Capitulo 08



Capitulo 08


 


- Acredito que perdemos a cabeça. - Hermione se agarrou ao assento quando o bico do Cessna se elevou para o suave céu outonal.


Relaxado ante os controles, Harry a olhou um segundo.


- Vamos, não gosta de aviões?


- Claro que sim. – uma corrente de ar sacudiu o avião - Mas com auxiliares de vôo.


- Há uma despensa atrás. Quando estabelecermos nossa altura de vôo, pode se servir.


Não se referia a isso, mas preferiu guardar silêncio e ver como a terra ia ficando abaixo. Gostava de voar, ainda que com certos rituais: abotoar-se o cinto de segurança, selecionar um canal de música para ouvir pelos fones, abrir um livro e isolar-se durante a duração do vôo.


Não agradava pensar em todos os comandos sobre os que exercia nenhum controle.


- Sigo pensando que é uma perda de tempo.


- Draco não questionou a idéia. – ele assinalou – Olhe Mione, conhecemos a localização geral da choupana. Estudei essa maldita fita até que os olhos quase me saírem das órbitas. A reconhecerei quando a ver, e quase todos os objetos circundantes. Vale a pena verificar.


- Talvez. – foi à única coisa que esteve disposta a ceder.


- Pense nisso. – estabilizou a avião em seu curso. - Sabem que tem alguém atrás deles. Por isso deixaram a cobertura. Sem dúvida vão perguntar-se onde foi parar essa fita, e se tentam pôr-se em contato com Leio, não o encontrarão, já que você o tem vigiado numa casa segura.


- Então se manterão longe de Denver. – conveio ela. Os motores eram um ruído horrível em seus ouvidos - É possível que inclusive levantem o acampamento e se mudem.


- É o que temo. – apertou os lábios ao deixar Denver atrás - O que acontecerá com Liz se o fazem? Nenhuma das opções tem um final feliz.


- Não. – isso, e a aprovação de Draco, tinham-na convencido de acompanhar a Harry - Não.


- Tenho de pensar que por momento não se moverão da choupana. Ainda que deduzam que sabemos que existe, não poderão pensar que conhecemos sua localização. Desconhecem que falamos com Jade.


- Concedo isso a você, Potter. Mas me dá a impressão de que conta com a sorte para que guie até eles.


- Já tive sorte antes. Se sente melhor? – perguntou quando o aparelho se estabilizou - É bonito aqui acima, não?


Tinha neve nos cumes ao norte, e entre as montanhas tinha uns vales largos e planos. Voavam a suficiente baixa altura como para poder vislumbrar os carros na estrada, as comunidades de pequenos grupos de casas e o bosque verde e denso ao oeste.


- Tem suas vantagens. – de repente ocorreu um pensamento que fez que girasse para Harry - Tem licença para pilotar aviões, Potter?


Olhou-a e esteve a ponto de soltar uma gargalhada.


- Deus, você me deixa louco, tenente. Quer um casamento em grande estilo ou um íntimo e pequeno?


- É você quem está louco. – sussurrou e se concentrou em olhar pela janela. Comprovaria se tinha licença quando regressassem a Denver - Disse que não ia voltar a tocar nesse assunto.


- Menti. – repôs com alegria. Apesar da preocupação que não conseguia dissipar-se por completo, nunca tinha se sentido melhor na vida - Isso me provoca um problema. Uma mulher como você sem dúvida poderia curar-me.


- Cure-se com um psiquiatra.


- Mione, vamos formar um casal perfeito. Espere até minha família conhecer você.


- Não acho que vou conhecê-la. – atribuiu a súbita agitação em seu estômago a outra turbulência.


- Bem, talvez tenha razão nisso… ao menos até que estejamos preparados para entrar na igreja. Minha mãe tende querer controlar tudo, mas você saberá lidar com ela. Meu pai gosta das regras. O que significa que combinam como os ovos e o bacon. Assim é o almirante.


- Almirante? – repetiu, apesar de ter jurado guardar silêncio.


- É um homem da marinha. Seu coração se destroçou quando me incorporei às Forças Aéreas. – encolheu de ombros - Provavelmente fiz por isso. Depois tenho uma tia… bom, será melhor que os conheça em pessoa.


- Não vou conhecê-los. – repetiu, irritada porque a declaração soava petulante demais. Soltou o cinto de segurança e foi à parte de trás, onde se pôs a remexer até encontrar uma lata de amendoins e uma garrafa de água mineral.


A curiosidade fez que abrisse o pequeno compartimento de refrigeração, onde viu uma diminuta lata de caviar e uma garrafa de vinho.


- De quem é este avião?


- De um amigo de Draco. Um jockey que gosta de voar com mulheres.


- Deve ser Frank, o libertino. – grunhiu ao regressar a seu assento - Há anos tenta me convencer de que voe com ele pelos céus sexys.


- É? Não é seu tipo?


- É tão óbvio. Ainda que os homens tendem a ser.


- Tenho que lembrar se ser sutil. Vai se comportar comigo?


- Isso é Boulder? – ofereceu-lhe a lata.


- Sim. Aqui porei rumo noroeste e voarei em círculos. Draco me contou que tem uma choupana perto.


- Sei. Muita gente tem. Gostam de escapar os fins de semana da cidade para passear pela neve.


- Não é de seu agrado?


- Não vejo nenhum sentido em neve e esquis. E o principal objetivo de esquiar, pelo que vejo por mim, é voltar ao refúgio para beber rum quente diante da chaminé.


- Ah, é aventureira.


- Vivo para a aventura. Na realidade, a choupana de Draco tem uma bonita vista. – reconheceu - E às crianças se encantam.


- Assim, vejo que já a visitou.


- Algumas vezes. Agrada-me mais ao final da primavera e começo do verão, quando há poucas possibilidades de que os caminhos fiquem fechados. – baixou a vista às ladeiras e nevascas - Odeio a idéia de me ver presa.


- Pode ter suas vantagens.


- Não para mim. – guardou silêncio um momento, contemplando as montanhas e as árvores - É bonito. –concedeu - Em particular por essa vista. Parece um quadro.


- A natureza à distância. – sorriu - Pensava que as garotas da cidade sempre almejavam um refúgio no campo.


- Não esta garota de cidade. Prefiro… - sofreram uma chacoalhada violenta que fez que os amendoins saíssem voando e que Hermione se segurasse - Que demônios foi isso?


Com os olhos entrecerrados, Harry estudou os indicadores enquanto se ocupava em levantar o bico do aparelho.


- Não sei.


- Não sabe? Que quer dizer com que não sabe? Se supõe que deve saber!


- Sss! – virou a cabeça para prestar atendimento aos motores - Perdemos pressão. – comentou com a calma fria que o tinha mantido com vida nas selvas rasgadas pela guerra, nos desertos e nos céus cheios de metralha.


Quanto Hermione compreendeu que o problema era sério, respondeu com frieza.


- Que faremos?


- Vou ter que aterrissar.


- Onde? – olhou abaixo, estudando com expressão fatalista os bosques e as colinas.


- Segundo o mapa, há um vale uns poucos graus ao leste. – modificou o curso enquanto ativava uns interruptores - Observe a paisagem. – ordenou, depois ligou o rádio - Torre de Boulder, aqui Baker Able John três.


- Ali. – Hermione assinalou em direção ao que parecia ser uma faixa muito estreita de terreno plano entre cumes rompidos. Harry assentiu e continuou informando à torre de sua situação.


- Segure-se. – disse. - Vai ser um pouco movimentado.


Ela obedeceu e se negou a afastar a vista à medida que a terra corria a seu encontro.


- Segundo meus relatórios, é um bom piloto, Potter.


- Está a ponto de averiguá-lo. – reduziu a potência, adaptando-se às correntes enquanto enfiava o avião para o vale estreito.


“É como manejar um agulha” pensou Hermione. Depois conteve o fôlego ao sentir o primeiro impacto forte das rodas sobre o solo. Quicaram, deslizaram com chacoalhadas e terminaram por deter-se.


- Está bem? – perguntou Harry no instante seguinte.


- Sim. – soltou o ar contido. Tinha o estômago revirado, mas além disso se sentia bem - Sim, estou bem. E você?


- Perfeitamente. – alongou as mãos para emoldurar-lhe o rosto e aproximou-se o suficiente para dar-lhe um beijo. - Por todos os céus, tenente. – comentou, beijando-a outra vez - Mostrou-se impassível.


- Medo. – quando essa mulher estava acostumada a emoções estáveis, custava saber o que fazer quando tinha o impulso de rir e gritar ao mesmo tempo. Empurrou-o. - Quer me deixar sair desta lata? Não notou que cairia bem um pouco de terra firme sob os pés.


- Claro. – abriu a porta e a ajudou a descer - Vou transmitir nossa posição por rádio. - informou.


- Bem. – respirou fundo o ar frio e limpo e firmou as pernas. Com prazer, descobriu que não as tinha frouxas. Era a sua primeira aterrissagem forçada, e esperava que fosse a última. Devia reconhecer que Harry tinha atuado com serenidade e perícia.


Não se pôs de joelhos para beijar o solo, mas agradeceu tê-lo sob os pés. Como bônus adicional, a paisagem era magnífica. Estavam entre montanhas e bosques, protegidos do vento, e podia observar a neve que caía dos cumes rochosos sem sofrer seus inconvenientes.


O ar era esplêndido, o céu azul e o ambiente fresco tonificavam o sangue. Com um pouco de sorte, os resgatariam numa hora, de modo que podia permitir-se o luxo de desfrutar da paisagem sem sentir-se abrumada pela solidão.


Sentia-se em sintonia com o mundo quando ouviu que Harry baixava da cabine. Inclusive sorriu a ele.


- E bem, quando vão vir procurar-nos?


- Quem?


- Eles. A equipe de resgate. Já sabe, esses heróis altruístas que retiram as pessoas de situações complicadas como esta.


- Oh, eles. Não virão. – deixou no solo uma caixa de ferramentas, depois regressou ao interior para pegar uma escada pequena de madeira.


- Perdoe-me? – conseguiu dizer ao encontrar a voz. Soube que se tratava de uma ilusão, mas as montanhas de repente pareceram maiores - Disse que ninguém vai vir procurar-nos? O rádio não funciona?


- Está perfeito. – subiu os degraus e levantou a tampa do motor. Já se tinha metido um trapo no bolso de trás do jeans - Disse a eles que iria verificar se posso consertar o motor e os manteria informados.


- Você disse a eles...? – moveu-se a toda velocidade, antes de que nenhum dos dois pudesse entender a intenção que almejava. O primeiro golpe foi nos rins e o fez descer da escada cambaleando - Idiota! Quer dizer que você vai consertar essa lata? – lançou outro golpe, mas ele esquivou, mais desconcertado do que irritado - Não se trata de um Ford avariado na estrada, Potter. Não é um maldito avião.


- Não. – respondeu com cuidado, pronto para seu seguinte ataque - Acredito que é o carburador.


- Acredita que é… - soltou o ar por entre os dentes e cerrou os olhos - Acabou. Vou matar você com as minhas próprias mãos.


Lançou-se sobre ele. Harry tomou uma decisão numa fração de segundo, girou e deixou que o impulso dela os levasse ao solo. Demorou outro segundo em dar-se conta de que não era inexperiente no combate corpo a corpo. Recebeu um golpe no queixo que fez seus dentes se chocarem. Tinha chegado o momento de pôr-se sério.


Rodeou-lhe o corpo com as pernas e, depois de uma breve luta, conseguiu colocá-la de costas.


- Calma, ok? Alguém vai se machucar!


- E não está errado.


Como a razão não funcionava, empregou seu peso, situando-se sobre ela enquanto lhe imobilizava os pulsos. Hermione esforçou-se duas vezes, depois ficou quieta. Ambos sabiam que só ganhavam tempo até encontrar o momento propício para lançar outro ataque.


- Escuta. – concedeu outro momento para recuperar o ar, depois lhe falou diretamente ao ouvido - Era a opção mais lógica.


- É uma merda.


- Deixa eu explicar. Se depois estiver em desacordo, ganhará quem derrube ao outro duas vezes em três chances. De acordo? – quando não obteve resposta, Harry apertou os dentes - Quero que me dê sua palavra de que não me dará um murro até que termine.


- Está certo. – aceitou de má vontade.


Com cautela, Harry se ergueu até poder ver o rosto dela. Estava se levantando quando ela subiu o joelho para golpeá-lo com força na virilha.


Ele não teve ar para amaldiçoá-la enquanto se colocava em posição fetal.


- Não foi um murro. – assinalou Hermione. Levou certo tempo para alisar-se o cabelo e sacudir a jaqueta antes de levantar-se - Muito bem, Potter, agora você pode falar.


Ele levantou uma mão, emitiu uns sons abafados e esperou que as estrelas desaparecessem de seus olhos.


- Pode ter posto em perigo nossa descendência, Mione. – ficou de joelhos como pôde e respirou com dificuldade - Você não briga limpo.


- É a única maneira de brigar. Fale.


Ao recuperar as forças, lançou um olhar assassino.


- Devo uma a você. E grande. Não estamos feridos. – soltou - Ao menos eu não estava até que você me atacou. O aparelho está ileso. Se der uma olhada ao redor, verá que não há espaço para que outro avião aterrisse com segurança. Poderiam enviar um helicóptero e nos resgatar com um cabo, mas, para que? As possibilidades são que, se realizo uns ajustes menores, podemos sair daqui.


“Talvez faça sentido”, pensou Hermione. Mas não era uma coisa simples.


- Deveria ter falado comigo. Eu também estou aqui, Potter. Não tinha direito de tomar essa decisão sozinho.


- Foi meu erro. – voltou e regressou coxeando à escada - Supus que era uma pessoa lógica e que, sendo servidora pública, não queria ver outros servidores públicos se dedicarem a um resgate desnecessário. Ademais, maldita seja, Liz poderia estar por trás daquela montanha. – com um movimento violento, sacou uma ferramenta da caixa - Não penso voltar sem ela.


“Oh, tinha que apertar essa tecla”, pensou ela ao voltar-se para observar o verde profundo do bosque próximo. Tinha que deixar de ouvir a preocupação em sua voz, ver o fogo em seus olhos.


- Tem toda a razão.


O orgulho era a pílula que pior se engolia. Fez o esforço, regressou e se situou junto à escada.


- Eu sinto muito. Não deveria ter perdido as estribeiras. – a resposta dele foi um rosnado - Está doendo ainda?


Então Harry a olhou com um brilho nos olhos que teria feito babar a mulheres menos decididas.


- Só quando respiro.


Hermione sorriu e apalpou a perna dele.


- Tenta pensar em outra coisa. Quer que eu passe as ferramentas ou ajude em algo?


- Conheces a diferença entre um trinquete e uma chave inglesa? – perguntou com os olhos duas fendas azuis.


- Não. - jogou o cabelo para trás - Por que teria que o saber? Um mecânico muito competente se ocupa de meu carro.


- E se ocorre uma avaria na estrada?


- E quanto à ajuda humana?


- Se eu me contentasse com isso, me chamariam de sexista. – apertou os dentes e se concentrou no carburador.


Ela sorriu a suas costas, mas quando falou o fez em voz séria.


- Há café instantâneo na despensa? – continuou - Prepararei um pouco.


- Não é prudente usar a bateria. – sussurrou - Nos conformaremos com refrigerantes.


- Bem.


Quanto Hermione regressou vinte minutos mais tarde, Harry amaldiçoava o motor.


- Teremos que fuzilar esse amigo de Draco, por descuidar de um avião.


- Vai conseguir arrumá-lo ou não?


- Sim, vou arrumá-lo. – afirmou enquanto se esforçava por afrouxar um parafuso - Mas vou demorar algo mais do que esperava. – preparado para algum comentário mordaz, olhou-a. Ela simplesmente esperou com paciência - O que é isso? – indicou o que tinha na mão.


- Creio que se chama sanduíche. – levantou o pão e o queijo para que os vistoriasse - Não é grande coisa, mas pensei que estaria faminto.


- Está certa. – o gesto o aplacou um pouco. Levantou as mãos e lhe mostrou os dedos cheios de graxa - Estou um pouco incapacitado para comê-lo.


- Ok. Agacha. – quando obedeceu, levou-lhe o pão à boca. Observaram-se enquanto Harry mordia.


- Obrigado.


- De nada. Encontrei uma cerveja. – sacou uma garrafa do bolso-. Vamos dividi-la. – a levou aos lábios dele.


- Agora sei que te amo.


- Come. – deu um pouco mais de sanduíche - Tem idéia de quanto demoraremos em voltar a voar?


- Sim. – mas antes de revelar se certificou de que lhe desse sua parte completa do sanduíche e da cerveja - Uma hora, talvez duas.


- Duas horas? – piscou. - Então nós ficaremos sem luz. Não está pensando em voar no escuro, verdade?


- Não. – ainda que estivesse preparado para um ataque surpresa, voltou a concentrar-se no motor - Será mais seguro esperar até amanhã.


- Até amanhã. – repetiu com a vista fincada em suas costas - O que se supõe que vamos fazer até a manhã?


- Para começar, montar uma barraca. Há uma na cabine, na parte de cima. Suponho que Frank gosta de acampar com suas amigas.


- Isso é estupendo. Estupendo. Esta me dizendo que vamos ter que dormir aqui?


- Poderíamos fazê-lo no avião. – assinalou - Mas não seria tão cômodo nem tão seguro como numa barraca na companhia do fogo. – começou a assobiar enquanto trabalhava. Tinha dito que devia uma. Mas não tinha imaginado que poderia pagar tão cedo ou tão bem - Suponho que não sabe como acender uma fogueira.


- Não, não sei.


- Nunca foi exploradora?


- Não. – bufou - E você?


- Não posso dizer que fui… mas tinha alguns amigos que sim. Bem, vá recolher alguns ramos, querida. Depois ensinarei como se faz.


- Não penso em recolher ramos.


- Muito bem, mas fará frio quando o sol se por. O fogo mantém o frio, e outras coisas, longe.


- Não vou… - calou e olhou incômoda ao redor - Que outras coisas?


- Oh, já sabe. Veados, alces… pumas…


- Pumas. - levou a mão automaticamente à pistoleira - Não há pumas por aqui.


Ele alçou a cabeça e olhou ao redor pensativo.


- Bem, talvez ainda não seja a temporada. Mas começam a baixar das montanhas ao chegar o inverno. Pode deixar, se quer esperar até que termine aqui, eu o farei. Mas então, talvez tenha escurecido.


Hermione estava certa de que ele fazia de propósito. No entanto… olhou outra vez ao redor, em direção ao bosque, onde as sombras se alongavam.


- Trarei a maldita lenha. – sussurrou, e se dirigiu para as árvores depois de ter comprovado sua arma.


Ele a observou com um sorriso.


- Vamos ficar muito bem aqui. – ele disse a si mesmo - Muito bem.


Seguindo as instruções de Harry, conseguiu iniciar um fogo respeitável dentro de um círculo de pedras. Não gostou, mas o fez. Depois, devido a afirmação dele em estar concentrado nos toques finais do motor, se viu obrigada a montar a barraca.


Era uma barraca leve que segundo Harry se levantava praticamente sozinha. Depois de vinte minutos de esforços e imprecações, conseguiu. Um estudo detalhado indicou que abrigaria os dois… desde que dormissem colados um ao outro.


Ainda seguia olhando a barraca, sem prestar atenção ao frio do crepúsculo, quando ouviu que o motor retornava a vida.


- Como novo. – gritou, e depois o desligou - Tenho que me limpar. – informou. Saltou da cabine com uma jarra de água. Usou-a com cuidado, junto com uma lata de removedor de graxa da caixa de ferramentas - Bom trabalho. – comentou, olhando a barraca.


- Obrigada.


- Há cobertores no avião. Nos ajeitaremos. - respirou fundo, cheirando a fumaça, o pinheiro e o ar puro - Não há nada como acampar entre as montanhas.


- Terei que aceitar sua palavra. – ela meteu as mãos nos bolsos.


Harry terminou de limpar-se com o trapo antes de se levantar.


- Não me diga que jamais acampou.


- Concordo, não direi.


- Como são suas férias?


- Vou a um hotel. – indicou com as sobrancelhas arqueadas - Onde há serviço de quarto, água quente e tv por cabo.


- Não sabe o que perde.


- Suponho que estou a ponto de averiguar. – tremeu uma vez e suspirou - Não me viria mal um vinho.


Junto ao vinho, deram-se um banquete de queijo, caviar e torradas salgadas untadas com um delicado patê.


Hermione chegou à conclusão de que poderia ter sido pior.


- Nunca comi assim num acampamento. – comentou Harry ao pôr mais caviar sobre uma torrada - Pensei que ia ter que sair e matar um coelho.


- Por favor, não diga isso enquanto como. – bebeu mais vinho e se sentiu estranhamente descontraída. Era verdade que o fogo ajudava a manter o frio a risca. E encantava ver como crepitava. No céu, inumeráveis estrelas piscavam, apunhalando o céu negro e sem nuvens. Uma lua crescente enchia de prata as árvores e projetava seu resplendor sobre os cumes nevados que os rodeavam. Já tinha deixando de sobressaltar-se cada vez que um lobo uivava.


- Lugar bonito. – Harry acendeu um cigarro - Nunca antes tinha passado muito tempo por aqui.


Hermione também não, fazia doze anos que não saia de Denver.


- Gosto da cidade. – sussurrou, mais para si mesma do que para ele. Escolheu um ramo para avivar o fogo.


- Por que?


- Suponho porque esta cheia. Porque pode encontrar qualquer coisa que queira. E porque ali me sinto útil.


- E para você isso é importante.


- Sim, é.


- Foi difícil seu passado. - comentou enquanto via como as chamas ressaltavam os olhos de Hermione e suavizava sua pele.


- É algo que ficou para trás. – quando Harry tomou a mão dela, não resistiu, nem respondeu - Não quero falar disso. – afirmou - Nunca.


- De acordo. – podia esperar - Falaremos de outra coisa. – levou a mão aos lábios e sentiu uma leve resposta no modo em que ela flexionou os dedos - Acho que nunca contou histórias em torno de uma fogueira.


- Suponho que não. – não sorriu.


- Provavelmente poderia me ocorrer uma… para passar o tempo. Mentira ou verdade?


Hermione se colocou a rir, mas no ato se pôs de pé de um salto, engatilhando a pistola. A reação de Harry foi como um relâmpago. No mesmo instante ficou a seu lado, afastando-a, com a arma na mão depois de tê-la sacado da bota.


- O que? – demandou, com os olhos entrecerrados, escrutinando a escuridão.


- Ouviu isso? Há algo aí fora.


Prestou atenção, enquanto instintivamente se movia para proteger as costas. Depois de um momento de vibrante silêncio, ouviu um leve rugido, depois o uivo longínquo de um coiote. O uivo fez que o sangue de Hermione gelasse.


Harry soltou um praga, mas ao menos não riu.


- Animais. – explicou, agachando-se para guardar a arma.


- De que tipo? – seus olhos não deixaram de estudar o perímetro com cautela.


- Pequenos. – assegurou – Coelhos. – apoiou uma mão sobre os dedos dela, que seguiam sustentando a pistola - Nada a que esburacar, franco atiradora.


Ela não se convenceu. O coiote voltou a emitir seu uivo e obteve a resposta de um uivo.


- E que me dizes dos pumas?


Foi responder, pensou melhor e se conteve.


- Vamos, querida, não é provável que cheguem muito perto do fogo.


- Talvez devêssemos avivar o fogo. – com o cenho franzido, guardou a pistola.


- Já é bem grande. – a voltou para ele e passou as mãos pelos braços - Acredito que jamais vi você tão assustada.


- Não gosto de ficar exposta, existem muitas coisas por aqui e a verdade é que preferia enfrentar um ianque pendurado num beco escuro que a uma criatura pequena e peluda com caninos. Não ria, maldito seja!


- Sorrir. – passou a língua pelos dentes e se esforçou por manter-se sério - Parece que vai ter que confiar em mim para sair disso.


- Oh, verdade?


A apertou com mais força quando ela ameaçou afastar-se. A expressão de seus olhos mudou com tanta velocidade, de divertida a cheia de desejo, que ela ficou sem fôlego.


- Só estamos você e eu, Hermione.


- É o que parece. – soltou o ar devagar.


- Creio que não é necessário que volte a dizer o que sinto por você. Nem o muito que desejo você.


- Não. – a invadiu a tensão ao sentir os lábios de Harry na têmpora. E a atravessou um calor aterrorizador.


- Posso fazer que esqueça onde está. – baixou os lábios até a mandíbula - Se me deixar.


- Teria que ser muito bom para isso.


Harry riu.


- Falta muito para manhã. Aposto que posso convencer você antes de que amanheça.


Não sabia por que resistia a algo que queria com tanto afinco. Não tinha dito, faz tempo, que nunca voltaria a deixar que o medo dominasse seus desejos? E não tinha aprendido a saciar esses desejos sem sentir-se culpada?


Podia fazê-lo nesse momento, com ele, e apagar esse demolidor anseio.


- De acordo, Potter. – com atrevimento rodeou o pescoço com os braços e o olhou aos olhos - Aceito a aposta.


A mão dele se cerrou sobre seu cabelo e jogou a cabeça para trás. Durante um momento longo e palpitante, olharam-se. Depois a pegou.


A boca de Hermione era ardente e tinha gosto de mel, tão exigente como a fome, tão selvagem como a noite. Aprofundou o beijo, utilizando a língua e os dentes, sabendo que podia dar-se um banquete que jamais o saciaria. Então tomou mais, atacando sua boca de maneira implacável enquanto ela respondia com igual fervor.


Mareada, Hermione compreendeu que era como a primeira vez que a tinha arrastado a ele e tinha feito provar o que podia oferecer. Como uma droga fatal, o sabor acelerou seu pulso e bombeou o sangue com tanta velocidade que a mente se afastou da razão.


Perguntou-se como tinha esperado sair ilesa. E depois esquecer o que  importava.


Já não queria estar certa, nem controlar a situação. Nesse momento, com ele, só queria sentir, experimentar tudo o que uma vez parecia impossível, ou pouco inteligente. E se com isso tinha que sacrificar a sobrevivência, que assim fosse.


Impulsionada pela cobiça, começou a tirar a camisa dele, desesperada por sentir aquele corpo duro e sólido. Ele não tinha que ser mais forte que ela, mas ele era, aceitaria a vulnerabilidade que implicava ser mulher. E o poder que a acompanhava.


Era como um vulcão a ponto de estourar e quando surgissem os tremores só queria estar unida a Harry.


Cobertura a cobertura, estava arrancando a sensatez. Esses lábios selvagens, essas mãos febris. Com um juramento mais parecido a uma prece, levou-a quase à força para a barraca, sentindo-se como um caçador primitivo que agarrava a sua companheira eleita no interior de uma gruta.


Caíram juntos no refúgio, uma emaranhada de braços, pernas  e necessidades. Tirou a jaqueta dela, lutando por respirar enquanto com cobiça enchia de beijos o pescoço.


Sentiu a vibração do gemido de Hermione sobre os lábios enquanto lutava com a cartucheira, deixando de lado o símbolo de domínio e violência, sabendo que começava a perder o controle, esmagado por uma torrente de sentimentos que não era capaz de suprimir.


Queria-a nua. Tensa e a ponto de gritar.


A respiração dela saía entrecortada enquanto lhe tirava a roupa. A fogueira brilhava com uma luz alaranjada através do tênue material da barraca, o que lhe permitia ver o propósito escuro e perigoso nos olhos dele. Encantou-lhe, extasiada no pânico que sacudiu seu corpo ali onde o tocava e possuía. Sabia que essa noite a tomaria. E seria tomado.


Contendo-se, Harry tirou a malha pela cabeça e o atirou de lado. Embaixo ela usava um sutiã, uma delicada renda branca que em outro lugar, num momento de maior sensatez, o teria excitado por sua manifesta feminilidade. Poderia ter brincado com as tiras, deslizado os dedos sobre os sutis elásticos. Mas nesse instante o arrancou com um movimento brusco para liberar os seios para sua boca faminta.


O sabor dessa pele cálida e aromática o agitou vigoroso como um golpe. E a reação dela, a forma adorável em que arqueou o corpo contra o seu, o prolongado e rouco gemido que emitiu, o rápido e desvalido arrepio que sentiu, impulsionaram-no a um cume de prazer com a que jamais tinha sonhado.


Deu-se um banquete.


Um gemido ficou atracado na garganta de Hermione. Fincou as unhas nos ombros nus dele, com o desejo de incitá-lo a continuar, aterrorizada ao pensar para onde a conduzia. Agarrou-se a Harry na procura de equilíbrio, moveu-se embaixo em sinuoso convite, arqueando-se uma vez mais quando tirou as calças, baixando esses dedos tão hábeis por suas coxas.


O triângulo de tecido que a protegia se rasgou. Uma vez mais se banqueteou.


O grito aturdido da libertação dela percorreu as veias de Harry. Hermione explodiu como um foguete. Mas chegado o momento do auge, não lhe deu respiro. Ela se agarrou ao cobertor enquanto a sacudia com sensações carentes de nome ou forma.


Ao posicionar-se sobre ela, com músculos trêmulos, seus olhos abertos se encontraram. Harry observou seu rosto, encheu-se com sua imagem enquanto se enterrava em seu interior com uma investida desesperada. Os olhos dela se puseram vidrados, fecharam-se. A própria visão dele se nublou antes de afundar o rosto em seu cabelo.


Seu corpo dominou a situação e se acoplou ao ritmo veloz e furioso dos quadris de Hermione. Cavalgaram como meninos furiosos e cobiçosos de uma fruta proibida. O grito final de escuro prazer que emitiu, ela soltou no ar segundos antes do de Harry.


Ausente de forças derrubou-se sobre ela e suspirou ao senti-la tremer.


- Quem ganhou? – conseguiu perguntar passado um momento.


A Hermione não tinha parecido possível poder rir num momento semelhante, mas um riso subiu por sua garganta.


- Digamos que foi um empate.


- Me basta. – pensou em levantar seu corpo, mas temia que se quebrasse com o movimento - Mais do que suficiente. Vou beijá-la num minuto. – murmurou - Primeiro tenho que reconstituir minhas forças.


- Posso esperar. – deixou que seus olhos voltassem a fechar-se e desfrutou da proximidade. O corpo dele seguia irradiando calor e o coração estava sereno. Acariciou-lhe as costas pelo simples prazer do contato, mas franziu um pouco o cenho quando seus dedos encontraram uma cicatriz - O que é isto?


- Mmm? – moveu-se, surpreso ao descobrir que tinha estado a ponto de dormir sobre ela - Tormenta do deserto.


Em nenhum momento pensou que tinha chegado a participar naquela guerra. De repente ocorreu que tinha muitas coisas dele ainda ocultas.


- Achava que tinha se retirado antes.


- E assim foi. Aceitei fazer um pequeno trabalho… algo colateral.


- Um favor.


- Poderia chamá-lo assim. Alguém soltou uma carga de metralhadoras em mim… nada de que se preocupar. – virou a cabeça - Tem belos ombros. Já tinha lhe dito?


- Não. Continua fazendo favores para o governo?


- Só se me pedem com amabilidade. – grunhiu, girando para poder colocá-la em cima dele - Melhor?


- Mmm… - apoiou a face em seu peito - Ainda acho que podemos congelar.


- Não se nos mantermos ativos. – sorriu quando ela levantou a cabeça para olhá-lo - Métodos de sobrevivência, tenente.


- Com certeza. – sorriu - Tenho de reconhecer, Potter, que gosto de seus métodos.


- Sim? – com suavidade passou os dedos pelo cabelo.


- Sim. Quando temos que adicionar madeira ao fogo?


- Oh, ainda temos algum tempo.


- Então não deveríamos perder o tempo, não é? – sem deixar de sorrir, baixou a boca à sua.


- Sim. – sentiu que voltava a enrijecer-se dentro de Hermione, preparado para deixar que ela tomasse a iniciativa. Ao beijá-la o invadiu um amor tão intenso que o deixou sem respiração. Abraçou-a com força - Sei que não é original, Mione, mas nunca tinha sido assim para mim. Com ninguém.


Isso a assustou, e mais do que as palavras foi à sensação de calidez que provocou nela.


- Fala demais.


- Mione…


Mas ela moveu a cabeça e ergueu seu corpo, levando-o ao mais fundo dentro dela, provocando-o para que a necessidade de palavras se desvanecesse.


 


 


 


 

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