A noite perfeita



A primeira opção seria correr pra chegar ao concurso e ainda dar tempo de ir à festa...


- Bicicleta?! – sobressaltou Ellen, desesperada.


- Mas eu estou de vestido, não posso pedalar.


Ela assentiu e olhou para bicicleta:


- Impossível – disse ela ainda olhando para a bicicleta como se fosse um objeto de outro mundo – Você sabe do meu trauma de bicicletas.


Eu gemi atordoada e sentei na calçada. Eu ainda me lembro do trauma de bicicleta dela, na verdade eu não sei exatamente o que ela sentia, mas toda vez que ela subia na bicicleta e o pai dela colocava a mão no banco da bicicleta para guiá-la ela gritava que nem uma alienada frenética, ela dizia que era medo, que da ultima vez ela tinha quebrado o braço. Lembrar disso me fez rir, um riso espontâneo e fora de hora. Não conseguia pensar no que fazer. Já era. Acho que não era mesmo pra eu ir nessa festa. Bufei e levantei, olhei para ela e ela estava segurando a bicicleta com uma só mão.


- Só porque você é minha amiga – disse ela fazendo biquinho, pouco animada com o fato de andar de bicicleta, mas concreta em sua idéia improvisada.


Logo senti meus olhos cintilarem e meus lábios automaticamente se esticarem para um sorriso. Ela sorriu de volta enquanto subia na bicicleta. Eu subi na roda traseira onde tinha duas bases, ainda com o pé no chão, esperava que ela arrancasse. Ela suspirou tensa, e deu impulso, ergui meu pé do chão.


Ela pedalava lentamente, ainda insegura.


- Acho que é pra a gente chegar lá hoje, Ellen – disse com calma, não queria apressá-la. Ta, na verdade queria sim, um pouco, mas não queria deixar ela nervosa.


Então ela começou a acelerar e eu firmei mais as minhas mãos em seus ombros, onde estavam apoiadas. Aos poucos ela começou a correr.


Chegamos ao concurso na exata hora em que começara. Hesitei um pouco ao entrar, estava hiper nervosa.


- Boa sorte – ouvi Ellen sussurrar pouco atrás de mim.


Eu sorri e assenti.


Entrei na sala, cumprimentei os professores e os compartes do meu grupo e logo sentei em meu lugar. Na frente havia duas lousas brancas de tamanho médio. De repente os compartes do outro grupo começaram a cochichar algo, e logo depois os do meu grupo também, não entendia bem o que eles cochichavam. Segundos depois um dos professores nos entregou um papel que havia a equação a ser resolvida, era enormemente assustadora e o triângulo era bizarro.


O mesmo professor pediu para que cada grupo escolhesse um adversário. Como previsto, escolheram a mim.


 Levantei e caminhei até a lousa, minhas mãos suavam frio. Mordi o lábio de nervoso e peguei o piloto preto. Plin – o sininho de mesa tocou. Agora começara, eu precisava raciocinar mais rápido do que minha mente permitira. Dei uma rápida olhada para trás, e meus compartes analisavam cada numero que eu escrevia, a cada numero desproporcional eles balançavam a cabeça em negativo. Não sei quanto tempo passou, eu estava tão concentrada, calculei tudo tão rápido que hesitava um pouco. Devia ter muita coisa errada. Plin. A pequena campainha apitou assim que conformei que havia terminado, de acordo com o grande relógio dependurado na parede duraram apenas dez minutos.


Um dos professores levantou para verificar as contas. Agora era outro professor. Ele ficou um bom tempo comparando a minha com a do adversário. Depois ele voltou à mesa e debateu em voz baixa com os outros professores, não dava pra escutar o que eles diziam.


Depois mais um dos outros professores – eram três – levantou-se com um sorriso. Parou no centro da sala ainda sorrindo, disparando os olhos para os dois grupos. Eu comecei a ficar nervosa de novo, batendo o pé no chão, desvairadamente. Até que ele apontou para o nosso grupo. Todos gritaram em comemoração – ao contrario dos outros que permaneceram em silêncio – e vieram me abraçar. Enquanto eles falavam, me abraçavam e pulavam, eu tentava me afugentar de todos aqueles braços. Aos poucos eu consegui sair. Acho que ninguém notou, mais tarde notaria.


Eu abri a porta realizada. E lá ainda estava Ellen, com os olhos grandes e brilhantes e um sorriso largo. Num pulo ela me abraçou.


- Eu sabia, eu sabia! – disse ela toda contente – Você é um máximo Angie!


- Ouun, obrigada amiga – disse ainda abraçada a ela. – Mas é melhor a gente ir logo, se não vai se atrasar.


Ela assentiu e pegou a bicicleta.


- Mas os Vips chagam atrasados – ela riu.


Agora ela não parecia insegura, ela e a bicicleta pareciam amigas de muitos e muitos anos.


Chegamos à festa que já havia começado, mas não fazia muito tempo.


Eu estava encantada com a iluminação e os enfeites, o globo de cristal no meio do salão, parecia um sonho.


- O jaleco – lembrou-me Ellen.


Eu tirei o jaleco e entreguei a ela, não sei onde ela botou, mas depois de um minuto ela estava ao meu lado de novo. E depois em menos de um minuto puxaram ela. Devia ser uma daquelas meninas que andavam com ela. Então continuei. A festa era na quadra do ginásio. Comecei a ficar nervosa quando percebi que todos os rostos me fitavam de cima a baixo.


Parecia um daqueles filmes: a linda princesa num baile, quando todos se focavam nela e iam se afastando para os lados abrindo o caminho, e no meio do salão o príncipe. A diferença era que eu não era linda. Mas lá estava o Dylan, como num filme. Ele olhava para mim de boquiaberta, sorrindo com os olhos.


Por que todos me olhavam assim como se eu fosse ser de outro mundo? Bom, deve ser porque ninguém nunca viu a esquisita da Angellyne de vestido, só pode.


Minhas pernas travaram. Dylan veio em minha direção, sem deslocar os olhos de mim, a não ser quando a Katie o puxou, ela estava pouco longe de mim, e mesmo com a música no ultimo volume e a ouvir dizer algo do tipo “Quanto tempo sem um beijo, gatinho”, com repulsa ele a empurrou sutilmente e continuou vindo em minha direção, meu sorriso aos poucos foi se abrindo, aquele friozinho na barriga – acho que eram as borboletas.


Quando ele já estava bem perto de mim, eu não pensei duas vezes e saquei a pagina que havia posto dentro do sinto largo do meu vestido.



Não sei por que eu fiz isso, foi um impulso. Caramba, que raiva de mim! Ele não respondeu nada, continuou imóvel olhando para o papel aberto que eu segurava nas pontas dos dedos de minhas mãos trêmulas, acho que eu tinha acabado com nossa amizade. Me arrependi, minha vontade era de sair correndo. Ele olhou para baixo e começou a procurar algo em seu paletó.


E desdobrou um papel.


      


Meus olhos ofuscaram. Nossa! Quem diria! – pensei. Eu acho que não estava respirando, meu coração estava mais acelerado do que as batidas da musica eletrônica que tocava. Ele juntou as duas páginas, dobrou e as colocaram no bolso de seu paletó. E nisso começou a tocar uma musica romântica. Coincidência. Nós rimos, ele segurou minha mão.


- Me concede a esta dança senhorita? – ele ergueu minha mão delicadamente com um sorriso torto e a beijou.


Agora ele bancando o cavalheiro, tão perfeito que parecia um sonho – acho que eu já falei isso. E se fosse eu não queria acordar.


Essa, com certeza tinha sido uma noite para rememorar, pra sempre, a melhor noite da minha vida com o Dylan depois de tanto tempo com uma paixonite mal correspondida – ele sentia o mesmo o tempo todo!


Se você quer saber se eu ele nos beijamos. Bom, ele ainda não terminou com a namorada dele, não oficialmente, apesar de isso já estar claro, mas acho que ele não se sentia na ousadia o suficiente pra me beijar – mesmo eu almejando isso em silêncio. Eu me sentia insegura, eu não conseguia entender a mim mesma. Beijar ele num seria igual a beijar todos os garotos que eu já beijei? Num seria prático? Eu não sei. Só sei que nunca beijei meu melhor amigo.


***


Minha noite maravilhosa, como se não bastasse, o Dylan me levou pra casa de moto. Eu nunca tinha andado de moto antes, e agarradinha com o Dylan então... Hmmm. Era uma sensação tão boa de liberdade. O vento golpeando meu rosto, a sensação de estar voando, o perfume delicioso do Dylan que me que me entorpecia.


Foi entristecedor chegar em casa e ter que me desgrudar dele. Ele estacionou a moto já na garagem dele. Enquanto eu já ia saindo.


- Ei – sussurrou ele, eu me virei – Aonde a mocinha vai?


- Pra casa.


- Eu te levo – disse ele sorrindo e estendo a mão para segurar a minha. – Eu num vou deixar você ir sozinha.


- Eu moro à apenas quatorze passos da sua casa.


- Muita coisa pode acontecer em quatorze passos – ele sorriu para mim maliciosamente.


Ele me deixou na porta de casa. Eu já destrancara a porta enquanto ele ainda estava ali parado.


- Vai ficar?


- Não, só to esperando você entrar.


Eu ri pela a sua super-proteção.


- Até amanhã então.


- Boa noite – disse ele sorrindo – Durma com os anjos.


Suspirei. Que infortúnio ter que fechar a porta.


Quando entrei meu pai estava vendo TV, vi que ele estava com Viviane, então nem falei com ele, subi direto pro meu quarto.


- Angellyne? – chamou meu pai enquanto eu ainda estava no meio da escada.


- Sou eu, pai. Já cheguei! – continuei subindo.


Quando cheguei ao meu quarto suspirei fundo e me livrei das sandálias de salto alto jogando-as em um canto. Como devia estar Ellen? Eu nem a vi depois que ela foi abduzida. Será que ela já estava em casa ou ainda estava lá curtindo a festa. Já passava das 23h00min. Só foi pensar nela que meu celular vibrou. Nova mensagem.


Como foi na festa?


Perfeita *-* eu nem ti vi mais, onde estava?


Dançando. Eu vi vc com o Dy, resolvi nem atrapalhar.


Eu fiquei preocupada com vc. Custava dar sinal de vida?


Ain amiga ç.ç vcs estavam tão fofos dançando qe eu não qeria estragar


Oun amiga *~* ta bom então... eu vou dormir.


Ta, boa noite sonhe com os anjos ;* ♥


Boa noite, migs, durma bem ;* ♥


Suspirei. Durma bem, repeti pra mim mesma. Depois de uma noite dessas, eu vou dormir nas nuvens... Suspirei mais fundo agora. Pensei no Dylan, as mãos dele hesitando em minha cintura para não deslizarem propositalmente, foi tão fofo. Eu ri baixo ao lembrar.


Depois de tomar banho e voltar pra minha cama, fiquei horas e horas na cama tentando encontrar o sono, mas ele não vinha. 03h28min da madrugada. Desisti, peguei meu mp4, não sei o porquê, mas procurava uma musica que marcasse aquela noite, e ali tinha tantas musicas que acho que eu nunca ouvi todas elas.


Do me a favor and tell me what you think about me.


Comecei cantarolando baixinho, era incrível o jeito que me coligava a música. Nunca foi fácil decifrar o que os garotos querem, na verdade, acho que nem eles sabem o que eles realmente querem.


Tell me how you want this to be.


Ele coloca minha cabeça nas nuvens e me faz pensar alto demais, tão alto que eu tenho medo de cair.


Quanto mais ele olha em meus olhos, mais eu acredito que nada é fora do alcance, e que vale a pena sonhar, tentar, mesmo sendo o motivo de uma paixão tola. Talvez meu sonho faça mais sentido agora. Não totalmente, mas já são 40%.


Convenci-me de que o meu sono não viria tão cedo. Tava chuviscando um pouco e eu abri a cortina. Respirei fundo e pude sentir o cheiro da chuva através do vidro, as gotículas escorrendo pelo vidro, as gotículas que pouco brilhava com a luz da lua.


Percebi que não era a única que estava sendo atormentada pela insônia. Vi naquela sombra um par de olhos me fitando, sorri mesmo sabendo que mal tinha a possibilidade de ele enxergar, mas logo ele sorriu de volta.


Ficamos ali parados em frente à janela nos comunicando por pensamentos, sorrisos e olhares. Os fones do mp4 ainda em meus ouvidos soando as músicas que agora eu mal prestava a atenção. Eram músicas lentas, não sabia se eram melancólicas ou românticas, porque toda a minha atenção estava naqueles olhos. Virei rapidamente para relógio e logo voltei o olhar pra ele com medo de perder o foco. Já passara das 04h00min da manhã. Parecia que não ia amanhecer nunca, a noite estava muito escura, só à luz da lua das estrelas que lampejavam o céu. Mas sabia que não faltava muito para o sol nascer com seu lindo tom alaranjado.


Agora 45%. Aqueles olhos só me faziam lembrar que vale a pena sonhar. Agora eu estou regenerando meus sonhos e tentando me convencer de que eles não são ilusões extraordinárias da minha mente, e que há probabilidades de eles serem verdade.


É só um quase-belo final feliz.

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