Capitulo 2



- Claro que não estou interessado nela, que­rida. Como pode pensar isso?


 


Gina ficara paralisada. Reconhecera a voz de Jonathan no mesmo instante, e o ciúme de ouví-lo  falar com outra mulher naquele tom suave e carinhoso, que achava que usava apenas com ela, e o choque de ouví-lo chamar a outra de "querida" a manteve rígida onde estava, o bloco de papel de carta que a chefe das datilógrafas lhe pedira para buscar aper­tado com força contra o peito.


 


Jonathan estava parado no corredor, diante da porta do depósito. Ob­viamente não tinha a menor idéia de que ela se encontrava ali, mas Susan Hodges sabia... Devia saber, pois estava perto quando a sra. Ellis mandara Gina buscar o papel de carta.


 


—  Bem, você tem saído com ela — ouviu Susan comentar.


 


—  Apenas porque você não estava disponível, minha cara. Oh, vamos falar honestamente agora. Imaginou mesmo que eu estivesse interessado em alguém tão assexuada e maçante como aquela garota pudica è insípi­da? Céus, ela nem sabe beijar direito... Não como você!


 


Gina ouviu risos, seguidos do inconfundível som de duas pessoas se beijando. Sentiu-se mal e zangada ao mesmo tempo, tão desesperadamente infeliz que teve de cerrar os punhos e ranger os dentes para não chorar, e tão furiosa com Jonathan e consigo mesma que se tivesse de se confrontar com ele naquele momento provavelmente o esbofe­tearia.


 


Como fora estúpida ao acreditar que Jonathan gostava mesmo dela, que a respeitava, a amava, quando na verdade ele e Susan Hodges... Su san Hodges, a escandalosa do escritório, a bonita loira que sempre usava roupas agarradas, que sempre parecia rir um pouco alto demais e por tempo demais.


 


Se alguém lhe tivesse dito que Jonathan estava envolvido com Susan ela jamais teria acreditado; diria que Susan simplesmente não fazia o ti­po dele. Como fora ingênua!


 


—  Então você não vai levar a "Srta. Recato" à festa desta noite, vai? — Susan indagou a Jonathan.


 


—  De jeito nenhum — ele respondeu com uma risada. — Aposto que você tem algo espetacular para vestir, não tem, Susie? Algo deslumbran­te e sexy?


 


—  Você terá de esperar para ver, não é? — Susie comentou num tom provocante, acrescentando: — É claro, você pode ir à minha casa e ver em particular...


 


Os dois riam quando seguiram pelo corredor. Dentro da despensa, Gina permaneceu paralisada de infelicidade.


 


Era verdade que Jonathan não a convidara especificamente para ir com ele à festa de aniversário de seu pai naquela noite, mas ela presumira... acreditara... Gina até mesmo comprara um vestido novo para a ocasião...


 


O vestido em questão era bonito e recatado, de veludo azul-escuro com um decote redondo e mangas longas, e de repente, com amargura, perce­beu que com ele pareceria tão assexuada e maçante quanto Jonathan dis­sera que era. Lágrimas enbaçaram sua visão. Sentia-se enjoada pelo cho­que e furiosa, possuída por uma necessidade de mostrar a Jonathan, a todo mundo, que não era a pessoa maçante e insípida que acreditavam, que podia ser tão excitante e desejável quanto as Susans do mundo.


 


Mais tarde imaginou se não teria sofrido algum tipo de instabilidade mental para reagir daquela maneira; com certeza jamais fizera algo pa­recido, nem o faria depois.


 


Tudo em que podia pensar era que a dor de saber o que Jonathan pen­sava a seu respeito, o trauma de cair de sua nuvem de ilusão a perturbara mentalmente de alguma forma.


 


Dentro da pequena firma, a comemoração do quinqüagésimo aniver­sário do sócio majoritário era um grande evento, para o qual haviam alu­gado um salão num grande hotel do centro de Londres. Haveria um jan­tar seguido de danças e, embora tivesse tentado não demonstrar, Gina ficara nervosa e excitada a respeito da festa desde que Jonathan começa­ra a sair com ela.


 


Os pais dele estariam presentes, claro, e suas irmãs, e naquele mundo de sonhos de alguma forma ela se imaginara sendo apresentada à famí­lia, sentando-se com eles, sendo aceita por eles como a namorada de Jonathan. Agora percebia como aqueles devaneios haviam sido idiotas e já não sabia mais se odiava Jonathan ou se o amava. Tudo que sabia era que estava determinada a lhe mostrar o quanto seus comentários cruéis haviam sido errados, como podia ser desejável... Muitíssimo mais dese­jável que garotas como Susan Hodges.


 


Todos os funcionários teriam a tarde livre para se preparar para a fes­ta. Durante a manhã os pensamentos de Gina permaneceram bem lon­ge do trabalho. Estava mentalmente ocupada fazendo planos, tomando decisões e, assim que pôde, apanhou seu casaco e saiu apressada para a rua.


 


O escritório ficava no centro da cidade, a pouca distância da área co­mercial.


 


Gina sentia um calor, uma ardência no peito, uma determinação fe­roz que a motivava e conduzia... Sem se dar tempo para hesitar, ela en­trou no moderníssimo salão de beleza recém-inaugurado perto do escri­tório. Não era nem um pouco parecido com os salões de cabeleireiros de sua cidade natal: nada de cor-de-rosa ou babados, a decoração se ba­seava em cinza e preto, as paredes enfeitadas com grandes fotografias de penteados. A recepcionista tinha cabelo curtíssimo, tingido de rosa, e um olhar arrogante.


 


Antes que pudesse mudar de idéia, Gina lhe disse o que queria. Dez minutos depois estava frente a frente com o cabeleireiro, que lhe indagou com um ar pensativo:


 


—  Tem mesmo certeza sobre isso?


 


Gina se irritou, percebendo por instinto o que ele dizia na verdade: que não conseguia ver alguém tão insípida com um penteado tão moder­no e inovador...


 


—  Se não é capaz de fazê-lo... O homem franziu a testa.


 


—  Oh, posso fazer, só que é uma mudança muito radical. — Ele a fitou com um olhar estranho, e continuou num tom baixo: — Olhe, não é de minha conta, mas seu cabelo é muito bonito. Um pouco antiquado talvez, cabelo liso não está muito na moda no momento... mas fazer uma permanente...


 


Gina rangeu os dentes. Sabia exatamente o que queria e estava determinada a conseguir. Lembrou-se de ter visto uma fotografia na janela do salão a caminho do trabalho alguns dias antes. Nela a modelo, uma bonita morena, ostentava uma massa de cachos remexidos e desordenados que transmitia, mesmo aos olhos inocentes de Gina, uma sensualidade capaz de atordoar. Nenhuma garota ou mulher com aquele penteado po­deria ser descrita como maçante, insípida... e certamente não como as­sexuada.


 


—  Quero a permanente — ela anunciou, quase desesperada.


 


Três horas depois, fitando seu reflexo transformado no espelho, sentiu-se abater. Mal se reconhecia, e quanto ao que seus pais diriam... Seu rosto era mesmo tão pequeno que parecia enterrado na massa de cabelo, o vo­lume virtualmente triplicado pela intensidade da permanente?


 


O cabeleireiro a fitava com um ar grave, porém ela se recusou a deixá-lo ver como se sentia chocada e desanimada. Estudou o reflexo com se­riedade, ignorando a palidez do rosto e o tamanho dos olhos arregalados.



Continua....




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