Capítulo 3
O vento soprava forte na rua. A neve caía constantemente, deixando a noite fria e escura. A família Dursley dormia profundamente. Não perceberam que, por baixo da porta dianteira, uma sombra parecia dançar. Ela então adentrou a sala pela fresta da porta, materializando-se em uma espécie de nuvem de fumaça bem suave. Não era espessa, e isso a fazia muito volúvel. Era como uma criança curiosa, dançando pelo lugar. Dançou pela cozinha, pela mesa de jantar, pela árvore de natal. Passou pelos vários presentes que lá estavam. Então subiu as escadas, lentamente, dançando e dançando.
Duda estava tendo problemas para dormir. No meio de seu sono, o frio aumentou muito, e ele começou a tremer. Tremeu tanto que acordou. Duda sentou-se na cama, procurando se esquentar enquanto se perguntava a origem de todo aquele frio. A casa era aquecida, não havia motivo para o frio. Nem para aquele vento. Duda ficou de pé e foi até a porta do quarto.
Não conseguiu expressar em palavras o que sentiu ao ver a nuvem dançando. Na verdade, não conseguiu emitir som algum, estava parado, olhando para a escada, boquiaberto, enquanto a nuvem dançarina vinha em sua direção.
A nuvem parou bem na frente de Duda. Se fumaça tivesse olhos, ela estaria o encarando. E encarando não por encará-lo, seria mais como se o estivesse analisando, como um estudioso faria. Então, num momento de lucidez, Duda gritou e correu em direção ao quarto dos pais.
Petúnia e Valter Durley acordaram com o grito do filho. Deu tempo apenas para Valter ligar o abajur e Petúnia tirar a máscara dos olhos, para verem Duda correndo quarto adentro com o rosto branco de pavor. Ele pulou na cama dos pais e ficou olhando para a porta, assim como o casal ocupante do quarto.
A nuvem de fumaça, lentamente, foi entrando no quarto, sempre dançando. Quando ficou bem em frente à família toda, a nuvem começou a condensar. E foi crescendo, vagarosamente, tomando forma de alguma coisa alta. Os Dursley viam tudo aquilo estupefatos. Ninguém ousava dar uma palavra sequer, enquanto a coisa ficava mais definida. Até que, por fim, o chapéu do topo da cabeça do homem se formou, e a família que estava amedrontada na cama pode ver que se tratava de um bruxo. De fato, era um bruxo conhecido. Era o mesmo que havia deixado, há tantos anos, um bebê com uma carta na porta da família, o mesmo que, há não tantos anos, havia entrado naquela mesma casa, tarde da noite, para levar o sobrinho dos Dursley embora.
– Espera um momento, eu conheço esse homem – bradou o Sr. Dursley.
– Sim, eu esperava que o senhor se lembrasse de mim – disse o novo ocupante do quarto – eu sou Alvo Dumbledore.
– Mas, mas... Você estava morto! – exclamou Sra. Dursley – Ele está morto, não pode estar aqui, o garoto e aquela gente disseram que ele havia morrido!
– Sim Petúnia, de fato estou morto. Mas veja bem, aqueles que morrem nunca se vão de verdade. Há muito mais segredos na morte da que se realmente imagina.
– Você é um fantasma? – perguntou Duda abobalhado.
– Não, não sou um fantasma – respondeu Dumbledore risonho – sou o que você pode chamar de lembrança. Sabem, os mortos não permanecem embaixo da terra, dentro de seus caixões. Seus espíritos são libertos do corpo com a morte. Para alguns, o destino é ir para o outro plano, plano espiritual. Mas há aqueles que temem o que podem encontrar do outro lado. Estes ficam nesse mundo. Eles se tornam fantasmas.
– Mas se você está aqui, então é um fantasma. – disse Valter, como se houvesse dito algo brilhante, que apenas sua inteligência desenvolvida havia sido capaz de descobrir.
– Não meu caro. A morte não é algo tão simples. – disse Dumbledore, explicando aos Dursley da mesma forma que explicava transfiguração em seus tempos de professor em Hogwarts - Não existe o sim ou o não. Ela é complexa, e tem várias formas de se mostrar, assim como a mágica. Elas de fato se fundem em vários momentos, momentos que podem ser obscuros, povoados pelas trevas, ou podem ser puros, repletos de luz. Eu fui para o outro lado. Embarquei na viagem para a eternidade. Mas há horas em que é necessária a vinda de alguém que já se foi para que a humanidade possa caminhar como se deve.
– E essa, por acaso, é uma dessas horas? – indagou Petúnia.
– Sim. Esta é uma dessas horas.
Dumbledore andou um pouco pelo quarto, enquanto fitava a família Dursley, ainda amedrontada e receosa. Não era todo dia que um morto voltava do além para fazer a humanidade caminhar como devia em sua casa. O velho diretor parou perto da cômoda, do outro lado do quarto.
– Eu reparei nas fotografias que vocês têm lá embaixo. São muitas. E vocês parecem estar muito felizes em todas elas.
– Bom, nós pretendíamos que elas mostrassem a quem quer que venha a nossa casa o quão felizes nós somos – disse Valter com um orgulho que deixaria o ser mais orgulhoso do mundo com inveja.
– De fato. Mas percebi também que não há nenhuma foto de Harry. Pergunto-me por que.
O clima no quarto ficou mais frio ainda, se isso era possível. Os Dursley se encararam, perguntando-se, em silêncio, se deveriam dizer alguma coisa.
– É perceptível a quem quer que venha a sua casa, que saiba que vocês têm um sobrinho que morou por vários anos nesta casa, que vocês não cuidaram de seu bem estar nem por um momento. Era de se esperar que após minha visita há pouco mais de dois anos fizesse com que sua relação para com Harry mudasse um pouco.
A família Dursley estava estupefata. Como aquele homem tinha a audácia de voltar dos mortos para passar-lhes sermão por causa daquele delinquente?
– Hoje é Véspera de Natal, e eu não vejo sinais de que vocês tenham tido a Ceia com seu sobrinho – disse Dumbledore, mantendo sua expressão tenra.
– É claro que não vê, porque nós não ceamos com ele – bufou Valter Dursley, dizendo “ele” com uma expressão de total desprezo.
– Pois deveriam ter ceado – disse Dumbledore – Harry é seu sobrinho, não há como negar esse fato. Mas vocês evitam qualquer contato que seja com ele. Após o fim da guerra, tudo está em paz, menos o coração de vocês, pois ele carrega mágoas de muito tempo.
– E o que você tem com isso? – gritou Petúnia, indignada – Não é da sua conta se nós falamos com o garoto ou não, se nós gostamos dele ou não. Por que está aqui afinal?
– Veja bem, estou aqui exatamente por isso – disse Dumbledore, sem alterar sua voz calma – Essa relação entre vocês deve ser mudada. Vocês receberão essa noite a visita de três espíritos. Eles irão ajudá-los a rever suas atitudes.
– Como é? Três espíritos virão aqui fazer o que? – perguntou Duda, com expressão ainda abobalhada.
– Vão fazer com que vocês repensem seus atos para com Harry e sua família e amigos – disse Dumbledore sereno – Bem, agora eu devo ir. Gostaria que vocês não desperdiçassem essa oportunidade.
E ele se foi com o vento, um vento que ainda insistia em soprar dentro da casa, mas que se extinguiu com a ida definitiva do velho diretor.
– Eu não estou entendendo querido – exclamou Petúnia ao marido – O que ele quis dizer com isso? Mais fantasmas vem aqui?
– Não sei Petúnia. Acho que comemos demais e estamos tendo pesadelos.
– Todos estamos tendo o mesmo pesadelo, pai?
– Isso filhão. Acho melhor voltarmos todos a dormir. Amanhã vai ficar melhor.
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