Aceitar o Inevitável
Não abri os olhos imediatamente, sinceramente não me lembrava de ter dormido tão bem desde... eu nem sabia a última vez. Minhas mãos deslizaram pelos lençóis, mas era... firme demais? Olhei pelo canto do olho e conti um grito de espanto: Harry James Potter, meu melhor amigo desde sempre, dormia tranquilamente em minha cama e como se não bastasse, minha cabeça repousava em seu peito, nossas pernas entrelaçadas, a mão dele repousando em minha cintura parcialmente exposta, me envolvendo de forma protetora. Que diabos... ? Recuperada do choque inicial, me desvencilhei suavemente, me sentando. Olhei para o relógio ao lado, marcava 5:00 da manhã, pelo menos ninguém estava acordado: eu sabia que não havia acontecido nada, mas pra quem estava de fora talvez não fosse tão óbvio.
Me virei para ele, parecia tão tranqüilo que por um momento não quis ter que acordá-lo. Ele havia sido tão doce na noite anterior, conversando comigo até que eu me acalmasse e conseguisse dormir, mas possivelmente ele estava tão exausto que acabou dormindo também. Eu comecei a mexer em seus cabelos negros, sempre despenteados, ficando assim por algum tempo até me aproximar de seu ouvido e sussurrar:
- Harry? – ele remexeu e espreguiçou-se – os orbes verdes se abriram lentamente pra encontrar os meus castanhos. Ele olhou ao redor, confuso – você acabou adormecendo, acordei tão perdida quanto você.
- Que horas são? – perguntou ao endireitar-se, esfregando os olhos sonolentos.
- Umas 5:00.
- Acho que eu devo ir, então – murmurou ao passo que se levantava. Antes que alcançasse a porta eu o chamei, impulsivamente:
- Harry... – ele se virou – obrigada, de verdade. Confesso que não me recordo de ter dormido tão bem nos últimos tempos. Você é um excelente travesseiro, devo acrescentar – ele me sorriu, divertido.
- Obrigado pelo elogio, se é que pode ser considerado um – ele riu – Até mais tarde, Herms – despediu-se e fechou a porta. Não tardou e dormi novamente, imersa num mundo sem lobos, bruxas más e facas.
- Cadê o Harry? – Indaguei meu melhor amigo ruivo enquanto caminhávamos pelo jardim
- Ainda dormindo, acho. – "pobre Harry, ficou acordado até tarde por minha causa", pensei. Acomodamos-nos num banco de madeira, observando arbustos e árvores mais a frente. Ron parecia triste.
- O que houve com você? Está tão quieto – eu estava preocupada – Não está gostando daqui?
- Não, nada disso! Bem legal você ter nos convidado e seus pais são incríveis. É só... – ele suspirou pesadamente - papai me mandou uma carta ontem à noite, quer que eu ajude George a tomar conta da loja.
- Ele não poderia ter esperado você voltar pra casa pra conversar sobre isso?
- Ah não... Disse que queria que eu tivesse um tempo pra pensar longe de casa, sabe? Mamãe já tomou a decisão dela, se assim posso dizer – ele riu, um tanto amargo – mas eu não decidi nada, não sei o que pensar.
- Você quer isso? Digo... Tem vontade de trabalhar lá?
- Acho que sim. Quando nós íamos lá eu ficava fascinado, louco de vontade de fazer aquilo, parecia tão divertido! Mas ao mesmo tempo, ocupar o lugar de Fred me parece errado, não sei explicar. Não sei como me sentiria trabalhando no lugar que ele e George construíram, com coisas que são totalmente idéias deles. Sem contar que não faço idéia de como George se sente em relação a isso.
- Olha, na minha opinião – e antes que prosseguisse segurei a mão dele, odiava vê-lo infeliz, por qualquer que fosse o motivo – se você acha mesmo interessante trabalhar lá, você devia aceitar, Ron. Quem melhor que você pra fazer isso? George é também seu irmão, você o conhece perfeitamente bem, poderá ajudá-lo como poucos fariam e ainda por cima faria companhia a ele.
- Se você olha por esse lado... Vou pensar com calma nisso. Imagina só, eu trabalhando no comércio, responsável por um loja? Você vai ter que ir lá, mesmo provavelmente estando em Hogwarts, e não poderá banir meus produtos na escola. – eu o encarei surpresa - Ei! Tudo bem que eu sou lento pra perceber certas coisas, mas não é preciso somar dois mais dois pra saber que a Srta-Sabe-Tudo-Granger gostaria de voltar pra escola. A questão é... Você vai voltar?
Eu tive que rir ao responder, não é que Ronald Weasley podia ser perspicaz? – Okay, tudo verdade. Mas vai ser difícil. – confessei - As últimas lembranças que tenho de Hogwarts definitivamente não são as melhores.
-Sei o que quer dizer. Então se as coisas seguirem assim, estaremos separados em breve, se bem que Harry pode resolver voltar pra escola também.
- Difícil dizer. De qualquer modo, iremos nos ver sempre. – a perspectiva de estar longe dos dois fez meu estômago afundar
- Eu sei... Se bem que não seria de todo mal, voltar, quero dizer. Hogwarts me trás boas lembranças também, apesar de tudo – ele ponderou – eu não mudaria nada, pelo menos nada que eu tenha feito. Mas considerando aquilo que não fiz, talvez uma azaração bem dada em Malfoy fizesse bem.
- É, tem isso. – eu ri – Se ao menos eu tivesse lhe dado mais um soco! – eu parei por um instante, pensando no que eu faria diferente – talvez eu poderia ter levado e F.A.L.E mais à serio, não sei.
- Ah, não, o FALE não! – ele fez uma cara de horror e eu fiz meu melhor pra conter uma risada.
- Não é FALE Ronald, é F.A.L.E! Meu consolo é pensar que nada aconteceu aos elfos na batalha final, graças a você. E se... - A sentença morreu em meus lábios no exato momento em que ouvi minhas próprias palavras, que eu sabia que eram as erradas. Muito erradas. Não era daquela forma que eu gostaria de tratar do tão delicado e cuidadosamente evitado assunto. Mas já que a besteira estava feita pelo menos iríamos esclarecer aquilo, de uma vez por todas. Ele me olhou espantado, completamente pego de surpresa pela introdução acidental do tópico, seu rosto atingindo uma tonalidade bem próxima a dos seus cabelos. "Ah, que se dane", pensei antes de brincar com todo esforço possível – eu até te agradeci por isso!
- É... – ele estava monossilábico. Não era um bom sinal.
- Talvez não seja uma boa hora pra falar disso.
- Não... Não é isso.
- Eu tenho pensado muito naquilo, Ron – olhei para as nossas mãos ainda entrelaçadas e resolvi continuar – e não me arrependo nenhum instante. Quando você começou a sair com Lavender, eu confesso que me fez sentir estranha e sei também que havia certa tensão entre nós. E eu pensei, porque não? Pode dar certo. Mas venhamos e convenhamos, a gente discute o tempo inteiro por qualquer coisa. Não me parece que seria um relacionamento saudável, tanto pra mim quanto pra você. Não parece certo, entende? Por mais que todo mundo venha me dizer que opostos se atraem e que nossas brigas são sinal disso... Eu não quero arriscar o que eu tenho com você por algo que tem grande potencial de dar errado. Eu não quero acabar te machucando sem razão de ser, nem me machucar a cada briga que teríamos. Você é importante demais, especial demais pra eu te magoar.
Ele me olhou e pra minha surpresa deu um sorriso – É impressionante como você sabe usar as palavras melhor que eu. – ele pausou – Sinceramente? Eu venho pensando como você, nos últimos tempos. Não que não tenha sido incrível o que aconteceu, não que eu não gostasse de você de verdade. Eu percebi o que sentia por você no terceiro ano, mas era sempre mais fácil implicar com você do que ser gentil. Era impossível não gostar de você! Você é linda, doce, incrivelmente inteligente e dona do maior coração que eu conheço – ruborizei, sem graça – Mas hoje, depois que tudo acabou eu vejo que gostar nunca foi o bastante. Nunca seria. Eu precisava te respeitar pelo que era, aceitar suas escolhas e te apoiar nelas. E nunca foi assim, você sabe disso. E eu sei que você vai me achar horrível pelo que eu vou dizer, mas um dos motivos da atração que eu sempre tive era inveja. –o olhei perdida - Veja bem, você sabe que eu sempre tive problemas com a atenção que Harry recebe, por mais idiota que fosse e por mais que ele odiasse recebê-la. Mas a relação de vocês é algo que está além de tudo que eu conheço: você é inabalavelmente fiel a ele, ele confia a vida dele a você sem nem pestanejar. Você é ligada a ele de uma maneira estranha, como se pudessem ler os pensamentos um do outro e se entendessem por um olhar. Eu quis isso pra mim, mas sei que eu não seria capaz de manter uma relação assim com você: somos diferentes demais pra isso. E eu nunca te faria feliz da forma que você merece, não pensando dessa forma. Você é minha melhor amiga, a melhor que existe no mundo inteiro e eu gosto demais do que temos. Eu amo você, Hermione Granger, mas como irmã. – eu joguei o pouco controle que ainda tinha e me atirei impetuosamente em seus braços e não quis largar. Era a conversa que eu mais temia e saber que estávamos bem, que ele não me odiava era absolutamente maravilhoso.
- Você não me detesta – eu disse, idioticamente feliz, eu chorava.
- Claro que não! – ele revirou os olhos - Por que diabos eu faria isso? Deixe de ser boba!
- Eu amo você também, sabe disso né? – era importante pra mim que soubesse o que significava em minha vida
- Óbvio que sei. Você teria me azarado em algum momento desses sete anos se não o fizesse! – ele me deu um beijo na testa – pare de chorar, não gosto quando chora.
- Mas é de felicidade – argumentei.
- Só vocês mulheres pra chorarem de felicidade... – quando eu sequei as lágrimas e lhe sorri ele se levantou repentinamente, puxando-me pela mão - Vamos lá, tenho sérias dúvidas se Harry está vivo, afinal são quase meio-dia.
Acontece que Harry estava bem acordado, ajudando minha mãe na cozinha com o almoço.
- Eu não vou comer algo que você fizer Potter, sem ofensa - brincou Ron assim que entendeu o que se passava.
- Não lembro de você ter deixado de comer alguns meses atrás, na verdade se bem me lembro você reclamava por mais.
- Mas agora é diferente. Entre a sua comida e a da Sarah... bem, não é justo com você, sabe? – todos nós rimos.
- Onde estavam? – ouvi minha mãe perguntar
- Lá fora, conversando um pouco. Daí resolvemos checar se o Harry estava vivo - Eu me encarreguei dos legumes e Ron da mesa e dos talheres.
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- Mas porque mesmo você tem que ir? – perguntei, pela milésima vez.
- Eu quero resolver tudo logo, você mesmo disse pra eu aceitar! – ele me lembrou.
- Quando você voltasse, na data prevista!
- Hermione, eu quero começar isso o quanto antes. Depois de conversar com você e depois com Harry eu percebi que quero fazer isso!
- E eu quero que você fique! - Era noite já, e estávamos os três na sala da televisão. Ron havia decidido voltar pra casa antes do esperado, aceitando a proposta de trabalhar na "Gemialidades Weasley". Eu tentava convencê-lo a ficar um pouco mais, Harry me ajudava, complementando - Cara, você podia ficar mais um pouco, pelo menos até amanhã!
- É Ron, só mais um pouco. Se você for agora já é tarde, vai ter que esperar até amanhã pra conversar com George e seu pai. – supliquei e pude notar Harry pelo canto do olho, mal segurando o riso diante da cara de cão sem dono que eu fazia pra Ron, eu mesma quase não me controlava – por favor...
- Argh, vocês dois... Eu fico – afirmou, contrariado - mas só até amanhã antes do almoço, certo?
- Antes? E eu que tinha falado pra minha mãe fazer lasanha, que você gosta tanto – argumentei com falso desapontamento em seus olhos – mas eu falo com ela então. Alguma preferência, Harry?
- Talvez seja melhor... – ele resolveu entrar no jogo, mas antes que prosseguisse Ron o interrompeu:
- Tá, okay, vocês venceram. Depois do almoço. – ele me encarou seriamente – você tem que ser a bruxa mais astuciosa e perigosa que conheci, Srta Granger.
Eu fiquei conversando com os dois até tarde, até o sono me vencer, cada um planejando o que fazer. Em meio a uma guerra de almofadas Harry decidiu reformar o Largo Grimmauld, 12. Não sabia se moraria lá, mas era um começo. Eu me dispus a ajudar com a arrumação e nós partiríamos na segunda
Nota da Autora: Nesse cap. eu quis suavizar o Ron e a reação dele. Eu sei que provavelmente a conversa não seria tranquila assim, mas achei importante salvar a amizade dos dois ;D
Ah, peço desculpas pelos erros. Meu beta sumiu do mapa e eu acabei revisando sozinha, mas depois de ler a mesma coisa 20 vezes eu já não tinha certeza do que estava vendo.
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