Capitulo 5



Capitulo 5


 


Infeliz, Gina empurrou para longe o desjejum intocado e concentrou-se na paisagem ensolarada através das janelas da sala de café da manhã.


Decidira comer lá naquela manhã porque esperava que a agitação das pessoas a sua volta prendesse sua atenção, e assim conseguisse pensar em algo que não a noite passada e, acima de tudo, em Harry.


Harry! Sempre que pensava nele, e isso ocorria com tanta freqüência que já não tinha paz de espírito, ela era invadida por sentimentos contraditórios de desejo e auto-censura, combinados a uma sensação de perplexidade e incredulidade por ter se envolvido em tal situação. Como pudera desejá-lo?


De sua mesa, Gina admirava desconsolada o saguão do hotel que parecia estar, naquela manhã, mais cheio de funcionários uniformizados do que de costume.


O garçom se aproximou para limpar sua mesa. A fim de passar o tempo enquanto aguardava a tia, Gina caminhou até um cartaz que divulgava os passeios promovidos pelo hotel. Um deles chamou sua atenção e ela leu os detalhes da excursão seguidas vezes.


Um passeio pelo deserto, uma noite em um resort situado em um oásis onde se tem a possibilidade de sentir de perto a magia do deserto.


O deserto... Antes que pudesse mudar de idéia, Gina entrou no escritório, de onde saiu dez minutos mais tarde com sua reserva nas mãos. Uma noite inteira longe de Harry lhe dava tempo para absorver os danos que sua reação instintiva causara em seu moral, e assim colocar sua cabeça de volta no devido lugar.


Tinha tempo suficiente para subir até sua suíte e trocar de roupa antes de encontrar a tia. Gina sorriu para o grupo aparentemente nervoso que se aproximou do elevador privativo da suíte presidencial.


- Todos parecem muito ocupados hoje. - ela comentou.


- Está havendo uma reunião lá em cima entre os donos do hotel. - um dos homens uniformizados comentou e suspirou.


Os donos do hotel. O coração de Gina acelerou. Aquilo significava que Potter tinha voltado? E se tivesse chegado, quanto tempo levaria para procurá-la?


- Hum... Isso cheira maravilhosamente bem. - Gina afirmou sorrindo quando cheirou o pedaço dourado de incenso que sua tia lhe estendia. Elas se encontravam no mercado de especiarias, onde a tia procurava com muito empenho algumas essências e as apresentava a Gina. Maravilhada, Gina examinava a pedra dourada em sua mão.


Era extremamente instigante viver no novo milênio e manusear algo familiar a civilizações tão antigas. Havia algo de especial naquele país, Gina pensava consigo mesma ao devolver a pedra ao vendedor.


- Eu tenho ótimas notícias para você. - comunicou a tia, após convidá-la a tomar um suco. - Seu avô está muito melhor e convidou-a para visitá-lo esta tarde. - prosseguiu, entregando-lhe um copo, radiante.


Gina quase derrubou a bebida. Seria apenas coincidência que seu avô a convidara justamente quando o sheik Potter voltara a Zuran? Seu corpo ficou tenso, numa reação de defesa.


- Me desculpe, mas não vai ser possível. Eu... eu tenho outros planos. - Gina sentiu-se orgulhosa por conseguir aparentar calma, mesmo evitando o olhar da tia.


O silêncio que se seguiu revelou-lhe que sua resposta não era a esperada pela tia, por isso sentiu-se culpada e desconfortável. A última coisa que queria era desagradar ou preocupar aquela mulher que sempre fora extremamente gentil com ela, mas afinal, lembrou-se, conhecia os verdadeiros planos de seu avô.


Sua tia sorria, mas Gina sabia que era um sorriso forçado.


- Seu avô vai ficar desapontado, Gina. - a tia disse em voz baixa. - Ele espera com tanta ansiedade por esse momento, mas se você está ocupada...


- Eu... eu programei uma viagem até o deserto amanhã. - Gina explicou, na defensiva. - E eu preciso fazer algumas coisas antes...


A tia ouviu a explicação de Gina com expressão grave. Insistiu em acompanhar Gina até o hotel, mas uma vez lá, recusou o convite para uma xícara de café.


Ela estava prestes a entrar no táxi quando um impulso inexplicável fez Gina correr até o carro e avisar que havia mudado de idéia.


Atordoada com sua fraqueza, Gina enterrou os dentes em seu lábio inferior quando a tia aprovou sua decisão e lhe deu um abraço carinhoso.


- Eu sei que não é fácil para você, Gina, mas garanto que seu avô não é nenhum monstro. Ele gosta muito de você. .


Um leve arrepio percorreu a coluna de Gina quando ouviu as palavras inconscientemente sinistras da tia, mas já era tarde para mudar de idéia.


- Seu avô descansa depois do almoço, mas eu providenciarei para que um carro venha buscá-la. Quatro e meia está bem para você?


Gina não pôde fazer nada a não ser concordar com um gesto de cabeça.


 


Gina tinha esperanças de que Harry a procurasse, pois, afinal, ainda não lhe pagara nada, mas não havia mensagens para ela.


Gina dizia a si mesma que a sensação de aperto em seu peito devia-se simplesmente a sua ansiedade em discutir com ele os acontecimentos do dia e decidir qual ação deveria ser tomada. Era natural, obviamente, que ela sentisse um misto de ansiedade e pressa uma vez que o sheik Potter estava de volta. E sobre a noite passada, bem, o que era um beijo, afinal?


Somente ela sabia o quanto sua reação fora exagerada! Ela não era tão ingênua a ponto de enganar-se e dizer que o beijo significara algo para ele.


Então, por que ele não a procurou? E por que ela não insistiu para que ele a procurasse?


Eram mais de duas horas, e apesar de não ter comido nada o dia inteiro ela não sentia fome. A perspectiva de encontrar o avô fazia seu estômago contrair-se. Seu nervosismo era aguçado por pontadas desagradáveis causadas pela volta de Potter e pela ausência de Harry.


Gina hesitou em frente ao seu guarda-roupa. O conjunto de vestido e blazer de linho seria uma boa escolha, modesto, porém moderno, ou quem sabe devesse usar o vestido de cambraia...


Ou... Sua mão tremeu levemente quando retirou uma calça preta lisa do armário. De corte simples, aquela peça preta sempre seria especial para ela. Fora presente da mãe semanas antes de sua morte, um presente que lhe daria sorte nas entrevistas pré-universitárias.


Mas Gina não a usou nas entrevistas, e sim no enterro de seus pais. Quando, contudo, tocava o tecido macio, não era do momento fúnebre que se lembrava, e sim, do carinho de sua mãe quando entrou na butique e disse que iria lhe comprar um presente, a felicidade e o orgulho em seu rosto quando insistiu para que Gina provasse praticamente todas as peças da loja antes de escolher a melhor.


Aquela calça tinha um apelo emocional muito forte para Gina, e às vezes podia jurar que sentia o cheiro de sua mãe impregnado na roupa.


A calça ainda servia, e na verdade, examinando sua imagem no espelho podia dizer que ela estava um pouquinho larga na cintura.


Eram quase quatro e meia, hora de descer para o saguão.


Seu traje formal atraiu diversos olhares discretos em seu trajeto até a saída. Mais uma vez havia um tapete vermelho em seu caminho até o estacionamento onde estavam paradas diversas limusines pretas e reluzentes.


Enquanto aguardava a chegada do motorista, Gina examinou com discreta curiosidade os veículos enormes, mas sua atenção desviou-se completamente quando um carro parou a sua frente e seu primo Saud saiu com imenso sorriso estampado no rosto.


Ao abraçá-lo, Gina percebeu vagamente uma agitação entre os motoristas e em seguida um grupo trajando mantos típicos saiu pela porta da frente. Mas foi Saud quem olhou diretamente para o grupo, segurando o braço de Gina, agitado.


- Aquele é Potter com seu tio-avô.


- O quê? Onde? - Seu coração teve um sobressalto, mas quando olhou na direção em que Saud apontava os homens já tinham entrado na limusine.


- Você já o conheceu? - o primo indagou quando os carros partiram. - Ele é legal, não é mesmo?


Gina escondeu seu desapontamento. Era evidente que o primo idolatrava seu pretendente.


- Não, ainda não. - ela informou ao entrar no carro. À medida que o veículo se distanciava do hotel um pensamento repentino invadiu-a. - Então Potter estava usando um manto?


- Isso mesmo. - Saud confirmou.


- Apesar de sua formação ocidental?


- Sim. - ele concordou um tanto confuso. - Ah, entendi! - ele sorriu em seguida. - O tio-avô de Potter foi como... Como um padrinho para Potter quando seus pais morreram num acidente de avião no deserto. Eu não me lembro disso porque não tinha nem nascido nessa época, mas uma vez escutei uma conversa entre meu pai e meu avô. Potter foi estudar na Inglaterra, mas seu tio-avô sempre o tratou como se ele fosse seu próprio filho. É uma grande honra para a nossa família que o tio-avô apóie seu casamento com Potter. É bom você ser uma pessoa simples, minha prima, porque Potter não aprova o comportamento de algumas turistas que vêm aqui para Zuran.


- Ele não aprova? - Potter replicou com um cinismo sutil. - E o comportamento dele? Ele é...


- Potter é um homem muito sério, todos que o conhecem sabem disso. Ele tem valores muito arraigados. Zara, minha amiga e prima de segundo grau, diz que sente vergonha de seu sexo quando vê o jeito que algumas mulheres se aproximam dele. Ele é muito rico, você sabe, e quando elas vêm aqui para o hotel e encontram com ele, fazem de tudo para atrair sua atenção. Mas ele não se interessa por elas. Zara diz que é porque... - Ele fez uma pausa e olhou diretamente nos olhos de Gina, mas ela estava tão furiosa com suas ingênuas revelações que não prestou muita atenção nele. - Potter é um homem muito orgulhoso e nunca permitiria que alguém prejudicasse o nome de sua família. - Saud continuou em tom solene.


Naquele momento eles chegaram à mansão da família, e Gina deu um suspiro quando o automóvel estacionou em frente à entrada.


Seu avô insistia em viver na casa que pertencera à família desde os tempos em que Zuran fazia parte da rota comercial do oriente e seus parentes prosperavam nos negócios. No entanto, como a tia lhe explicara, poucos anos atrás o tio de Gina convencera o avô a ampliar a mansão e conferir-lhe um estilo moderno. Na parte antiga da casa, entretanto, ainda estavam de pé os tradicionais moinhos de vento.


A família não mantinha mais o costume de reservar às mulheres uma parte separada da casa, como na época em que sua mãe vivia ali, mas sua tia prontamente lhe explicou, assim que conduziu Gina a um salão muito bem-decorado, que seu avô ainda mantinha uma área privativa para si.


- Kahrun, seu secretário, vai levá-la até ele. - informou-lhe a tia. - Ele esteve muito doente Gina - continuou hesitante - e eu gostaria de pedir para que você... faça concessões... ao modo de vida dele. Ele amava muito a sua mãe, e a morte dela... - A tia fez uma pausa balançando a cabeça, desconsolada, enquanto Gina viu-se forçada a engolir sua mágoa e calar-se.


Uma criada trouxe um café que exalava um aroma forte e marcante. Sua mãe nunca perdera a paixão por essa bebida, e só seu cheiro bastava para trazer-lhe boas lembranças dela. Alguns minutos depois, quando Gina recusou uma segunda xícara, um empregado aproximou-se com uma reverência e pediu-lhe que o acompanhasse.


Com o coração batendo forte e a cabeça erguida, Gina o seguiu.


Eles percorreram diversos corredores antes que o funcionário parasse em frente a uma grande porta de madeira entalhada.


A sala era fresca e sombreada, suas janelas estreitas davam para um jardim interno de onde vinha o som de água que tanto agradava aos habitantes do deserto. A sala cheirava a incenso e sândalo, que lhe trazia à memória a pequena caixa em que a mãe guardava suas mais preciosas lembranças.


Como as emoções embaçaram-lhe temporariamente a visão, não conseguiu distinguir as feições do homem deitado em um divã a poucos metros de distância.


- Chegue mais perto para que eu possa vê-la. - Gina ouviu-o pedir. - Meu médico proibiu-me de fazer muito esforço, por isso preciso ficar deitado neste divã para não desagradá-lo.


Gina escutou a leve risada irônica que se seguiu àquela frase e controlou a emoção.


A descrição do avô feita pela mãe formara na mente de Gina a imagem de um homem forte e obstinado, um homem que oprimiu os sentimentos de sua mãe, e agora que podia vê-lo pessoalmente esperava encontrar essas características em seu semblante. No entanto, o homem a sua frente possuía uma aparência frágil. Sua mão achava-se apoiada ao encosto bordado do divã e Gina pôde perceber em sua postura todo o orgulho ao qual a mãe sempre se referia. Ela, porém, não conseguia ver naqueles olhos que a examinavam minuciosamente a rejeição e a raiva que tanto feriram a mãe.


- Eu não me pareço muito com minha mãe. - Gina disse friamente.


- Você não precisa parecer com ela. Você é parte dela e isso é suficiente. Filha de minha filha! Sangue do meu sangue! Eu esperei muito tempo até você vir a mim, Gina. Algumas vezes cheguei até a temer que você não viesse a tempo e que eu nunca fosse conhecê-la pessoalmente. Entretanto, sempre conheci você com meu coração. Mas você está enganada. - ele acrescentou abruptamente, o tom de voz mais forte. - Você é como minha Molly. Ela era minha filha do coração, minha filha mais nova. A mãe dela era minha terceira esposa.


Gina desviou o olhar com raiva.


- Você não aprova minha atitude. Não precisa negar, eu vejo em seus olhos. Eu vejo como eles brilham e queimam com as emoções. Você é igual a sua mãe.


Gina não conseguia falar palavra alguma.


Estava chocada com seu aspecto extremamente frágil. Sabia que ele era velho, ele tinha quarenta anos quando sua mãe nasceu, mas de alguma forma ela se convencera de que ele ainda era o homem forte e impiedoso que sua mãe conhecera.


Não essa pessoa envelhecida, de barbas brancas cujos olhos escuros transmitiam uma compreensão que a perturbava.


De alguma forma as palavras secas que gostaria de dizer, as indagações sobre seu repentino desejo em vê-la, e o cinismo que pretendia mostrar recusaram-se a sair.


Em vez disso...


Gina ergueu o braço e a luz refletiu em sua pulseira de ouro.


Imediatamente seu avô estremeceu.


- Você está usando o bracelete de Miolly! - Ele suspirou. - Foi meu último presente para ela... Eu tenho uma fotografia em que ela o usa.


Para o espanto de Gina ele apanhou um álbum de fotografias que ela não tinha notado ao seu lado, e pediu que se aproximasse.


À medida que seus dedos frágeis viravam as páginas o coração de Gina acelerava em seu peito. Todas as fotografias do álbum eram de sua mãe e algumas delas...


Seus olhos encheram de lágrimas quando ela reconheceu uma delas. Era uma foto dela recém-nascida no colo da mãe. Seu pai tinha uma exatamente igual em seu escritório!


Imediatamente ela colocou a mão sobre o álbum impedindo que ele virasse a página, e indagou com a voz trêmula:


- Essa fotografia, como...


- Seu pai enviou para mim. - ele contou. - Ele mandou várias fotografias suas, Gina, e muitas cartas também.


- Meu pai! - Esse fato era novo para Gina, e ela precisou de alguns minutos para assimilá-lo. Para ela era difícil aceitar tal atitude do pai, principalmente porque não lhe contara nada. E sua mãe, ela saberia? Gina ficou gelada. Com certeza não.


O que poderia ter motivado seu pai se ele sabia exatamente como seu avô magoara sua mãe?


Quando seus olhares se encontraram, Gina sabia que o avô podia ler os seus pensamentos.


Sem jeito, ele acenou para que ela se aproximasse.


- Há uma caixa ali. Eu gostaria que você a trouxesse para mim. - ele pediu, quando ela hesitou.


A caixa estava em cima de uma mesa de madeira habilmente entalhada, a superfície lisa e quente ao toque. Sem olhá-la Gina sabia que era muito antiga.


- Isso pertenceu ao meu avô. - ele contou quando apanhou a caixa das mãos de Gina. - Ele era um mascate e essa caixa o acompanhava a todos os lugares. Ela foi feita por um artesão a pedido de um sultão do grande Império Otomano. - O avô esboçou um breve sorriso. - Ele era um grande contador de histórias, e muitas vezes, quando eu era criança, eu me sentava a seus pés para ouvir seus contos, fossem eles verídicos ou não!


Enquanto falava, apanhou um pesado molho de chaves, buscando no meio delas a que lhe servia.


Seus dedos, evidentemente enrijecidos pela idade, lutaram para enfiar a chave na minúscula fechadura e quando ele abriu sua tampa, Gina pôde sentir os aromas de sândalo e rosas que emanavam de seu interior.


Ela não conseguia ver o que havia dentro da caixa, mas esperou pacientemente o avô remexer em seu conteúdo até encontrar o que procurava.


- Leia isso. - ele ordenou bruscamente, estendendo a ela um envelope. - É uma carta de seu pai, contando-me de seu nascimento.


Gina apanhou o envelope com hesitação. Não sabia se estava pronta para ler o que o pai escrevera. Sempre o considerara um homem de sólidos valores morais e de grande honra. E se lesse algo que abalasse sua crença...


- Leia. - o avô insistiu com impaciência.


Gina respirou fundo.


 


Para aquele que é o pai de minha amada Molly, eu tenho o prazer em informar que agora sou pai de um lindo bebê.


Quando Molly entrou em minha vida acreditei que não haveria espaço em meu coração para amar outra pessoa, mas eu estava errado. Eu lhe escrevo para contar como foi maravilhoso o nascimento de Gina e para lhe dizer que agora nós dividimos a mesma situação, ambos somos pais, e que nós recebemos a dádiva de sermos pais de duas mulheres. É na qualidade de pai que eu lhe escrevo implorando para que reconsidere sua decisão de excluir Molly de sua família. Eu me casei porque eu tenho certeza de que posso dar a Molly todo o amor de que ela precisa. Nós nos amamos, amamos nossa filha e nossa vida está repleta de amor e alegria. Mas e você?


Você virou as costas para a sua própria filha, negando o amor que ela sente por você.


Mais uma vez eu lhe imploro para que reconsidere sua decisão e ponha seu orgulho de lado. Eu sei o quanto significa para Molly ouvir uma palavra sua, especialmente neste momento.


Qualquer que seja sua decisão, eu prometi a minha filha que você, seu avô, e o resto da família ficarão informados sobre sua vida.


 


A carta continha a assinatura oficial de seu pai, mas Gina via aquelas letras com dificuldade, pois suas mãos tremiam e seus olhos estavam marejados de lágrimas. Mesmo que por um segundo, sentia vergonha por ter duvidado de seu pai.


Após apanhar a carta de sua mão e colocá-la novamente na caixa, o avô disse, ríspido:


- Seu pai era um homem bom, no entanto não era o homem que eu escolhi para a minha Molly.


- Meu pai era uma pessoa maravilhosa. Um homem muito especial. - Gina corrigiu-o com orgulho.


Sua mãe saberia que o marido tinha escrito tal carta? Mesmo que soubesse, nem ela nem seu pai haviam lhe contado! De repente, apesar dos planos secretos do avô, sentia-se feliz por ter vindo a Zuran!


- Ele entendeu meus sentimentos de pai. - o avô reconheceu.


Gina fechou os olhos para conter a intensidade das emoções que estremeceram seu corpo.


- Você diz isso agora! Você afirma que amava minha mãe, mas nunca a procurou para... - Gina recusou-se a dizer a palavra "perdoar", pois de acordo com seu entendimento, era sua mãe que tinha o direito a tal presente, não seu avô! - Você deveria saber o quanto significava para ela ouvir uma palavra sua!


Era impossível para Gina esconder seus sentimentos, ou sua dor por mais tempo. Sabia que o avô deveria ouvir toda a mágoa guardada em seu peito.


- Quando ela foi embora você disse que nunca mais permitiria que seu nome fosse pronunciado nesta casa. Você disse que ela estava morta para você e para toda a família, você os proibiu de ter qualquer contato com ela. Você a deixou morrer pensando que você não a amava mais! Como pôde fazer isso? - Gina explodiu, soluçando como uma criança.


Enquanto ela procurava controlar-se, percebia a dor invadir os olhos do avô. De repente o corpo daquele homem contraiu-se um pouco e ele parecia mais velho e frágil do que quando entrou na sala.


- Não há nada que eu possa dizer para aliviar a sua dor. Nenhuma palavra irá diminuir seu sofrimento, ou o meu. - ele disse com sobriedade. - Ainda é muito cedo. Talvez com o tempo... Mas na minha idade o tempo não é mais um aliado. Desculpe por minha desatenção com você, Gina, mas agora que meu médico parou com todo o seu alarde inútil, eu darei instruções para que um quarto seja preparado para você. Nós dois temos muito que conversar.


- Como, por exemplo, sobre sua vontade de me ver casada com o homem de sua escolha? - Gina suspeitou, e abruptamente pôs-se na defensiva; ele poderia parecer frágil e arrependido agora, mas ela não iria se esquecer da esperteza e falsidade de que sempre fora capaz.


E uma vez que estivesse morando ali, embaixo de seu teto, ela seria como uma prisioneira. Sem o passaporte não tinha como deixar o país. Isso significava que deveria manter o seu plano de fazer com que Potter se recusasse a aceitá-la como esposa.


Mesmo que isso significasse ver Harry novamente e enfrentar os riscos deste encontro?


Sem meios para encontrar uma resposta verdadeiramente racional para suas dúvidas, Gina quis mostrar ao avô sua firme determinação de permanecer independente.


- Eu fiz uma reserva para uma viagem até o deserto amanhã, por isso...


- O deserto! - Para sua surpresa, os olhos dele se arregalaram de prazer e aprovação. - É uma boa idéia que você se interesse pelo país que faz parte de sua herança cultural. Eu gostaria muito de poder acompanhá-la! Mas você pode me contar tudo o que viu depois! Eu informarei no hotel que Kahrun irá buscá-la quando você voltar.


Ele parecia estar cansado, mas instintivamente Ginra sentia que seu orgulho era grande demais para que ele admitisse qualquer fraqueza. Quaisquer que tenham sido as suas mentiras, Gina percebia agora que ele realmente estivera doente. A pele acinzentada e o rosto pálido denunciavam sua fraqueza. Uma emoção inesperada e indevida tomou conta dela: uma sensação de proximidade e os laços de sangue que os uniam simplesmente a desarmavam e ela sentia que não tinha armas para lutar contra essa emoção. Ele era seu avô, o homem que dera vida à mãe que amara tanto, e a ponte pela qual poderia reviver as suas mais preciosas lembranças.


Sufocando o soluço em sua garganta, Gina levantou-se, e como o avô estendeu-lhe as mãos, Gina respondeu ao carinho.


- Amada criança de minha amada filha. - ele murmurou emotivamente quando a porta se abriu e Kahrun, seu secretário, entrou para levá-la de volta ao hotel.


Apenas após ter chegado ao hotel Gina questionou-se sobre o porquê de não ter desafiado o avô, já que conhecia suas verdadeiras intenções. Será que as emoções que ele demonstrara eram realmente verdadeiras? Ou ele estava apenas tentando manipulá-la? Não seria ela boba o bastante para ser influenciada pelo seu aspecto frágil, por uma carta antiga de seu pai e por algumas palavras carinhosas?


Mas a situação era muito mais complexa! Muito mais! Na presença de seu avô, na casa que fora de sua mãe, Gina era forçada a mergulhar fundo em sentimentos ocultos no fundo de sua alma.


A morte dos pais a obrigara a crescer antes do tempo, a amadurecer quando ainda era jovem, e de certa forma, representar para si mesma o papel de pai e mãe. Seu padrinho, apesar de sua atenção, era um diplomata, um homem dedicado à carreira, e na realidade não tinha a menor idéia das necessidades de uma garota de dezessete anos. Gina sabia muito bem que, se fosse uma pessoa diferente, poderia ter perdido o rumo. O estilo de vida de seu padrinho permitia a ela uma liberdade quase total, fazendo com que a vida lhe cobrasse decisões mais adequadamente tomadas por um adulto. Dessa forma ela precisou "policiar" seu comportamento e se tornar responsável por suas emoções e por sua reputação.


Naquela tarde, na companhia do avô, percebeu como era pesado o fardo que carregava e como sentia falta de alguém para ajudá-la, aconselhá-la, guiá-la e amá-la! Ela precisava da família que lhe fora negada!


Ela reconhecia que havia um grande perigo no ar. Uma vez que necessitava da aceitação de sua "família" a tal ponto, poderia cair na armadilha de trocar sua liberdade e independência por esse reconhecimento!


O peso de seus pensamentos fazia a sua cabeça latejar.


 


 


Agradecimentos especiais:


 


tukinha weasley: também sou um pouco fa dos livros dela, fico feliz em saber que vai acompanhar a fic. Abraços.


 


Bianca: a Gina finalmente conheceu o avô, o que a deixou realmente duvidosa da verdadeiras intenções dele, mas isso somente mais para frente. Beijos.


 


 


 

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