Lua Minguante



 


Eu estava em polvorosa. Eu tinha um encontro com ele. Ele. Coloquei-me diante do primeiro espelho que vi. Droga, eu sou tão sem graça! Mas deve haver algo interessante em mim, ou ele não estaria tão empenhado em me tornar a sua companhia num chá. O mundo tinha se tornado tão bonito, como se um pincel derramasse beleza em tudo aquilo que era cinza e sufocante.


Se eu tivesse sorte ele seguraria minha mão ou talvez me abraçasse como na noite da enfermaria! Eu estava me aprontando para esperá-lo na Sala Comunal quando ouvi um barulho no corredor.


 


-Me deixe entrar! –apesar de entender as palavras, o timbre da voz era abafado e eu não podia reconhecer.


 


Abri a porta por dentro e senti uma varinha espetar minha bochecha enquanto uma mão grande me segurava pelos cabelos.


 


-O que está acontecendo? Srta. Carrow, o que eu fiz?! Não, não, por favor!


 


Mas minhas suplicas serviam apenas para fazê-los rir. Senti meus joelhos cederem de medo do que estaria me esperando e ao ser colocada diante das gárgulas de pedra, o medo se intensificou. Um gosto amargo invadiu minha boca. Como ele estaria envolvido?


 


-Snape, já estou com a garota.


-Acham isso realmente necessário? –ele perguntou friamente vendo-me ali, dominada e colocada de joelhos.


-É uma boa alternativa para atrair Potter. –disse Aleto- Eu usaria Ginevra Weasley, mas ela não está aqui e demorará algum tempo para retornar. O lorde está se impacientando, você bem sabe.


 


Ele esfregou a Marca Negra inconscientemente. Seus olhos fixos nos Comensais. Parecia estar deliberando sobre alguma coisa.


 


-Certifique-se de que Minerva e Flitwick não saberão disso por enquanto. Eu levo a garota.


-Mas...


-Aleto, Amico, eu deixarei claro que a idéia foi de vocês. –ele garantiu como se estivesse entediado- Acabei de ser convocado e vocês bem sabem que o Lorde não gosta que nós o incomodemos. Ele apenas recebe aquele servo que convocou.


 


Entreolhando-se eles resolveram concordar e me jogaram nos braços do Professor, que fechou sua mão em torno do meu pulso. Ele jogou Pó de Flú no fogo e disse:


 


-Mansão Malfoy! –rodopiamos juntos no meio do turbilhão de cores. Ele me segurava firmemente contra seu peito- Luna! –ele disse em voz alta para que eu pudesse ouvi-lo- Confie em mim!


-Por favor... Ajude-me.


-Espere por mim! Confie.


 


E saímos da lareira para uma sala luxuosa. Sentado num sofá negro, tendo uma enorme cobra enrolada em seus ombros, Lorde Voldemort. Snape me jogou a seus pés.


 


-Um presente de Amico e Aleto Carrow para alegrar seu Natal, milorde.


-Excelente. –ele disse- Eu esperava pela menina Weasley, mas esta deve servir. Espalhem a notícia que eu estou com ela e vamos ver se Potter é realmente seu amigo, mocinha.


-Ele não será tolo. –eu disse de modo insolente.


-Crucio!


 


A dor era imensa, desesperadora, sufocante.


 


-Ele é tolo, é emocionalmente dominável. E se ele tiver adquirido um pouco de inteligência, Lovegood, eu vou fazer você implorar para mais um pouco de Cruciatus. Lobo Greyback aprecia garotinhas loiras e insolentes. Rabicho jogue-a num porão!


 


Ali era tão úmido, frio e escuro que eu sentia como se tivessem me enterrado viva. Não havia nada ali, nem cadeira, cama ou mesmo uma almofada. Sequer havia um cobertor. O frio era tanto que eu sentia dificuldades para respirar.


Eu não podia chorar, sentia-me seca, brutalmente lançada naquele mundo de verdade do qual eu desejava fugir. Eu precisava me esconder em algum lugar, mas o meu mundo autista estava destruído e nada mais restava dele a não ser um pequeno e tênue fio de esperança. Harry viria me buscar ou Severus Snape seria o meu salvador?


O tempo parecia não passar e eu sabia que jamais viveria dias tão tenebrosos quanto aqueles. Eu não tinha noção do quanto meu cárcere estava sendo prolongado, eu apenas podia discernir pelas refeições periódicas que já devia ser Janeiro. A minha confiança nas palavras de Severus Snape começava a fraquejar e eu já duvidava que Harry viesse a minha procura.


Eu não podia condená-lo, eu apenas acreditava que aquilo era extremamente injusto comigo. Que culpa eu tinha para estar sob tão severa provação? O que eu tinha feito de tão grave?


Logo eu parei de comer e derramava a água que me mandavam. Eu sabia que um ser humano não seria capaz de sobreviver mais do que quatro dias sem água. Aquilo forçaria uma reação nos meus algozes, para o mal ou para o pior.


Os pratos voltavam intactos e a fraqueza passou a ser tão intensa que eu mal podia me mover. Então, naquela fatídica noite, abri os olhos para contemplar a imagem altiva de Lucius Malfoy. Ele me ergueu em seus braços após perceber que eu não tinha forças para ficar de pé. Levou-me para fora e mesmo a fraca luz de uma tocha distante feria meus olhos. Fui colocada num sofá, meus olhos fechados me resguardavam da certeza de que eu estava sendo observada por muitas pessoas hostis.


Havia risos maldosos e masculinos, mas eu não podia reconhecer seus donos.


 


-Um bom brinquedo o Lorde está nos dando. –dizia uma das vozes rosnadas.


-Isso é praticamente necrofilia. –e meu peito se sobressaltou ao reconhecer a voz letal do meu Professor.


-É bom que ela esteja assim. É a primeira vez que Draco faz isso, não é filho? Tenho certeza de que ele não apreciará arranhões e mordidas.


-Não mesmo.


 


Céus, o que haviam planejado pra mim?


 


-Não devemos matá-la. –disse Snape- O Lorde havia prometido que ela seria de Greyback.


-Ele vai devorá-la de outras maneiras, Snape. –disse Lucius Malfoy- É lua cheia, ele está transformado.


-Que seja. São ordens do Lorde. Eu sinceramente não posso entender como vocês acham isso atraente. –ele dizia desdenhoso- É tão rudimentar.


-Não repare Draco, mas seu diretor é um homem puritano. –disse uma voz feminina, debochada- Ou alguém que se acha realmente muito importante, já que ele dispensa todas as moças que capturamos para o divertimento dos Comensais.


-Não é bem isso, Bella. –ele disse calmo e suave- Eu apenas não vejo graça nenhuma em humilhar pessoas dessa forma. Há métodos tão mais eficientes e estimulantes do que o estupro que eu não consigo enxergar como forçar uma pessoa sexualmente pode estar relacionado com as artes das trevas.


-Eu sou forçado a discordar, Severus. –disse a mulher, Bellatrix Lestrange- Não há nada pior para uma mulher do que isso.


 


Abri uma pequena fenda dos meus olhos e pude perceber a sala cheia. Eu podia ver quatro pessoas, mas tinha certeza que atrás do sofá haveria mais. Ele não estava no meu campo de visão, mas Draco Malfoy e seu pai, sim. Ele olhava para mim, eu podia notar que havia certa ansiedade no modo como ele batia o pé e mexia nos botões da roupa.


 


-E então?! –ele disse me indicando com a mão- Podemos parar com essa ladainha inútil sobre ética entre comensais?


 


E ele era forte, porque quando foi autorizado, me pegou no colo, jogando-me sobre seu ombro e me levou para uma sala estranha.


 


-Por favor... –eu pedi sem voz- Não...


-Cale a boca, Lovegood. –e sua mão rasgou minhas vestes e ele me invadiu. A dor foi imensa, eu sufoquei por um minuto inteiro buscando entender como aquilo era possível. A tortura não era nada perto de toda aquela humilhação, Lestrange estava certa.


 


Os ruídos que ele produzia eram absolutamente vis, a dor era imensa e a minha falta de forças para resistir me deixava ainda mais machucada.


Eu estava completamente violada, sem forças sobre a madeira dura de uma mesa. Ele saiu de cima de mim e logo veio outro, e mais outro e acabei perdendo a conta, bem como a consciência. Havia momentos de lucidez em meio à dor e eu apenas desejava poder desmaiar ou morrer. Não tinha mais esperanças de ser deixada em paz. Havia um cheiro de sangue no ar e eu sentia algo quente vertendo pelas minhas pernas moles.


 


-Luna? –sua voz trêmula e ainda assim fria soou perto do meu ouvido- Eu estou aqui, me dê algum sinal de que pode me escutar...


-Por quê? –gemi sem forças, esgoelada.


-Eu não vou tocar você...


 


Mas aquilo não fazia muita diferença, aquilo era até engraçado. Não havia mais o que ser resguardado, não havia mais nenhuma pureza, apenas uma moça violada que desejava que a morte viesse o mais depressa possível.


 


-Eles vão levá-la para a floresta, você é um premio para Lobo Greyback. –ele me dizia com sua voz triste e pausada- Eu realmente lamento por isso... Está arruinada. –ele murmurou fracamente, sua mão puxando minhas vestes em frangalhos tentando me cobrir.


-Me mate...


-Não, eu não posso fazer isso. –ele me disse, dessa vez assustado- Eu não consigo. Luna... –eu senti os olhos dele me sugarem para seu íntimo- Me perdoe.


 


E fui deixada sozinha. Eu não podia perdoar. Ele me deixaria viva para ser levada a um lobisomem transformado. Ele que havia me dito para confiar em suas palavras, ele que prometera me ajudar... Ele, a quem eu salvei a vida e a quem eu entregaria a minha.


Onde andariam meus amigos, será que eles sabiam que eu estava nesta situação? E porque não vieram a minha procura? Eu não era importante o suficiente ou o altruísmo de Harry havia acabado de sucumbir? Amaldiçoando o momento em que nasci, me entreguei ao vazio.


Era claro como a lua, fulgurando divina no céu e grotesco como os pântanos, que inundavam as terras férteis da jovialidade: Eu seria brutalmente assassinada além de todo o resto.


A minha leveza, pureza e graça extraídas entre deleite, humilhação e dor. A realidade forçada no meu mundo de fantasia. Eu pagava com sangue pela minha própria desgraça e eu queria ter forças para um dia, quem sabe, poder cobrar derramando cada gota do fluido vital dos meus agressores para a saciedade total da minha vingança.


Como ondas, como flechas, tornando-se intrínseco a mim, um ódio retumbante ecoava na minha índole sonhadora, agora marcada a ferro pelas patas grotescas de insumos rastejantes. Eu havia deixado de ser Luna e pura como a lua, para me tornar um poço de trevas. Tiraram de mim aquilo que havia de mais importante e me descartaram como um brinquedo quebrado.


Enquanto o sangue verte das minhas carnes, na neve, manchando de dor um cenário frio, assimilo vozes a lembranças e encontro nisso uma força sobre-humana. Eu não serei as trevas se ainda tenho fios de luz onde me segurar, mesmo os fios quebradiços e escassos das minhas lembranças.


Sentia-me abandonada e sem nenhuma importância. Sequer as promessas feitas a mim tinham valor. O meu perdão ou minha negação não faziam diferença para ninguém. Eram apenas palavras vagas, a consciência alheia não doeria caso as atitudes me maculassem. Eu sou humana, ainda que tenha passado a vida inteira escondida dentro de mim mesma, mas eles não, aqueles seres pertencentes ao mundo real, ao mundo dos humanos.


 


-Luna! –a exclamação, seguida do barulho de pés triturando a neve me tirou das minhas divagações- Está respirando... –eu senti seu rosto próximo ao meu e seus lábios roçando minha pele quando ele me pedia para ficar viva e me içava do chão- Por favor, não vá ainda... Dê-me a chance de tentar salvar sua vida...


 


A sensação da aparatação me envolveu e eu perdi os sentidos antes mesmo de descobrir para onde eu havia sido levada. Eu cheirava a libido alheia e aquilo me causava asco, repulsa. Fui colocada numa cama, sem sequer me importar com o que iria acontecer.


 


-Você pode falar comigo? Você consegue falar?


-Está frio... –eu disse, minha mão se fechando na sua.


-Eu vou resolver isso, você passou algum tempo deitada na neve. –ele me disse nervoso, sua mão grande afastando os cabelos do meu rosto- Eu vou cuidar de você...


-Está frio... –repeti, meu corpo sacudindo-se na cama tentando por meio da insistência, me aquecer.


 


Ele colocou um cobertor sobre mim enquanto saia por um instante. Não era o suficiente pra me aquecer e eu acreditava estar morrendo por hipotermia. Meu corpo doía tanto que eu realmente esperava que uma hora a morte viesse. Ouvi os passos dele, junto com o tilintar de alguns frascos.


 


-Luna, beba isso... –e verteu um conteúdo que lembrava bastante Wisky de Fogo pela minha garganta- Tente ficar consciente, fale comigo... Eu preciso curar suas feridas antes de aquecê-la... Há uma hemorragia aqui.


-Eu... preciso respirar...


-Continue respirando, isso mesmo... –ele me estimulava a falar enquanto suas mãos terminavam de rasgar as vestes já esfarrapadas.


 


Eu sabia que estava completamente despida, mas não via nenhum problema naquilo... eu não via problema em nada, sequer em morrer!


 


-Episkey! –era tudo o que eu o ouvia dizendo, a varinha tocando diferentes lugares do meu corpo machucado.


 


Aquilo fazia com que eu me sentisse melhor, de certa forma. Eu pude abrir os olhos e contemplar seu rosto preocupado e tenso olhando fixamente para o lugar mais ferido do meu corpo. Ele me encarou por um segundo como se pedisse permissão para me tocar. Com um leve meneio de cabeça, anui. Delicadamente ele separou minhas pernas e com uma precisão quase cirúrgica consertou o estrago que haviam feito.


 


-Ainda dói?


-Não... –respondi agradecida.


-Bom, não está sangrando mais. –ele disse mais tranqüilo- E aqui? –e colocou a mão no meu baixo ventre e apertou levemente.


-Oh! –só então eu me dava conta de que estava completamente machucada por dentro.


-Beba isso. –e me deu uma poção- Vai ajudar a sarar isso.


 


E sem dizer mais nada, pegou o meu corpo nu e fragilizado da cama e me levou para o banheiro. Encheu a banheira com água morna utilizando um único feitiço e me colocou dentro. Aos poucos eu sentia a sensibilidade retornar a minha pele açoitada pelo frio. Eu mantinha meus olhos fechados todo o tempo já que agora, depois de ter minhas feridas curadas, eu comecei a me intimidar com a presença do professor não podendo esquecer ou relaxar ante o fato de estar completamente nua.


Mas eu não via malicia em nenhuma das suas atitudes. Ele agora passava uma esponja delicadamente pelo meu corpo, limpando a sujeira acumulada os meus meses de cárcere. Lavou meu cabelo, massageando minha cabeça cuidadosamente. Depois de me deixar completamente limpa, ele me ergueu no colo, não dando importância ao fato de eu estar ensopada, e me colocou na cama. Com uma toalha felpuda e macia, secou-me e depositou uma pesada manta de lã sobre mim.


Percebi que ele havia se sentado na cama junto a mim e só então abri os olhos. Estava mais abatido do que eu jamais o vira, uma sombra de preocupação obscurecendo seu olhar. Segurei sua mão, e ele me olhou sobressaltado.


 


-Achei que estivesse dormindo. –ele disse ameno permitindo que os dedos se entrelaçassem.


-Obrigada. Muitíssimo obrigada.


-Tudo bem. –ele disse passando uma mão grande pelo meu rosto, arrumando minhas sobrancelhas- Preciso arrumar uma roupa pra você.


-Por favor. –eu disse dando uma olhada para o que havia debaixo da manta.


 


Ficando de pé, ele abriu um armário e pegou um pijama branco, de seu uso. Diminuiu um pouco do tamanho com um feitiço mudo e se aproximou.


 


-Consegue fazer isso? –ele perguntou me indicando o pijama.


-Não sem varinha.


-Consegue se vestir, eu quis dizer...


-Posso tentar. –e ri da minha tolice.


 


Mas meus membros não me obedeciam e não havia nada que eu pudesse fazer para mudar aquilo. Eu estava completamente fraca e nem sentar-me na cama foi possível. Percebendo minha situação ele me sentou, deixando meu rosto a altura do seu abdome enquanto vestia as mangas da camisa de botões e as calças.  Eu comecei a abotoá-los devagar, meus dedos sem muita coordenação. Quando terminamos aquele exercício dificílimo ele afagou meus cabelos úmidos e sacou a varinha,. Secando-os com uma rajada de vapor. Não resisti e o envolvi pela cintura com os braços. Se aquele homem era um monstro, ele não queria que eu o visse assim. Ele era o meu anjo salvador que estava ali, dedicando-se ao máximo em me deixar confortável e digna.


 


-Luna... Você deve comer alguma coisa. –ele ergueu meu rosto para me olhar de frente- E beber alguma água.


-Sim, senhor.


-Eu vou pedir uma sopa aos elfos enquanto você descansa um pouco mais.


-Tudo bem.


 


E me deitou novamente na cama, recostando-me em travesseiros macios. Ele ainda afagou meu rosto por um momento, esquadrinhando as minhas feições. Segurei suas mãos e as beijei ainda sem poder achar palavras para expressar toda a gratidão que havia pulsando e queimando dentro de mim. Eu estava tão satisfeita que poderia chorar com toda aquela felicidade e todo aquele alivio.


Ele mesmo trouxe uma bandeja com um prato de sopa de legumes e um copo de suco de abóbora. Tentei bravamente, mas não tinha força ou coordenação para levar o alimento à boca, então ele o fez.


 


-Por que está fazendo isso?


-Você precisa comer. –ele disse simplesmente


-O senhor entendeu o que eu disse. É apenas gratidão, uma retribuição?


-Talvez eu realmente me importe com você. –ele disse em tom de confissão, seus olhos queimando em mim- Eu não concordo com o que fizeram a você e eu sei que posso estar colocando muita coisa em risco te salvando, mas eu não poderia mais... –ele hesitou puxando o ar com força pelo nariz e me encarando, pensando nas palavras- ... não poderia mais ter o mínimo de paz que ainda tenho se não tivesse feito isso.


-O senhor não precisava fazer nada.


-Obviamente eu precisava. –ele disse com aquela frieza característica morrendo em cada uma das silabas.


-Por quê?


-Porque eu gosto de você. –ele despejou olhando pras próprias mãos- Porque fazer isso por você também é um ato egoísta. Eu a quero... já há muito tempo. E eu não podia permitir que me levassem você. Mesmo que apenas para ficar viva, mesmo que fuja de mim ou que decida se esconder de tudo, mas eu preciso saber que você está viva.


 


Eu não soube como reagir e eu apenas senti uma descarga elétrica percorrer meu corpo e levar minha mão em direção ao rosto dele, coisa que eu não faria com minhas forças atuais. Segurei seu queixo e o virei para me olhar.


 


-Diga isso olhando para mim.


-Eu a quero. –ele repetiu, me sugando para suas profundezas- Muito.


-Por quê?


-Você parece uma criança de cinco anos. –ele disse erguendo uma sobrancelha desdenhosa- Você pergunta demais. Não existe por quê. Não existe um motivo palpável, algo que eu possa usar como justificativa. Eu apenas sei que a quero.


-Mas isso não faz sentido... –gemi confusa


-O seu amor também não, mas é impossível fugir dele. –ele disse colocando o prato de sopa quase intacto na mesa de cabeceira e, apoiando o cotovelo no joelho, segurou a ponte do seu nariz adunco- Seu sentimento me domina, seus olhos me arrancam de mim mesmo, fazem com que eu esqueça as coisas que... –e hesitou- As coisas terríveis que vem acontecendo. Fazem-me divagar sobre outro tipo de vida. Você não precisa dizer que me ama, eu sou um leigiminente bom o suficiente para ver isso. Em outros casos eu ignoraria você, mas eu não posso fazer isso, eu não consegui fazer isso. Não posso ignorá-la. Eu descobri que só posso querê-la. E foi nisso que eu pensei quando a convidei para um chá, foi pensando em lhe falar estas coisas e eu não podia imaginar que eles iriam precisar de você. Eu não tive condições de privá-la daquele sofrimento e...


-Mas o senhor foi me buscar! –eu disse tentando suprimir toda a culpa que eu via escorrer por suas palavras- Eu estou aqui.


-Mas você...


-Estou arruinada? Foram essas as suas palavras na floresta congelada. O senhor disse que eu estou arruinada.


-Mas você não está. Eu temia que ficasse algum trauma, alguma seqüela muito grave, mesmo física. Eu temia por sua vida. Não leve ao pé da letra as palavras de alguém que está desesperado.


-Fale olhando pra mim. –repeti o pedido, incomodada com suas pálpebras fechadas e sua cabeça baixa, como se ele precisasse do meu perdão.


-Eu ia lhe dizer que a amava. –ele murmurou aproximando-se de mim, seus olhos me capturando- Ia dizer que a queria, ainda que soubesse o quanto aquilo era errado. Eu ia lhe pedir uma chance, Luna, mas eu não tenho mais este direito.


-Eu acho que posso decidir isso. –eu murmurei segurando o rosto dele com as duas mãos- Sou eu quem decide se você tem direito a isso ou não.


-Você já provou do mundo em que eu vivo. Eu não posso prendê-la a mim.


-Mas eu posso me prender a você.


 


E o abracei, quase esvaindo minhas ultimas forças. Ele me pressionou contra seu peito, seus lábios encostando desajeitadamente na minha testa. Respirei o ar que ele exalava e aquilo o era tudo com o que eu havia sonhado. Eu tinha suas mãos me resguardando do mundo, eu tinha sua proteção a minha volta, seu sentimento puro para me fortalecer. Eu não precisava de mais nada.


Talvez do meu pai, se um dia eu ainda pudesse vê-lo. Mas eu não tinha amigos e isso agora não tinha muita importância. Ele era meu amigo, ele havia arriscado muita coisa pra me salvar, e onde andavam Harry e os outros? Eu teria me arriscado por eles, mesmo que acabasse perecendo por isso, mas eles não foram capazes disso por mim.


Qualquer um podia dizer o que quisesse sobre Severus Snape, mas eu não concordaria com nada daquilo. Um assassino? Nunca, ele havia me resgatado de um inferno de gelo onde eu havia sido jogada para servir de petisco a um lobisomem! Um homem frio? Mas onde estava a frieza se seu corpo me aquecia afastando meus medos e inseguranças? Um Comensal da Morte? Pois para mim ele apenas tinha o significado de vida.

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