A menina dos cabelos vermelhos



 


 Capítulo I - A menina dos cabelos vermelhos




    Olhou no relógio mais uma vez: 10h30. Apressou ainda mais o passo atrás dos seus pais que iam na frente, procurando incansavelmente a Plataforma nove e meia. Plataforma nove e meia. Impossível, só podia ser algum tipo de encantamento. Rox tinha lido vários livros sobre Hogwarts depois que recebera a carta e descobrira que era uma bruxa. Aquele tinha sido um momento muito feliz e esclarecedor para ela. Sabia que era diferente das outras pessoas. Não só pelo curioso fato de que podia mudar a cor dos cabelos (embora preferisse o roxo) e mudar de forma sempre que quisesse (lera em um livro que tinha esse dom por ser uma metamorfomaga), mas também porque coisas estranhas sempre aconteciam ao seu redor quando experimentava emoções fortes.


    Uma das cosias mais esquisitas aconteceu quando tinha nove anos. Como dentistas, seus pais sempre a proibiram de comer doces, o que era uma tortura para a garota, que sempre amou esse tipo de guloseima e só podia comê-los escondido. Certa vez, comprara uma caixa de bombons e a escondera debaixo de alguns livros em sua estante. A Sra. Granger encontrou a caixa quando limpava o móvel, e Rox teve de passar o que lhe pareceram horas, escutando a sua mãe esbravejar um discurso que a garota conhecia tão bem, sobre quanto mal os doces faziam aos dentes. Depois deste dia, toda vez que Rox abria algum livro daquela estante, encontrava um bombom que simplesmente brotava de dentro, e o mais curioso era que quando seu pai ou sua mãe faziam o mesmo, a única coisa que encontravam eram folhas de papel.


    – Não tem jeito, filha, tem de ser aqui – exclamou a Sra. Granger, cansada, retirando Rox de seu devaneio.


    A garota olhou no relógio de novo, eram 10h42. Eles estavam entre as plataformas nove e dez, e ela olhava frustrada para a parede entre elas, esperando que algo acontecesse. Algo tinha de acontecer.


    E aconteceu. Rox teve certeza de ter visto uma garota de cabelos vermelhos caminhar em direção à parede e, um segundo depois, ter simplesmente sumido. Rox piscou. Não estava vendo coisas, aquela menina havia atravessado a parede. Atravessado a parede!


    – Charlotte? – Seus pais a chamavam pelo segundo nome. O Sr. Granger a olhava com a testa franzida. Só agora a garota percebera que estava com a boca aberta, e a fechou, corando um pouco.


    Apressou-se em contar para os pais o que acabara de ver, mas nenhum dos dois estava prestando atenção suficiente naquela parede, na hora do desaparecimento da garota; fora muito rápido. O casal Granger, porém, confiava cegamente na filha, e por mais absurda que fosse a idéia de atravessar paredes, eles concordaram em segui-la, caso ela conseguisse atravessar a barreira.


    Segurando o carrinho com suas pesadas malas, a garota respirou fundo olhando para os lados para ver se tinha alguém a observando. Algumas pessoas olhavam realmente, mas Rox supôs que fosse por causa do roxo de seus cabelos e, apesar de desconfortável, já havia se acostumado com isso. Decidiu, então, que iria correr, ao invés de caminhar. Respirou fundo mais uma vez, virando-se para olhar a sua mãe, que acenou com a cabeça, sussurrando um “boa sorte”. Sorriu sutilmente para ela antes de começar a correr. A um segundo de distância da parede, sentiu-se muito idiota, porque de repente tinha certeza que ia colidir e... atravessou.


    Arregalou os olhos, mal acreditando que estava olhando para o Expresso de Hogwarts. Passou os olhos pela multidão de estudantes e seus familiares, procurando pela garota de cabelos vermelhos. Estava tão radiante por ter conseguido chegar à plataforma, que pensava em agradecer àquela garota. Não havia visto seu rosto, mas poderia reconhecer aqueles fios de cabelo cor de fogo se os visse, coisa que não aconteceu.


    O casal Granger havia atravessado o portal e Rox abraçava o seu pai, despedindo-se:


    – Eu sentirei sua falta, pai.


    – Eu também, filha. Cuide-se e não exagere nos doces, está bem?


    Rox revirou os olhos, mas sorriu. Era a sua mãe que a abraçava agora. A mulher depositou um beijo em sua bochecha antes de soltá-la.


    – Sei que você será brilhante, Charlotte – declarou a Sra. Granger, fazendo a filha sorrir. – Apenas cuide-se, sim?


    A menina percebeu que os olhos de sua mãe estavam marejados, mas que ela não deixaria as lágrimas caírem, não agora. O Sr. Granger segurou a mão sua esposa e Rox correu para abraçá-la mais uma vez.


    – Eu amo vocês, pai, mãe – a garota tinha a voz embargada no momento. – Preciso ir – soltou a mãe e correu para o trem sem olhar para trás, enxugando os olhos com as costas da mão.


 


 


    Tremendo da cabeça aos pés, Rox observava a diretora Minerva Mcgonagall desenrolar um longo pergaminho com os nomes dos primeiroanistas. Estavam no Salão Principal e os alunos novatos organizavam-se em uma fila, aguardando o seu nome ser chamado. Era a Cerimônia de Seleção das Casas. A garota passou o olho pela fila e percebeu que todos pareciam tão nervosos quanto ela. Já ia voltar a admirar seus pés quando levantou a cabeça novamente. Longas mechas de cabelo vermelho caíam graciosamente nas costas de uma garota, bem no começo da fila. Rox a reconheceu imediatamente como a garota da estação King’s Cross.


    – Marie Delacour – chamou a professora Mcgonagall e a garota ruiva andou cautelosamente até o banquinho. Antes que ela se virasse, Rox sentiu cócegas nas canelas e deu um pulo: uma gata feia, magricela e cor de areia esgueirava-se entre os estudantes, como se procurasse algo. A garota a olhava intrigada quando ouviu a voz grave do Chapéu Seletor.


    – Sonserina!


    Quando Rox levantou os olhos, a menina ruiva já tinha se levantado e misturava-se entre os alunos da Sonserina.


    – Rox Granger – ouviu-se a voz da diretora mais uma vez. A jovem bruxa sentiu centenas de pares de olhos em si, quando saiu da fila e caminhou até o pequeno banco de madeira. Antes que o Chapéu esfarrapado fosse colocado em sua cabeça, a garota percebeu que o Salão, antes silencioso, explodia em murmúrios, principalmente na mesa da Sonserina. Até a professora Mcgonagall a olhava com a testa franzida, mas antes que pudesse entender alguma coisa, tudo ficou escuro e silencioso – o chapéu enterrara em sua cabeça até os olhos. De repente apenas uma voz, alta e grave pôde ser ouvida pela garota, assustando-a.


    – Hum... interessante – disse o Chapéu, ficando em silêncio por um segundo antes de continuar. – Vejo inteligência, muita, e você seria brilhante na Corvinal, mas em conjunto com sua coragem e admirável nobreza, você seria ainda mais brilhante na Grifinória! – todos puderam ouvir a última palavra.


    Rox suspirou aliviada, podendo ver a luz novamente. Levantou-se e correu para a mesa da Grifinória, que aplaudia entusiasmada. Alguns olhares curiosos ainda a seguiam, mas a garota supôs que fosse uma reação exagerada à cor dos seus cabelos, e não se importou.


    – Drooft Dawson – continuava a chamar, a diretora. Rox virou-se para olhar e viu um garoto alto, com os cabelos louro-escuros sentar-se no banquinho de madeira. O chapéu mal encostou em sua cabeça antes de anunciar:


    – Corvinal!


    O garoto sorriu como se já soubesse que esse seria o seu destino. Pela rapidez com que a sua casa fora anunciada, Rox imaginou o quão pronunciada deveria ser a característica principal da Corvinal, naquele garoto: a inteligência. A garota continuou assistindo a cerimônia de Seleção, mas a todo o momento lançava olhadelas furtivas em direção ao garoto.


 


    Admirou-se quando o banquete foi servido e, do nada, apareceram centenas de travessas com todo tipo de comida que se pode imaginar. Virou-se e ela e outra primeiroanista que estava sentada ao seu lado, e elas sorriram uma para a outra. Rox de repente percebeu o quanto estava faminta, servindo-se de um pouco de tudo que estava ao seu alcance.


    Depois da sobremesa, quando se sentia confortavelmente sonolenta, Rox olhava a professora Mcgonagall que havia se levantado e mantinha seus olhos severos nos alunos distribuídos pelo Salão que ainda conversavam.


    – Agora que estamos todos satisfeitos, – começou a professora, depois que o Salão havia finalmente silenciado – gostaria de dar alguns avisos. Lembro aos veteranos e informo aos novatos que o acesso à Floresta da propriedade é proibido. O Sr. Filch pediu para lembrar-lhes que não devem fazer mágicas nos corredores, no intervalo das aulas, e que quaisquer artigos das Gemialidades Weasley são proibidos. E agora todos podem encaminhar-se a seus respectivos dormitórios. Boa noite.


    Uma garota e um garoto mais velho levataram-se imediatamente, um deles chamando pelos alunos primeiro ano, guiando-os. Rox já ia seguindo os monitores, quando viu, em frente à mesa dos professores, a menina dos cabelos vermelhos, que estava virada de frente para uma professora que tinha chegado atrasada para o jantar. As duas conversavam como se já se conhecessem. Rox achou estranho que uma aluna do primeiro ano já tivesse tamanha intimidade com um professor. Mas não se esquecera que só estava ali por causa daquela garota, e mesmo que ela não soubesse disso, Rox sentia que deveria agradecê-la.


    Abandonou a fila de alunos que ainda tentavam sair do Salão e andou na direção contrária, de frente com uma multidão de alunos, até onde estava a menina ruiva. Quando conseguiu finalmente chegar perto da mesa dos professores, percebeu que a garota não estava mais lá. Um tanto frustrada, Rox caminhou rapidamente de volta à porta do Salão; àquela altura os alunos haviam finalmente saído dali e separavam-se de acordo com suas Casas e com o caminho que levava aos seus respectivos Salões Comunais. Rox reconheceu de longe os cabelos da garota, que já se misturava aos outros alunos que seguiam o monitor da Sonserina. Rox esgueirou-se entre os alunos, ficando atrás de todos, pois não queria que o monitor a visse ali, ou a mandaria para o seu salão comunal, e Rox não queria dormir antes de falar com a menina – daria um jeito de falar com ela sozinha. Enquanto caminhava, a jovem bruxa teve uma idéia repentina. Certificou-se de que ninguém estava olhando, fechou os olhos, fazendo uma careta de quem sente dor: um segundo depois, seus cabelos haviam mudado de roxo para castanho claro – com uma cor de cabelo mais comum, Rox achou que seria mais fácil passar despercebida entre os sonserinos que caminhavam à sua frente.


    Quando Rox já havia se cansado de caminhar, viu o monitor parar em frente a um trecho liso e úmido de parede de pedra. A garota rapidamente se afastou, sem que ninguém percebesse, encondendo-se atrás de uma armadura que tinha ali perto. Apressou-se para trazer de volta o roxo habitual de seus cabelos. Por trás da armadura, pôde ver que o monitor havia dito uma senha e uma porta de pedra escondida na parede deslizou. Observou contente, que enquanto os primeiroanistas seguiam o monitor para dentro do salão, a garota ruiva havia ficado para trás, sendo a última da fila. Esperou até que o último aluno antes dela atravessasse a porta de pedra, antes de sair de trás da armadura.


    – Espera! – sussurrou Rox, quando a menina ia atravessando a porta.


    A garota parou por um segundo, antes de se virar para ver quem a chamara. A porta de pedra atrás dela voltou a se fechar, mas nenhuma das duas garotas parecia ter percebido.


    Rox tinha os olhos arregalados, enquanto olhava, incrédula, para a menina dos cabelos vermelhos. Era como se estivesse se olhando num espelho que muda a cor dos olhos e dos cabelos de quem reflete.


    A menina dos cabelos vermelhos e Rox eram... idênticas.  

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