Capitulo 03
Capitulo 03
Gina ouvia a própria voz como se esta não lhe pertencesse, grave e evidentemente assustada, indagando:
- O que você está fazendo aqui?
Podia jurar que seu nervosismo o divertia. Havia um brilho especial nos olhos dele quando respondeu:
- Esperando você, é claro.
- Mas aqui... E desse jeito? - ela perguntou, a voz trêmula. - E se alguém estivesse comigo? Minha tia...
- Assim você teria atingido seu objetivo, não é mesmo? - ele replicou, dando de ombros, despreocupado. - Além do mais, precisamos conversar, e eu precisava de um banho, por isso fez sentido juntar as duas coisas.
Ele parecia tão à vontade em sua suíte que ela se sentia como uma intrusa, e desistiu de perguntar como ele conseguira entrar ali.
- Você poderia ter tomado banho em seu próprio quarto. - esbravejou. - E eu estava planejando ir para a praia mais tarde, como combinamos.
- Depois eu não vou poder. Hoje é meu dia de folga. E a respeito do meu quarto, - prosseguiu cínico - você acha mesmo que o pessoal do hotel tem acomodações tão boas como esta?
- Como conseguiu me achar? Eu não falei meu nome e você não me falou o seu.
- Não foi difícil. Seu avô é muito conhecido por aqui.
- Você o conhece? - Gina espantou-se.
Ele franziu a sobrancelha em sinal de zombaria.
- E por acaso um mero funcionário conhece algum milionário?
- E seu nome é? - pressionou-o.
Seria apenas impressão ou ele hesitou mais que o necessário?
- É Harry. - disse.
- Harry?
- Algo errado? - perguntou.
Gina balançou a cabeça.
- Nada, é que eu imaginava que você fosse italiano, ou... espanhol ou grego. Mas seu nome...
- Minha mãe era da Cornualha. - ele informou quase bruscamente.
- Cornualha? - Gina repetiu estupefata.
- Sim. - ele confirmou levemente entediado. - E de acordo com a minha mãe, seus antepassados eram todos piratas!
Piratas. Sem dúvida seu tom de pele e seu tipo perigoso revelava essa descendência, concluiu Gina, lembrando que os piratas da Cornualha saquearam os navios da coroa espanhola, roubando não só seu ouro como as damas da mais alta nobreza espanhola que viajavam com seus maridos.
Harry. Combinava com ele. Harry.
- Bem, agora que já nos conhecemos, talvez possamos falar de coisas práticas. Esse seu plano...
- Eu não quero falar sobre isso agora. - interrompeu-o. - Por favor, vista-se e saia.
Sentia um mal-estar progressivo, uma agitação diretamente relacionada à semi-nudez dele.
- O que está errado? - ele indagou ríspido. - Mudou de idéia? Por acaso sua família a convenceu a conhecer este homem, afinal? Enfim, existem coisas bem piores do que casar com um homem rico...
- Não que eu saiba. - Gina retrucou. - Eu não consigo imaginar nada pior do que... um casamento sem amor. - defendeu com paixão.
- Você já se apaixonou alguma vez? – Harry quis saber, respondendo ele mesmo a pergunta: - Não, é claro que não. Porque...
Havia um brilho em seus olhos que fazia o coração de Gina bater mais forte. Ela ainda estava chocada por tê-lo encontrado ali, e seus sentidos reagiam com intensidade à figura recostada na parede de modo másculo e arrogante, os braços cruzados sobre o peito, os músculos retesados atraindo o olhar fascinado de Gina.
- Meu passado amoroso não tem nada a ver com nosso... nosso acordo comercial. - Gina disse com veemência.
- Quando você vai conhecer Potter?
- Eu... eu não sei! - tornou ela, o cenho franzido. - Até agora eles acham que eu não sei dos planos de meu avô. Minha tia deu apenas pequenas dicas sobre quem é Potter, fingindo que ele é apenas um bom amigo da família que se ofereceu para... mostrar-me o hotel, mas...
Quando Harry arregalou os olhos, Gina defendeu-se:
- Parece que ele projetou todo o hotel. De acordo com minha tia, ele é um arquiteto experiente.
Intranqüila, Gina se perguntava se Harry percebia o tom ofegante de sua voz. Em caso positivo, esperava que o motivo fossem as qualidades de seu pretendente e não os músculos dele!
- E quando ele vai lhe mostrar o hotel?
Gina deu de ombros.
- Eu não sei. Segundo a minha tia, o sheik Potter está em viagem de negócios.
- E você, sem dúvida, está esperando perder sua reputação antes que ele volte? Bem, se é assim, nós não temos tempo a perder. - Harry concluiu sem esperar resposta. - Hoje à noite todos da alta sociedade de Zuran vão sair de suas casas para ver e ser vistos, e o lugar da moda hoje em dia é o restaurante The Venue. O chef é excelente, e além do mais tem pista de dança. Acho que devemos fazer nossa primeira aparição lá. Os trajes são formais, e existe um controle sobre o que se veste, mas como você é mulher e hóspede do hotel não vai haver problema!
- Parece caro. - Gina hesitou.
- E é. Mas com certeza isso não é um problema, não é mesmo? Você me disse que sua família está pagando suas despesas, e como convidada deles pode debitar a conta junto com a do seu quarto.
- Não! Eu não poderia fazer isso. - Gina negou a idéia imediatamente, incapaz de distinguir se estava chocada ou repugnada.
Longe de parecer comovido, Harry parecia divertir-se.
- E por que não? Você precisa comer, não é mesmo?
- Sim, eu preciso comer. - Gina concordou. - Mas não posso esperar que minha família pague...
Quando fez uma pausa e procurou as palavras certas para, expressar seus sentimentos, Harry disse abruptamente:
- Ou você não está levando a sério essa idéia, ou é apenas um impulso infantil do qual você está se arrependendo. Em ambos os casos, você está perdendo o seu tempo e o meu.
- Eu estou levando a sério. - Gina interrompeu-o prontamente.
- Muito bem, então. Nós jantamos lá, hoje. Eu a encontro no hall às nove e meia... a não ser que você queira que eu suba até seu quarto um pouco antes para que nós...
- Não. - Gina recusou com firmeza, o rosto em chamas quando percebeu o sorriso dele.
- Você parece uma virgem assustada. Você é uma, por acaso?
Gina corou ainda mais e esbravejou:
- Você não tem o direito de me fazer tal pergunta!
- Quem diria? - Harry riu, sacudindo a cabeça. - Agora você me surpreendeu! Uma virgem histérica que quer parecer completamente disponível. Você não quer mesmo este casamento!
- Eu só disse que não estou preparada para discutir minha... Minha vida pessoal com você...
- Mesmo assim você espera que eu convença a todos que faço parte de sua vida particular? - disse calmamente.
O olhar de Harry fez Gina estremecer, indignada. Como ele ousava zombar dela? Ele encontrara uma forma de inverter a situação e agora assumia o controle. Um calafrio percorreu sua pele avisando-a do perigo de se envolver em uma situação que fugia de seu domínio. Entretanto, antes que pudesse analisar seus sentimentos a campainha da suíte tocou, deixando-a em pânico.
- Está tudo bem. - Harry a tranqüilizou. - É o serviço de quarto. Eu pedi alguma coisa para comer.
- Você pediu... - Gina encarou-o, e em seguida olhou furiosa para a porta do quarto quando a campainha tocou novamente. - Você não... - interrompeu-se ao notar que Harry ria mansamente.
- Sabe de uma coisa, - ele disse - acho que vai ser engraçado. Você sabe o quanto é tentador chocar você, minha princesa?
Ainda rindo, inclinou-se para frente, envolveu o rosto dela com a mão, colou por um instante sua boca na dela e desapareceu no banheiro. A porta do quarto se abriu e a refeição pedida foi posta sobre a mesa.
- O medo passou?
Automaticamente Gina olhou na direção de Harry quando ele saiu do banheiro, com o corpo ainda enrolado na diminuta toalha e esfregando o rosto recém-barbeado. Ela desviou o olhar, pois parecia que seu coração dera três voltas antes de voltar com força à posição normal.
O que estava acontecendo com ela, afinal? Ele estava só se barbeando. E daí?
E daí? Bradou dentro dela uma voz de indignação feminina, ele fazia algo muito íntimo... barbeava-se em sua suíte... em seu banheiro...
- Hum... Eu vou acabar me acostumando. - disse com gosto enquanto examinava o carrinho recém-chegado. - Quer me servir um café, por favor? - pediu enquanto voltava para o banheiro. - Preto e forte, sem açúcar.
Servir um café! Quem ele pensa que é?
- Ah, a propósito. - ele começou, aparecendo na porta do banheiro. - Eu reservei uma mesa no The Venue para hoje à noite e você pode colocar a despesa na conta de seu quarto. Nós tivemos sorte. Eles estavam quase lotados. Por que nós não resolvemos logo essa situação? Eu poderia me mudar para cá...
- Não!
A recusa de Gina manifestou-se por meio de um som repleto de indignação e pânico que, em vez de embaraçá-lo, só aumentou-lhe o prazer.
- Sabe de uma coisa, eu adoraria tornar essa história real, se você quiser. - ele brincou, apoiado ao vão da porta.
- Não. - ela repetiu, mais veemente dessa vez, os olhos arregalados quando completou com a voz rouca: - Nunca.
- Ah, sim! Eu tinha esquecido que você está se guardando para o homem de seus sonhos! Bem, tome cuidado para que ele não acabe se transformando em um pesadelo... Esse é meu café? - emendou calmamente enquanto ela enchia uma xícara, insegura.
Furiosa com sua atitude automática diante do pedido dele, puxou a xícara para si.
- Não, não é. Este é meu. Sirva-se você mesmo.
Sem se perturbar, ele deu de ombros e apanhou a jarra de café enquanto Gina digeria sua pequena vitória com a bebida que ele pedira.
Com ar meditativo, observou Harry avançar na refeição com extremo apetite. Não era isso que ela planejara quando o procurou.
Pensara apenas em um flerte evidente na praia, talvez alguns pequenos encontros públicos e, quem sabe, um almoço.
- Sente-se comigo e coma um pouco. Há o suficiente para nós dois.
- Eu vi. - Gina concordou visivelmente irritada.
Era um absurdo permitir que sua família pagasse por qualquer coisa a mais que Harry colocasse no trato. Por sorte ela viajara com vários traveller's checks e com seu cartão de crédito, uma vez que seu padrinho, sem dúvida movido pela culpa, havia depositado uma quantia bem generosa em sua conta antes da viagem.
- Eu sou um homem em serviço. - Harry disse com entusiasmo.
- Ainda bem que você me lembrou. E, por falar em trabalho, você não deveria...
- Não se preocupe. - assegurou. - Eu tenho várias horas extras, por isso eu tirei uma folga. Assim estou livre para fazer tudo o que você quiser. Se Potter não presenciar a coisa toda, acho que vai ser bem difícil convencê-lo. Então, eu e você precisamos ter certeza de que está dando certo. Você tem certeza de que não quer que eu me mude para cá? - provocou-a olhando descaradamente para o quarto a sua volta.
- Absoluta. - Gina rangeu os dentes. - E eu ficaria muito grata se você se vestisse e fosse embora assim que terminar.
- Embora? Tão cedo? Não podemos passar mais algum tempo juntos, para nos conhecermos melhor?
Para humilhação de Gina, sua expressão de desconsolo a traiu, e ele começou a rir.
- Você vai ter de fazer muito melhor do que isso se espera convencer alguém de que somos namorados. - Harry avisou depois de parar de rir.
- Acho que a sua reputação basta para convencer por nós dois.
- Você parece suada e desconfortável. - ele constatou, ignorando o comentário e a ira de Gina. - Eu lhe recomendo o chuveiro. E se você quiser...
- Não! Não se atreva... - Gina interrompeu com as faces coradas.
- Atrever-me a quê? - tomou Harry, fingindo inocência. - Eu só ia dizer que poderia alterar a altura do chuveiro se você quisesse.
Gina disparou um olhar fulminante.
- Muito obrigada, mas sou perfeitamente capaz de fazer isso sozinha.
Ela se arrependia amargamente de ter deixado escapar a verdade sobre sua virgindade e era óbvio que Harry considerava o fato muito divertido e sem dúvida continuaria a provocá-la. A menos que descobrisse um meio de pôr um fim nisso!
Gina ficou tensa ao ouvir o telefone tocar. Olhou-se rapidamente no espelho, estava praticamente pronta e vestia o terninho creme novo. Afobada, atendeu o telefone. Era a sua tia.
- Eu queria ter ligado antes. - desculpou-se. - Tudo bem com você? Eu me sinto tão culpada por deixá-la sozinha.
Após garantir que estava bem, Gina aguardou sua tia marcar uma data para finalmente visitar a família e o avô. Em vez do esperado convite, um silêncio embaraçoso por parte da tia foi seguido por uma explicação não convincente e apressada. Devido a assuntos de família, não poderiam lhe fazer companhia no dia seguinte.
- Ao menos seu avô está se sentindo melhor, mas mesmo assim o médico diz que ele precisa descansar. Ele está ansioso para vê-la, Gina, e...
A voz da tia soava cada vez menos convincente, Gina refletiu amargamente. Ela mentiu dizendo que também estava ansiosa para vê-lo.
Não tinha idéia de como ele pretendia conseguir alguma coisa agindo assim. A menos que imaginasse que, deixando-a isolada e solitária, cairia nos braços de seu pretendente em sinal de gratidão.
- É uma pena que minhas irmãs e seus filhos estejam fora do país, no momento. - prosseguiu a tia. - Mas tão logo Potter volte...
- Você não precisa se preocupar comigo, tia. - Gina a tranqüilizou. - Sou perfeitamente capaz de cuidar de mim. Por falar nisso... - fez uma pausa, pensando no que iria dizer, mas era evidente que a tia não a escutava, pois a interrompeu dizendo:
- Existem diversas excursões que saem do hotel e que você pode aproveitar bastante enquanto espera Potter voltar. A vila de ouro, por exemplo. Oh, preciso ir. Seu avô está me chamando.
Mal houve tempo para Gina despedir-se antes que a tia desligasse.
Virou-se para o espelho para passar o batom e percebeu quanto suas mãos tremiam.
Era porque estava com raiva, tentou convencer-se, e não devido à ansiedade que a idéia de passar a noite com Harry provocava. Sentia raiva da tia, pois sabia que ela não estava sendo sincera.
Mentalmente tentava imaginar a figura do avô. As descrições feitas pela mãe ainda estavam claras em sua memória. Além disso, observara alguns homens extremamente arrogantes vestidos com o manto típico circularem pelo hotel. Ele deveria ter barba, é claro, o nariz aquilino e a expressão severa, quem sabe até rancorosa, quando se encontrasse com ela, o resultado de um casamento contra o qual lutara com tanto empenho.
Era impossível para Gina imaginar o que teria passado pela cabeça de um pai, antes protetor e carinhoso, e que depois se recusava a mencionar o nome da filha simplesmente porque ela se casara com o homem que amava.
Observava sua imagem refletida no espelho. Em sua casa na Inglaterra freqüentemente sentia-se diferente, pois o corpo delicado e moreno dava-lhe um ar exótico. Em contrapartida, ali, na terra de sua mãe, sentia-se como uma escocesa.
Sua mãe! O que ela pensaria sobre o rumo dos acontecimentos? O que acharia de Harry?
Apanhando a bolsa, Gina recusou-se a permitir que esses pensamentos atordoantes a dominassem.
Nunca vira o hall do hotel tão lotado. Um grande grupo de mulheres elegantes acompanhadas de seus parceiros encontrava-se de pé diante da entrada do piano bar, e Gina espantou-se com as jóias que usavam.
Provocou olhares discretos nas mulheres e cheios de admiração nos homens, mas Gina, alheia ao impacto que causava, procurava Harry ansiosamente.
- Aí está você. Estava quase subindo para apanhá-la.
Gina deu meia-volta e examinou Harry de cima a baixo. Ele vestia um elegante terno italiano que certamente custara uma fortuna. Não era de espantar que algumas das mulheres cobertas de diamantes o encarassem com tamanho desejo!
Ele não teria condições de comprar aquele tipo de roupa com o salário que ganhava, Gina concluiu, o que significava...
Não gostava da sensação desagradável que a invadia, ou da idéia indigesta de que ela certamente não fora a primeira mulher a pagar pelos serviços de Harry, apesar de que, evidentemente, os serviços que contratara eram bem diferentes dos pagos por suas benfeitoras.
- Algo errado? Você parece que engoliu algo extremamente horrível.
A intuição dele deixou-a em estado de alerta.
- Eu só estava imaginando qual será o cardápio. - respondeu com calma.
Ele à apanhara desprevenida à tarde, mas agora seria diferente. Dessa vez deixaria perfeitamente claro que ela estava no comando da situação!
- Hoje Zuran é um lugar renomado pela variedade e qualidade de seus restaurantes, como você logo vai perceber.
Enquanto falava, Harry a conduzia pelo vestíbulo com a mão protetoramente encostada ao cotovelo dela. Sentiu uma vontade imensa de afastar aquela mão, de manter-se distante dele, mas o grande número de pessoas que lotavam o saguão impediu a separação, e afinal, Gina reafirmou para si, encontrava-se ali para ser vista com ele!
Entretanto, em vez de conduzi-la à saída como esperava que fizesse, Gina percebeu que ele a levava em direção a uma das grandes portas de vidro que davam para o jardim, o qual se conectava por meio de canais a todo o complexo do hotel.
- Pensei que fôssemos jantar. - ela comentou diminuindo o passo para que dois homens uniformizados abrissem as portas para eles.
- Nós vamos. - Harry informou enigmático. - Qual é o problema? - ele provocou. - Você acha que eu a trouxe até aqui para uma pequena reunião íntima antes de enfrentarmos o público?
Ele esboçou um leve sorriso e segurou o braço de Gina, puxando-a para junto de si enquanto caminhavam envoltos no calor da noite escura.
- No jardim? Onde todos podem nos ver. Ah, não... - ele prosseguiu. - Se essa fosse a minha intenção eu a teria levado para bem, bem mais longe...
- Como o seu quarto, por exemplo? - Gina desafiou-o, determinada a não deixá-lo pensar que suas palavras a afetavam.
- Você me lembra uma gatinha arisca com garras afiadas. Tome cuidado para que eu não me sinta tentado a ensiná-la a ronronar de prazer e usar essas garras só para o bem...
- Nós não estamos em público ainda. - Gina conseguiu responder, agradecendo à penumbra que ocultava seu rosto corado. - Portanto, guarde seu charme para quando estivermos!
Eles cruzaram o jardim e pararam em frente ao canal onde Harry acenou para um gondoleiro que aguardava alguns metros adiante.
- Este não é o caminho mais curto até o restaurante, mas com certeza é o mais... relaxante. - Harry murmurou quando a gôndola se aproximou.
Ele ajudou-a a subir na gôndola e ela inevitavelmente pensou se poderia haver algo mais romântico... ou trivial!
Uma iluminação adequada envolvia o resort numa aura de magia e mistério, transformando-o num local projetado para mexer com os sentidos. Ao passarem pela área de lazer, um malabarista apresentava-se para um pequeno grupo de adolescentes e um artesão guardava seus pertences sobre um camelo, fazendo o coração de Gina acelerar.
Uma coisa que gostaria de fazer durante sua viagem em Zuran era passear pelo deserto. Sua tia até poderia falar com entusiasmo sobre os shoppings e as vilas de ouro e diamante, mas era o deserto que mais atraía Gina, como um chamado hipnotizador dos seus antepassados.
Imersa em pensamentos, Gina teve um sobressalto quando Harry tocou-lhe o braço. A gôndola atracou em um deck ornamentado de onde um tapete vermelho conduzia a um edifício de estilo parisiense que arrancou de Gina um olhar estupefato.
Diversas pessoas estavam agrupadas em frente ao restaurante e quando sentiu Harry colocar as mãos em seus quadris a fim de ajudá-la a sair, sentiu o corpo enrijecer, como que rejeitando tamanha intimidade diante de estranhos.
- Não faça isso! - protestou quando Harry inclinou a cabeça para frente, fazendo sua respiração roçar de leve o rosto dela, e estendeu a mão para ajeitar-lhe os cabelos. - As mulheres que pagam as suas roupas podem até gostar de ser apalpadas em público, mas eu não.
No instante que parou de falar, Gina sentiu que fora longe demais. O repentino enrijecer do corpo dele e a frieza em seu olhar deixaram isso claro.
Seria inútil explicar que o medo diante da reação instintiva de seu corpo motivou aqueles insultos. Além do mais, seu orgulho não permitiria tal explicação. Gina estava tensa e abaixou a cabeça como se procurasse um esconderijo.
- Para seu governo, nenhuma mulher nunca... Nunca... Pagou pelas minhas roupas. E a respeito de seu comentário sobre apalpar... graças a sua inocência você está livre das conseqüências de tais palavras, por enquanto!
Em silêncio, mas com a cabeça erguida, Gina fixou o olhar no tapete vermelho. Por nada neste mundo admitiria, nem para si mesma, o quanto o calor protetor da mão de Harry em seu cotovelo era agradável. Gina observava, com uma inveja secreta, a elegância dos casais bem vestidos que entravam abraçados.
- Mais vinho? - Harry ofereceu quando o garçom solícito se aproximou com a garrafa. Gina recusou com um gesto de cabeça e cobriu seu copo meio cheio com a mão. A refeição estava divina e a cada bocado ela lembrava-se de seu primeiro jantar em Paris, durante a comemoração do aniversário de casamento de seus pais. Tudo na decoração e na ambientação do local, até mesmo o perfume sutil das velas nas mesas, era uma réplica dos mais finos restaurantes de Paris, e Gina sabia que não seria difícil encontrar alguém falando francês ali.
- Café, então? - Harry perguntou ao mesmo tempo que sinalizava a recusa para o garçom.
Concordando com a cabeça, Gina alertou-se mentalmente sobre os perigos de se deixar levar pelo clima de sedução, pois Harry representava com perfeição o papel do namorado carinhoso e solícito. Mas ele, com certeza, já tinha muita experiência nessa área, lembrou contrafeita.
Horrorizada, Gina imaginou o rombo que o custo daquele jantar causaria em seu cartão de crédito, mas de maneira alguma ela permitiria que a conta fosse debitada junto com as diárias.
Enquanto aguardava o café, ela subitamente percebeu que era observada por um grupo de três casais sentados em uma mesa ao lado.
A chegada do garçom prendeu sua atenção por um momento, e quando olhou novamente para eles, Gina pôde jurar que percebeu um aceno negativo de Harry para um dos homens que se levantava, como se ele estivesse vindo até sua mesa.
- Quem é esse... - Gina ia perguntar quando o garçom se afastou.
- A quem você se refere? - Harry quis saber, um tanto intrigado.
- O homem para quem você olhou. Ele estava vindo para cá, mas você...
- Eu não olhei para ninguém. - Harry negou.
- Sim, olhou. - Gina insistiu. - Eu vi você...
- Você está vendo coisas. De quem está falando? Aponte-o para mim.
Irritada, Gina obedeceu, mas quando Harry olhou deliberadamente na direção do homem, este percebeu a situação e desviou o olhar.
Com um olhar irônico, Harry deu de ombros e Gina corou.
Ela estivera evidentemente enganada, mas de maneira alguma admitiria isso a ele!
- Quer dançar um pouco, depois que terminar o café? - ele perguntou. - Afinal, precisamos representar o papel de namorados, apesar de sua aparência virginal...
Gina cerrou a boca e colocou a xícara na mesa desajeitadamente.
- Já basta! - disse com veemência. - Daqui em diante, sempre que você mencionar a palavra virgem eu vou descontar cinco dólares de seu pagamento! Eu lhe pago para me ajudar a escapar de um casamento que eu não quero. Não para... para trazer à tona um assunto que não tem nada a ver com nosso acordo!
- Não? Eu discordo. - Harry afirmou calmamente. - Eu preciso passar a impressão de que estou seduzindo você. Quem vai acreditar nisso se você insiste em olhar para mim com esse ar de...
- Cinco dólares. - Gina alertou-o.
- De uma mulher que não sabe o que é a paixão de um homem. - ele concluiu com suavidade.
Ela terminou o café e Harry acenou para o garçom e pediu a conta.
Nesse instante Gina apanhou a bolsa com a intenção de pegar seu cartão de crédito.
- O que você está fazendo? - Harry indagou secamente.
- Eu não posso deixar minha família pagar por isso. Isso seria... Imoral. - explicou.
- Imoral... Deixar eles pagarem um jantar? Mas não é nada imoral fazer com que eles acreditem que você está dormindo comigo... Um homem que você achou na praia...
- Eu faço o que quiser com o meu corpo. - Gina sussurrou furiosa, enquanto o garçom entregava a conta. Ela segurava o cartão de crédito nas mãos, porém Harry foi mais rápido e apanhou-a:
- Eu cuido disso. - ele avisou com frieza. - Depois você me reembolsa.
Voltando-se para o discreto garçom, murmurou algo que Gina não pôde entender, entregou-lhe a conta, após o que o rapaz se afastou depressa.
Alguns minutos mais tarde, ao se dirigirem para a pista de dança, Gina pressentia que todos no restaurante olhavam em sua direção. Mas isso, é claro, era exagero de sua parte. Sem dúvida eram as mulheres que olhavam para Harry, pensou consigo mesma.
Quando ouviu a música provocante e sensual e reparou no jeito de as pessoas dançarem na pista escura, automaticamente estancou. Aquilo não era dança. Aquilo era... puro sexo, e de maneira alguma permitiria que Harry a segurasse daquela forma.
Não ousaria permitir que ele a abraçasse assim.
Por que não? Apesar de achá-lo extremamente sensual, reconheceu irritada, e embora se mostrasse encantador e romântico, ele não sentia nada por ela. Estavam ali a negócios, e tão logo isso tudo terminasse ela estaria livre para voltar para casa.
Segundos mais tarde, envolta em seus braços, com o rosto colado ao ombro dele e sentindo o calor daquela mão em sua cintura, Gina percebeu que confiara demais em sua capacidade de controlar seu corpo.
Ele era um sedutor nato, dizia para si, indefesa. Um homem que aperfeiçoara sua técnica com inúmeras mulheres diferentes...
- Relaxe... Lembre-se que somos namorados agora...
- Eu estou relaxada. - Gina afirmou tensa.
- Não, você não está! - corrigiu-a. - Você está com medo de que eu faça algo assim com você...
Assim que terminou de falar, Harry deslizou a mão pela nuca de Gina e gentilmente roçou-lhe o pescoço com os lábios e subiu lentamente até o lóbulo da orelha. A respiração de Harry fazia o corpo de Gina estremecer de prazer.
- Você tem idéia do quanto eu desejo você?
Aquelas palavras roucas embaralhavam os sentidos de Gina, então ela se lembrou que ele estava apenas representando...
Fazendo justamente aquilo que ela pedira.
- Posso levá-la até seu quarto e mostrar o quanto a desejo? Tirar suas roupas lentamente, despir esse seu corpo sexy e beijá-la inteira antes de...
Gina sufocou um grito quando ele apanhou sua mão e disse sem rodeios:
- Sinta o que você está fazendo comigo...
Ela tentou se soltar, mas era tarde demais. Harry já colocara a mão dela de encontro a seu corpo e Gina pôde sentir o coração dele pulsar fortemente.
- Fique mais perto de mim. - pediu, abraçando-a com mais intensidade. - Mais perto! Tão perto que eu possa imaginar você nua em meus braços, sua pele de seda em contato com a minha...
Gina sabia que o calor que a invadia não era conseqüência do ar abafado do recinto, no entanto recusava-se a admitir o verdadeiro motivo das sensações inflamadas que a invadiam, tão fortes que ela temia não conseguir resistir.
- Eu quero ir embora. - ela pediu rouca, afastando-se dele com esforço.
- Já? Mas ainda é meia-noite!
Gina sentia um medo crescente. Se ele continuasse ali abraçando-a daquela maneira por mais tempo... Estava muito claro em sua mente que ele apenas representava, mas seu corpo parecia não conseguir distinguir ficção de realidade... Ela correspondia às suas caricias como se... Como se... realmente o desejasse!
- Hoje foi um dia longo, e minha tia provavelmente vai me ligar amanhã cedo para informar o estado de saúde de meu avô!
- Pensei que você não estivesse interessada na saúde dele.
- E não estou. - Gina negou de pronto. - É que...
Harry afastou-se um pouco e encarou-a com severidade. Instintivamente Gina quis esconder-se, fugir de seus sentimentos, fugir dele, e proteger-se de uma sensação que crescia rapidamente dentro dela e que poderia marcar sua vida para sempre! Por que ele a deixava tão abalada? Afinal, ele não era o primeiro homem com quem dançava tão intimamente, muito menos o primeiro a quem desejara! Ela nunca tivera um relacionamento íntimo, mas sabia muito bem o que era desejar alguém. Ela vivera todos os acontecimentos normais na vida de uma adolescente, envolvera-se com alguns rapazes e até se apaixonara algumas vezes, mas aquela era a primeira vez que tais sensações tomavam proporções que receava não poder controlar!
- O quê? - Harry insistiu, invadindo seus pensamentos.
- Eu não quero falar sobre isso. - Gina respondeu balançando a cabeça obstinadamente.
- Muito bem, então. Se você tem certeza de que quer ir embora, e que isso não é uma desculpa para escapar dos meus braços porque você tem medo de gostar...
Gina encarou-o, invadida por um misto de raiva e descontentamento diante de seu comentário. Ele certamente apenas a provocava e testava, disse para si mesma. E ele não poderia saber como ela se sentia... Ou poderia?
- Ah, eu não faria isso. - ela reagiu com firmeza, sorrindo confiante. - Além do mais, nunca gostei muito de espaços apertados!
Esperava que suas palavras bastassem para calá-lo, mas em vez disso ele continuou:
- O que você quer dizer?
- Quero dizer que o espaço entre seus braços está ocupado pelas inúmeras mulheres que já estiveram aí. - disse com sinceridade.
- Eu tenho trinta e quatro anos. Naturalmente existiram... relacionamentos... - Harry retrucou, dando de ombros, despreocupado.
Gina quase disse a ele que não se referia a relacionamentos, mas sim às muitas outras mulheres que suspeitava terem entrado e saído constantemente de sua vida. Em vez disso, porém, simplesmente balançou a cabeça e afastou-se.
Ele a seguiu até a porta, aberta por um funcionário uniformizado com tantas mesuras como se eles pertencessem à realeza, Gina pensou ao pisar no tapete vermelho que conduzia ao estacionamento e aos canais.
- Eu prefiro voltar de carro. - Gina afirmou impaciente.
Não queria, vulnerável como estava, dividir com ele a intimidade de um passeio de gôndola à luz da lua!
Ao contrário do que ela imaginou, Harry nada comentou e simplesmente acenou para um dos carros do hotel.
A volta silenciosa para o hotel foi, de alguma forma, mais desconcertante do que os momentos compartilhados na pista de dança. Não conseguia entender como um homem na posição de Harry, que se comportava de tal maneira e que afinal estava sendo pago por ela, podia ser tão arrogante!
- Quanto mais óbvio for nosso comportamento em público, melhor. - ele comentou já dentro do hotel, após chamar o elevador. - Por isso eu sugiro que amanhã nós nos concentremos nesse objetivo. Existem diversas excursões que podemos fazer juntos.
- Excursões? - Gina interrompeu-o, intrigada. - Mas não é suficiente nos exibirmos apenas para os turistas. É necessário que sejamos vistos por gente que conhece Potter.
- Zuran é uma cidade pequena. Tenho certeza de que... nossa amizade... vai chegar logo aos seus ouvidos. - Harry afirmou assim que o elevador chegou.
Ele entrou junto com ela e apertou o botão referente a seu andar.
- Você não precisa subir comigo. - Gina protestou, mas as portas já haviam se fechado e o elevador estava em movimento.
- Do que você tem medo? - ele zombou. - De que eu a beije, ou de que não a beije?
- Nenhum dos dois! - Gina negou com veemência.
- Mentirosa! - ele provocou. - Afinal, você é uma mulher, e é evidente que você quer...
- O que eu quero - Gina interrompeu-o com raiva, já em frente a sua suíte - é que você se lembre que está sendo pago para agir como meu namorado em público, e isso é tudo!
Enquanto falava, ela procurava a chave na bolsa, e, por sorte, achou-a rapidamente.
A mão de Harry estava na maçaneta e ela suspirou profundamente quando ele abriu a porta para ela. O que ela faria se ele insistisse em entrar no quarto? E se ele insistisse em fazer bem mais do que isso? Seu coração começou a bater muito rápido, e Gina pôs a mão no peito como que para conter a pulsação descontrolada.
Mantendo a porta aberta, Harry acendeu as luzes da suíte.
Gina tinha a boca seca, seu corpo estava mole, e o sangue corria quente em suas veias. Fechou os olhos e abriu-os novamente quando escutou a porta se fechar.
Deu meia-volta com intenção de pedir a Harry que saísse, mas deparou-se com o quarto vazio.
Harry se fora. Ele não entrara em seu quarto! Ele simplesmente fechara a porta e partira. Era exatamente isso que ela queria... não é mesmo?
Agradecimentos especiais:
Nanny Black: você pediu e veio mais um capitulo, espero que tenha gostado. Beijos.
nath krein: fico feliz em saber que vai acompanhar mesmo tendo preferência sobre os marotos. Espero realmente que goste da fic. Beijos.
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