A Mansão Hawgeoff
"Amor é o desejo irresistível de ser irresistivelmente desejado."
- Robert Frost -
Bom dia meus aluninhos de Wiztron!
Hoje é domingo, e eu adoro domingo. Aprontem bastante para a minha felicidade!
Meu leque vermelho veio repleto com coisas reveladoras. E vocês sabem que eu detesto o leque vermelho quando se trata de tragédia.
Perigo no bosque!
Isso não é fofoca, é um alarme para meus aluninhos preciosos de Wiztron. Parece que o nosso amado bosque – verde e florido – já não é mais o mesmo desde que a nossa boltsana, Mikaella Devonne se deparou com uma criatura estranha. Em minha opinião, aquilo era um lobo, mas para a lenda de alguns mon cherries lobos não aparecem ao clarão do dia. E isso é verdade.
Mas então o que será que assombra o nosso bosque? Os guardas de Wiztron estão a investigar. Encontraram pegadas enormes, mas nenhum sinal do nosso suposto “lobinho”.
E não é só no bosque não. Na orla da floresta o menino astreniano, Lucas Remburg, foi atacado por uma mulher, e pelo o que eu vi... Talvez minha opinião desta vez esteja errada, mas desde quando os vampiros assumiram tanta beleza e perfeição? Parece que os dentes estupidamente expostos, os olhos vermelhos fundos e cheios de olheiras, a aparência cinza e doentia não faz mais parte do padrão vampiresco, mas, sim, os cabelos sedosos como a brisa, a pele branca como porcelana, os olhos dourados e os dentes salientes e afiados. Ui.
Chega de notícias trágicas, agora para as minhas doces fofocas!
Alex Gallabriel e Michelly Devonne numa discussãozinha histérica de casal?
Parece que Michelly explodiu de ciúmes por Alex passar mais tempo com a irmã dela – Mikaella – do que com ela. Houve até restrições. Michelly ergueu seu dedinho e disse que se Alex quisesse continuar com ela ele teria de se afastar de Mikaella.
Ele vai? Pelo menos eu não tenho visto os dois perambulando pelo castelo... Ou será que vi? Hoho. Como eu disse, segredos são segredos, darling. E o nosso Gallabriel não nasceu para obedecer a regras.
E quem sou eu?
Nhá, eu sou apenas mais um belo segredo que nunca vai ser revelado.
Beijinhos mon cherries, Swee Scan.
Mikaella forjou uma cara de choro. Nem a mais fofoqueira da escola havia se lembrado do seu aniversário... E por isso passar uma atraente tarde monótona trancada em Wiztron.
Ah não, não mesmo.
Mikaella voltou para o salão comunal para vestir uma roupa descente e um sobre tudo jeans. Em cima de sua cama havia uma caixinha púrpura com um delicado laço em forma de flor. Presente de aniversário? Mikaella abriu a caixinha com todo cuidado, desfazendo laço por laço que constituía a flor.
Ela prendeu a respiração e tossiu um pouco quando retirou a tampa da caixinha. Estava enfumaçada e com um cheiro horrível. Em questão de segundos Mikaella já estava no banheiro, abrindo a porta do boxe e jogando o conteúdo da caixinha dentro do vaso sanitário, e depois fechou porta do banheiro.
A pequena explosão fez espirrar água para todos os lados
Mikaella abriu a porta hesitante. O banheiro estava inundado e o vazo de porcelana estava quebrado. Mikaella virou a caixinha e leu o bilhete que estava pregado no fundo da mesma.
Feliz aniversário, meu bem.
Beijinhos, Cely Hampton.
Mikaella riu do bilhete e do presentinho. Bombus Temporium: uma bombinha relógio do tamanho de uma bola de gude. É um simples feitiço do terceiro ano.
Ela saiu impecável do banheiro feminino que estava todo alagado, desprendeu o bilhete da caixinha, embolou o bilhete e colocou no bolso do seu sobre tudo.
Ela passou pela sala comunal estranhamente vazia, deserta, e voltou para biblioteca...
- Você ainda está ai! – exclamou ela quando viu Lucas ainda sentado na mesa empilhada de livros.
Lucas riu.
- E você resolveu sair da toca?
- É, eu vou dar uma volta na Wizoney, respirar um ar diferente... Quer ir comigo? – propôs Mikaella.
Lucas olhou pensativo para a pilha de livros.
- Ou prefere ficar aqui com essa torre de livros e madame Weader? – ela lançou um breve olhar para a velhinha com varias ruguinhas pendendo delicadamente que estava atrás de um balcão mogno. Mikaella falava num tom baixo que só Lucas podia ouvir e a senhora Heloe Weader já estava com a audição abortada – Dizem que ela está na seca há trinta anos, é perigoso você ficar aqui sozinho com ela – alertou Mikaella com um tom de ironia.
Lucas fechou o livro e o colocou junto com os outros. Solidariamente Mikaella o ajudou a repor os livros em seus determinados lugares.
O garoto foi até a sala comunal da Astren para pegar um casaco, Mikaella o esperou do lado de fora, encostada num corrimão de uma escada de pedra.
Era surpreendente como os meninos conseguiam ser rápidos em trocar de roupa. Em menos de dois minutos Lucas já estava de volta vestindo um casaco caramelo de moletom e uma calça jeans. Como o Alex para trocar de roupa daquela vez que eles fugiram para festa nas masmorras.
Eles já estavam no terceiro lance de escada – só faltava mais dois para chegar ao saguão e sair do castelo quando Mikaella deu de cara com Thomas.
Ela tentou agir naturalmente forjando um sorriso.
- Thomas, meu amor, eu estava te procurando – disse ela animada.
- Aonde você... – Ele olhou para Lucas de cima a baixo com rispidez – Vocês vão?
- Para Wizoney! – anunciou Mikaella – Eu estava procurando por você... Num é Lucas? – Mikaella cutucou Lucas com o pé e ele logo entendeu.
- Claro, claro – disse ele.
- Vai lá, Tommy – disse Mikaella empurrando o garoto de volta para a sala – Vai lá trocar de roupa, e não esquece o casaco, está frio lá fora. A gente espera você aqui!
Thomas a olhou com desconfiança e Mikaella sorriu angelicalmente. Depois ele entrou e foi trocar de roupa.
Mikaella e Lucas se entreolharam aliviados.
- Como ta a cicatriz? – sussurrou Mikaella.
Lucas abriu o casaco, abaixou a manga do mesmo e subiu a manga de sua camisa para dar visibilidade a cicatriz recente. Mikaella olhou e pôde reparar as marcas de dentes que constituía o raio no ombro do garoto.
- Ainda dói?
- Bem pouco – respondeu ele baixinho –, mas às vezes eu a sinto queimar – Lucas estremeceu lembrando a última vez que sua cicatriz havia doído.
Mikaella mordeu o lábio inferior e cruzou os braços contra o peito tentando não lembrar quando o mesmo aconteceu com ela.
- Depois de um tempo você se acostuma – disse ela quase para si mesma.
Logo Thomas abriu a porta e saiu com um sorriso estampado no rosto.
- Vamos? – disse ele animado pegando a mão de Mikaella.
Estranha mudança de humor...
Foi um tédio ficar com Thomas e Lucas disputando olhares e discutindo sobre qual é o melhor time – Astren ou Valen? – até que Mikaella se exaltou e disse que de todo coração e na maior modéstia do mundo que Bolts era o melhor time, que os batedores eram rápidos que nem uma bala, e Bolts tem a melhor capitão também, disse ela se gabando com um sorriso presunçoso nos lábios. Depois disso os meninos se calaram.
Era difícil poder falar com Lucas quando toda vez Thomas puxava Mikaella para a vitrine de uma loja “Olha amor, eles tem caximilhes”, disse ele na vitrine da Honingers. Caximilhes é tipo um cachimbo, a diferença é que em vez de soltar aquela fumaça inútil e que acaba com os pulmões os caximilhes soltam fumaças cheirosas e com um gostinho doce. Era muito raro encontrar caximilhes.
Depois de um tempo Mikaella conseguiu se libertar da mão de Thomas e se perdeu na vitrine da Vougloud – uma loja de roupa da moda bruxo. E tinha cada lançamento, as roupas eram incríveis, originais e lá tinha roupas de todos os estilos imagináveis – estilo girly, wild, glam, artsy, sassy, cutie...
Quando Mikaella se preocupou em procurar Thomas e Lucas viu que os dois estavam em frente a loja de artigos esportivos juntamente a Alex, conversando civilizadamente, e até rindo como se fossem amigos. Mikaella encarou aquela cena, perplexa. Ela fechou os olhos e balançou a cabeça. Você está vendo coisas, disse ela para si mesma. Depois tornou a olhar. Era quase impossível de essas coisas acontecerem, tudo bem, eles não se odeiam, mas nunca se toparam e agora conversando? Garotos!
Mikaella pensou em se aproximar, mas sentiu medo de estragar aquele momento lindo e raro entre o seu pecado, o seu acaso e o seu pacto – Alex, Thomas e Lucas.
Logo veio Lucas com aquele sorriso radiante na direção de Mikaella.
- Gosta daquela blusa? – perguntou ele apontando para a blusa lilás, sem maga e com ilhoses.
- Adorei... Minha cor preferida é lilás – disse Mikaella num tom monótono ainda tentando encaixar os detalhes daquela situação. – O que você estava falando com o Tom e o Alex?
- Ah, não é nada demais – respondeu ele de imediato – É papo de garotos...
- E desde quando garotos têm papo de garotos?
- Do mesmo jeito que meninas têm papo de meninas. Mas se um dia você quiser conversar comigo sobre o quanto você engordou, por mim tudo bem... Brincadeirinha – disse ele ao ver o olhar mortal de Mikaella.
- Eu to gorda? – perguntou ela depois de um longo tempo pensativa.
Ele olhou para Mikaella, de cima a baixo, analisando-a.
- Mikaella... – murmurou ele balançando a cabeça negativamente como se a pergunta dela fosse absurda.
- Gostou daquela blusa? – perguntou uma outra voz que Mikaella reconheceu como Alex.
Mikaella deu um breve sorriso e quando abriu a boca para falar foi interrompida.
- Sim, ela gostou – disse Lucas secamente – A cor preferida dela é lilás...
- Eu sei muito bem que a cor preferida dela é lilás – disse Alex ríspido.
- Meninos, meninos! – disse Mikaella antes que eles se agredissem.
Ambos bufaram e cruzaram os braços.
- Vocês são tão estranhos... – disse Mikaella – Há alguns minutos estavam conversando como se fossem amigos e agora estão soltando faíscas!
Alex travou o queixo e permaneceu em silêncio. Lucas soltou um suspiro longo.
- Te vejo depois, Mika – disse Lucas dando um beijinho na testa da mesma e saindo em seguida.
- Alex... – sussurrou Mikaella depois que Lucas já estava longe o suficiente para não ouvir.
- Sinto sua falta – disse ele bem baixinho ainda olhado para vitrine.
Mikaella desviou os olhos dele e começou a andar vagarosamente.
- Pensei que você já tinha se esquecido – murmurou ela quando percebeu que Alex andava em seu lado – E também pensei que ficar longe de mim era um item na listinha de regras da Michelly.
Ele soltou uma breve risada baixa.
- Esquecer de você? – Ele balançou a cabeça negativamente – E eu não sou um garoto de obedecer a regras.
Mikaella olhou para Alex reprimindo um sorriso pervertido. Porque ela, melhor que todo mundo, sabia que ele não era de obedecer às regras.
Os dois foram caminhando até o final da rua do vilarejo. Eles conversavam coisas tão fúteis que se distraíram a ponto de não perceber aonde iam.
Bem no finalzinho da rua eles se depararam com um chafariz no meio de um jardim colonial, Alguns metros depois havia uma mansão antiga, com o reboco caindo aos pedaços, cheia de umidade e mofo. Era assustadora. Alex e Mikaella encaram a mansão por uns longos segundos.
- É melhor a gente voltar – disse Mikaella recuando um passo.
Alex segurou a mão da menina e a fez voltar.
- Por que não entramos? – sugeriu Alex com um sorriso se formando em seu rosto.
- Será que é por que ela ta caindo aos pedaços? – rebateu Mikaella.
Ele sorriu radiante como uma criança arteira e puxou Mikaella pela mão. Nos primeiro passos em direção a mansão ela tentou lutar, prender os pés no chão, mas ele era mais forte que ela.
A maçaneta enferrujada rangeu quando a rodou para abrir a porta. Dentro da casa tinha um salão, o hall de entrada, e duas escadas curvadas nos cantos que dava ao segundo andar. O chão do salão que antigamente devia brilhar como um espelho, agora estava incrustado de poeira. E havia teias de aranha pendendo nos cantos da casa.
- Essa é a mansão dos Hawgeoff – murmurou Mikaella de má vontade.
- Então você conhece... – falou Alex num tom curioso e admirado.
Eles subiram as escadas aparentemente frágeis. No segundo andar havia quartos e quartos, eles entraram no primeiro. Parecia ser um quarto de uma menina, com um véu que cobria a cama, os móveis também corroídos por cupins, havia placas de reboco no chão e algumas ainda penduradas no teto ameaçando a cair...
- Alex – murmurou Mikaella quando uma aranha desceu na teia bem na sua frente.
Alex se virou tirando a aranha da frente de Mikaella. Ele parou para olhar em seus olhos.
- Por que está com medo? Você está comigo – disse ele com aquele sorrisinho meigo para transmitir confiança a ela. Com o dedão da mão esquerda ele afagou o cantinho da boca de Mika – Não precisa sentir medo.
Mikaella sentiu uma leve cócega no cantinho da boca que a obrigou a sorrir. Ela deixou sua mente esvaziar e deixou seu coração mais leve. Não precisava sentir medo.
- Mas Alex... – murmurou Mikaella mais uma vez. Alex olhou para ele controlando a impaciência. – Ta escurecendo – disse ela olhando para a janela.
Com o dedo indicador no queixo da menina ele manuseou o rosto de Mikaella voltando os olhos dela para os dele.
- Feche os olhos e tente não pensar mais em nada – sussurrou ele num tom tão irresistível que Mikaella, sem hesitar, obedeceu.
Depois de um leve suspiro Mikaella sentiu as mãos de Alex em sua cintura e, lentamente, ele a puxou para mais perto de seu corpo. Mikaella sentiu sua garganta arder, sentiu os lábios quentes e macios de Alex pressionaram-se em seu pescoço e depois contornarem a linha do seu maxilar enquanto ele afastava as mechas de cabelos que havia ali com uma mão. Ele subiu pelo queixo até sua boca, os lábios se movendo de forma delicada que Mikaella se submergiu em outro mundo bem diferente da mansão assustadora de Hawgeoff. Sua garganta queimava de desejo, um desejo desconhecido que ela nunca havia sentido antes.
Até que uma estranha nota musical os assustou fazendo ambos recuar um passo automaticamente. Mas não era nada de apavorante. Era uma velha caixinha de música, daquelas que tem uma bailarina miudinha dançando.
- Que linda – sussurrou Mikaella encantada.
Mikaella se aproximou da caixinha que estava posta em cima de uma cômoda de madeira velha meio corroída. Ela parecia tão hipnotizada que não percebeu que tudo a sua volta havia mudado. O ar não estava mais úmido e não havia cheiro de mofo. As placas de reboco que estavam no chão estavam impecavelmente fixas no teto branco. Era um quarto bege com os móveis em marfim e a luz do sol se radiava com intensidade ali.
A música era familiar, o ambiente era familiar e ela não sentia estranheza nenhuma de estar ali. Ainda hipnotizada olhando a bailarina girar...
- Katherine – sussurrou a voz perto do seu ouvido.
Com o susto, Mikaella se libertou abruptamente de seus devaneios.
Ela encarou Alex com a expressão perplexa.
- É melhor a gente ir agora – disse ele.
- Por que me chamou de Katherine? – indagou Mikaella.
Alex franziu o cenho.
- Eu te chamei de Mikaella – disse ele pausadamente. Ele encarou Mikaella por um tempo e depois balançou a cabeça – Vamos logo, o cheiro do mofo deve está afetando sua mente.
Mikaella deu uma última olhada na caixinha de música que ainda tocava. Alex tornou a segurar sua mão e os dois saíram dali.
Quando Mikaella pôs os pés para fora do quarto a música lenta e melancólica cessou.
A rua do vilarejo estava desertamente vazia. Só havia alguns alunos circulando por ali, mas eram bem poucos. O pôr-do-sol refletia um tom púrpuro no céu.
Ao chegarem ao castelo eles foram diretamente para a sala comunal. Mikaella sugeriu que Alex ficasse um pouco atrás ou a sua frente, porque se Michelly os visse juntos de novo os matariam. Então Alex diminuiu os passos e deixou Mikaella ir à frente.
O castelo estava quente. Enquanto subia as escadas, Mikaella começou a tirar o sobre tudo jeans escuro ficando apenas com uma blusa branca e fina por baixo. Quase transparente a ponto de poder ver a renda delicada da alça do seu sutiã. O olhar de Alex se demorou ali e sua cabeça pendeu de lado maliciosamente. Mikaella o olhou por sobre o ombro e ele corou voltando a cabeça ao lugar e engolindo a seco. Ela sorriu.
Primeiramente, Mikaella; quando entrou no salão comunal percebeu que também estava vazio. Mesmo assim, ela subiu direto para o dormitório feminino.
Em cima de sua cama havia outra caixinha e ela sentiu repulsa em abrir. Ela pegou a caixinha e foi para o banheiro. Entrou num boxe deixando a porta aberta para caso de emergência a fuga ser facilitada. Mikaella abriu a caixinha lentamente. Mas não tinha nada de explosivo dentro da mesma. Havia apenas um pedaço de pergaminho em forma de flor. E nele estava escrito:
Salão Principal.
E logo ela conheceu a caligrafia absurdamente correta. Era de Michelly, e que bilhete estranho para se colocar em uma caixinha...
Mikaella saiu do boxe do banheiro se sentindo meio estúpida, mas precaução nunca é demais, certo?
Ela voltou para o dormitório e sentou na cama, e ficou ali por um longo tempo pensativo. Pensou em pegar o diário... Mas iria ir ao salão principal primeiro. Seja lá o que fosse acontecer lá, ela iria escrever. O diário já havia se tornado uma necessidade depois de tudo o que aconteceu, depois de todos os segredos que Mikaella teve que guardar, mas se não fosse a linguaruda da Entwhist nada disso estaria acontecendo. Ou estaria... talvez.
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