#capítulo dez
Capítulo Dez
Ou The Tragedy, It Seems Unending
Lily não sabia o que estava acontecendo, mas seu corpo estava tão retesado que implorou pela morte. A dor pungente e ininterrupta a impedia de descerrar as pálpebras pesadas. Tinha medo do que podia encontrar se o fizesse; estaria realmente no Inferno? Então Artemis, tão facilmente, tinha desistido de sua alma? A ânsia de vomitar a atacou assim que teve ciência de todo o suor a ensopando, no entanto algo a repeliu de fazer qualquer ação. Eram mãos rápidas e desesperadas percorrendo alguns pontos de seu corpo. Nada muito indigno. Apenas o bastante para que ela sentisse calafrios pelo encontro de peles. Depois que detectou as mãos quentes em seus ombros e rosto, as vozes lhe chegaram aos ouvidos. Uma em especial murmurava palavras em tom de consolo. Estava muito próxima dela.
- Cale a boca, Dorcas. Ajuda aqui! Não, espera! James, faça alguma coisa! – Remus, impaciente, puxava seus cabelos, irritado, como se tal ato pudesse lhe fazer calmo.
- Por quê? Eu sou, por acaso, o prometido a ela? – James perguntou sem dar a devida atenção ao assunto
- Detesto meninas assim! Dorcas, volta aqui! – Remus saiu correndo atrás de Dorcas, que, enfezada, voltara a correr para dentro da cidade.
- Ela vai ficar bem, não vai? Você vai melhorá-la, não vai? – Marlene chorava próximo aos dois.
- Não sei, não sei, Marlene – James falou, sentindo suas palavras o engasgar. Temia que o incerto se concretizasse.
As mãos começaram a ficar ainda mais ágeis e aflitas.
- Vai ficar tudo bem, eu lhe prometo. Shhh. Vai ficar tudo bem – James não se cansava de repetir, mesmo que soubesse que Lily estava muito debilitada para entendê-lo.
Mas ela entendeu. Por fim, entendeu. Assim que os dedos quentes preferiram rasgar o pedaço de tecido chamuscado e desgastado, e Lily notou que seu ombro esquerdo não estava mais tão pressionado pela veste e que abriu desorientadamente os olhos, as palavras finalmente lhe saíram pela boca. Fracas, insólitas e partidas.
O que seus olhos captaram foi a imagem borrada de alguém ajoelhado ao seu lado, com a face brilhante de suor e de medo. As mãos quentes, agora que sabia de quem pertenciam, não mais a incomodava.
- J-ames? – foi a primeira palavra que se lembrou em dizer.
James arregalou os olhos, lívido e desopilado. Marlene se arrastou até a amiga, embevecida.
- Ah, Lily – sua garganta do jovem pareceu se rasgar pela ânsia de consolá-la – Vai ficar tudo bem.
- Está doendo. Faça parar – choramingou ela.
- O James disse que você vai ficar boa. Você é uma boa menina, não merece morrer – Marlene, em pânico, lhe disse.
James, horrorizado, lançou a Marlene um olhar estarrecido.
- Eu sugiro que a deixem aí. Logo algum animal caçador fará o uso dela. É tão mais fácil – Sirius falou, recostado no tronco de uma frondosa árvore, apenas observando a situação.
- Sirius! – Marlene repreendeu.
- O quê, meu amor? – o rapaz se fez de desentendido, olhando-a cínico.
Marlene não lhe respondeu.
Piratas. Quem, realmente, confiaria em um?
- Olha, se não queres ajudar, não piores a situação – James vociferou, sem nem mesmo dirigir seus olhos a Sirius.
O sangue era muito. Não conseguia estancá-lo de forma total. A área atingida não era muito maior do que a palma de sua mão, mas bem sabia o quanto sentir-se devastado era ruim. O fogo tinha se espalhado tão rapidamente que não houvera tempo para sequer dar um passo. A água se fora, os cantis estavam desocupados; as ervas carregadas por Dorcas não tinham feito o efeito esperado. A marca, se o ferimento se cicatrizasse, deixaria muitas lembranças. Todos desesperados, exceto, claro, Sirius (que preferiu acompanhar o grupo apenas por educação ou por sobrevivência), não sabiam o que fazer para aliviar a dor da Princesa. O choro crescia drasticamente na garganta dos preocupados, repelindo qualquer atitude muito coerente.
Dorcas, a mais furiosa, não se contentara em arrastar a Princesa da praça; ansiava por mais. Precisava machucar igualmente aquela gente ensandecida.
Afinal, de bruxa, todas tinham um pouco. Não propriamente o dom de Lily, mas o fascínio pelo diferente, pelo errado, pela magia, todas carregavam. A maioria dos boticários era incendiada pelos mais inescrupulosos, que julgavam as casas de ervas e perfumarias um afronto aos que nada tinham ou em nada acreditavam.
Se a Princesa era bruxa, a magia se espalhava rasteiramente galho por galho, flor por flor. Era a demônia do povoado. E, certamente, deveria ser erradicada dali. Artemis, ainda que não se aliasse à matança em hipótese nenhuma, não gostaria que as crianças fossem reinadas por uma bruxa, pensavam eles. Assim sendo, a fogueira era o caminho para todas. Sem argumentos, sem misericórdia, todas eram empurradas até a praça para queimarem em frente aos olhos vitoriosos.
Sirius levantou as mãos, como que se desculpando e pedindo uma trégua. A verdade é que ele pouco ligava para a Princesa. A Marinha Espanhola estava farejando seu rastro e ele, sendo um pirata ou não, não dava a mínima para a Princesa de outro país. Claro, poderia ser ainda mais baixo, se a Princesa não tivesse concordado em ajudá-lo a se esconder da Marinha Imperial dos Portos. O Código não mencionava nem uma linha sobre se confraternizar com Princesas desconhecidas que lhe podem dar cobertura em plena década de ascensão marítima, mas tão pouco sequer seguia o Código que os demais piratas nunca descobririam sua farsa.
- Eu não prometi a minha vida a ela, caso algo lhe acontecesse, prometi? – Sirius sorriu maldosamente, agora verificando as unhas encardidas.
James sentiu uma pontada de raiva. E de culpa.
Raiva, primeiramente, porque: que tipo de homem era aquele, que não se mexia ao estar vendo uma donzela claramente em perigo? Ele tinha tentado ao máximo ajudar a Princesa na Praça Principal, era verdade, mas ali? Ali aquele pirata sarnento não estava sendo nadinha prestativo. Ou até mesmo racional. E culpa, porque James tinha certeza de que assim que algo acontecesse à Lily, o culpado era ele. Tinha sido ele que não tinha conseguido salvá-la a tempo, não? Se tivesse feito o que seu coração mandasse...
Se ele não tivesse se entregado tão facilmente, talvez Lily tivesse outro destino. Deus meu, ele pensou, não a deixe morrer, por favor.
Ao menos alguém tinha saído daquela sem seqüelas.
Menfins estava inteiro, e melhor ainda. Operante.
Aparentemente a força mágica de Thalma não conseguiu se abater sob O Mago, o que era um alívio. Assim ele podia ajudar.
Mas ele permanecia na Praça Principal. Tinha feito o grupo conseguir recuperar Lily e tinha tomado a luta para ele.
James não estava realmente feliz por sequer imaginar por quais encantamentos poderosos Menfins estava sendo submetido àquele momento. Já bastava Lily estar morrendo logo ali...
Não, Lily não ia morrer.
O Reino precisava de Lily. Precisava de sua ingenuidade clássica e de sua delicadeza. Precisava de sua humildade e de sua ânsia de fazer tudo melhorar. Precisava até mesmo de seus sorridos encantadores.
Porque... se algo viesse a lhe acontecer, James nunca, jamais, iria se perdoar.
Uma menina morrido em suas mãos, quando tinha claramente dedicado sua vida (não por inteira, mas parte dela) à ela? Não, ele não queria dormir e sonhar com a expressão sôfrega de Lily, nem com seus gemidos de dor. Nem queria também visualizar de novo o sangue que ainda brotava do ferimento.
Se Lily morresse...
- Já atrás de Dorcas e lhe diga que precisamos de trapos. Rápido! – James rugiu para o Pirata. Sua voz transmitia urgência.
Sirius olhou para a vestimenta rasgada da Princesa.
- Sabe, não é, que se vai se aproveitar um pouco mais da inocência desta menina, tem que deixá-la ainda mais nua, não? – Sirius respondeu com peculiaridade no tom de voz.
- Por Artemis, não estou me aproveitando da inocência da Princesa, estou ajudando-a! – James ficou vermelho de fúria.
- Ela não é Bruxa? Não deveria, sei lá, cura-se sozinha ou algo assim? – Marlene perguntou, mostrando-se estar amedrontada.
- Achei que, por ser uma Deusa do Fogo, esse elemento não a ferisse de fato – Sirius comentou.
- Ela é humana, certo? Fogo machuca! – James perdeu a paciência.
- Acho que precisamos de mais ervas – Marlene sugeriu.
Lily agora se debatia sem ao menos saber por quê. Apenas queria arrancar de seu corpo aquele fogo ardente que lhe consumia.
- Não me deixe morrer, por favor – a Princesa choramingou, olhando para James. Sua face brilhava quanto tanto uma moeda de ouro. As lágrimas de pavor lhe inundavam as bochechas – Você me prometeu.
James se culpou novamente.
Preferia passar fome a ter de manter aquela menina no fim da vida em seus braços.
Aquilo o mataria também, caso o pior viesse.
- Não vou. Eu lhe prometi e vou cumprir – James a balançou como se fosse uma criança. Queria sorrir-lhe para tentar dizer que tudo ficaria realmente nos eixos, mas não pôde. Seus lábios não conseguiam se soerguer, por mais que quisesse. A imagem nunca seria desmanchada de sua mente. Nunca. Como pôde tentar, algum dia, matar aquela menina? E agora aquela mesma menina doce estava morrendo tão perto de si, que ele podia sentir seu coração batendo.
- Vá buscar os trapos! – James se dirigiu a Sirius, fingindo que o que realmente queria fazer era bater no Pirata.
- Caramba, achei que você fosse um pirata bom! – Marlene esfregou os olhos, varrida de qualquer lembrança coerente.
Como pôde se apaixonar por... bem, por aquilo? Lily era sua melhor amiga, não podia deixar que ela se esvaísse e nunca tomasse o trono que lhe pertencia. E o pirata não fazia nada para ajudar. Era como se não estivesse agradecido por Lily ter concordado em não denunciá-lo à Marinha.
- Bem, eu sou um bom pirata. Nunca disse que eu era completamente bom. Quem pensou isso foi você. E eu não lhe pedi para me julgar – Sirius retorquiu.
- Você é um cachorro depravado mesmo, não? – Marlene gritou furiosa.
- Se são essas palavras que procura... – Sirius deu de ombro – Tudo bem – ele disse, rolando os olhos – Volto à casa e tento encontrar algo para estancar o resto do sangue.
- Precisamos de barro – James disse.
- Barro? – Marlene quis rir com o absurdo.
- Na guerra, quando nos queimávamos, era o melhor remédio. Claro que é apenas em casos de emergência... como agora, logicamente – James explicou coma voz corrida. Precisava poupar tempo.
- Vou até o leito do Rio – Marlene disse já se virando para o Leste.
- Mas aquilo é barro e provavelmente tem alta alcalinidade – Sirius interveio.
- Se lhe fizer algum mal, logo saberemos. E que não podemos ficar fazendo é isso: esperando que algo aconteça – James disse, não deixando de olhar para Lily quando a menina se agitava.
Ele bem sabia o que era sofrer por queimaduras. Lily não estava se sentindo nada bem.
E ainda que ele soubesse que o ferimento não estivesse não ruim assim (já tinha adquirido muitos piores), não podia deixar de pensar na morte.
Sirius ficou verificando a cena de minuto a minuto. Não entendia como aquilo era possível.
Por que ele não tinha aquela ligação íntima com Marlene?
Por que tudo era tão difícil para Sirius Black?
Sem rumo, sem valor, sem amor.
Por mais quanto tempo ele poderia suportar?
Marlene voltou rápido. Tinha colocado uma boa quantidade de barro escuro em um pedaço de trapo, e James ficou feliz por ter tido a informação certa.
- Agora vai passar, eu juro – James tranqüilizou a Princesa, agora com um pequeno sorriso esboçado nos lábios preocupados.
O barro realmente amenizou a sensação de queimação e logo a dor se diminuiu.
Ainda que Lily estivesse recuperando a consciência absoluta por vários minutos, não deixou de pensar que a pessoa que a estava segurando era alguém que ela nunca poderia esquecer.
Como se esqueceria de alguém que salvou sua vida? Que prezou por ela, quando poderia deixá-la ali, simplesmente?
Quando pensava com maior coerência descobriu por que sabia que nunca poderia esquecer aquela pessoa.
James Potter tinha salvado a sua vida.
Milagrosamente tinha.
- Como estou? – Lily riu, piscando bobamente, sabendo que seu olhar se fixava em apenas um homem.
James arqueou as sobrancelhas.
Lily não poderia estar rindo. Estava ainda debilitada, não estava?
- Lily – James a repreendeu – Não fale nada.
Lily meramente afastou a mão dele de seus cabelos e tentou se acomodar melhor naquele colo.
Tombou sua cabeça no peito dele, desejando que aquela sensação nunca desaparecesse.
- Ah, por Artemis! – Dorcas exclamou, que já estava de volta e sem nenhum ferimento aparente.
Lily olhou para a amiga.
- Acho que ela nunca quis a minha alma jovem demais – Lily disse.
- Ninguém quer almas jovens demais. Nenhum Deus – James apressou-se a dizer.
- Cadê Marlene? – a princesa olhou em volta com precariedade.
- Foi resolver umas coisas com aquele cara – Dorcas respondeu.
- O que vocês acham de voltarmos para o castelo? – Lily lutava para não fechar os olhos e adormecer mais uma vez. Ali, tão perto de James, tudo parecia possível.
- Estou precisando de descanso. E preciso saber do meu pai – Dorcas disse suspirando.
- Claro, nós vamos... – a voz da Princesa morreu enquanto seus olhos verdes se arregalaram.
- Achou que escaparias de mim desta vez, Vossa Alteza? – uma voz de sino serpenteou até os ouvidos dos mais próximos.
Remus, Dorcas e James viraram suas cabeças para a clareira de onde a voz tinha sido propagada.
Uma criatura muito loura e com olhos muito vivos, trajando um vestido negro e uma capa da mesma cor, apareceu na silhueta da floresta. O ar carregado dificultou a entrada de ar para os pulmões de Lily. Sentia como se tudo lhe tivesse sido sugado, assim que ouviu aquela mulher proferindo a primeira palavra.
Sentia, além de tudo, que já deveria conhecer aquela loura dos olhos azuis cristalinos.
Ninguém que ela conhecia tinha algum dia falado com ela daquela maneira. Soava tão despótico e tão impetuoso.
Como aquela imagem podia falar assim com a Princesa?
A menos que...
Mas isso, Lily varreu imediatamente da mente.
Porque não era possível. Como Emmeline poderia estar ali tão rápido? A menos que... bem, aquilo era bastante provável, na verdade. Thalma e Peter estavam claramente sucumbidos a acabar com a Princesa, seja onde ela estivesse. Infelizmente, encontraram-na com muita esperteza. Lily, sendo uma das remanescentes das Deusas, sabia bem onde podia pisar. E certamente ela iria correndo para a Festa das Deusas.
Mas foi nisso que erraram. Ou melhor, acertaram quando Lily errou, porque Lily não queria realmente ficar no Rio do Pó. Justo quando queria se preparar para retroceder, Thalma chegou e a capturou.
- Em-meline? – Lily gaguejou. Não estava com medo. Estava perplexa.
- Olá, Princesa. Acho que sabes quem sou, não? – Emmeline sorriu enviesado.
James ficou alerta. Remus sacou sua espada. Emmeline nem se mexeu.
- Não precisamos de violência, garotos. Sairão ilesos dessa se me entregarem a Princesa – a voz doce, mas ao mesmo tempo autoritária, reverberou pelo local.
- Tu não vais querer fazer isso, Emmeline – Lily lhe comunicou. A Princesa tinha adquirido uma potência de coragem e se levantou de onde estava.
Emmeline era mais alta do que Lily, bem mais do que um palmo, mas a diferença não pareceu incomodar Lily.
Lily, apesar de estar se sentindo bem de verdade realizando tais movimentos, não sabia de onde tinha vindo tanta coragem. Não parecia a mesma menina que estava a menos de duas horas quase morrendo.
A Princesa, no todo, nunca tinha sido covarde, era verdade. Mas corajosa o suficiente a ponto de enfrentar sua maior inimiga apenas com palavras? Onde estava seu poder quando realmente precisava dele?
- E por que não? Esperei anos para poder, enfim, fazer isso. Acabar com ti e com a tua maldita família! – Emmeline confirmou com raiva nos olhos. Uma menina de cabelos ruivos a desafiando? Só pedia para morrer, realmente!
- Deixe minha família fora disso – Lily deu um passo para frente, e sentiu sua mandíbula retesada.
- Deixar teu pai fora disso? – a loura riu de modo áspero - De modo algum! – acrescentou, agora fechando o rosto – Na verdade, era ele quem deveria estar morrendo em teu lugar. Aquele velho miserável... preferiu uma ruiva a mim! – Emmeline parecia furiosa. Seus dentes muito regulares se rangiam e seu semblante estava distorcido – Então, decidi que se queria atingi-lo, deveria procurar a filha renegada dele... e eu a achei, finalmente – sua sobrancelha direita se entortou para cima.
Lily ficou possessa. Ninguém iria tocar em sua família. Seu pai não tinha verdadeiramente se afeiçoado a ela logo de primeira, mas ainda assim não tinha motivos para não querer protegê-lo. Ele fazia parte de um grupo de pessoas que não moravam apenas em sua mente, mas em seu coração.
Lily suspirou, irritada.
- Olhe... isso não tem a ver comigo – ela disse – Sei que nossas ancestrais se odiavam... mas isso não é motivo para tentar fazer a história se repetir – concluiu.
- Não estou tentando fazer a história se repetir, eu vou acabar com ela, isso sim! – Emmeline riu.
- Emmeline... olhe – Lily tentou urgentemente preparar algum discurso lamentoso – As coisas não precisam ser assim. Matar-me não provará que venceu, de fato.
- Tu vais desaparecer e ninguém poderá reinar.
- Então é isso? Queres acabar com a Monarquia?
- Não. Quero me ver lá, na Monarquia – Emmeline disse, achando que Lily fosse uma menina muito precária.
- Mas não vai ser assim que conseguirás! – Lily replicou – Você tinha que ter se casado com meu pai para que...
- Cale a boca! Não me lembre disso! – Emmeline gritou – Ah, por favor. Por que eu não acabo logo com isso? – ela rolou os olhos, irrequieta.
Lily sentiu-se pronta para atacar. Para fazer o que fosse preciso. Não podia deixar que o Reino caísse em mais tão baixas.
Então, foi quando aquilo começou.
O vento mudou, e as correntezas da água do Rio estavam mais rápidas do que nunca. Pareciam borbulhar de tão agitadas.
James trocou um olhar assustado com Lily assim que começou a ouvir o barulho.
Será que... Emmeline iria matar Lily afogada?
E, de todo modo, a Princesa pensou... a Água sempre vence o Fogo. Seu poder de nada adiantaria, naquele momento.
Mas Lily ficou com raiva. Por que seu poder era tão inútil? Seu poder não amenizava nada, só alastrava desgraça. Por que tinha que ser a Deusa do Fogo? Não queria ser. Queria que seu poder lhe dissesse o que fazer, algo que provesse a todos.
Então, outra coisa começou a acontecer, concomitantemente.
O fogo, agora, estava vindo. Lily sentia. Estava queimando de novo. Sua raiva a estava transformando em uma chama acesa.
Sua áurea apareceu, brilhando tão intensamente em sua pele alva que Emmeline apertou os olhos para se proteger da luminosidade.
Sua áurea estava pegando fogo.
Lily estava em chamas.
- Você... Lily, o que estás fazendo? – James perguntou.
Nem mesmo Emmeline foi capaz de dizer algo a mais. Parecia atordoada com a luz.
- E-eu não sei – Lily disse, pensando que a temperatura de seu corpo não estava tão insuportável – Eu fiquei com raiva...
Emmeline, distanciando-se um pouco de Lily, riu.
- Acha que se tornado uma flaminha vai me derrotar?
Lily não disse nada, apenas continuou a experimentar a raiva comer suas entranhas.
Ela já tinha agüentado muitas coisas até ali. Os cochichos das meninas comuns do vilarejo, os olhares de desprezo...
Ela era a Princesa e todos a odiavam por isso. Achavam que ela era superior e que o mundo rodava em torno dela.
E antes mesmo de conhecê-la, todos a julgavam metida e prepotente. Mas o que faltava em Lily era o calor de uma amizade verdadeira. Todos se afastavam e nem queriam ouvir o que ela tinha para dizer. Poucos sabiam que aquelas roupas, o pó de arroz no rosto e os cabelos lindamente penteados eram para esconder o rosto abalado e inchado por causa das lágrimas. As roupas eram um passatempo que ela tinha para tentar esquecer os problemas. Ela realmente tinha vida de princesa, mas todos esqueciam como deveria ser é chato e entediante ser uma Princesa, sempre delicada e com o nariz empinado. Seus pais não queriam ouvir suas tristes palavras e passavam o dia planejando seu futuro. Um futuro que nem mesmo ela sabia se queria aceitar. Enquanto todos pensavam que era uma pessoa má porque era bonita e refinada, a Princesa era a mais doce e mais humilde do que se imagina. Perdendo o tempo de todos, esquecendo da igualdade, cada um vivia sua vida… um sendo ignorante e outro sendo ignorado.
Lily, vagarosamente, sentiu que cada mínima parte de seu corpo estava sendo preenchido por um líquido muito viscoso. E, de repente, o líquido transbordou.
Emmeline gritou, quando foi atingida pela massa laranja.
O fogo estava alto e intenso. Envolveu Emmeline e a sugou para dentro.
Dorcas fez uma careta.
- Eca – ela disse.
Lily, muito ofegante, piscava com força. Não sabia exatamente o que tinha feito, mas Emmeline estava em chamas. Estava sendo castigada da mesma forma que retribuiu à Lily.
James rapidamente agarrou uma das mãos de Lily. Esta continuava quente, mas apenas de um modo comedido.
Emmeline gritava, implorava, suplicava.
- Não! – ela berrava – O que tu fizeste, sua imundinha?
Lily nem soube o que lhe responder. Queria ter uma resposta, mas definitivamente não tinha.
O fogo subia e sumia e levava Emmeline consigo... completamente alheio aos observadores do solo.
- Você acabou com ela, Lily! – Dorcas gritou de alegria, abraçando a amiga.
- E-u não sei o que fiz – Lily confessou.
James sorriu, maravilhado.
Ele estava apaixonado por uma Bruxa que foi capaz de derrotar sua inimiga. O que mais poderia querer?
Emmeline, finalmente, desapareceu com a fumaça longa e negra.
Ela tinha ido. Para sempre.
Lily se permitiu sorrir com cautela e canseira.
- E agora? – ela se perguntou, alto demais.
- Precisamos voltar. Para o castelo – Dorcas disse – Lembra-se?
- Claro. Preciso da minha casa – o coração de Lily se apertou. Lembrou-se de sua mãe. Queria que ela lhe explicasse o que tinha feito ali.
- Teus poderes são bastante úteis, não? – James brincou.
Lily riu e apertou-o entre os braços.
Ali, ela sabia, pouco interessava se era Princesa ou Bruxa. Ela era, ali, apenas uma menina.
x.x.x
Dois dias depois, lá estava o grupo ainda junto. Com os cavalos dados pelo vilarejo do Rio do Pó como agradecimento por Lily ter prevalecido sobre Emmeline, a viagem de volta pareceu bem menos cansativa e bem mais divertida. Todas as meninas já tinham montado em cavalos e acharam extremamente divertido estarem em cima deles por todo o trajeto.
Lily sentiu o cheiro do orvalho do castelo. Era bom estar ali. Muitas lembranças lhe saltaram da mente, introduzindo-a a uma rede de sensações variadas.
Lily não queria que aquilo acabasse, embora soubesse que tudo tinha um fim.
Olhou para a expressão admirada de James; ele observava com espanto os múltiplos tons de verde que despontavam em todos os lugares.
- Uau, esse lugar é incrível – ele disse um pouco atônito com tanta beleza.
- É – Lily confirmou.
James ouviu Lily suspirar pesarosa.
- É. Os minutos estão se esvaindo. Logo nunca mais nos veremos. Nosso relacionamento foi bom, não foi? – ele sorria tão profusamente que Lily mal percebeu seus olhos tristes.
- Somos ótimos juntos. Formaríamos uma boa dupla – Lily falou.
- É... Seu noivo será muito feliz ao seu lado.
- Ele é meu consorte. Já tive vários desde os quinze anos. Sempre que meu pai fazia elos com outros Reis, e se esses Reis tinham filhos homens, ele prontamente me colocava a leilão.
- Aposto que teve uma vida bastante agitada.
- Nem tanto. Não gosto de nenhum daqueles Príncipes.
- Parece que cada um tem habilidades únicas. Deveria experimentar. Digo, a aventura.
- Não gosto mais de aventuras. Já me estabilizei. Já encontrei alguém. Há alguns dias, realmente cria que estava condenada a esse mundo de pessoas muito importantes e influentes, mas agora tenho absoluta certeza que quero aproveitar o resto de minha vida ao lado de apenas uma pessoa.
- Ah. Entendo.
Lily o encarou seriamente. O sorriso nos lábios dele ainda não tinha esmorecido, embora tampouco aparentasse plena felicidade. Sem maquinar muito, juntou seus dedos frios aos dele. Ele sempre seria mais quente do que ela e Lily não se incomodava. A sensação era confortável e lhe trazia boas lembranças. James não fez objeção. Logo teria de deixá-la e se não se despedisse demoradamente dela, não sabia se conseguiria sumir da vida da Princesa.
- Ele é Cavaleiro – ela disse.
James apenas suportava os olhos dela nos seus, quase difundidos tão docemente, porque a Princesa não era qualquer uma. Era a Princesa dele. Apenas dele. Agüentaria ir aos Confins do Mundo junto àquela dama.
- Espero que sejas bem melhor em pontaria do que eu – James riu baixo, pesaroso - E que tenha um bom cavalo selado.
- É, considerando que esse Cavaleiro quase tentou me matar dias atrás e não conseguiu, não sei se posso julgar tanto assim as habilidades dele em pontaria. E seu cavalo foi roubado.
James abriu a boca para retorquir qualquer frase divertida, mas parou no meio da ação. Seus lábios ficaram entreabertos, a garganta engolindo o ar frio do fim de tarde. Logo, sua mão entrelaçada na dela escorregou daqueles dedos longos e femininos.
- Lily... – a testa de James estava enrugada, demonstrando toda a sua confusão e incredulidade.
Lily sorriu.
- Achou mesmo que eu fosse lhe deixar escapar?
- Bem. Voltemos aos fatos: eu tentei matá-la, seqüestrei-a e quase a deixei morrer há apenas dois dias. Acho que é completamente louca se não me deixar partir.
- Tudo bem. Todos me dizem que sou louca, de um modo ou de outro. Então, estou acostumada.
- Essa não é a questão.
- Claro que é. E você será o louco que pedirá minha mão. Tão simples que eu poderia duvidar disso tudo.
- Eu estou duvidando.
- Então não duvide. A magia acabou. Você está no mundo real. No mundo em que eu o amo e o quero para sempre.
- Por que és sempre tão convencida? – James riu.
- Não sou tão diferente de você.
Ingênuos, apenas continuaram naquelas posições. James a admirando minuciosamente, indesejando qualquer intromissão; Lily, convicta, não tirava seus olhos dos dele. Mover-se dali, possivelmente, os denunciariam e não era o que queriam. Precisam da quase escuridão e do afastamento do grupo. O momento era só deles.
A Princesa e o Cavaleiro.
Estavam tão mergulhados um no outro, que mal notaram quando a aproximação se fez muito presente entre eles. As pontas dos dedos de James roçavam deliberadamente nas de Lily. Então, o simples toque (aquele toque que ambos ansiavam) ocorreu. Fora ele que dera passagem para que aos pensamentos fluíssem com mais espaçamento e para que, afinal, tudo se restabelecesse.
A felicidade, aos poucos, foi tomando os corpos dele e dela.
Os lábios dele pediram gentilmente permissão para experimentar, pela primeira vez, alguma parte do corpo da Princesa que não fosse o local de seu ferimento recém-adquirido ou seus dedos. De olhos ainda abertos, Lily, sem saber o que ele realmente esperava daquilo, arfou baixo. E se aquilo não fosse o certo?
Ora, ela, uma Princesa que não tinha completado os anos que a tornariam reinante daquelas terras, deixando-se tentar por um cavaleiro-seqüestrador cujo tempo de convivência não passara de uma semana? O que a Rainha falaria? Que tinha manchado sua honra de dama? Mas e se a Princesa não mais precisasse de ratinhos ao seu redor? Podia muito bem se entregar àquele homem. Não pensar na mãe e não associar aquele beijo a algo esdrúxulo funcionava perfeitamente. Lily, não mais ligando para quem quer que fosse, não deixou que o beijo se partisse, aproveitando todos os pequenos segundos dele.
James, grudado suavemente em sua boca, era ainda mais fervoroso. Mais apaixonante e envolvente.
- Posso pensar em pedir a tua mão se prometeres que faremos isso mais vezes até a tua coroação – James, assim que abriu os olhos, encontrando os de Lily ainda fechados, brincou com o sorriso bobo que ali nascera milésimos depois.
- Ei, isso é chantagem – Lily riu, divertida, olhando definitivamente para cima, para os olhos de James.
- Não, é compromisso – corrigiu James, voltando a juntar seus dedos nos dela.
- Venhas, precisamos chegar ao castelo – Lily o puxou, apontando entre as árvores.
As tochas do jardim, vigiado e guardado por homens com quinquilharias diferentes, eram visíveis daquela clareira tão bem, que Lily quase conseguia sentir a maciez de seu colchão.
- Achas que teu Império apenas, de fato, depende de ti? – James lhe perguntou ao seu ouvido, enquanto voltavam para onde Dorcas e Remus e Sirius e Marlene se encontravam, todos muito ocupados em admirar o vasto Vale.
- Ele sempre apenas dependeu de mim, James. Eu sempre fui a esperança de Artemis.
- E tu gostas desse fardo?
- Agora estou aprendendo a apreciar. E aposto como seremos tão bons para esse povo que estaremos vivos por muitas e muitas décadas, mesmo após a nossa morte.
- Tu pensas grande, Princesa – James constatou – Eu gosto disso.
:::
N/a: heey, yeey (?) nem acredito que finalizei esse capítulo com tanta rapidez, considerando toda a rotina de estudos e tal. Tipo assim, eu não sei realmente o que achar desse capítulo. O "enfrentamento" entre a Lily e a Emmeline, para mim, ficou meio tosco, mas né. Pode ser só a minha opinião. Se também acharam esse cena tosca escrevam (: Eu não queria que fosse nada tipo: "e ela venceu por causa do amor *-*". Eu não acho isso muito "uau", sabe? hahaha. Quero dizer, um monte de filmes e livros se baseiam apenas no amor... e isso se torna, sabe como é, repetitivo. E eu não queria que essa fic fosse apenas mais uma réplica do que já existe. Prometo que até semana que vem eu posto o epílogo para vocês (: E já sabem: comentem *-* beijo beijo ;*
#ps: ignorem os erros de gramática e tal. Eu meio que só passei os olhos por cima do capítulo (:
Nina H.
29/03/2011
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