CINCO



Cinco


 


Pois é. Não importa, porque vou ser promovida. Então Simas vai parar de fazer piadinhas sobre minha carreira e eu vou poder pagar ao papai. Todo mundo vai ficar impressionado – e vai ser maravilhoso!


Acordo na segunda-feira de manhã me sentindo empolgada e positiva, e me visto com a roupa usual de trabalho, jeans e uma blusa bonita da French Connection.


Bem, não exatamente da French Connection. Para ser honesta, comprei na Oxfam. Mas a etiqueta diz French Connection. E enquanto estou pagando ao papai, não tenho muita opção de onde fazer compras. Quero dizer, uma blusa nova da French Connection custa umas cinqüenta pratas, e essa custou 7,50. E é praticamente nova!


Enquanto subo depressa os degraus do metrô, o sol está brilhando e eu me sinto cheia de otimismo. Imagine se eu for promovida! Imagine eu contando a todo mundo. Mamãe vai dizer: “Como foi a sua semana?” E eu respondo: “Bem, mamãe, na verdade...”


Não, o que vou fazer é esperar até ir na casa dela, e então entregar casualmente meu novo cartão de visita.


Ou talvez eu apenas vá no carro da empresa, penso empolgada! Quero dizer, não sei se algum dos outros executivos de marketing tem carro – mas nunca se sabe, não é? Eles podem introduzir isso como uma coisa nova. Ou podem dizer: “Hermione, nós escolhemos você especialmente...”


- Hermione!


Viro a cabeça e vejo Luna, minha amiga do departamento de pessoal, subindo a escada do metrô atrás de mim, ofegando ligeiramente. Seu cabelo loiro está todo revolto, e ela está segurando um dos sapatos.


- O que aconteceu? – pergunto quando ela chega ao topo.


- A droga do sapato – exclama Luna desconsolada. – Mandei consertar um dia desses, e o salto se soltou. – Ela o balança na minha direção. – Paguei seis pratas por esse salto! Meu Deus, este dia está sendo um desastre. O leiteiro esqueceu de levar o meu leite,e eu tive um fim de semana terrível...


- Pensei que você ia passar com Justin – falo, surpresa. – O que aconteceu?


Justin é o último namorado de Luna. Os dois estão se encontrando há algumas semanas, e ela ia visitar o chalé no campo, que ele está arrumando nos fins de semana.


- Foi horrível! Assim que a gente chegou, ele disse que ia jogar golfe.


- Ah, certo. - Tento achar um ângulo positivo. – Bem, pelo menos Justin se sente à vontade com você. Ele pode agir normalmente.


- Talvez. - Ela me olha em dúvida. – Mas aí ele perguntou: o que eu achava de dar uma mãozinha enquanto ele estava fora? Eu disse que claro, e então ele me deu um pincel e três latas de tinta, e disse que eu conseguiria pintar a sala de estar, se trabalhasse rápido.


- O quê?


- E ele só voltou às seis horas. E disse que minha pintura era descuidada! – A voz dela se ergue, cheia de espanto. – Não era descuidada! Eu só manchei um pouquinho, e isso porque a porcaria da escada era pequena demais.


Encaro-a.


- Luna, você não está me dizendo que pintou a sala.


- Bem... pintei. – ela me encarava com seus grandes olhos azuis. – Sabe, para ajudar. Mas agora estou começando a pensar... será que ele está me usando?


Estou quase sem fala, de tanta incredulidade.


- Luna, claro que ele está usando você – consigo dizer finalmente. – Ele quer uma pintora-decoradora grátis! Você tem de dar um pé na bunda dele. Imediatamente. Agora!


Luna fica quieta alguns segundos, e eu a encaro meio nervosa. Seu rosto está inexpressivo, mas dá para ver que um monte de coisas acontece por baixo da superfície. É como quando o tubarão do filme desaparece embaixo da água, e a gente sabe que a qualquer minuto...


- Ah, meu Deus, você está certa! – explode ela subitamente. – Você está certa. Ele vem me usando! A culpa é minha. Eu deveria ter percebido quando ele me perguntou se eu tinha alguma experiência com encanamento ou montagem de telhado.


- Quando foi que ele perguntou isso? – digo incrédula.


- No nosso primeiro encontro! Eu achei que ele só estava, você sabe, jogando conversa fora.


- Luna, a culpa não é sua. - Aperto o braço dela. – Você não podia saber.


- Mas o que há comigo? – Luna pára na rua. – Por que eu só atraio uns merdas completos?


- Não é verdade!


- É sim! Olha os homens que eu namorei. – Ela começa a contar nos dedos. – Daniel pegou todo aquele dinheiro emprestado comigo e fugiu para o México. Gary me deu o pé na bunda assim que eu arranjei emprego para ele. David estava me traindo. Você consegue ver um padrão surgindo?


- Eu... hmm... – murmuro, desamparada. – Talvez...


- Eu acho que deveria desistir. – Seu queixo cai. – Nunca vou encontrar ninguém.


- Não – digo imediatamente. – Não desista! Luna, eu sei que sua vida vai dar uma reviravolta. Você vai achar um homem amoroso, gentil, maravilhoso...


- Mas onde? – pergunta ela desesperançada.


- Eu... não sei. – Cruzo os dedos às costas. – Mas sei que vai acontecer. Tenho um sentimento realmente forte com relação a isso.


- Verdade? – Ela me encara. – Tem mesmo?


- Sem dúvida! – Penso depressa um momento. – Olha, uma idéia. Por que você não tenta... ir almoçar num lugar diferente hoje? Um lugar totalmente diferente. E talvez você conheça alguém lá.


- Você acha? – Ela me encara. – Certo. Vou tentar.


Luna solta um suspiro fundo, e começamos a andar de novo pela calçada.


- A única coisa boa do fim de semana – conta ela quando chegamos à esquina – é que eu terminei de fazer minha blusa nova. O que acha?


Ela tira o casaco com orgulho e dá um rodopio, e eu a encaro por alguns segundos, sem saber direito o que falar.


Não é que eu não goste de crochê.


Certo. É que eu não gosto de crochê.


Especialmente blusas de crochê de gola alta e ponto aberto. Dá para ver o sutiã por baixo.


- É... incrível – consigo dizer enfim. – Muito bonita!


- Não é ótima? – Ela dá um sorriso agradável. – E foi tão rápido! Depois eu vou fazer a saia para combinar.


- Que ótimo – comento debilmente. – Você é inteligente demais.


- Ah, não é nada. Eu gosto de fazer essas coisas.


Luna dá um sorriso modesto e recoloca o casaco.


- E aí, e você? – acrescenta ela quando começamos a atravessar a rua. – Teve um bom fim de semana? Aposto que sim. Aposto que Draco foi completamente maravilhoso e romântico. Aposto que ele levou você para jantar ou alguma coisa assim.


- Na verdade Draco pediu para eu morar com ele – revelo, sem jeito.


- Verdade? – Luna me olha cheia de desejo. – Meu Deus, Hermione, vocês formam o casal perfeito. Você me dá fé de que isso pode acontecer. Tudo parece tão fácil para você!


- Não é tão fácil – discordo, com um risinho de modéstia. – Quero dizer, a gente discute, como todo mundo.


- Verdade? – Luna parece surpresa. – Eu nunca vi vocês discutirem.


- Claro que a gente discute!


Reviro o cérebro procurando um momento, tentando me lembrar da última vez em que Draco e eu brigamos. Quero dizer, é claro que a gente tem discussões. Um monte. Todos os casais têm. Isso é saudável.


Qual é, isso é idiota.  A gente deve ter...


Isso. Houve aquela vez perto do rio, quando eu pensei que aqueles pássaros grandes eram gansos e Draco achou que eram cisnes. Exato. Nós somos normais. Eu sabia.


 


Estamos chegando perto do edifício Panther, e quando subimos os degraus de pedra clara, cada um com uma pantera de granito saltando, começo a me sentir nervosa. Paul vai querer um relatório completo da reunião com a Glen Oil.


O que eu devo dizer?


Bem, obviamente vou ser totalmente franca e honesta. Sem realmente dizer a verdade...


- Ei, olha. – A voz de Luna me interrompe e eu sigo seu olhar. Através da fachada de vidro do prédio vejo uma agitação no saguão. Isso não é normal. O que está acontencendo?


Meu Deus, será que houve um incêndio ou alguma coisa assim?


Quando Luna e eu passamos pelas pesadas portas giratórias, olhamo-nos perplexas. O lugar inteiro está num tumulto. Pessoas correm de um lado para o outro, alguém está polindo o corrimão de latão, outra pessoa está limpando as plantas artificiais, e Cyril, o gerente-geral, está empurrando pessoas para dentro dos elevadores.


- Podem ir para as suas salas, por favor? Nós não queremos vocês na recepção. Todos já deveriam estar em seus lugares. – Ele parece totalmente estressado. – Não há nada para ver aqui embaixo! Por favor, vão para as suas mesas.


- O que está acontecendo? – pergunto a Dave, o segurança que está encostado na parede com uma xícara de chá, como sempre. Ele toma um gole, faz a bebida girar na boca e ri para nós.


- Harry Potter vem fazer uma visita.


- O quê? – Nós duas o olhamos boquiabertas.


- Hoje?


- Está falando sério?


No mundo da Corporação Panther, é como dizer que o papa vem fazer uma visita. Ou Papai Noel. Harry Potter é um dos fundadores da Corporação Panther. Ele inventou a Panther Cola. Sei disso porque digitei elogios sobre ele aproximadamente um milhão de vezes. “Em 1993 os jovens e dinâmicos sócios Harry Potter e Ronald Weasley compraram a fábrica de refrigerantes Zoot, remodelaram a Zootacola, transformando-a na Panther Cola, inventaram o slogan ‘Não Pare’ e com isso fizeram história no marketing.”


Não é de espantar que Cyril esteja histérico.


- Dentro de uns cinco minutos – Dave consulta seu relógio. – Mais ou menos.


- Mas... mas como? – espanta-se Luna. – Quero dizer, ele resolveu vir do nada, assim?


Os olhos de Dave brilham. Parece que passou a manhã toda comunicando a notícia a todo mundo, e está se divertindo de montão.


- Harry Potter quer dar uma olhada na filial do Reino Unido.


- Eu pensei que ele não atuava mais na empresa – comenta Parvati, da Contabilidade, que veio atrás de nós, de casacão, e está ouvindo boquiaberta. – Eu achei que, desde que Ronald Weasley morreu, ele estava curtindo o sofrimento, recluso. No rancho dele, ou sei lá o quê.


- Isso foi há três anos – observa Luna. – Talvez ele esteja se sentindo melhor.


- É mais provável que esteja querendo vender a empresa – objeta Parvati, sombria.


- Por quê?


- Nunca se sabe.


- Minha teoria – manifesta-se Dave, e todas inclinamos a cabeça para ouvir – é que ele quer ver se as instalações estão suficientemente brilhantes. – Em seguida assente na direção de Cyril, e todos rimos.


- Cuidado – grita Cyril. – Não estrague os galhos. – Ele ergue os olhos. – O que vocês ainda estão fazendo aí?


- Já vamos! – responde Luna, e nós nos dirigimos à escada, que eu sempre uso porque significa que não tenho de me preocupar com malhação. Além disso, por sorte, o marketing fica no primeiro andar. Acabamos de chegar ao patamar quando Parvati estrila:


- Olha! Ah, meu Deus! É ele!


Uma limusine chegou ronronando pela rua e parou bem na frente das portas de vidro.


O que é que há em certos carros? São tão brilhantes e polidos que é como se fossem feitos de um metal completamente diferente dos carros normais.


Como se acionadas por um mecanismo de relógio, as portas dos elevadores na outra extremidade do saguão se abrem e saem Graham Hillingdon, o executivo-chefe, além do diretor administrativo e uns seis outros, todos parecendo imaculados em ternos-escuros.


- Já chega! – está sibilando Cyril para os pobres faxineiros no saguão. – Vão embora! Deixem assim!


Nós três ficamos paradas, arregaladas como crianças, quando a porta do carona da limusine se abre. Um instante depois sai um homem de cabelos castanhos e sobretudo negro. Está usando óculos escuros e segurando uma pasta de aparência muito cara.


Uau. Ele todo parece muito caro.


Agora Graham Hillingdon e os outros estão todos do lado de fora, enfileirados nos degraus. Apertam a mão dele um de cada vez, depois o trazem para dentro, onde Cyril está esperando.


- Bem-vindo à Corporação Panther, Reino Unido – enuncia Cyril com servilismo. – Espero que sua viagem tenha sido agradável.


- Não foi má, obrigado – responde o homem, com sotaque americano.


- Como o senhor pode ver, este é um dia normal de trabalho...


- Ei, olha – murmura Luna. – Kenny ficou do lado de fora.


Kenny Davey, um dos designers, está inseguro nos degraus do lado de fora, vestido com seus jeans e botas de beisebol, sem saber se entra ou não. Coloca uma das mãos na porta, depois recua um pouco, depois chega à porta de novo e espia incerto para dentro.


- Entre, Kenny! – rosna Cyril com um sorriso bastante selvagem. – Um dos nossos designers, Kenny Davey. Você deveria ter chegado há dez minutos, Kenny. Mesmo assim, não faz mal! – Ele empurra o perplexo Kenny para os elevadores, depois ergue os olhos e sinaliza para irmos embora, irritado.


- Venham – propõe Luna. – É melhor a gente ir. – E, tentando não gargalhar, as três subimos depressa a escada.


 


A atmosfera no departamento de marketing está meio como o meu quarto antes de irmos para festas na sexta série. Pessoas escovam os cabelos, borrifam perfume, folheiam papéis e fofocam empolgadas. Quando passo pela sala de Neil Gregg, encarregado de estratégia de mídia, vejo-o arrumando cuidadosamente seu prêmios de Eficácia de Marketing sobe a mesa, enquanto Fiona, a secretária, dá polimento nas fotografias emolduradas em que ele aperta as mãos de pessoas importantes.


Estou pendurando meu casaco no cabide quando Paul, o chefe do departamento, me puxa de lado.


- Que porra aconteceu na Glen Oil? Eu recebi um e-mail muito estranho de Doug Hamilton hoje cedo. Você derrubou bebida em cima dele?


Encaro-o chocada. Doug Hamilton contou ao Paul? Mas ele prometeu que não contaria!


- Não foi bem assim – digo rapidamente. – Eu só estava tentando demonstrar as muitas qualidades da Panther Prime e... meio que deixei derramar. – Paul levanta as sobrancelhas, não de modo amigável.


- Certo. Foi pedir muito a você.


- Não – tento contornar. – Quero dizer, teria sido tudo ótimo se... o que eu quero dizer é que, se você me der outra chance, eu vou fazer melhor. Prometo.


- Veremos. – Ele olha o relógio. – É melhor andar depressa. Sua mesa está uma zona do caramba.


- Certo. Bem, a que horas vai ser minha avaliação?


- Hermione, se é que você não sabe, Harry Potter está visitando a gente hoje – grunhe Paul, em sua voz mais sarcástica. – Mas, claro, se você acha que sua avaliação é mais importante do que o cara que fundou a empresa...


- Eu não quis dizer isso... só...


- Vá arrumar sua mesa – manda Paul com a voz entediada. – E se derramar Panther Prime no Potter, está demitida.


Enquanto vou para a minha mesa, Cyril entra na sala, parecendo atormentado.


- Atenção! - chama ele, batendo palmas. – Atenção todo mundo! Esta é uma visita informal, nada mais. O Sr. Potter vai entrar, talvez falar com um ou dois de vocês, observar o que vocês fazem. Por isso quero que todos ajam normalmente, nos seus padrões mais elevados... O que são esses papéis? – Diz ele de repente, olhando para uma pilha de provas, muito bem arrumada, no canto, ao lado da mesa de Fergus Grady.


- É a... hmm... a arte da nova campanha da Panther Gum – responde Fergus, que é muito tímido e criativo. – Eu não tinha espaço na mesa.


- Bom, isso não pode ficar aí! – Cyril pega os papéis e empurra em cima dele. – Livre-se disso. Agora, se ele fizer uma pergunta a algum de vocês, só sejam agradáveis e naturais. Quando ele chegar, quero que todos estejam trabalhando. Só fazendo tarefas típicas que vocês estariam fazendo naturalmente no correr de um dia normal. – Ele olha em volta, distraído. – Alguns de vocês podem estar ao telefone, alguns podem estar digitando nos computadores... uns dois podem estar numa discussão criativa... Lembrem-se, este departamento é o centro da empresa. A Corporação Panther é conhecida pelo brilho de seu marketing!


Ele pára e todos o olhamos feito idiotas.


- Andem! – Ele bate palmas de novo. – Não fiquem aí parados. Você! – Ele aponta para mim. – Ande. Mexa-se!


Ah meu Deus. Minha mesa está completamente coberta de coisas. Abro uma gaveta e enfio um monte de papéis dentro, então, num ligeiro pânico, começo a arrumar as canetas no pote. Na mesa ao lado, Pansy Parkinson está retocando o batom.


- Vai ser muito inspirador conhecê-lo – comenta ela, admirando-se no espelhinho de mão. – Sabe, um monte de gente acha que ele mudou sozinho a cara do marketing. – O olhar dela pousa em mim. – Essa blusa é nova, Hermione? De onde é?


- É... French Connection – digo depois de uma pausa.


- Eu estive na French Connection na semana passada. – Seus olhos estão se estreitando. – Não vi esse modelo.


- Bem, deve ter acabado. – Viro-me para o outro lado e finjo que estou organizando a gaveta de cima.


- Como é que a gente chama o cara? – pergunta Padma. – Sr. Potter ou Harry?


- Cinco minutos sozinho com ele – está insistindo Zach, um dos executivos de marketing, febrilmente ao telefone. – É só disso que eu preciso. Cinco minutos para convencê-lo da idéia do site. Puxa, meu Deus, se ele topasse...


Nossa, o ar de empolgação é contagiante. Com um jorro de adrenalina, vejo-me pegando o pente e verificando o brilho labial. Puxa, nunca se sabe. Talvez ele veja meu potencial, sei lá. Talvez ele me separe da multidão!


- Certo, pessoal – anuncia Paul, entrando no departamento. – Ele está neste andar. Vai primeiro na Administração...


- Continuem com as tarefas cotidianas! – exclama Cyril. – Agora!


Puta que o pariu. Qual é minha tarefa cotidiana?


Pego o telefone e digito o código da caixa de mensagens. Posso estar ouvindo os recados.


Olho o departamento em volta – e vejo que todo mundo fez a mesma coisa.


Não podemos estar todos ao telefone. Isso é muito estúpido! Certo, só vou ligar o computador e esperar que ele esquente.


Quando olho a tela mudando de cor, Pansy começa a falar alto.


- Acho que toda a essência do conceito é vitalidade – exclama ela, com o olhar saltando constantemente para a porta. – Sabe o que eu quero dizer?


- É... sei – responde Zach. – Quero dizer, num ambiente moderno de marketing, acho que precisamos buscar uma... é... fusão de estratégia com uma visão de pensamento avançado...


Meu Deus, meu computador está lento hoje. Harry Potter vai chegar e eu vou estar olhando para ele, como uma imbecil.


Sei o que vou fazer. Vou ser a pessoa que está pegando um café. Quero dizer, o que pode ser mais natural do que isso?


- Acho que vou pegar um café – digo sem jeito, e me levanto.


- Pode pegar um para mim? – pede Pansy, erguendo os olhos brevemente. – Bem, de qualquer modo, no meu curso de MBA...


A máquina de café fica perto da entrada do departamento, numa pequena reentrância. Enquanto espero que o líquido mefítico encha o copo, olho para cima e vejo Graham Hillingdon saindo do departamento de administração, seguido por alguns outros. Merda! Ele está vindo!


Certo. Fique fria. Só espere o segundo copo encher, bem natural...


E aí está ele! Com seu cabelo castanho, o terno caro e os óculos escuros. Mas, para minha ligeira surpresa, ele recua, saindo do caminho.


De fato, ninguém está sequer olhando para ele. A atenção de todo mundo está concentrada em outro cara. Um cara de jeans e gola rulê preta que vem saindo agora.


Enquanto olho fascinada, ele se vira. E quando vejo seu rosto sinto uma pontada gigantesca, como se uma bola de boliche tivesse se chocado contra o meu peito.


Ah meu Deus.


É ele.


Os mesmos olhos verdes. As mesmas rugas desenhadas ao redor. A barba está feita, mas com certeza é ele.


O homem do avião.


O que ele está fazendo aqui?


E por que a atenção de todo mundo está grudada nele? Agora ele está falando, e os outros saltam diante de cada palavra.


Ele se vira de novo, e eu instintivamente recuo para não ser vista, tentando ficar calma. O que ele está fazendo aqui? Ele não pode...


Não pode ser...


Não pode ser de jeito nenhum...


Com as pernas bambas, volto à minha mesa, tentando não derramar o café no chão.


- Ei – chamo Pansy, com a voz ligeiramente aguda demais. – Hrm... você sabe como é Harry Potter?


- Não – responde ela, e pega o café. – Obrigada.


- Cabelo negro – informa alguém.


- Negro? – engulo em seco. – Não é castanho?


- Ele está vindo para cá! – sussurra alguém. – Está vindo!


Com as pernas moles, afundo-me na cadeira e tomo um gole de café, sem sentir o gosto.


- ...nosso chefe de marketing e promoções, Paul Fletcher – ouço Graham dizendo.


- Prazer em conhece-lo, Paul. – É a mesma voz seca, americana.


É ele. É definitivamente ele.


Certo, fique calma. Talvez ele não se lembre de mim. Foi um vôo curto. Ele deve viajar muito de avião.


- Pessoal. – Paul está guiando-o ao centro da sala. – Tenho o enorme prazer de apresentar nosso fundador, o homem que influenciou e inspirou uma geração de profissionais de marketing: Harry Potter!


Todo mundo aplaude, e Harry Potter balança a cabeça, sorrindo.


- Por favor – pede ele. – Não precisa. Só façam o que vocês fazem normalmente.


Ele começa a andar pela sala, parando de vez em quando para falar com pessoas. Paul vai guiando-o, fazendo todas as apresentações, e, seguindo-os em silêncio a toda parte, está o de cabelo castanho.


- Aí vem ele! – sibila Pansy, e todo mundo na nossa ponta da sala se enrijece.


Meu coração começa a martelar, e eu me afundo na cadeira, tentando me esconder atrás do computador. Talvez ele não me reconheça. Talvez não lembre. Talvez não...


Porra. Ele está me olhando. Vejo o clarão de surpresa em seus olhos, e ele ergue as sobrancelhas.


Ele me reconhece.


Por favor, não venha, rezo em silêncio. Por favor, não venha até aqui.


- E quem é esta? – pergunta ele ao Paul.


- Esta é Hermione Granger, uma das nossas assistentes de marketing.


Ele está vindo na minha direção. Pansy parou de falar. Todo mundo está olhando. Estou fervendo de vergonha.


- Olá – diz ele em voz agradável.


- Olá – consigo dizer. – Sr. Potter.


Certo, então ele me reconheceu. Mas isso não significa necessariamente que se lembre de alguma coisa que eu disse. Alguns comentários aleatórios feitos por uma pessoa na poltrona ao lado. Quem vai se lembrar disso? Talvez ele nem tenha ouvido.


- E o que você faz?


- Eu... é... trabalho como assistente do departamento de marketing e ajudo a estabelecer iniciativas promocionais – murmuro.


- Hermione esteve em Glasgow na semana passada, a trabalho – intervém Paul, dando-me um sorriso completamente falso. – Nós acreditamos em passar responsabilidades aos nossos funcionários iniciantes sempre que possível.


- Muito sensato – concorda Harry Potter. Seu olhar percorre minha mesa e se ilumina com interesse súbito no meu copo de isopor. – Como está o café? – pergunta ele em tom agradável. – Gostoso?


Como uma gravação na minha cabeça, subitamente ouço minha voz estúpida arengando.


- O café lá no trabalho é a coisa mais nojenta que alguém já bebeu, um veneno absoluto...


- É ótimo! – respondo. – Realmente... delicioso!


- Fico feliz em saber. – Há uma fagulha de diversão nos olhos dele, e eu me sinto ficando vermelha.


Ele lembra. Porra. Ele lembra.


- E esta é Pansy Parkinson – continua Paul. – Uma das nossas mais brilhantes jovens executivas de marketing.


- Pansy – murmura Harry Potter em tom pensativo. Ele dá alguns passos até a mesa dela. – É uma bela mesa, e grande, a sua, Pansy. – Ele sorri para ela. – É nova?


- ...chegou uma mesa nova outro dia, e ela simplesmente pegou...


Ele se lembra de tudo, não é? Tudo.


Ah meu Deus. Que outras coisas eu disse, porra?


Estou sentada perfeitamente imóvel com minha agradável expressão de boa funcionária, enquanto Pansy dá alguma resposta metida a besta. Mas minha mente está freneticamente rebobinando, tentando lembrar, tentando juntar o que eu disse. Puxa, meu Deus, eu contei a esse cara tudo sobre minha vida. Tudo. Contei que tipo de calcinha eu uso, de que sabor de sorvete eu gosto, como perdi minha virgindade e...


Meu sangue fica gelado.


Estou lembrando de uma coisa que eu não devia ter dito a ele.


Uma coisa que não deveria ter dito a ninguém.


- ...sei que não deveria ter feito isso, mas eu queria tanto o emprego...


Falei a ele que menti sobre minha nota A no currículo.


Bem, é isso. Estou morta.


Ele vai me demitir. Vou ter uma ficha de desonesta e ninguém nunca mais vai me dar emprego, e vou terminar no documentário sobre os “Piores empregos da Grã-Bretanha’, limpando bosta de vaca e dizendo toda alegre: “Na verdade não é tão ruim.”


Certo. Não entre em pânico. Deve haver alguma coisa que eu possa fazer. Vou pedir desculpas. É. Vou dizer que foi um erro de avaliação do qual me arrependo profundamente, e que nunca quis enganar a empresa, e...


Não. Vou dizer: “Na verdade eu tirei nota A, ha ha, que idiota, eu esqueci! E depois vou falsificar o certificado do GCSE com um daqueles kits de caligrafia. Puxa, ele é americano. Nunca vai saber.


Não. Ele pode acabar descobrindo. Ah meu Deus. Ah meu Deus.


Certo, talvez eu esteja reagindo com exagero. Vamos colocar as coisas nas devidas proporções. Harry Potter é um cara importantíssimo. Olha só! Ele tem limusines e lacaios, e uma empresa gigantesca que rende milhões por ano. Não se importa se uma de suas funcionárias tirou uma porcaria de A ou não. Puxa, honestamente!


Rio alto do meu nervosismo, e Pansy me lança um olhar estranho.


- Eu gostaria de dizer que fiquei muito feliz em conhecer todos vocês – diz Harry Potter, olhando o escritório silencioso ao redor. – E também apresentar meu assistente Neville Longbottom. – Ele sinaliza para o cara de cabelo castanho. – Eu vou ficar aqui alguns dias, portanto espero conhecer melhor alguns de vocês. Como vocês sabem, Ronald Weasley, que fundou comigo a Corporação Panther, era inglês. Por esse motivo, dentre outros, este país sempre foi muito importante para mim.


Um murmúrio simpático percorre a sala. Ele levanta uma das mãos, faz um discreto cumprimento com a cabeça e vai embora, seguido por Neville e todos os executivos. Há silêncio até ele sumir, depois irrompe uma balbúrdia empolgada.


Sinto todo o corpo afrouxar de alívio. Graças a Deus. Graças a Deus.


Honestamente. Como sou imbecil. Imaginando apenas por um momento que Harry Potter iria se lembrar do que eu disse. Quanto mais se importar com isso! Imaginando que ele tiraria tempo de sua programação ocupada, importante, para alguma coisa tão insignificante quanto eu ter falsificado meu currículo ou não! Quando estendo a mão para o mouse e clico num novo documento, estou sorrindo.


- Hermione. – Levanto os olhos e  vejo Paul parado junto da minha mesa. – Harry Potter gostaria de ver você – informa peremptoriamente.


- O quê? – Meu sorriso desaparece. – Eu?


- Na sala de reunião, em cinco minutos.


- Ele disse por quê?


- Não.


Paul se afasta, e eu olho minha tela de computador sem enxergar, sentindo náuseas.


Eu estava certa da primeira vez.


Vou perder o emprego.


Vou perder o emprego por causa de um comentário idiota numa droga de uma viagem de avião.


Por que eu tive de mudar de classe no vôo? Por que eu tive de abrir a porra da minha boca? Não passo de uma tagarela idiota, idiota.


- Por que Harry Potter quer ver você? – pergunta Pansy, parecendo chateada.


- Não sei.


- Ele quer ver mais alguém?


- Não sei – digo distraidamente.


Para impedir que ela faça mais perguntas, começo a digitar qualquer coisa no computador, a mente girando e girando.


Não posso perder esse emprego. Não posso arruinar mais uma carreira.


Ele não pode me demitir. Não pode. Não é justo. Eu não sabia quem ele era. Puxa, obviamente se ele tivesse dito que era meu patrão, eu nunca teria falado do currículo. Nem... de nada.


E, de qualquer modo, não é como se eu tivesse falsificado meu diploma, é? Não é como se eu tivesse ficha criminal ou algo assim. Eu me esforço de verdade, não vôo tanto assim e trabalhei aquelas horas extras com a promoção de roupas esportivas e organizei a rifa de Natal...


Estou digitando cada vez com mais força, e meu rosto está ficando vermelho de agitação.


- Hermione. – Paul está olhando significativamente para o relógio.


- Certo. – Respiro fundo e me levanto.


Não vou deixar que ele me demita. Simplesmente não vou deixar isso acontecer.


Atravesso a sala e vou pelo corredor até a sala de reuniões, bato na porta e empurro.


Harry Potter está sentado numa cadeira junto à mesa de reuniões, rabiscando alguma coisa num caderno. Quando entro, ele ergue os olhos, e a expressão séria em seu rosto faz meu estômago dar uma cambalhota.


Mas eu tenho de me defender. Preciso manter esse emprego.


- Oi – diz ele. – Pode fechar a porta? – Ele espera até eu ter feito isso, depois levanta os olhos. – Hermione, precisamos conversar uma coisa.


- Imagino que sim – respondo, tentando manter a voz firme. – Mas eu gostaria de falar minha parte primeiro, se puder.


Por um momento Harry Potter parece perplexo. Depois levanta as sobrancelhas.


- Claro. Vá em frente.


Ando pela sala, respiro fundo e olho-o direto nos olhos.


- Sr. Potter, sei por que o senhor quer me ver. Sei que foi errado. Foi um erro de avaliação do qual me arrependo profundamente. Sinto muitíssimo, e isso nunca mais vai acontecer de novo. Mas, em minha defesa... – Posso ouvir minha voz subindo, emocionada. – Em minha defesa, eu não fazia idéia de quem o senhor era, naquela viagem de avião. E não acredito que eu deva ser punida pelo que foi, honesta e genuinamente, um equívoco.


Há uma pausa.


- Você achar que eu vou punir você? – indaga Harry Potter finalmente, franzindo a testa.


Como ele pode ser tão insensível?


- Sim! O senhor deve saber que eu nunca teria mencionado meu currículo se soubesse quem o senhor era! Foi como uma armadilha! O senhor sabe, se isso fosse um julgamento, o juiz não aceitaria. Eles nem deixariam o senhor...


- Seu currículo? – A sobrancelha de Harry Potter fica lisa. – Ah! A nota A em seu currículo. – Ele me dá um olhar penetrante. – A nota A falsificada, devo dizer.


Ouvir aquilo em voz alta me deixa em silêncio. Posso sentir o rosto ficando cada vez mais quente.


- Sabe, um monte de gente diria que isso foi uma fraude – comenta Harry Potter, recostando-se na cadeira.


- Sei que diria. Eu sei que estava errada. Não deveria ter... Mas isso não afeta o modo como faço o meu trabalho. Não significa nada.


- Você acha? – Ele balança a cabeça pensativamente. – Não sei. Passar de uma nota C para uma nota A... é um tremendo salto. E se nós precisarmos que você faça alguns cálculos matemáticos?


- Eu sei fazer cálculos – exclamo desesperada. – faça uma pergunta de matemática. Ande. Pergunte qualquer coisa.


- Certo. – Sua boca está tremendo levemente. – Oito vezes nove.


Encaro-o, com o coração disparando, a mente vazia. Oito vezes nove. Não faço idéia. Porra. Certo, nove vezes um é nove. Nove vezes dois...


Não. Saquei. Oito vezes dez é oitenta. Então oito vezes nove deve ser...


- Setenta e dois! – grito, e me encolho quando ele dá um sorriso minúsculo. – Setenta e dois – acrescento com mais calma.


- Muito bem. – Ele sinaliza educadamente para uma cadeira. – Bem. Você terminou o que queria dizer ou há mais?


Coço o rosto, confusa.


- O senhor... não vai me demitir?


- Não – responde Harry Potter pacientemente. – Não vou demitir você. Agora podemos falar?


Quando me sento, uma suspeita horrível começa a crescer na minha mente.


- Foi... - pigarreio. – Foi por causa do meu currículo que o senhor quis me ver?


- Não – diz ele em tom ameno. – Não foi por isso que eu quis ver você.


Quero morrer.


Quero morrer aqui mesmo, agora.


- Certo. – Ajeito o cabelo, tentando me recompor; tentando parecer profissional. – Certo. Bem. Então, o que o senhor... o que...


- Eu quero pedir um pequeno favor.


- Certo! – sinto uma pontada de antecipação. – Qualquer coisa! Quero dizer... o que é?


- Por vários motivos – começa Harry Potter, lentamente – eu preferiria que ninguém soubesse que eu estive na Escócia na semana passada. – Seu olhar encontra o meu. – Por isso, gostaria muito que nós mantivéssemos nosso pequeno encontro só entre nós.


- Certo! – concordo, depois de uma pausa. – Claro. Sem dúvida. Eu posso fazer isso.


- Você não contou a ninguém?


- Não. Ninguém. Nem mesmo ao meu... quero dizer, a ninguém. Não contei a ninguém.


- Bom. Muito obrigado. – Ele sorri e se levanta da cadeira. – Foi um prazer encontrá-la de novo, Hermione. Tenho certeza de que vamos nos ver outra vez.


- É isso? – digo perplexa.


- É isso. A não ser que você queira discutir alguma outra coisa.


- Não! – Levanto-me apressadamente, batendo como tornozelo na perna da mesa.


Puxa, o que eu pensei? Que ele ia me pedir para chefiar um empolgante projeto internacional?


Harry Potter abre a porta e segura-a educadamente para mim. E já estou saindo quando paro.


- Espera.


- O que é?


- O que vou dizer quando perguntarem por que o senhor queria me ver? – pergunto sem jeito. – Todo mundo vai perguntar.


- Por que não dizer que nós discutimos logística? – Ele ergue as sobrancelhas e fecha a porta.


 


N/A: Finalmente!!! Agora sabemos quem o Harry é! Presidente da empresa hein? Quem diria... E o medo que a Hermione ficou??? Imaginem vocês no lugar dela! Ah, o Rony morreu... muito triste isso, né? Mas posso garantir que mesmo assim ele será importante pra estória!


Agradecimentos:


Rosana Franco - Obrigada pelo apoio desde o início da fic! A Mione é hilária e vc ainda vai rir muito dela! O Draco é um fofo, gosto mto dele nesse livro... Mas ele não é o Harry, certo? Gostou dos 3 capítulos hoje? Bjos!


Felipe_Rodrigues - Eu amo esses livros de romance que são engraçados! Aliás, já tenho mais 2 adaptados pra H², para o caso dessa adaptação ser bem-sucedida! A estória toda desse é muito engraçada, vc ainda vai rir mto! Gostou dos 3 capítulos novos? Beijos!


Aninha Snape - Atualizado em dose tripla! A fic é mesmo mto engraçada, garanto! Espero que vc continue lendo e comentando! Gostou dos capítulos novos? Bjos!


A todos os outros que leram, mas não comentaram - Muito obrigada por ler! E gostaria que vocês passassem a comentar, pq é um incentivo enorme! Bjos!


 


No mais, peço que divulguem a fic! Pra quem gosta de comédia romântica, é uma ótima pedida! Além de ler um romance mto bonito, nessa estória vcs se divertem!!! ;D


Até sábado que vem!

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