Capitulo 06
Capitulo 06
Gina estudava sua imagem refletida no espelho do quarto e tentava afugentar o sono. Quase não dormira na noite anterior e, além disso, os poucos momentos em que conseguira se desligar foram povoados por sonhos sombrios nos quais era perseguida por um homem de túnica branca cujas feições não pôde distinguir. Em seu pesadelo pedia ajuda a Harry, mas ele, mesmo podendo vê-la, a ignorava e se divertia, rodeado por um bando de mulheres. Uma vez apenas ele a fitara, balançara a cabeça e dissera com crueldade: "Vá embora, pequena virgem. Eu não quero você".
E de manhã, mesmo após o fim da noite, Gina sentia como se uma sombra negra ainda pairasse sobre ela. Não havia mais tempo para convencer Potter de que ela não era uma boa esposa, e mais uma vez Harry a abandonava.
Lentamente saiu da frente do espelho. Já preparara uma pequena mala para passar a noite e vestira um traje que esperava ser adequado para enfrentar o deserto. Usava uma blusa de mangas curtas, calça cáqui e sapatos esportivos e resistentes. Levava também uma jaqueta de mangas compridas, um chapéu, óculos escuros e uma garrafa d'água. Contudo, o espírito de aventura e o entusiasmo que haviam motivado a viagem tinham desaparecido, deixando um triste vazio em seu lugar.
Agora ela estava com medo, Gina admitiu tremendo. E com toda razão! Seus pensamentos a deixavam atordoada! Não havia sentido em acreditar que amava Harry.
Amar? Desde quando a palavra amor entrou no jogo? Ela tentou zombar da situação.
Apenas dois dias antes não queria admitir que estava sexualmente atraída por ele, e dois dias antes disso nem sabia de sua existência. E nesse momento, tentava se convencer de que o amava! Não, não era nada disso, corrigiu-se. Ela não o amava.
O telefone tocou e ela alcançou o aparelho depressa. Era a recepcionista avisando que sua condução chegara.
Apanhando a mala, Gina disse a si mesma que um tempo para pensar lhe faria bem. Era uma pena viver nesses tempos modernos.
No passado seria simples montar num camelo e atravessar a fronteira sem precisar apresentar um passaporte...
Um grupo de recém-chegados se aglomerava no saguão e a organização do passeio não pôde fazer nada por Gina senão apontar para o veículo que os aguardava do lado de fora.
Mesmo seus óculos escuros não conseguiram protegê-la da forte luz do sol que ofuscou seus olhos no trajeto até o automóvel.
Enquanto tentava se acostumar com a claridade sentiu alguém tirar a mala de suas mãos, e em seguida segurar sua cintura para ajudá-la a sentar-se no banco da frente do automóvel. Ouviu a porta do passageiro se abrir e logo depois o porta malas se fechar. Quando o motorista entrou no carro e ela virou-se para olhá-lo, não pôde disfarçar a surpresa!
- Harry! - exclamou com a voz fraca. - O que você está fazendo aqui?
Gina quis desviar o olhar enquanto procurava recuperar o fôlego. O aperto no peito era tão intenso que chegava a doer, e um forte calor, reação à presença inesperada, percorreu-lhe o corpo.
- Você reservou uma viagem para o deserto. - ele disse enquanto punha o automóvel em movimento.
- Sim... Mas...
- Mas o quê? - desafiou-a como se nada estivesse acontecendo. - Eu pensei que faria sentido. O deserto é um lugar extremamente sedutor, e seu pretendente não vai gostar nem um pouco de saber que sua futura noiva passou a noite com outro homem. E como foi o encontro com seu avô? Tudo perdoado? - petulante, ele mudou de assunto.
- Minha mãe é quem deveria perdoá-lo. - Gina retrucou. - Mas ela morreu acreditando que ele não a amava mais.
Houve um pequeno silêncio antes que Harry falasse num tom estranhamente sério:
- Então eu imagino que seu avô deve achar muito difícil perdoar a si mesmo.
- Eu não tenho nada a ver com os sentimentos dele! - Gina esbravejou, logo se interrompendo, pois sabia que não era verdade. - Eu pensei que ele fingia estar doente. - contou a Harry.
- E ele fingia?
- Não. - informou-lhe. - Mas isso não significa que ele tenha o direito de fazer o que pretende com minha vida.
- Talvez ele ache que esse casamento vá fazer bem para você. - Harry sugeriu. - A geração dele ainda acredita que uma mulher precisa de um protetor, de um marido. Além disso, ele manteria você aqui, perto da família de sua mãe e a sustentaria.
- O quê? - tornou ela incrédula. - Como pode dizer isso depois do que eu lhe contei? Meus sentimentos... Minhas necessidades... São a última coisa com que ele se preocupa.
- Você acredita que seja assim! Se pudesse deixar Zuran agora, o que você faria... Para onde iria?
Gina olhou-o atentamente. Por que de repente ele estava bancando o advogado do diabo? Por diversão?
- Eu iria para casa... Para a Inglaterra. Eu tenho vinte e três anos e em breve pretendo fazer minha pós-graduação. Há tanta desigualdade no mundo, pude ver isso quando trabalhei na área de serviço social. Eu gostaria de fazer alguma coisa para ajudar as pessoas.
- Como esposa de um homem rico você pode fazer bem mais do que num simples emprego.
- Eu já lhe disse, nunca poderia me casar com um homem que eu não ame e respeite. E pelo que Saud me contou, eu deveria adorá-lo como a um deus! Saud o idolatra e não vê a hora em que eu me case para poder dizer que Potter é seu parente. E é claro que ele não é o único! Pelo que parece, minha família inteira está delirando de alegria com a possibilidade deste casamento.
- Seu primo parece uma fonte preciosa de informações. - Harry comentou com secura, deixando Gina um tanto preocupada.
- Saud é jovem e impressionável. Como eu disse, ele idolatra Potter e acredita que ele não pode me causar mal algum.
- Às vezes um modelo e mentor pode ser útil a um jovem.
- Oh, eu concordo com isso. Mas se um homem simplesmente classifica as mulheres em dois grupos, boas ou más, virtuosas ou imorais, enquanto ele pode fazer tudo o que quer, deixa de ser, na minha opinião, um modelo a ser seguido.
- Se você olhar para a sua esquerda, poderá ver os cavalos da família real sendo exercitados. - Harry a interrompeu calmamente.
Gina sentiu-se tentada a prosseguir com suas críticas, mas quando viu os cavalos correndo, a excitação diante de tamanha demonstração de força fez com que se calasse e aplaudisse os animais em silêncio.
- Você ainda é totalmente contra esse casamento? - Harry perguntou minutos mais tarde.
- É claro que sim. Por que não seria? Nunca vou me casar com um homem que não amo.
- Quem sabe você comece a amá-lo depois do casamento.
Gina olhou-o com desprezo.
- Nunca. - negou com veemência. - E mesmo que eu fizesse isso, duvido que um sheik correspondesse aos meus sentimentos. O nosso casamento significaria para ele um acordo diplomático bem sucedido. Eu preciso fazer com que ele mude de idéia e se recuse até em considerar essa idéia.
- Você já parou para pensar que ele pode estar sentindo a mesma coisa? Por que não se encontra com ele e, quem sabe, discute o assunto?
Gina lançou-lhe um olhar fulminante.
- Ao contrário de mim, ele teve a chance de dizer não! Afinal, com toda a sua influência, ele poderia simplesmente não aceitar, e pronto. Mas por que você, de repente, está tão interessado em promover esse casamento? Você não quer mais ganhar o que combinamos?
Ou será que ele a queria fora de sua vida por ter percebido como ela se sentia a seu respeito? Um homem como ele definitivamente não ia querer uma mulher apaixonada aos seus pés!
Apaixonar-se? Mas ela não se sentia assim, não é mesmo?
Gina fechou os olhos desconsolada. Será que ela já não tivera desilusões sentimentais suficientes em sua vida? .
- Segure-se. Daqui a pouco nós vamos sair da estrada e entrar no deserto. - Harry avisou sem tirar os olhos da pista.
Gina agarrou-se firme ao banco quando eles entraram no terreno irregular e percorreram um caminho que parecia completamente indefinido. Harry, no entanto, não teve dificuldade para seguir as tênues marcas de pneus no solo arenoso.
Dentro de poucos minutos viram-se totalmente cercados por dunas de areia. Um tanto ansiosa, Gina virou-se e olhou para trás.
- Como... Como você sabe o caminho? - perguntou insegura.
- Eu sei a direção certa por causa da posição do sol. - ele informou indiferente, completando em seguida: - Além do mais, os automóveis próprios para esse tipo de terreno são equipados com bússola e computador de bordo. Uma tempestade de areia forte pode, além de reduzir a visibilidade a zero, apagar todas as trilhas. Vê aquele pássaro ali? - ele apontou uma ave distante.
- O que é?
- É um falcão. - ele respondeu estendendo a mão até o console. Por um instante as pontas de seus dedos roçaram o joelho de Gina. Imediatamente o corpo dela foi invadido por uma onda de calor, ansioso pelo toque de Harry. Se ela se virasse para ele, tomasse sua mão e o beijasse; se o tocasse como desejava ser tocada... Mas era tarde demais. Ele retirou a mão quando conseguiu apanhar o binóculo. Era isso que ele oferecia para ela! Binóculos! Quando ela só queria uma única coisa dele... - Olhe com atenção. Provavelmente é um pássaro treinado. Alguns dos moradores mais ricos de Zuran possuem um criadouro de falcões onde eles são domesticados e treinados. É um costume milenar que ainda existe por aqui.
No momento em que Gina focalizou a ave, ela subitamente mudou de direção e sumiu de sua vista, como que respondendo a algum chamado.
- Freqüentemente ocorrem demonstrações de falcões no vilarejo onde vamos passar a noite. A maioria das pessoas tem medo dos pássaros, mas na verdade os camelos são muito mais perigosos.
- Minha mãe me contou isso.
Era desconcertante descobrir que Harry, o garanhão da praia, mostrava-se conhecedor da cultura local e sua história. Sem a intenção de parecer pedante, ela prontamente lhe informou que, apesar de nunca ter vivenciado essa experiência, fazia parte desse meio cultural.
O deserto era realmente fascinante, no entanto Gina não conseguia se concentrar na paisagem, pois a presença de Harry dominava todos os seus sentidos.
Isso, porém, não significava que estava apaixonada por ele, disse a si mesma com convicção. Seu coração estava mais acelerado que o normal. Evitava olhar diretamente para ele, pois se o fizesse corria o risco de não conseguir desviar o olhar... examinando... admirando, admitiu para si. Mas isso não significava... nada. Nada além de uma forte atração física.
Contudo, se fosse honesta consigo mesma, reconheceria que era mais que isso...
- Você parece estar com calor. - Harry constatou, interrompendo o silêncio. - Você precisa beber bastante água. O deserto é o pior lugar para se desidratar.
Talvez Gina devesse estar satisfeita por ele pensar que o responsável pelo calor que sentia era o sol e não os desejos sensuais que nutria por ele.
Imaginava que as lembranças da mãe sobre suas viagens ao deserto a tinham preparado para tudo que pudesse acontecer, mas Gina vibrava de emoção a cada duna que venciam. Mais adiante o oásis podia ser visto em meio ao calor como se fosse uma miragem. O resort montado em pleno deserto permitia aos turistas sentir na pele o hábito de vida dos povos nômades que vagavam entre um oásis e outro.
Diversos automóveis estavam estacionados e Harry encostou seu veículo junto a eles.
- Espere aqui. - ele pediu. - Eu vou até a recepção descobrir qual tenda foi reservada para nós.
Nós? O estômago de Gina contraiu-se. Minutos mais tarde Harry retornou e eles caminharam até suas acomodações no final do acampamento. Quando atingiram a enorme tenda Gina apressou-se em conferir suas dependências. O espaço era dividido em três cômodos independentes. Aquilo não era uma simples tenda, e sim, um verdadeiro pavilhão sobre a areia. Uma sala de estar decorada com tapetes orientais e divãs de seda e dois dormitórios. Os banheiros, cujas instalações eram modernas e confortáveis, eram decorados com mais simplicidade e, segundo Harry, ficavam ao lado.
Gina mal ouvia o que ele dizia. Ela afastou o pano que servia de porta e deleitou-se com o que via.
Diferente de sua suíte no hotel, o ambiente parecia um cenário das Mil e Uma Noites. As paredes eram cobertas de seda de várias cores decorada com fios de ouro que refletiam as luzes dos abajures colocados sobre cômodas de madeira entalhada. A cama estava forrada com lençóis de seda e era cercada por um cortinado de voil que certamente a cobriria por inteiro quando solto. O efeito era de opulência e sensualidade, e Gina receou que tudo desaparecesse de repente, como uma miragem.
- Algo errado? - Harry perguntou do lado de fora.
- Não. É... é maravilhoso...
- É uma mistura de Mil e uma Noites com Disney World, isso sim. - ele criticou, olhando a sua volta.
- É lindo. - Gina defendeu sua nova casa.
- Esta é a suíte nupcial. - ele contou com um sorriso. - Mas não se preocupe, se não houver lua-de-mel, ou se o casal brigar, há um segundo quarto.
A suíte nupcial! Por que ficariam naquele quarto? Será que Harry o escolhera justamente para reforçar a idéia de que eles eram namorados?
- Se você quiser dar um passeio de camelo, a hora é agora. - Harry sugeriu, claramente indiferente à sensualidade do ambiente e à tentação que invadia Gina.
- Mais café?
Sorrindo, Gina fez um sinal negativo com a cabeça e cobriu a xícara com a mão.
Eram quase onze da noite, as mesas já estavam limpas e tudo estava pronto para o show.
Gina percebeu a excitação dos espectadores quando os músicos mudaram o ritmo da música. De dentro de uma tenda uma mulher estonteante vestindo um traje típico saiu dançando provocativamente. Seu quadril se contorcia com sensualidade.
As jóias espalhadas por seu corpo, especialmente as de seu umbigo, reluziam com o movimento frenético de seu ventre.
Ao seu lado um grupo fumava um cachimbo que exalava uma suave fragrância de morango, as garotas rindo, alegres, quando tragavam a fumaça adocicada. Dizia-se que tal especiaria provocava uma leve euforia e Gina hesitou quando o cachimbo foi passado para ela.
- Se você não experimentar vai ser obrigada a se levantar e dançar junto com a nossa dançarina. - o guia turístico provocou-a.
Gina deu uma breve tragada relaxando com a essência de morango. Quando se virou para oferecer o cachimbo a Harry percebeu que ele não estava ao seu lado. Ele conversava com o domador de falcões, que mantinha sua ave pousada em seu pulso.
Devolveu a iguaria ao guia e percebeu que não era a única mulher que olhava para Harry. A dançarina focalizara o olhar nele e, ignorando o resto do público, ia lentamente em sua direção com gestos provocantes.
E Harry... Uma sensação cortante de ciúme invadiu-a ao perceber que ele retribuía o olhar e sorria para ela.
Gina julgava conhecer a dor, mas percebia agora que o que sentira era apenas uma de suas muitas dimensões. Naquele momento, observar Harry olhar para outra, quando o que mais queria era sua atenção somente para ela, permitiu-lhe experimentar um tipo de aflição que não conhecia até então!
Pensamentos, desejos, necessidades ocultas em seu íntimo, eclodiram um após o outro e desabaram sobre sua cabeça como uma avalanche. Enterraram para sempre qualquer tentativa de negar o que realmente sentia!
Desesperadamente procurou refletir sobre o que acontecia.
Um silêncio lúgubre se seguiu a sua tormenta interior. Sua mente ficou como que paralisada.
Sua intensa dor deixou-a sem fôlego. Será que sua mãe nutrira o mesmo sentimento por seu pai? Provavelmente sim. Mas as coisas tinham sido diferentes para sua mãe. Ela sabia que era amada... Ela tinha certeza de que o marido a amava com a mesma intensidade.
O ritmo da música se acelerava, e Gina estremeceu diante da ardente determinação da dançarina em se fazer notar por Harry, em ser escolhida por ele. Harry se virara e estava de frente para ela. A garota dançava cada vez mais rápido e no instante em que a música atingiu seu ápice ela se jogou aos pés de Harry.
Pela reação dos guias de turismo e dos homens que trajavam a túnica branca típica, Gina pôde perceber que aquele não era realmente o final usual da dança. Instintivamente sabia que a garota não se oferecia com tanta frivolidade para os espectadores da maneira que fizera com ele. Naquele momento, o ciúme dominou-a totalmente.
Quis correr e afastar a dançarina de Harry e dizer-lhe que ele lhe pertencia. Mas isso certamente não era verdade!
O público, como fora encorajado a fazer, jogava alegremente moedas para a moça, mas esta permanecia prostrada diante de Harry e não se dava conta da generosidade dos espectadores.
O dinheiro ficou no chão até um malabarista se aproximar e recolher a soma. .
Gina observou Harry admirando a garota e se perguntou o que ele estaria pensando. Ele disse algo para o homem com quem falara anteriormente, e este lhe fez uma leve reverência e inclinou-se para a moça.
O que aquele homem estaria dizendo para ela? Gina perguntou-se com ciúme. Que mensagem Harry teria pedido para o homem transmitir? Teria ele dito que gostaria de encontrá-la mais tarde? A garota ergueu-se, lançou um olhar desafiador a Harry, virou-se e foi embora lentamente.
Poderia um homem recusar tal convite? E por que um homem como Harry iria sequer tentar resistir? E por que uma mulher como ela fora se apaixonar justamente por ele?
A noite caminhava para o fim. Os hóspedes terminavam suas bebidas e voltavam para as suas tendas.
Gina olhou para Harry, que conversava com o domador e um outro homem. A dançarina desaparecera e Harry não fazia menção alguma de ir até ela ou até mesmo olhar em sua direção. Cansada, Gina levantou-se e foi para seu pavilhão, apanhou seus pertences e dirigiu-se à sala de banho. Muita coisa estava acontecendo rápido demais para ela. Desde que chegara àquele país fora forçada a enfrentar aspectos mal-resolvidos de sua vida pessoal e sentimentos muito difíceis de aceitar.
Debaixo do chuveiro, Gina desejava intensamente voltar tempo e esquecer tudo o que acontecera em Zuran, um tem em que teria rido se alguém lhe dissesse que se apaixonaria por um homem como Harry.
O acampamento estava praticamente deserto quando voltou ao pavilhão. O brilho tênue das luzes em seu interior criava uma atmosfera de mistério e romance.
Alguém havia colocado um prato de tâmaras numa das mesas de madeira e ajeitado grandes almofadas de seda na frente. Gina, no entanto, não se sentia com ânimo para nada, uma vez que seu coração fora inundado por uma grande angústia por causa de seu amor não correspondido. Mesmo que Harry retribuísse seus sentimentos, que futuro poderia haver para eles?
Não era uma questão de dinheiro. Harry poderia não ter nada e ela o amaria mesmo assim. Como não se sentir aflita por amar um homem que usava seu corpo da maneira que ele fazia? Isso era o que mais a machucava. Ainda mais do que imaginá-lo com outra mulher? A dançarina, por exemplo?
Gina cerrou as mãos. Onde ele estaria agora? Ele não se achava no quarto. O pano que cobria a entrada estava recolhido e ela podia ver o interior do aposento.
Diferente do seu, as "paredes" do quarto dele eram feitas de um tecido mais pesado, mais grosso, ornamentado com mais ouro.
Havia um bonito tapete no chão e sobre a cômoda um prato com pedaços de bolo e uma jarra de café.
Parecia o aposento de um príncipe árabe, Gina admirou-se. O lugar perfeito para o príncipe levar a dançarina que escolhesse.
Rapidamente Gina suprimiu esse pensamento. Harry não era nenhum príncipe, muito menos árabe, e a dançarina...
Onde ele se encontrava? O resort achava-se totalmente mergulhado no silêncio, e mesmo assim ele não aparecia.
Agitada, Gina perambulava pela sala de estar quando a porta do pavilhão se abriu e Harry entrou. Estava sem camisa e tinha uma toalha nos ombros. O perfume do deserto alastrou-se pelo ambiente.
O corpo de Gina derretia por dentro ao olhar boquiaberta para aquele torso nu.
Na primeira vez em que o vira assim não pôde reparar na perfeição de seu corpo, mas naquele momento foi capaz de sentir-lhe toda a sensualidade e masculinidade.
De repente, reparou em um arranhão em seu braço do qual ainda saíam gotículas de sangue. Gina sentiu o mundo girar e foi tomada pelo ciúme. Ele estivera com a dançarina e ela deixara sua marca em seu braço!
A marca de sua paixão!
- Onde você esteve? - Gina bradou antes que pudesse raciocinar e avançou para cima dele com os punhos cerrados, furiosa. - Como se eu não soubesse! Ela era boa? Melhor que as turistas ricas que pagam por seus favores?
- O que...
Na velocidade de um relâmpago a expressão dele tornou-se séria e concentrada. A raiva era evidente em seu rosto.
- Que burra eu sou! - Gina gritou, enfurecida, não se fazendo de rogada. - Eu pensei que nós estávamos aqui para convencer a todos de que somos namorados! Mas pelo jeito eu estava errada! Pelo visto o que importa para você é aproveitar os favores sexuais de uma dançarina do ventre! Mas é claro que vocês dois têm algo em comum, não é mesmo? Vocês dois trocam sexo por dinheiro e...
Gina emitiu um som esganiçado quando sentiu que era erguida. Seus braços eram como dois gravetos na mão de Harry, que a levantou até a altura de seus olhos.
- Você deveria ter certeza do que diz antes de sair por aí proferindo insultos a torto e a direito. - ele vociferou. - Ah, se você fosse um homem... - desafiou-a. Sua voz transformou-se num rosnado: - Você não é nem uma mulher... Você é apenas uma virgem histérica que está louca para saber como é que é. Não negue! Está escrito na sua cara e em todos esses seus olhares que você me dá, ou pensa que eu não percebo? Você está desesperada para fazer sexo, não é mesmo? Bem, desculpe desapontá-la, mas você não desperta meu interesse.
- Você quer dizer que eu não lhe ofereci o suficiente? - ela o insultou sem pena.
- Dinheiro suficiente? - Para desgosto de Gina, ele soltou uma sonora gargalhada. - Ao contrário do que você imagina, não é o dinheiro que me atrai, que me faz querer uma mulher e lutar por ela com todas as minhas forças. Acordar do lado dela de manhã, sabendo que meu toque ainda está em seu corpo, sentir que o cheiro dela é meu também. Mas você não sabe nada sobre isso, não é mesmo? Você não sabe nada sobre os desejos de um homem... A compulsão que faz com que ele queira uma mulher. Você quer que eu lhe mostre? É isso que você quer?
Gina sabia que deveria negar tudo o que ele dizia... Recusar-se a aceitar o que ele lhe oferecia. Mas tudo que pode fazer foi fitá-lo indefesa e imóvel quando ele a beijou.
Gina não conseguiu impedir um gemido quando seus lábios se encontraram. Ela agora sentia na pele o que era realmente desejar alguém como se sua vida dependesse disso. Nunca um nômade precisou tanto de água em pleno deserto como ela precisava de Harry agora!
Ela o beijava com avidez, abraçava-o com força, dominada pela pressão da língua dele contra a dela.
- Por que eu estou fazendo isso? - ele perguntou de repente, afastando-se, descontrolado, antes que Gina pudesse impedi-lo. - Eu devo estar ficando louco! A última coisa que eu quero agora é... - fez uma pausa balançando a cabeça, mas Gina podia adivinhar o que ele estava prestes a dizer!
A última coisa que ele queria era ela!
Movida pela repentina sensação de rejeição, como que tomada por algum espírito primitivo, ela reagiu às palavras cruéis e insultuosas e ergueu a mão na direção do rosto de Harry.
Quando a palma de sua mão atingiu-lhe o queixo, uma expressão de espanto cobriu-lhe a face. O corpo de Gina estremeceu violentamente, como se fosse ela a pessoa agredida.
Ela sentiu quando Harry a soltou e seus pés tocaram o chão e de repente viu-se deitada em sua cama, sozinha em seu quarto.
Ela tremia e só conseguia se lembrar do estalo provocado por sua mão ao tocar a pele de Harry.
Como pudera cometer tal ato? Ela era contra qualquer tipo de violência. Sentia-se enojada consigo mesma por ter agido daquela forma, e seus olhos nem ao menos forneciam as lágrimas que serviriam para aliviar a sua dor.
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