matar pessoas.
- Sangue de animais? – Draco perguntou.
Hermione fez uma careta.
- Dá pra viver. – disse, meneando a cabeça de um lado para o outro. Draco pode ver que Dean ria, do outro lado – Mas é simplesmente intragável. Argh!
Dean riu mais alto e Hermione fez uma nova careta.
- Dean foi meu guia. – ela explicou, meio contrariada, meio achando graça – Me levou para morar com ele sem sequer me conhecer direito. Cuidou de mim todos os dias, me ensinou tudo o que eu precisava saber. Me aconselhou, me ouviu... Cuida de mim até hoje... – Hermione suspirou, sorrindo, bobamente – Me transformou na melhor vampira que alguém podia ser...
- E, mesmo assim, ela ainda se recusa a casar comigo... – Dean murmurou, fingindo decepção, piscando marotamente para a jovem.
Draco sorriu, mas superficialmente. Agora, entendia o rancor que Hermione tinha por Harry.
- Vamos partir? – Sarah disse, pondo-se de pé, vestindo sua mochila – Temos muito ainda o que fazer.
- Minha mochila? – Hermione procurou.
- Aqui, amor. – Dean entregou para ela, puxando-a pela cintura, dando-lhe um selinho.
- Obrigada. – Hermione agradeceu da mesma forma.
Draco desviou o olhar, procurando sua mochila no chão. Não soube dizer o porquê de aquela demonstração de carinho ter sido tão incômoda para si...
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Andaram por quase uma hora até atingirem a ponta extrema do túnel entre as rochas. Estava escuro, úmido...
- Por Merlin! – Sarah exclamou, tirando o casaco que usava, em seguida a camisa de mangas – Que calor infernal é esse?!
A jovem abanava-se com uma mão. A camiseta de alças finas que restara estava completamente colada ao seu corpo devido ao suor. Draco e Zach tiveram a mesma atitude, retirando o excesso de roupas, dobrando-as e as colocando dentro da mochila magicamente aumentada.
- Eu to pingando! – Zach exclamou, passando a mão na testa.
- Chegamos. – Hermione disse, parando de frente, suspirando – Bem-vindos ao Tártaro.
Os demais integrantes do grupo saíram do túnel e olharam em frente. Ninguém pronunciou uma palavra sequer. O cenário dizia por si mesmo...
O calor... O calor que eles sentiam vinha dali. À sua frente, um largo rio de fogo corria entre diversas rochas e pedras que formavam as margens. Era um rio extenso e largo, o maior que eles já haviam visto...
As margens eram feitas de areia e cinzas, e delas emanavam vapores quentes, como se o próprio chão estivesse pegando fogo. O cheiro de enxofre era forte. Acima deles, não dava para ver o teto da caverna. Em seu lugar, os gases e os vapores emanados do rio de fogo e das margens encontravam-se, criando nuvens vermelhas, laranjas e amarelas, que se movimentavam constantemente, diversos estalos e explosões ocorrendo em seus interiores...
Após o rio, cerca de vários quilômetros abaixo dele, uma enorme muralha de pedra, de onde não se podia precisar a sua largura exata, pois ela parecia não ter fim... E era alta, imensamente alta...
Por estarem numa posição elevada, Draco, Hermione e os demais podiam avistar o que havia por detrás dos muros: um castelo de pedras. Mas não era um castelo qualquer...
Maior do que qualquer castelo que já haviam visto, maior inclusive que Hogwarts. Com diversas torres e torrinhas, suas paredes eram feitas do que parecia ser mármore branco e pedras. Em alguns pontos, chamas saiam por frestas, dando-lhe uma coloração avermelhada.
Vultos brancos vagavam ao longe, no que parecia ser um enorme pátio. Filas e filas de vultos... Almas amaldiçoadas...
- O que será que tem por trás? – Zach perguntou, apontando na direção em que as almas desapareciam atrás de uma enorme coluna.
- Talvez o lugar onde as almas são castigadas. – Sarah sugeriu, dando de ombros, sem, porém, retirar os olhos da visão do Tártaro.
- Depois do castelo, deve estar o caminho para as Ilhas Afortunadas. – Draco disse, ainda estupefato – Ou os Campos sei-lá-o-quê que vocês disseram...
- Campos Elísios. – Dean assentiu, meio bobo.
- Vamos. – Hermione disse, os ombros baixos – Temos que descer.
- Mais rapel? – Sarah murmurou, meio desgostosa.
- Escadas. – Zach a corrigiu, vendo Hermione se dirigir para a lateral esquerda de onde se encontravam.
Todos fizeram o mesmo. Ao chegar mais perto da borda, viram que o caminho todo era recortado por escadas, diversas e diversas escadas, com milhares de degraus, que desciam em espiral, até tocaram as margens, muito abaixo deles. Próximo ao fim das escadas, havia, a cerca de quinze metros de distância, um pequeno deque de madeira, que flutuava nas águas vermelhas de fogo, sem, todavia, sofrer algum dano sequer.
Uma espécie de cais. Ancorado a uma ponta, flutuava um pequenino barco. Uma espécie de balsa...
- Bom... – Zach disse, sorrindo, mais animado, descendo diversos degraus – Pelo menos, não vimos nenhuma hidra!
- Besta! – Sarah murmurou, sorrindo, cutucando o ombro do amigo.
- Chego primeiro! – o lobisomem falou, correndo rapidamente, pulando vários degraus.
- Não mesmo! – Sarah retrucou, correndo em seguida, alcançando-o facilmente.
Dean olhou para Hermione de soslaio, saindo em disparada assim que ela assentiu com um leve aceno de cabeça.
- Criança! – ela murmurou, mais para si mesma, vendo-o chegar em questão de segundos aos cais, voltar, e refazer o mesmo percurso, somente para implicar com os lobisomens.
- Você é rápida assim? – Draco perguntou, descendo lentamente, observando os três abaixo.
- Uhum. – a morena assentiu – Todos somos. – explicou, pacientemente – Zach e Sarah também. Tão rápidos quanto nós. – um ‘quê’ de incômodo transitou em sua voz – Mas, para isso, precisam estar transformados. Aqui... – disse, estendendo sua mão - ... eles são apenas humanos. Como você.
- Como eu. – o loiro assentiu, meio contrariado.
- Me diz. – Hermione pediu, fitando-o, meio sem jeito – Por que o Harry mandou você vir conosco? Quero dizer... Nós... – e indicou a si, Dean e os dois licantropos - ... Temos habilidades especiais. Força sobre-humana, velocidade sobre-humana... Reflexos milhões de vezes mais ágeis...
Draco fitou os próprios sapatos por alguns minutos enquanto descia as escadarias.
- Não sei. – disse, mirando-a rapidamente.
Hermione ficou quieta por um tempo também, processando a informação.
- Você é um excelente bruxo. – murmurou, baixinho, seus olhos observando tudo menos o loiro – Sabe muitas coisas sobre as artes das trevas. Passou por poucas e boas... Deve ter algo a ver com isso. Ou senão...
- ‘Senão’...? – ele repetiu, quando ela não continuou.
Hermione soltou um longo suspiro e parou. Draco fez o mesmo, ambos ficando a poucos centímetros de distância, pois os degraus não eram muito largos.
- Lembra sobre o que falamos assim que passamos pelo véu? – ela perguntou, tentando ser coerente – De que o Harry quer a pedra da ressurreição, mas não sabemos até onde ele é capaz de ir para consegui-la?
O loiro assentiu com a cabeça.
- Pois é. – a morena disse, fazendo uma leve careta – Acontece que eu tenho uma teoria...
- Que é...? – Draco questionou, sentindo seu estômago se contorcer, mais gotas de suor pingando de sua testa.
A garota o fitou brevemente antes de continuar.
- Eu acho... – disse, respirando fundo - ... que o Potter seria capaz de... de pegar a pedra de nós, quando voltarmos, e nos matar sem, necessariamente, ter que nos lançar algum feitiço.
Draco arregalou os olhos, mas estava ainda confuso.
- Pensa! – Hermione continuou – Ele nos manda para cá, onde, teoricamente, todos acreditam que quem cruza o véu está morto. Assim sendo, ninguém se atreveria a vir checar se estamos ou não realmente mortos. Nossa missão, essa missão... – ela disse, abrindo os braços ao seu redor – Ninguém sabe que estamos aqui, a não ser ele. Você deve ter feito um voto perpétuo, assim como ele nos obrigou a fazer. – o loiro assentiu – Depois, ele nos dá aquela bobagem de poção antes de atravessarmos o portal... Pra mim, ele estava se certificando de que você, Zach e Sarah, jamais conseguissem voltar. – Hermione disse, por fim.
Draco pensou e pensou. “Filho da puta!”, praguejou mentalmente.
- Vocês?! – disse, sua voz saindo ríspida sem ele querer.
Hermione meneou a cabeça para o lado, dando de ombros.
- Eu e Dean já estamos... bem... mortos! – explicou, fazendo uma careta – Acho que ele acredita que este fato vá permitir que nós voltemos e, conosco, a pedra. – disse, pacientemente – Mas tenho certeza de que, assim que entregarmos a pedra para ele, ele dará um jeito de enfiar uma estaca em nossos corações.
- Estaca de madeira realmente mata vocês? – Draco perguntou, sem conseguir se conter.
- Não. – a morena explicou – Mas nos incapacita temporariamente. Estando fracos...
Draco entendeu o que ela deixou implícito.
- O que faremos, então? – perguntou, enfiando as mãos nos bolsos da calça com força.
- Dean e eu já planejamos tudo. – ela disse, firme – Eu e ele voltaremos pelo véu, mas vocês continuam aqui. Com a pedra. – enfatizou, quando o loiro já se preparava para argumentar contrariamente – Não queremos que o Potter a pegue e ele não irá. Daremos um jeito de imobilizá-lo. Quando ele não for mais uma ameaça, voltaremos e levaremos vocês conosco. A poção que estão tomando permitirá que vocês atravessem de volta, sãos e salvos.
- E depois? - ele queria saber – O que faremos? Ele não vai nos deixar simplesmente partir!
- Isso não será problema. – a morena continuou, voltando a descer as escadas – Klaus Barikkov e Liam Reapper, do Ministério da Magia de Sófia, Bulgária, estão montando guarda naquela clareira. Eles e mais cinco de nós, mais Lupin e alguns lobos. Não terá como ele nos escapar...
Um sorriso malicioso percorreu os lábios da morena.
- Como eles sabem? – o rapaz não entendia – Fizemos voto perpétuo! Quem o rompe...
- ... morre. – Hermione assentiu, sorrindo amplamente.
Draco acompanhou seu sorriso, entendendo.
- Vocês já estão mortos, você e Dean! – exclamou, impressionado com a esperteza da morena – Quebraram os votos.
- Eu quero o Potter em Azkaban. – ela explicou, assentindo – Por tudo o que ele fez e ainda pode fazer. O poder subiu a cabeça dele. É um perigo para todos nós! E, claro, quero me vingar também...
Draco assentiu, chegando, finalmente, às margens de areia e cinzas.
- Como você conseguiu? – ele quis saber, curioso – Reforço, quero dizer...
Hermione sorriu, sem jeito.
- Krum. – disse, por fim, afastando-se em direção ao grupo – Ele me devia um favor...
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- Essa balsa é pequena. – Zach disse, depois de uma breve análise – Só cabe uma pessoa!
- Uma alma de cada vez. – uma voz ecoou atrás do grupo, obrigando todos a se voltarem – Uma alma de cada vez, para o meu senhor, Hades.
Uma figura alta e encurvada, com a voz de um ancião, dizia. Andava a passos muito lentos, trazendo consigo, de apoio, um cajado. Uma luz fraca era emitida da ponta do mesmo. Trajava uma longa capa negra, sendo impossível vislumbrar o seu rosto
- Caronte? – Dean perguntou, no que a figura assentiu.
- Precisamos que nos leve até... – mas a figura negou veementemente, impedindo que Sarah terminasse de falar.
- Uma alma de cada vez. – repetiu – Uma alma de cada vez, para o meu senhor, Hades. – disse – Uma moeda por alma. Sem moeda, sem travessia. Vivos não podem atravessar. – enfatizou – Proibição de meu senhor, Hades.
- Não dá pra abrir uma exceção? – Zach quis saber – Nós pagamos, se quiser.
Caronte negou.
- Vivos não podem atravessar. – repetiu – Proibição de meu senhor, Hades...
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- Saco... – Zach resmungou, sentando-se na areia – Saco!
Hermione andava de um lado para o outro, seu pequeno livro de anotações na mão. Draco estava de pé, encostado nas escadas. Dean e Sarah conversavam trivialidades...
Meia hora já havia se passado. Caronte continuava em pé, ao lado de sua barca, observando o grupo, atentamente.
Hermione o encarou, friamente. Um brilho surgiu no lugar dos olhos da figura do barqueiro.
A morena fechou o caderno, indo até ele.
- Uma alma de cada vez. – disse, muito depressa.
A figura assentiu.
- E se houvesse mais almas?
Caronte estendeu o braço, movendo-o por cima da embarcação. Imediatamente, ela teve o seu interior ampliado. Moveu o braço na direção oposta, o barco retomou as proporções originais.
- Ok, o número de almas não importa. – ela assentiu, quase saltando no mesmo lugar – Só almas.
- Vivos não podem atravessar. – ele tornou a dizer – Proibição de meu senhor, Hades.
- Tá, ta, já entendi. – ela respondeu, freneticamente – E não vivos???
Caronte meneou a cabeça para frente, numa mesura. Hermione teve certeza de que ele exibia um sorriso.
- Vampiros podem? – quis confirmar – Estamos mortos! – explicou.
Uma nova mesura.
- Lobisomens? – ela questionou, tentando esconder a dúvida em sua voz – Não são propriamente humanos. – explicou – Assim sendo, não tem uma alma propriamente dita.
Caronte pareceu analisar o que ela dissera. No que pareceram minutos de angústia, ele fez uma nova mesura, no que Hermione soltou gritinhos de alegria.
Draco, Dean, Zach e Sarah vieram correndo ao seu encontro.
- Podemos atravessar! – ela disse, animada, para o amigo vampiro e os lobisomens – Draco? – ela murmurou, voltando-se para Caronte, ansiosa.
A figura negou com a cabeça.
- Vivos não podem atravessar. – ele repetiu – Proibição de meu senhor, Hades.
Xingamentos baixinhos de Dean e Zach.
- Ele não está vivo. – Hermione disse, tentando argumentar – Atravessamos o véu, certo? Vivos não conseguem atravessar o vê da morte. Eles morrem! - enfatizou – Ele atravessou o véu. Está morto então.
- Ele não parece morto. – Caronte disse, firme.
- Não parece, mas está. – Hermione retrucou – O quê? Pra ser morto agora tem que ser moribundo e acabado?
Caronte não respondeu. Sarah tentou conter umas risadinhas com a mão.
- Ele atravessou o véu. – Hermione repetiu – Tem todo o direito de usar a barca quanto nós. Nós vamos e ele vai junto. – decidiu – E você vai nos levar, querendo ou não. – a morena pegou umas moedas de uma bolsinha e estendeu para o barqueiro – Cinco moedas pela viagem. Pagamento antecipado. Agora, dá pra ser ou ta difícil???
Caronte meneou a cabeça negativamente, mas deu-lhe as costas. Com um aceno, o barco tornou a se alargar.
- Zarpando. – Hermione disse, dando espaço para que os outros entrassem.
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Dean ia sentado na proa da pequena embarcação. Zach e Sarah vinham em seguida. Draco e Hermione sentavam juntos. Atrás deles, Caronte vinha em pé na popa, segurando o leme, que nada mais era que seu cajado, obrigando o barco a cortar as águas vermelhas do rio de fogo.
- Já que estamos aqui... – Dean disse, voltando-se para Caronte – O que há depois daquele castelo, além da muralha que vimos?
Caronte permaneceu em silêncio.
- Estamos mortos. – Hermione tornou a dizer, tentando incentivá-lo – Acredite, não há ninguém para quem iremos passar essa informação adiante.
O barqueiro continuou em silêncio, mas por pouco tempo.
- Atrás da muralha, fica o castelo do sofrimento. – disse, sua voz lenta e calma – As almas amaldiçoadas estão presas nele, nas torres em chamas. Recebem castigos diversos pelos pecados que cometeram em vida. É um lugar de sofrimento, dor e redenção. Sim, pois só através da dor que aquelas almas conseguem alcançar a redenção e, assim, seguir em frente.
- Em frente pra onde? – Dean questionou.
- Para o Paraíso. – Caronte respondeu, pacientemente.
- Campos Elísios? – Hermione perguntou, no que a figura assentiu – Mas e as Ilhas Afortunadas?
- Não sei do que se trata. – Caronte explicou – O que há, após aquelas torres, é o pátio de bronze. Nele, as almas daqueles que foram bons em vida e daqueles que já tiverem obtido sua redenção, atravessam um enorme pátio, passando por um portão de bronze, onde há os jardins do Paraíso. Os jardins são imensos e belos. No final dele, há o castelo do meu senhor, Hades.
- A floresta e as ruínas que você viu! – Sarah exclamou para Hermione.
- O filósofo deve ter confundido esses jardins e chamado de Ilhas Afortunadas. – Dean sugeriu, baixinho, para que Caronte não pudesse ouvi-los.
- Quanto tempo uma pessoa leva para ter sua redenção? – Draco perguntou, curioso.
A figura do barqueiro meneou a cabeça para o lado.
- Depende do tamanho de seus pecados. – disse, um ‘quê’ de satisfação em sua voz – A alma que saiu daqui mais depressa, pelo que sei, e conseguiu fazer a travessia para os jardins do Paraíso, demorou cento e três anos.
- Fiiiiiiiiu... – Zach assobiou, baixinho, com pena dos demais infelizes.
- Há condenados perpétuos? – Hermione perguntou, observando o deslizar do barco pelas águas de fogo – Quero dizer, aqueles que nunca sairão do castelo?
Caronte assentiu.
- Meu mestre sempre dá uma segunda chance. – ele explicou – Basta que as almas cumpram sua pena para que possam realizar a travessia em seguida. Infelizmente, nem todos conseguem... – disse, sem realmente sentir – Basta um pensamento mal para que ele seja condenado a passar a eternidade no castelo do sofrimento.
- Que merda! – Dean murmurou, sem se conter.
- Como é o caminho da travessia? – Hermione perguntou – Desde a saída do castelo até a chegada aos jardins?
- Uma reta. – Caronte responde – Um lugar repleto de almas. As almas virtuosas passam direto pelo castelo. Nenhum dos espectros que lá vivem as perturba. Eles não têm esse direito. Ordens do meu senhor, Hades. Eles existem somente para perturbar as almas amaldiçoadas.
- E se um deles perturbar uma alma virtuosa? – Sarah perguntou, curiosa.
- Hades, meu senhor, castiga-os. – disse, um tom de pavor impresso pela primeira vez em sua voz – Tornam-se almas amaldiçoadas e passam a sofrer seus próprios castigos.
- Nada bom. – Zach murmurou, piscando um olho para Sarah.
- E depois disso? – Hermione queria ouvir mais.
- As almas esperam em filas para atravessarem o portão de bronze. Cada uma tem seu nome chamado por um dos espectros. Após receberem a autorização, atravessam uma ponte e chegam aos jardins suspensos.
- ‘Suspensos’? – Draco e Dean repetiram em uníssono.
Caronte assentiu.
- As escadas por onde desceram. – o barqueiro apontou para trás, de onde vieram – Elas se repetem. Todavia, ao invés de paredes e rochas quebradiças, lodo e calor, as escadarias dos jardins são repletas de flores e folhas. As árvores fornecem sombra fresca a todo instante. Eras verdes cobrem os degraus... Uma brisa leve acompanha as almas, dando-lhes uma prévia do que vem a ser os jardins ao final das escadas.
- E como é lá? – Sarah perguntou.
- Não sei. – Caronte disse, negando com a cabeça – Nunca me foi autorizado entrar. Minha função é de carregar as almas pelo rio Aqueronte, até o castelo. Uma alma de cada vez. – disse.
- Uma alma de cada vez, para o meu senhor, Hades. – Zach e Sarah completaram, achando graça.
- Uma moeda por alma. Sem moeda, sem travessia. Vivos não podem atravessar. – Dean repetiu, fazendo coro aos lobos.
- Proibição de meu senhor, Hades. – os três disseram, rindo ao final.
Caronte ficou em silêncio. Hermione meneou a cabeça, envergonhada.
- Perdoe-nos. – disse, sem jeito – Meus amigos... São idiotas!
O barqueiro assentiu.
- Esse tipo de atitude que irá levá-los a permanecer no castelo do sofrimento. – disse, no que Zach, Dean e Sarah ficaram mudos no mesmo instante, os olhos arregalados.
- Não, por favor, não... – Hermione pediu, desesperada.
Caronte voltou-se para os três e fez uma mesura.
- Hoje... não. – disse, no que Dean soltou um alto suspiro em alívio.
- Mas, então... – Sarah murmurou.
- Nunca se sabe. – o barqueiro respondeu – Nunca se sabe nada com certeza na terra dos mortos. Não brinquem com a morte. – avisou-os – Nunca se sabe quando ela irá devolver a brincadeira...
Todos na embarcação ficaram quietos pelo restante da viagem. Não souberam precisar quanto tempo demorou até que atingissem a margem oposta, metros e metros abaixo do ponto de onde partiram. À sua frente, uma enorme muralha se estendia. Um portão negro gigantesco os aguardava.
- Deixo-os aqui. – Caronte disse, depois que o último passageiro, Hermione, saltou.
- Obrigada. – a morena agradeceu.
Caronte assentiu e mudou o cajado de posição. O barco tornou a subir o rio de fogo, deixando-os para trás.
- Muito bem, sabemos que muita coisa é verdade agora. – Dean disse, retirando sua camisa e a jogando por sobre o ombro – Vamos em frente.
- Tá com calor? – Hermione perguntou, sem entender.
- Não. – o vampiro disse, vendo-a prender os cabelos num rabo de cavalo – Força do hábito. Você?
- Mais ou menos. – ela explicou – É mais um incômodo.
- Vampiros não sentem calor? – Draco perguntou, curioso.
- Não. – Dean explicou, ajeitando melhor sua mochila no ombro – Hermione sente porque ainda se encontra em transição. – continuou – Ela é muito apegada à sua antiga vida, como mortal. Isso torna a transição mais demorada e difícil.
O loiro assentiu com um aceno de cabeça. Em seguida, continuou a andar, pois Zach e Hermione já haviam chegado ao portão negro.
Ele encontrava-se aberto. O grupo continuou sua caminhada. Porém, ao chegarem à divisa, Hermione e Zach foram jogados para trás, caindo em cima de Sarah, embolando-se na areia e cinzas que formava o chão.
- Quem trouxe vocês até aqui?! – uma voz, que mais se assemelhava a um rugido, ecoou do lado de dentro do castelo.
- Caronte. – eles responderam, em uníssono.
O chão abaixo de si começou a tremer. Eles se olharam, assustados.
Segundos depois, uma figura gigantesca surgiu diante de seus olhos.
Hermione lembrou-se de Fofo, o cão de três cabeças de seu amigo Hagrid. Porém, o cão negro diante deles era cerca de cinco vezes maior do que Fofo, isso somente em altura...
Com três cabeças, o enorme animal possuía cobras ao redor de seu pescoço, as quais cuspiam fogo, e rabo de dragão. Ao avistá-los, todas as três cabeças exibiram os dentes pontudos, cada um do tamanho de um braço humano adulto.
- Sejam bem-vindas, almas. – o cachorro disse, curvando as três cabeças – Entrem. Entrem no castelo do sofrimento. Fiquem aqui, se este é o seu destino, ou sigam direto para os fundos, a fim de realizarem a travessia para os jardins suspensos.
- Jardins suspensos, é pra lá mesmo que vamos. – Zach confirmou, com um meio sorriso.
- Entrem, fiquem à vontade. – disse a criatura – Sou Cérbero, guardião da entrada do reino de Hades.
- Entrada, uhm, interessante. – Dean murmurou, tentando abrir o máximo de distância entre si e o cão – Que mal pergunte, er... onde é a... saída...?
Todos levaram as mãos aos ouvidos, pois os latidos e ranger de dentes de todas as cabeças eram ensurdecedores.
- Não há saída! – Cérbero disse, firme – Quem entra na terra dos mortos, jamais volta, a não ser com permissão do meu senhor, Hades. E ele não é de dar permissão. – enfatizou ao final.
- Tudo bem, perfeito. – Hermione assentiu, puxando Draco por uma mão, Dean por outra – Só queremos entrar e chegar aos jardins suspensos o quanto antes.
- Como deseja, minha dama. – Cérbero tornou a mostrar os dentes, no que Hermione entendeu ser uma tentativa de um sorriso.
A fera chegou para o lado e o grupo pôde atravessar os portões. Hermione e eles olharam para trás e viram que, ao contrário do lado de fora, o portão não era negro, mas, sim, claro e brilhante, formado por diversos diamantes brutos.
O grupo havia avançado pouco desde que cruzaram os portões, porém, já era possível ouvir gritos de dor. As chamas das torres queimavam acima de suas cabeças, barulhos de chicotes sendo brandidos estalavam no ar...
- Por aqui. – Sarah disse, apontando para uma fila de almas que seguia rumo ao norte.
Eles foram atrás. Então, para seu espanto, avistaram dezenas e dezenas de espectros sobrevoarem suas cabeças. Pareciam muito com as almas que se encontravam ali. Ao invés de serem translúcidos, como os fantasmas, as almas mantinham sua aparência, a mesma que tiveram em vida. Porém, pareciam mais leves, como se feitos de fumaça. Os espectros, por sua vez, possuíam corpos idênticos aos humanos; porém, usavam uma enorme capa preta, rasgada em muitos pontos. Alguns levavam consigo chicotes, outros, foices. Conseguiam voar, mesmo sem possuírem asas.
- Entrem na fila. – Hermione sussurrou, empurrando Dean para sua frente e Draco, para suas costas.
Zach e Sarah entraram na fila do lado.
Mais e mais almas chegavam, a todo o instante, vindo de diversas partes do castelo. Todas andavam no mesmo ritmo, vagarosamente.
Hermione estava tensa. Seu corpo, rígido. A todo instantes, voltava-se para trás, para verificar se Draco estava bem. Isto deixava o loiro mais e mais nervoso...
- Pára! – ele resmungou, depois de alguns minutos, segurando-a pelos ombros, sua boca colada ao ouvido dela – Vou morrer de aflição desse jeito!
A morena voltou-se para frente, sem nada dizer. Seu corpo continuava tenso, mas, agora, por outro motivo. Hermione tentou se controlar. Suas mãos formigavam de vontade de coçar a nuca, perto do ouvido, onde antes Draco estivera tão próximo. O som da voz dele ainda ecoava em seus ouvidos, deixando as pernas da morena bambas...
Em pouco mais de dez minutos, eles já haviam cruzado o pátio do castelo. De onde estavam, já podiam vislumbrar os espectros que guardavam a passagem pelo portão de bronze, bem como a ponte que os levaria até o outro lado, e as escadarias que subiam e subiam, sem nunca parecer ter fim, até os jardins suspensos.
Dois espectros guardavam o portão, enquanto outros diversos tomavam conta das filas de almas. Enquanto estiveram ali, o grupo pode ver alguns espectros que arrancavam almas das filas; almas que se fingiram de virtuosas para tentar fugir do castelo do sofrimento. Os espectros arrastavam tais almas, erguendo-as no ar, levando-as paras torres. Lá, jogavam-nas na chamas, onde seus gritos aumentavam sem cessar.
Hermione fechou os punhos, tensa. Fez uma pequena oração em sua mente, pedindo a Merlin que os protegesse.
Inconscientemente, Draco a segurou pela cintura e voltou a se aproximar.
- Calma. – disse, bem baixinho – Do contrário, podem perceber!
Mais dez minutos, quinze...
- Seu nome. – o espectro perguntou na fila ao lado, Zach sendo o primeiro a ter chegado.
- Zachary Grings. – o rapaz respondeu.
- Seu nome não consta da lista. – mais dois espectros se aproximaram, ao ouvirem o outro falar.
- Não morri de morte natural. – o lobo disse, tentando manter a voz firme – Eu... eu ultrapassei o véu da morte porque quis.
Os espectros se entreolharam, muito quietos.
- Fiz o mesmo! – Sarah disse, pondo-se ao lado do amigo – Sarah Piccoli. Meu nome não deve contar da lista também.
O espectro assentiu, olhando do início ao fim um enorme pergaminho chamuscado nas pontas.
- Também! – Dean exclamou, puxando Hermione pelo braço, a morena puxando Draco em seguida – Dean Winchester. – apresentou-se – Estes são Hermione Granger e Draco Malfoy.
- Quem os trouxe aqui? – um dos espectros perguntou, brandindo sua foice de um lado para o outro.
- Caronte. – Hermione respondeu – Estamos mortos, por isso ele nos trouxe. Queremos chegar aos jardins suspensos, se nos derem licença.
- Confira. – o primeiro espectro ordenou a um outro, que saiu voando, em direção a entrada do castelo.
A fila de almas recomeçou a andar. Tempos depois, o outro espectro voltou.
- Caronte disse para deixá-los passar. – o espectro disse, firme, olhando para Hermione e Draco – Podem prosseguir ilesos. Os demais, devem receber quinze chibatadas antes de seguir em frente.
Zach, Sarah e Dean arregalaram os olhos, abismados.
- Agradeça que ele não os condenou a permanecer aqui. – Hermione resmungou, sabendo que a brincadeira deles iria custar caro de algum modo – Não se esqueçam! Basta um pensamento mal e serão condenados a ficar aqui!
Três espectros vieram e puxaram Dean, Sarah e Zach para um canto do pátio. De repente, eles foram lançados ao chão, ficando de quatro, sem conseguirem se mover. Os três espectros tinham chicotes em que as pontas eram divididas em três partes, cada uma contendo uma lâmina.
Suas camisas foram rasgadas atrás. Suas costas, expostas. Os três fecharam os olhos, antecipando o que viria...
- Vai arrancar-lhes a pele! – Draco exclamou, estupefato.
- Merda! – Hermione esbravejou, as mãos à cabeça – Merda!
- Um! – um espectro disse, em alto e bom som, e os outros três arremessaram seus chicotes contra as costas dos lobos e do vampiro, sem piedade.
Seus gritos foram adicionados à sinfonia de lamentos do castelo de sofrimento.
- Dois! – continuou o espectro e uma nova onda de chicotadas recomeçava – Três! Quatro! Cinco!...
Hermione segurou o braço de Draco e o apertou com força.
- Pára, pára, pára!!! – ele disse, desvencilhando-se dela – Quer quebrar meu braço???
A morena tentou pedir desculpas, mas seus olhos fecharam aos ouvir novamente as chibatas acertarem as costas de seus amigos.
Draco entendeu e, sem pensar, puxou-a para si, escondendo a face dela em seu peito.
Os minutos passaram. Os gritos continuavam...
- Pronto. – o espectro que contava as chibatas disse – Podem prosseguir.
Hermione correu para ajudar os três. Primeiro, ajudou Dean a se levantar. O sangue escorria pelas costas do loiro.
- Nunca mais sacaneio ninguém. – disse, tentando se endireitar, uma expressão de dor em sua face lívida.
Draco e Zach ajudavam Sarah a se levantar. As costas da menina estavam em carne viva...
- Tomem. Depressa! – Hermione entregou aos três um frasco de poção.
Sendo apressados pelos espectros, o grupo atravessou a ponte, Dean sendo ajudado por Hermione. Os outros dois, ajudando Sarah.
Após cruzarem a ponte, passaram pelo portão de bronze, chegando ao primeiro degrau das escadas que os levaria aos jardins suspensos. Uma brisa tocou-lhes os rostos, e Sarah sorriu pela primeira vez desde a travessia.
A poção que Hermione dera ajudou a curar os ferimentos, mas eles ainda podiam ser vistos nitidamente.
- Merda! – Dean reclamou, jogando no chão os farrapos de sua camisa – Eu adorava essa camisa!
Hermione o encarou, o queixo caído.
- Aqueles chicotes... – Sarah argumentou, retirando os frangalhos de sua camiseta ensangüentada, ficando apenas com os restos do que fora seu sutiã - ... têm algum tipo de magia oculta. Por isso não cicatrizamos por completo.
- Que merda! – Zach reclamou, ainda dolorido – Isso dói pacas! Acho que tinha esquecido o que era sentir dor!
- Vocês... – Draco balbuciou - ... estão bem?!
- Não! – Sarah respondeu, fazendo uma careta, tentando abrir um galão de água – Mas vamos ficar. – completou, jogando um pouco do líquido em sua face, em seus cabelos – Você! – ela disse, num tom acusativo, entregando o galão para Dean lavar o rosto – Gritou feito uma menininha... tsc tsc... A vergonha de sua espécie! – e riu, achando graça.
- Ha ha! – Dean deu-lhe a língua – E seu amiguinho aqui, gritou mais do que eu!
Draco e Hermione não conseguiam acreditar no que estavam vendo.
- Mentira, seu sanguessuga! – Zach arrancou-lhe o galão das mãos, jogando o restante da água em seus cabelos – Agüentava mais quinze!
- Agüentava nada! – o vampiro retrucou, fingindo golpear o estômago de Zach.
- Ridículos! – Hermione exclamou, passando por entre eles, que riam, fazendo piada – Idiotas! Imbecis!!! Filhos da p...
Draco subiu atrás dela, ainda não acreditam no que acabara de presenciar. O loiro engoliu em seco. Sabia que não resistiria nem a três chibatadas daquelas... E lá estavam eles, tirando sarro do que se passara...
- Idiotas! – ele ouviu Hermione repetir, durante um bom tempo, enquanto subiam os degraus...
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