Por ordem da Alta Inquisidora



                      Capítulo quatro. – Por ordem da Alta Inquisidora de Hogwarts.


 


 


 


Por ordem da Alta Inquisidora de Hogwarts


 


Todas as organizações, sociedades, times, grupos e clubes estudantis estão doravante dissolvidos.


 


Uma organização, sociedade, um time, grupo ou clube é aqui definido como uma reunião regular de três ou mais estudantes.


 


A permissão para organizálos deverá ser solicitada à Alta Inquisidora


(Profª Umbridge).


 


Nenhuma organização, sociedade, nenhum time, grupo ou clube estudantil poderá existir sem o conhecimento e a aprovação da Alta Inquisidora.


 


O estudante que tiver organizado ou pertencer a uma organização, sociedade, um time, grupo ou clube não aprovado pela Alta Inquisidora será expulso.


 


O acima disposto está em conformidade com o Decreto da Educação Número Vinte e Quatro


 


Assinado: Dolores Joana Umbridge,


                                                                                        Alta Inquisidora


 


 


Mesmo depois de ler o anunciado no quadro de recados da sala comunal da Corvinal pela terceira vez, Lince ainda precisou de alguns minutos para assimilá-lo, que porcaria era aquela? O que estava acontecendo? Sentiu toda a alegria esvaindo-se de seu corpo como se tivesse acabado de levar uma ducha de água fria, sobrando apenas a sensação de ter algo pesado no estômago e outra coisa entalada na garganta.


 


Umbridge sabia, e sabia antes mesmo deles terem o primeiro encontro.


 


Que houve? Era a pergunta que não saía de sua cabeça. Teria a professora saponídea conseguido se apossar da lista e agora estavam todos ferrados? Seus pais não ficariam nada contentes se fosse expulsa de Hogwarts. O que mais preocupou Lince, de fato, foi a velocidade com que a professora tinha descoberto.


 


“Alguém deu com a língua nos dentes” pensou “algum infeliz covarde, tipo aquele Zacarias Smith ou tipo algum babaca sem um pingo de palavra. Quem quer que seja o tal, quando eu encontrá-lo, vou cobrir a cara do traidor com tantas azarações que nem sua mamãe vai reconhecê-lo.”


 


Os alunos se aglomeravam em volta do quadro e cochichavam, tão perplexos quanto ela própria, mas o motivo era bem diferente: estavam mais eram preocupados com seus times de quadribol, e não com um curso que poderia vir a salvar muitas vidas.


 


- Eu disse que era besteira fazer aquilo, coleguinha – era a voz sonolenta de Linette após um longo bocejo – se ferrou.


 


Lince sentiu um puxão de raiva.


 


- Isso é o que nós vamos ver – declarou – ainda estou dentro, não é uma sapa velha que vai me impedir de salvar minha vida.


- Você deveria sair dessa, Lauren – a voz de Linette assumira um tom sério que raramente usava – Potter é um pirado, e vai se dar mal, e você vai acabar indo junto.


- Se eu tiver que ir junto – ela disse, trincando os dentes – irei com prazer, e com consciência de que não sou uma covarde inútil. Como você consegue? Os sinais estão por todas as partes, Linette, e não é hora pra ter medo, é hora de lutar, de nos unirmos, você não ouviu o discurso do Chapéu Seletor no começo do ano? Até uma porcaria de chapéu sabe do perigo, como seres humanos não o percebem? Como os Corvinais não percebem tendo uma mente tão aguçada?


 


Linette não disse nada, não gostava de discutir esse assunto, optando por apenas ignorar Lince na maioria das vezes.


 


- Anda, me diz o que vai fazer quando a guerra começar! –insistiu - Vai se esconder embaixo da cama e esperar passar? Ein?


- Belo discurso, Lince... Mas olhe à sua volta, você não acha que ele já não teria destruído tudo? Você-Sabe-Quem foi um bruxo muito poderoso, e se quisesse poderia nos estraçalhar em segundos!


- Mas é exatamente isso o que ele vai fazer se todo mundo agir como você – Lince rosnou – e se você quer saber porque ele não pula de trás daquela poltrona e mata a todos nós, eu vou dizer a razão: ele quer semear a discórdia primeiro, fazer com que fiquemos uns contra os outros, que rompamos todos e qualquer tipo de laço entre nós, assim estaremos mais fáceis pra se abater, e é exatamente o que está acontecendo!


- Olha Lince, não acho uma boa continuarmos com isso ok? – ela suspirou e virou as costas para o quadro de avisos – bora pro café da manhã?


 


Lince passou a mão pela testa num sinal de impaciência, mas resolveu ignorar Linette e se retirar para o Salão Principal.


 


Enquanto comiam, Lince lançava olhares nervosos para a mesa da Grifinória na esperança de ver algum tipo de manifestação por causa do anúncio: tinha certeza que não havia sido pregado apenas na Corvinal. Logo suas suspeitas tornaram-se realidade, Ernesto Macmillan, Ana Abbott e Zacarias Smith iam em direção à mesa da Grifinória traçando uma reta até Harry, mas logo foram mandados embora por Hermione, que parecia pensar que desconfiariam daquela comoção.


A menina se serviu de mais torradas com geléia e observou, quieta, Linette tirar um bilhete da mochila.


 


- Má hora, Linette.


- Má hora? Por que você não fala isso pros cem sapos de chocolate que eu te comprei e vamos ouvir o que eles acham?


- Não posso ir até lá agora, é suspeito - justificou-se – eu entrego quando encontrá-lo mais tarde.


 


Linette lançou-lhe um olhar de censura.


 


- Eu vou entregar essa porcaria! – ela rosnou – calma, temos coisas mais importantes no que pensar nesse momento, não sei se você reparou, mas a Alta Inquisidora de Hogwarts meio que descobriu a gente.


- Então, é mais um motivo pra você entregar agora, porque só Merlim sabe se vai estar viva pra...


 


Lince enfiou três torrões de açúcar na boca amiga e lhe deu tapinhas no ombro.


 


- Fica quietinha, fica... isso... come esse açúcar...


 


Linette pareceu não se incomodar com os cubos de açúcar na boca, e sorriu, deixando à mostra, propositalmente, uma meleca cristalizada.


 


- Pelo amor de deus, Linette!


- Vem cá Lince – disse ela com a voz engrolada pela boca cheia – finge que eu sou o Fred e me dá um beijinho! – ela tentou agarrá-la pela cintura – aposto que meus lábios são tão doces quanto os dele...


 


Lince corou violentamente a ponto de ficar da mesma cor da Grifinória e empurrou a amiga que ainda gesticulava para ela, se esforçando para não rir.


 


- Você é uma grande babaca sabia? – ela sorriu.


- E aí meninas? – ouviram uma voz masculina e animada de alguém que acabara de chegar.


- Ah, oi Terêncio – Linette sorriu com alguns cristaizinhos presos entre os dentes – beleza?


- Beleza eu não sei se tenho tanta certeza- ele olhou para Lince, esperando um cumprimento que não veio, pois ela tirara da mochila seus papéis e escrevia furiosamente – vocês viram o papel no quadro de avisos?


- Lince aqui acha que vocês estão ferrados – ela indicou com a cabeça o montinho de cabelos curtos e negros debruçado sobre o pergaminho.


- Será que alguém contou à Umbridge? – Terêncio parecia assustado e inseguro.


- Tenho certeza de que Umbridge sabe de alguma coisa, mas não tem provas ainda – Lince erguera os olhos do papel e encarava um Terêncio muito surpreso.


- Como você... como sabe?


- É óbvio, se aquela mulher pudesse provar alguma coisa, tipo que estamos contra o Ministério, não estaríamos aqui tomando café tranquilamente. Ela deve  ter sido informada mas não pôde fazer nada, pois não estávamos na ilegalidade, então criou aquele decreto para poder nos acusar de estar fazendo algo errado, mesmo que nós não estejamos de fato contra o Ministério, como um exército, e sim querendo ter aulas decentes que nos permitam proteger a nós mesmos, por mais que aquela cabeça doentia esteja cheia de conspirações.


Terêncio parecia encantado.


 


- Escute ela, Terêncio, Lauren entende de conspirações. – Linette ria, mas o sorriso foi rapidamente apagado se seu rosto quando seus olhos encontraram os de Lince.


- Então você... você acha que estamos prestes a nos ferrar? Quer dizer, de certa forma nós estamos contra o Ministério, já que eles estão tentando nos impedir... mas – Terêncio amassava um pãozinho entre os dedos nervosamente – acha que ela só fez esse decreto pra ter fundamento na acusação?


- Escute, - ela parecia ameaçadora, sua voz firme e decidida – Umbridge não tem acusações contra nós porque não estávamos quebrando nenhuma regra da escola, então qualquer reunião que tenhamos feito antes do decreto é absolutamente problema nosso.


- Mas agora, o decreto... – Terêncio suspirou, lançando um olhar triste às duas garotas – o que vamos fazer?


- Continuar, é claro, mas com consciência de que  se ela souber que continuamos sem sua permissão, aí estaremos legalmente ferrados, o que exige muita cautela de nossa parte.


 


Lince voltou a escrever em seu pergaminho fingindo não perceber as imitações de pirada que Linette fazia às suas costas, e sem perceber que Terêncio olhava para ela de forma assustadoramente doce. No momento seguinte ouviu-se um estardalhaço de asas e pios anunciando a chegada do correio matinal, centenas de corujas adentravam o Salão Principal com correspondências amarradas em suas patas.


Mal havia acabado de pôr um ponto final em seu texto enfaticamente, Lince recebia bicadinhas carinhosas na mão de uma coruja muito negra e de olhos redondos e amarelos, um segundo depois recebeu a companhia de outra marrom que acabara de pousar ao lado do açucareiro e se aproximara olhando para ela.


 


- E aí Neide? – saldou a coruja negra com uma carícia na cabeça na mesma antes de pegar o envelope preso em sua pata.


 


A coruja marrom soltou um pio indignado por estar sendo ignorada.


 


- Neide? - surpreendeu-se Terêncio – sua coruja se chama Neide?


- E que droga de nome é Terêncio? – disse ela, ao colocar o dinheiro na bolsinha de couro da outra coruja e pegar o jornal- pelomenos a minha coruja tem nome de gente.


 


Terêncio fez um biquinho e proclamou, como se seu argumento findasse o assunto:


 


- Tem outro Terêncio na Sonserina, o Higgs, tá?


- Ótimo, como se o mundo precisasse de dois Terêncios.


 


Linette se engasgou com o suco de abóbora e tossia como louca, Terêncio se ocupou imediatamente em ajudar a garota após lançar a Lince um olhar de censura.    


 


Lince empurrou uma torrada para as duas corujas e abriu o envelope que viera preso à perna de Neide, era de seus pais, e pedia que fosse cuidadosa com suas atividades dentro da escola com um representante do Ministério por perto, pois estavam atrás de qualquer pessoa que saísse o mínimo das regras. Que coincidência macabra pensou, minha mãe nem sabe nada sobre o que estamos fazendo...


A mãe de Lince trabalhava no Ministério no Departamento de Transportes Mágicos, na seção de Autoridade da Rede de Floo, e seu pai era um Auror, ambos sabiam o que acontecia fora da escola e conheciam muito bem Umbridge, mas ela não se importava, continuaria a fazer o que tinha intenção de fazer, e embaixo da assinatura de sua mãe lia-se algo que quase a fez engasgar:


 


 


 ...então peço para que tome cuidado, Lauren, você sabe que os tempos não estão fáceis e que é bom manter-se na linha... Eu e seu pai estamos com muitas saudades e esperamos que você esteja bem. Não esqueça de nos responder, como da última vez. Te amamos muito


                                                                               Mamãe.


PS: Oi meu anjinho, aqui é o papai, a controladora da sua mãe não me deixou escrever na carta, tive que puxar o envelope dizendo que eu mesmo a despacharia. Queria dizer que sinto muitas saudades de você, mas que você está mais segura em Hogwarts do que estaria em casa, apesar de estar com certos monstros comandando sua escola.


Você sabe de quem eu falo e peço para que tome cuidado sim, mas nunca baixe a guarda e se prepare pelo que está por vir.... é claro que me refiro à Dumbledore e os seus N.O.Ms, meu anjinho. Estude bastante e deixe o papai orgulhoso como você sempre fez. Te amamos muito...


                                                                                Papai.


 


Lince corou e deu uma gargalhada ao terminar de ler a carta, seu pai era terrível... ele sabia que a correspondência estava sendo checada assim como ela, e não estava de verdade se referindo à Dumbledore como monstro, e sim à Umbridge, e que se preparasse para uma batalha e não para os N.O.Ms. Riu mais uma vez e ainda com um sorriso nos lábios deixou a carta de lado para se concentrar no jornal.


Odiava as notícias do Profeta Diário, eram mentirosas e deixavam de fora muitíssimas verdades, mas precisava ler para saber o que se passava no mundo do lado de fora dos portões de Hogwarts, de como o clima andava e se haveria mais mortes ou mais menções à loucura de Harry Potter. Não conseguiu achar nada explícito sobre a insanidade de Dumbledore e nenhuma notícia nova e mentirosa sobre Harry, mas percebera que o nome de Harry ainda estava sendo usado como piada, como por exemplo num trecho de texto de uma história mirabolante que havia sido publicada: Uma história digna de Harry Potter. Por mais que a história nada tivesse a ver com o menino.


Não podia mais agüentar esse tipo de comportamento ridículo que o Ministério estava demonstrando, já estava de saco cheio das mentiras e das ocultações, das sátiras à Harry Potter e à Dumbledore, sendo que os dois estavam perfeitamente sãos e só queriam proteger a verdade, proteger as pessoas, enquanto elas mesmas jogavam pedras em seus possíveis salvadores.  Jogou o jornal longe e guardou a carta de seus pais furiosamente no bolso interno nas vestes.


 


- Você é sempre assim tão violenta? – ouviu Terêncio perguntar, e olhou pra ele com as sobrancelhas ameaçadoramente arqueadas. - N-Não que eu me importe, claro, na verdade eu meio que gosto...


 


Linette começou a ter outro ataque, só que dessa vez era um ataque de riso por ver Lince ficar bem vermelha, fingir que não tinha ouvido nada e se esconder no meio de seus papéis novamente. Terêncio se aproximou mais, espiando sobre o ombro dela.


 


- O que você tá fazendo aí? Que feitiço é esse? Nossa... realmente complicado, por Merlim isso não é pra nossa faixa etária.


- Cai fora, Boot. – ela apontou a pena para ele num sinal de aviso – ou eu te mostro pra que serve.


- Escuta... você tem namorado? – Terêncio parecia esperançoso.


- Ela está quase... – Linette disse, sorrindo de um jeito maroto – sabe o Fred Weasley? É louca por ele.


- Eu não... LINETTE! – ela não sabia mais o que dizer, então apelou.


- Você tem ou não namorado? – ele insistiu, parecendo ainda mais interessado agora que ela havia ficado mais brava e mais corada.


 


Lince estreitou os olhos para a melhor amiga, Linette sorria: E agora, Lince?


Que maneira mais baixa de fazê-la dizer que gostava de Fred... Só pra tirar Terêncio do caminho... Mas tudo bem, qualquer coisa pra manter esse cara irritante longe dela, então a menina suspirou e disse, como que se dando por vencida:


 


- Sim eu tenho uma queda por Fred Weasley e ele não sabe, então mantenha essa boca fechada se não me quiser caçando você pelos corredores. – Lince suspirou mais uma vez e voltou a escrever só pra não ter que olhar pra cara de decepção de Terêncio.


- AI QUE BONITINHO! – guinchou Linette.


- É, muito lindo, agora podemos parar de falar de mim? – ela deitou a cabeça no pergaminho à sua frente e fechou os olhos.


- Me avise quando terminar com o Weasley ok? – Terêncio sorria sonhadoramente para Lince, e a menina podia jurar que o tinha visto suspirar pelomenos umas três vezes.


- Eu não estou namorando com o Fred.


- Então é só um rolo temporário? – o bruxo pareceu interessado novamente.


- Terêncio, meu amor, chegue mais perto – Lince sorriu, fazendo o pedido suavemente, e apontou a varinha para o rapaz quando este se aproximou – Densaugeo.


No mesmo momento, os dentes de Terêncio começaram a crescer tanto que saíram de sua boca e continuavam seu caminho rumo ao chão, e o menino saiu apavorado, correndo pelo Salão Principal com os olhares curiosos pregados em suas costas.


 


- Como você é ... – Linette disse, mas não parecendo muito penalizada, e sim divertida – foi só uma cantada leve... não precisava pegar pesado desse jeito.


- Não se faça de santa, você está mais pra Diabrete – ela desviou os olhos das portas por onde Terêncio acabara de desaparecer – da pra parar de falar besteiras sobre o Weasley? Sério Linette, já to perdendo a paciência, e você não quer que isso aconteça, quer?


- Hum – ela mordeu o lábio inferior e riu, voltando sua atenção para seu prato. – mas você gosta dele não gosta?


- Claro que não, gosto de meninos que estudam e querem ser alguém na vida, tá bem? Alguém da Corvinal.


- Não seja idiota Lince, você tem chances com ele, eu perguntei pro Jorge o que o Fred diria se visse você...


- VOCÊ O QUÊ?


- Ele prometeu que não ia contar nada ao irmão, e você sabe que os Grifinórios tem palavra...


- O QUE VOCÊ FEZ SUA MALUCA?


- Nada demais, só perguntei o que ele achava que o Fred diria, bem... você sabe que eles são quase a mesma pessoa, tem os mesmos gostos e tal, e ele disse que está aprovada...


- APROVADA?


 


Lince parecia estar em pânico e ao mesmo tempo dando a impressão de que atacaria Linette a qualquer momento. Sentiu um tremor transpassar seu corpo e suas bochechas esquentaram, que raios aquela menina descontrolada fizera agora? O que diria Jorge Weasley quando a visse novamente? Até já podia ver o sorriso maroto nos lábios dele, e aquele olhar de quem sabe das coisas, e até parece que não contaria ao irmão...


 


- É, não precisa ficar nervosa, tá vendo? Eu disse que você era gata... E o Jorge concorda comigo, ou seja, o Fred te acharia bonita... E quando eu falei com o Jorge, disse que perguntaria a você e então eu ia lá falar pra ele dar um incentivo com o irmão, sabe?


- VOCÊ. PERDEU. A. CABEÇA?


- Claro que não, não é nada demais... fala sério Lince, é só um menino. Como é que você quer arrumar um namorado desse jeito? Principalmente o Fred, que é extrovertido daquele jeito...


 


Linette usava um tom de quem está tentando ignorar para que seu feito passasse despercebido e nada mais do que uma boa notícia.


 


- Só... um menino? – Linette pôde ver os olhos de Lince se estreitando de um jeito ameaçador, felino, duas fendas azuis e perigosas.


- É, não seja boba, agora vocês saem e você pode parar de correr do Terêncio e de fingir que não gosta do...


- Mas eu não gosto dele, entendeu? – sua voz se tornou mais perigosa, combinando perfeitamente com a expressão de seu rosto – quem foi que te disse isso? Um oráculo? A professora Trelawney? Você leu nas suas borras de chá e acha que tem o direito de sair por aí falando essas besteiras pra pessoas que eu sequer conheço?


- Mas Lince o...


- Eu não quero saber. – continuou – só saiba, minha querida, que se você continuar com essas porcarias, você não vai gostar do que vai acontecer com a nossa amizade. Não preciso disso, tudo bem? Já tenho coisas suficientes pra pensar, tipo no que você anda espalhando para os quatro ventos: que eu sou pirada, que meus planos não passam de bobagem e que vivo conspirando contra tudo. Pois quer saber, Linette? Vá se ferrar.


- Meu deus, quanta agressividade!


 


Lince se levantou bruscamente e começou a enfiar as coisas na mochila.


 


- Não adianta você ficar toda nervosinha não minha filha, eu sei que você gosta dele, e não quero te ver sem esperanças...


- Que merda é essa de sem esperanças? DE ONDE VOCÊ TIRA ESSAS COISAS?


- Sabe que eu não queria falar nada, mas eu estava procurando a minha meia da sorte e fui procurar embaixo do seu travesseiro...


 


Lince estacou no que estava fazendo, passou os olhos pela mesa até subirem ao rosto de Linette. Ela tinha achado, a foto de Fred embaixo de seu travesseiro. Um recorte feito de uma foto da família Weasley que ela achara acidentalmente no banheiro da Corvinal, onde o rosto de Percy Weasley aparecia completamente rabiscado com a palavra "idiota" escrita ao lado, suspeitava que aquilo tinha sido feito por sua namorada, Penélope Clearwater, durante uma briga de casal, há anos atrás. A foto que tinha queimado depois de recortar Fred e guardá-lo carinhosamente embaixo do travesseiro.


 


Queria sair de lá o mais rápido possível, e fechou a bolsa violentamente após lançar para dentro dela o último papel. Linette a observava com uma expressão de pena no rosto.


- Lince, não precisa ser assim... você sabe disso.


 


Seus olhos lacrimejavam, era tanta humilhação saber daquilo... e saber que ele também já deveria estar a par de tudo, e tudo por culpa de Linette. Se não fosse a intrometida, a sabichona, todas as coisas estariam no seu lugar.


Por que ela não podia simplesmente ficar na dela? Que deixasse os outros com os próprios problemas!


De onde tinha surgido toda aquela vontade pra que ela conseguisse um namorado? Não precisa de um namorado, e nunca, nem uma vez sequer mencionara o nome de Fred com segundas intenções, pelo contrário: evitava até olhar para ele em qualquer hipótese. As coisas estavam totalmente estragadas agora que ela tinha visto a foto, é claro, mas muito antes disso, Linette gostava de dar uma de intrometida.


 As pessoas começavam a cochichar e apontar, e Lince sentia uma raiva extraordinariamente acumulada subindo quente e lentamente pela sua espinha, pronta para explodir, expandindo-se por todo o seu corpo como chamas.


É claro que estava morrendo de raiva de Linette, mas não faria nada: seu auto-controle era bem maior e bem treinado. Não daria às pessoas o show de feitiços que queriam ver, e nem o assunto para comentar durante semanas, dizendo que a maluca da Lince finalmente explodira.


Tentou esconder os olhos marejados e se virou para sair, não se importava de ser a primeira a chegar à aula de Flitwick . Apanhou seu material que jazia em cima da mesa perto de uma travessa de pãezinhos e saiu abruptamente para a primeira aula do dia, e não se virou quando ouviu Linette sair correndo atrás dela logo em seguida.


 


- Lince... por favor... você é minha melhor amiga, não quero perder você por causa dessa besteira! Eu não fiz por mal, só quero ajudar você...


- Não quero sua ajuda.


- Você gosta pra caramba desse cara, e é tímida, por que não iria querer?


 


Lince havia se virado e encarava Linette com um olhar intenso, como se pudesse ler sua mente. A imagem de Linette descabelava e equilibrando o material no colo precariamente ao correr ao seu encontro não a comoveu nem um pouco.


 


- Não fique brava comigo, por favor...


 


Ela não disse nada e voltou a andar apressadamente.


 


- Lince, é sério... eu vou te ajudar, não quero saber se você quer ou não, só sei que você merece, caramba.


- Não.


- Não uma vírgula, escuta aqui, se até o final desse ano você não se pegar com o Weasley eu não me chamo Linette


- Então vá pensando num nome bem bonito, porque isso não vai acontecer.


- Você que pensa.


 


As duas se encaravam venenosamente, Lince de cara fechada, Linette descabelada e decidida.


 


- Eu amo você, só quero ajudar, de verdade.


 


Era estranho ouvir a melhor amiga falando do que sentia abertamente daquele jeito, mas algo em seu peito finalmente amoleceu um pouco quando ouviu aquilo: também amava Linette apesar de todas as besteiras que fazia. Deu um longo suspiro e procurou relaxar o corpo antes rígido. Assentiu com a cabeça uma vez e voltou a andar.


 


- Estou perdoada então? Você não vai me azarar nem nada?


- Não contaria muito com isso. – alfinetou, se dirigindo para a aula de Flitwick.


- Tudo bem... Vou ficar quietinha ok?


- Você? Quieta?– ela olhou para uma armadura que rangia de forma particularmente irritante conforme andavam pelos corredores do castelo, seus passos ecoando tristemente.


 


Linette riu, ainda sentindo uma pontada de culpa.


 


- Me desculpe se eu te irritei, mas é pro seu bem, só estou dando uma força sabe... eu acho você super legal, inteligentíssima e bonitona, é óbvio que você vai se dar bem, é que você é tímida.


- Entendo que seja normal pra você usar de amor e descaso numa situação que foi descoberta por mim, sendo que considero essa situação indesejável e vergonhosa, mas não considero elogios uma boa forma de desculpas.


- Hm... – Linette mordeu o lábio inferior – Hm... tudo bem – ela desistira  ao sentir seu silêncio e o olhar de quem não está se importando muito que Lince mantinha – o que é uma boa forma de desculpas pra você?


- Sapos de chocolate.


 


Lince podia ver que Linette gostava muito dela, porque no momento segurava com todas as forças de seu ser o profundo impulso de gargalhar feito uma louca da resposta, limitando-se a sorrir e balançar a cabeça, conformada.


 


- Não muda nunca... você e seus chocolates.


 - Sapos de chocolate são para os bons.


- Amo você, minha maluca!  


 


Quando menos esperava, Linette estava pendurada em seu pescoço e enchendo-a de beijinhos.


 


- Pelo amor de deus Linette! – entoou sua frase padrão.


 


E contra a vontade Lince sorriu ao mesmo tempo em que Linette dava uma de suas tradicionais gargalhadas ao virar o corredor rumo à aula de feitiços.

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