Além de um reencontro
Tudo aconteceu no mesmo instante a partir daí: as mãos magras da professora ainda um pouco abalada pelo coma, fecharam o livro sobre o seu colo, o qual ainda estava tendo dificuldade mínima para interpretar, exatamente na hora que um homem de longos cabelos e barbas prateadas, de oclinhos de meia-lua sob um nariz torto e de vestes elegantes entrou, ligeiramente ofegante, parou frente as portas e levantou a cabeça para encará-la a certa distância dele.
Albus Dumbledore deu o maior sorriso que alguém já o tinha visto dar, numa mistura de enorme alegria e alívio ao encontrá-la acordada a algumas camas de distância, branco de ver-se de longe. Depois de poucos momentos, nos quais ambos os olhares ansiosos encontraram-se junto à sorrisos, o diretor quebrou a distância com pressa, a professora fazendo menção de fazer o mesmo, mas impossibilitada por seu estado recém-desperto, o livro sendo deixado de lado, os raios vermelho-alaranjados enfeitando o imenso céu visto através das grandes janelas, enquanto os dois eram envolvidos num único grande e carinhoso abraço.
Enquanto se abraçavam, em meio a grandes sorrisos, lágrimas de felicidade começaram a brotar, sem querer, dos olhos de ambos os docentes, mas não se importavam, comportavam-se como se elas não existissem ou como amigas que vieram se juntar aos dois.
Até mesmo com ele, McGonagall nunca, em anos, havia sorrido daquela forma e tampouco chorara em seu ombro, contudo não sabia se era a alegria do reencontro com o melhor amigo, o abraço forte e confortável ou simplesmente pelo fato de poder tornar a vê-lo e rir de felicidade junto com ele, algo que nunca tinha feito que a desse liberdade para tanto.
Quanto tempo passara-se, não tinham a menor ideia, e pouco quiseram saber. De que importava isso afinal? O mais importante era que estavam ali, juntos como sempre foram. Ela pode sentir os longos cabelos dele em seus dedos, e eram pelos mesmos fios prateados que algumas lágrimas escorriam devagar partindo de seus escuros olhos de contas, ao mesmo tempo que sentia duas mãos as suas costas, abraçando-a muito fortemente.
Pouco antes de enfim soltarem-se, ela engoliu fortemente ao notar finalmente o que estava fazendo, que posição havia tomado, e ao sentir os braços dele desatarem de seu corpo, ela enxugou rapidamente as lágrimas e o máximo que pode também de seus rastros, antes de encarar, sorrindo mais levemente, um par de olhos azuis muito reluzentes no rosto de alguém que não se preocupava com as mesmas razões que ela; na sua barba havia pequenas gotas que aos poucos eram absorvidas ao escorrerem.
- Ah, minha cara - disse ele finalmente enquanto segurava uma das mãos da bruxa, trazendo uma incomum sensação agradável em poder ouvi-lo - não imagina o quão bom é poder vê-la acordada depois de tanto tempo.
- Digo-lhe o mesmo - respondeu fora de seu tom usual - Estou contente em vê-lo também.
Após suas palavras, ele puxou uma cadeira próxima, a mão dela ainda segura na sua, e continuou, seu olhar mais cintilante do que nunca.
- Não sabe o quanto fiquei feliz quando soube que finalmente havia despertado... Imagino que Papoula e Pomona já lhe contaram o alarge que rondou o corpo docente.
- Oh, sim - disse um tanto constrangida ao ver como a popularidade de ambas as amigas espalhara-se, a mão escorregando por entre os dedos dele para de volta ao seu colo - Foi uma das primeiras coisas que disseram-me... Soube que Filio cobriu minhas aulas durante as últimas semanas.
- Sim, cobriu. Ele pediu-me pouco depois de saber o que acontecera. Estava se sentindo culpado... achou que deveria. E disse que o repreendimento de Pomona não ajudou muito a aliviar-se.
- Imagino... Mas, diga-me, como foi a prova de Potter? Soube que teve de comparecer-la.
Nesse momento o sorriso leve do senhor, desmanchou-se com a velocidade de uma lâmpada queimando e isso deu à professora uma pontada de remorso muito desconfortável.
- Desculpe-me, Albus, - disse visivelmente arrependida, mesmo não sabendo por que da tristeza do tutor. - achei que...
- Não, minha cara, está tudo bem - apressou-se a dizer antes que ela tivesse a oportunidade de continuar. Soltou um suspiro - A prova, bem... Harry se saiu muito bem, chegou em último, no entanto recebeu o segundo lugar, para não ser injusto com o Sr. Diggory que alcançou o primeiro lugar, contudo... foram as próximas notícias que surpreenderam-me... - Sua face em expressão sombria fez McGonagall perceber que era muito mais do que lugares no ranking do Torneio Tribruxo que o preocupava, os olhos azuis, agora opacos, encarando o chão infelizes, como raramente eram.
- O que houve Dumbledore? - perguntou a professora, cautelosa e preocupada.
Ele ergueu os olhos novamente para ela, e seguiu-se um momento de silêncio.
- Bartô Crouch, Minerva. Harry encontrou-o morto na Floresta.
Os olhos da subdiretora arregalaram-se subtamente de espanto, e ao falar, uma de suas mãos fora colocada sobre o coração.
- Santo Deus... Não consigo... Não posso acreditar... Ah, Albus... Mas... mas, Dumbledore, tem ideia de como...?
- Sim... e não - adiantou-se ele a lhe responder - Sabemos dizer o que causou sua morte, uma maldição imperdoável, mas a questão não é essa. A questão é quem, Minerva, quem... - e tornou a baixar a cabeça infeliz.
Todos que algum dia tinham visto Bartô a qualquer hora e em qualquer lugar, sabiam como ele fora. Muitas vezes encontravam-no emburrado, seco, e em seus últimos dias de vida, muito estranho, diferente demais do seu normal, mas o incrível era como ele conseguia fazer falta... Conhecidos de longa data sabiam o que ele já fora, feliz, sorridente... e era com pesar que se lembravam disso agora.
A expressão dela também mudou. Tornou-se triste. Não só por Bartô, mas por ele também, por Albus, seu melhor amigo e companheiro. Detestava vê-lo daquela forma. Apertava tanto o coração de quem via, em especial o dela. Ele era o único que dava-lhe razão para chorar muito silenciosamente, excluída, quando o fazia. Não sabia o que dizer, nem muito menos se deveria, mas tinha que ajudá-lo... Não podia deixá-lo assim... Não devia...
Ela pousou sua mão magra sobre o ombro dele num gesto carinhoso, ao mesmo tempo consolador, e falou com uma voz estranhamente mansa, como se estivesse a falar com uma criança explicando que os adultos também podem errar.
- É realmente muito triste, Albus, ambos sabemos disso... - falava mansamente, esfregando o polegar levemente sobre o ombro dele, a infelicidade transpadecendo em sua face - mas sei... que deve estar em um lugar melhor agora... Sabemos que ele era... uma boa pessoa.
O diretor levantara vagarosamente sua cabeça ao sentir uma mão magra sobre suas vestes e agora sorria levemente, balançando quase imperceptivelmente a cabeça em concordância.
- Sei que sim - e para a surpresa de Minerva, segurou seus dedos magros sobre seu próprio ombro, o olhar cintilando de encontro ao seu cor de noite.
Depois de um momento de susto, ela sorriu de volta à ele. Oras, pois, era melhor que vê-lo entristecido, não é mesmo?
Durante os instantes que permaneceram em silêncio, um formigamento quente começou a nascer no estômago de McGonagall. Preocupou-se nos primeiros segundos, com receio de ser algum sinal de um novo desmaio, mas tal sensação não fez doer, tampouco. Na verdade, pareceu dividir-se com levesa, permanecendo parte por lá, parte nas maçãs de seu rosto que rosavam-se com o toque macio do outro, seu coração começando a bater mais forte... Que raios estava acontecendo com ela? Seria uma doença?
Não comentou, apenas agradeceu em silêncio quando ele mudou de assunto.
- Ah! - disse Dumbledore de repente, seu rosto iluminado ao lembrar-se de algo que o fez soltá-la de seu carinho, permitindo-a levar a mão de volta ao colo enquanto ele colocava a sua própria dentro de um dos bolsos das vestes - Trouxe-lhe uma coisa. Espero que goste - e entregou um pequeno embrulho vermelho e dourado.
Ela hesitou por um instante antes de tomá-lo para si e abrir com cuidado. Sorriu ao ver o conteúdo e balançou levemente a cabeça negativamente, falando ironicamente:
- Deveria ter imaginado... é a sua cara! - e mostrou-lhe a caixinha de gotas de limão que ele próprio havia dado, sorrindo gostosamente e obtendo resposta. - Obrigada.
- Não tem por que agradecer - disse educadamente e neste momento ouviu-se um canto belo e breve de fênix ao longe, o que o fez erguer-se da cadeira elegantemente. - Desculpe-me, minha cara, gostaria de ficar, mas tenho assuntos a tratar com Cornélio, que creio, já ter chegado, então - ele tomou delicadamente a mão dela novamente e a beijou, lançando-lhe um olhar brilhante. - até mais tarde. - e saiu da ala, rumo a torre de sua sala.
McGonagall, agora, encontrava-se muito confusa e sobressaltada. Observando a mão que ele havia beijado, pouco depois de acompanhar os passos de Albus até perdê-lo de vista, analisou um pouco mais a caixinha em uma das mãos. Deixou-a sobre os cobertores e quando faltava pouco para abri-la, ouviu uma risada sendo abafada. Virando a cabeça muito rápido à sua esquerda, viu alguém a espreita na porta da própria sala, parecendo estar ali por tempo demais.
Uma Papoula muito sorridente a encarava esperançosa, o que fez, imediatamente, um único pensamento passar pela mente da professora.
"Ah, essa não..."
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