Capitulo 4
Despindo-se, Gina voltou ao banheiro. Meia hora depois, com os cabelos penteados e a maquiagem retocada, saiu para a galeria. Seus passos ecoaram ruidosamente pela escadaria. Ao chegar ao hall, uma porta abriu-se sob a escada e um homem surgiu. Ela adivinhou de imediato quem era, pois ele tinha o rosto marcado por cicatrizes e os cabelos grisalhos. Havia mais curiosidade que embaraço no olhar que ele lhe lançou e, tentando se portar com naturalidade, Gina disse:
- Você deve ser Pierre. Eu sou Gina Weasley e... – Parou de falar ao se lembrar de que Pierre era surdo e mudo. Fitou-o sentindo-se mais desajeitada do que nunca, e foi com alivio que viu o conde descer as escadas.
Ao contrario dela, ele se trocara, e agora estava com uma camisa de seda e calças escuras que a tomaram súbita e profundamente consciente dele, não como amigo de seu pai, mas como homem. Com o coração disparado e o corpo rígido como o mármore que a cercava, Gina não conseguia tirar os olhos daquela figura viril à sua frente. Mal percebeu os sinais que ele fez a Pierre e a compreensão que brilhou nos olhos escuros do criado, ante de se virar para a porta.
- O jantar está quase pronto. Não precisa me olhar desse modo – o conde comentou, interpretando errado a expressão chocada do rosto feminino. - Pierre é um excelente cozinheiro.
A sala de jantar resplandecia com o brilho da madeira polida, prata e cristal, e Gina comparou mentalmente essa magnificência com o refeitório do convento. Dois pratos foram servidos e comidos em silêncio. Gina limitou-se a bebericar o vinho que lhe fora servido. Recusou o doce de sobremesa, observando o conde servir-se de um queijo local, chamado Chaource. Ele lhe ofereceu um pouco, mas de novo ela meneou a cabeça em negativa. Estava cansada da longa viagem e com a mente embotada por tanto quadro na parede chamou sua atenção e pôs-se a estudá-lo. Era relativamente moderno e retratava uma mulher morena, de ar orgulhoso e um pouco arrogante, mas que parecia esconder uma certa rebeldia por baixo da mascara de elegância convencional.
- É... é sua mãe? – perguntou, hesitante.
O conde virou a cabeça e estudou o retrato por um momento, antes de responder em voz áspera:
- Não. É a minha irmã, Tanya. Já morreu. Ela se suicidou.
Gina olhou de novo para o retrato, achando que tinha ouvido mal. O que poderia levar uma mulher tão linda e orgulhosa a tirar a própria vida? Só percebeu que tinha feito a pergunta em voz alta quando o conde respondeu, num tom amargo:
- Um homem, é claro, ma petite. Um homem e a vergonha de ser descartada.
Gina estremeceu, incapaz de tirar os olhos do quadro.
- Aconteceu há seis meses – o conde continuou – Eu estava em Paris e Tanya no Caribe, com o amante. Acho que ela tinha esperanças de que ele acabasse se cansando com ela, mas eu sabia que isso jamais aconteceria. Já a tinha avisado, mas ela não quis me ouvir. No fim, Tanya preferiu tirar a própria vida a enfrentar o fato de ter sido abandonada por ele.
- Ele... Ele se apaixonou por outra pessoa?-Quantas impressões novas.
-Não. Tanya não passava de diversão que não cabia mais na vida dele. Até o último momento a coitada continuou a se iludir com a idéia de que ele a amava. Mas a morte será vingada. Ele não ficará impune, depois de envergonhar nossa família.
A ultima frase foi dita num tom de voz tão baixo que Gina mal conseguiu ouvi-la.
- Tanya... – ela murmurou, num tom inquisitivo. – É um nome russo?
- Sim. Minha mãe insistiu nisso. Ela não pôde passar aos filhos a herança a que tinha direito... Ela era uma princesa, a princesa Tatiana Potter... Mas nos deu nomes de sua família. Eu sou Harry, como o pai dela.
E era o sangue russo que exigia que ele vingasse a irmã, Gina percebeu intuitivamente, sentindo a selvageria e o orgulho que existiam por baixo daquele verniz de sofisticação francesa.
- Quem era o amante de Tanya? – perguntou. Sem saber o por quê.
- Acho que você é capaz de adivinhar – o conde responde devagarzinho, olhando-a nos olhos enquanto se levantava e se aproximava. -0 Seu pai era o amante de Tanya, Gina – disse, baixinho. Tão baixinho que, por um momento, ela não percebeu o perigo envolvendo-a.
- Meu pai? Mas... o senhor e ele são amigos! Por que foi me buscar então, se...
- Como você é ingênua, Gina! Seu pai não sabe nada a meu respeito, além do fato de que sou irmão de Tanya. No entanto, eu sei muito a respeito dele. Eu quis saber. Descobri, por exemplo, que ele tinha uma filha. Uma criança inocente, mantida longe do mundo e criada de forma a permanecer pura de corpo e espírito. Uma criança que ele pretendia usar para alcançar o poder que sempre quis. Você, Gina.
À meia-luz, os olhos do conde brilhavam perigosamente, duros e frios como esmeraldas.
Gina sentiu-se sufocar pelo medo, enquanto tentava entender o que ele dizia.
- Quando minha irmã se matou, eu jurei que a vingaria. Meu sangue russo exige que eu me vingue, apesar do lado francês zombar da minha paixão. E desta vez o lado russo venceu, embora eu tenha que admitir que o espírito francês me ajudou a planejar o que faria, com todo o cuidado. Minha primeira reação foi tirar a vida de seu pai, como ele havia tirado a de Tanya.
Gina estremeceu. Bem podia imaginar aquele homem matando seu pai, fechando os dedos em torno do pescoço dele e exigindo que sofresse tanto quanto Tanya sofrera.
- No entanto, pensando melhor, decidi que isso não era o bastante. Além disso, não tenho vontade de passar o resto da minha vida na prisão. Não, tinha que haver um jeito melhor. Seu pai tinha que ter um ponto fraco. Então, num jantar em Paris, completamente por acaso, descobri. Vai ficar surpresa de saber, ma petite, mas você foi o assunto da conversa à mesa, aquela noite.
Gina olhava-o atônita, tentando imaginar o que viria em seguida.
-Minha companheira – o conde continuou -, cujo nome agora não importa, me falou do casamento que seu pai planejava para você, com o herdeiro dos Malfoy. Parece que ele fez a tolice de tomar dinheiro emprestado, com base nas esperanças que tinha de se tornar avô do herdeiro. Os Malfoy são uma família antiga e poderosa, cujas noivas são sempre escolhida a dedo. Normalmente, elas são ricas também, mas o numero de mulheres ricas e virgens de corpo e caráter está diminuindo rapidamente. No entanto, seu pai tomou o cuidado de garantir que você preenchesse os dois últimos requisitos – Fez uma pausa, observando-a maliciosamente.
Gina nada dizia, assustada, e ele continuou:
- Vocês podem não ter fortuna, mas seu nome também é antigo, e Narcisa Black, a mãe de Draco, prefere que o filho tenha uma noiva facilmente moldável e capaz de ser ensinada. Uma noiva jovem e principalmente sadia, que dará herdeiros ao filho dela; uma moça de virtudes inatacáveis. E quem melhor que a filha de seu sócio de negócios, uma garota que pode trazer como dote toas essas coisas? Em troca da sua inocência, seu pai recebera uma participação maior nos negócios dos Malfoy, participação que naturalmente será passada a você e depois aos seus filhos, quando ele morrer. Mas, como eu disse, ele já fez uso do que ainda vai receber, investindo num complexo de férias no Caribe, que não está rendendo o que deveria. Antes do fim do verão, sir Arthur pretende lançar mão do ultimo investimento que lhe resta: você. Ou pretendia, pelo menos – O conde se afastou, indo para diante da lareira, de costas para Gina.
Seria verdade? Seu pai tivera mesmo intenção de lhe arranjar tal casamento? Naturalmente, não deveria estar chocada. Afinal, era para serem preparadas para casamentos desse tipo que muitas meninas iam para o convento. No entanto, nunca imaginara que isso pudesse acontecer com ela. E o conde, sugerindo que seu pai era o responsável pela morte da irmã dele... Que idéia absurda!
Lutando com seus sentimentos, tudo que Gina conseguiu dizer foi um rouco:
- Não acredito no senhor. Meu pai nunca...
- Faria amor com minha irmã? Nunca descartaria como um brinquedo não mais desejado? Não a destruiria e humilharia publicamente, forçando-a tirar a própria vida? Pois eu lhe garanto que foi o que fez. Os jornais publicaram a noticia com espalhafato. Não guardo os recortes, mas posso consegui-lo para você, se quiser.
- Não! - Gina rejeitou a idéia de imediato, cheia de náuseas.
Seria possível que seu pai tivesse mesmo se portado de forma tão insensível? Mas não fora assim que ele a tratara, inúmeras vezes? Não a deixara no convento, passando a ignorá-la quase por completo? E também não lhe contara nada a respeito dos planos que tinha para ela.
Gina sentiu um calafrio, imaginando se não seria por isso que ele nunca permitira que saísse de férias com as amigas. Na certa não queria que se envolvesse com alguém de sua idade, um rapaz a quem poderia dar seu corpo e assim se desvalorizar aos olhos dos Malfoy. Parecia incrível, mas mesmo assim ela sentiu que o conde dissera a verdade.
-Não entendo, - murmurou afinal. – Se o senhor é inimigo do meu pai, por que...
- A tirei do convento? – O conde virou-se, examinando a expressão amedrontada e ao mesmo tempo resoluta com que ela o fitava, enquanto tentava entender o que acontecia. – Quero que saiba que não lhe desejo nenhum mal, mas é só através de você que posso atingir seu pai como ele atingiu Tanya. Não, não pretendo matá-lo – assegurou, vendo-a empalidecer. – E ele também não porá fim à própria vida, como fez minha irmã; não é desse tipo de homem. Mas, se o seu casamento não for em frente, ele estará financeiramente arruinado. Deixará de ser o querido da Cote d’Azur, o acompanhante de modelos e atrizes, com entrada garantida em todos os cassinos. E isso o destruirá tão bem quanto ele destruiu Tanya. Ver esse mundo voltar as costas ao seu pai, como com certeza acontecerá, será uma vingança mais que suficiente.
- Mas como pretende conseguir isso? Não pode me manter aqui para sempre, e quando eu sair...
-Seu casamento pode se realizar. – O conde balançou a cabeça, fitando-a com a expressão que a fez gelar. - Não prestou atenção no que eu disse, Gina. Eu lhe contei o que Narcisa Black procura em uma noiva para o filho, e ela não aceitará nada menos. Draco é um jovem que já fez muitas extravagâncias e, dizem os rumores, espera com gosto o prazer de uma noiva virgem.
Afinal, a implicação do que ele dizia atingiu-a, e Gina arregalou os olhos, protestando chocada:
- Não!
- Sim – o conde corrigiu. - E isso não é o pior, Gina. Jamais gostei de seu pai, e agora o odeio pelo que fez com Tanya. Ela tinha vinte e um anos quando o conheceu, era jovem cheia de esperança. Pensou que seu pai se casaria com ela e entregou-se a ele por amor. Mas, assim que isso aconteceu, ele lhe disse que o único lugar que poderia ocupar na sua vida era de amante. Amando-o como o amava, Tanya aceitou. Eu fui obrigado a ver como o orgulho e o respeito da minha irmã foram-lhe roubados pouco a pouco, enquanto Arthur a exibia ao mundo como uma prostituta. Acho que será um castigo justo se eu fizer o mesmo com a filha dele!
“Eu vou desmaiar”, Gina pensou histericamente. Não podia estar ouvindo aquilo. Não podia estar ouvindo o conde lhe dizer, sem a menor emoção, que pretendia violentá-la e depois exibi-la publicamente como sua amante. Subitamente iniciou a lhe dizer que chegara tarde, que já se entregara a alguém, mas ele a interrompeu.
- Não adianta, Gina. Você já mostrou, de inúmeros jeitos, que ainda é inocente. Não pode deixar o château... Pierre não a ajudará e... pela manhã... – O conde deu de ombros, e ela entendeu, horrorizada, que ele pretendia começar sua vingança aquela noite. – Não precisa ter medo de que eu a machuque ou a maltrate. Não é a minha intenção punir a sua pessoa, e até lamento que o que quero só possa ser conseguido através de você. Com certeza não sofrerá mais nas minhas mãos do que sofreria nas mãos de Draco...
- A não ser pelo fato de que estaria casada com ele – Gina lembrou, com amargura.
Toda sua vida ouvira as freiras dizendo que sexo, fora do casamento, era pecado. E nem por um instante chegara a pensar em fazê-lo com outra pessoa que não seu marido. Mesmo que estivesse casada e apaixonada, teria medo do que tinha a frente. E pensar nas mãos do conde em sua pele, em seu corpo...
- Não! – gritou, em pânico, fazendo com que os lábios do conde se apertassem numa linha fina.
-Seus protestos só tornarão as coisas mais difíceis para você, Gina. Neste château, é a minha vontade que prevalece. Ficaremos aqui uma semana. Depois desse tempo, espero que já tenha perdido esse ar de inocência. – O conde fez uma pausa, depois continuou com calma, como se estivesse discutindo um assunto mundano qualquer. – Vamos para o Caribe, então. Tenho lá uma villa, e é para o Caribe que vão as pessoas com quem seu pai anda, nesta época do ano. Sem dúvida ele estará de ótimo humor, pensando no casamento que acha que ocorrerá, no verão. Ficará surpreso ao ver você ao meu lado, completamente minha.
- Eu lhe contarei o que o senhor fez – Gina gritou. – Não poderá me forçar a ficar, então. Irei embora...
- Acha que seu pai a receberá? De jeito nenhum, ma petite.
- Por enquanto... por quanto tempo terei que ficar?
- Pelo tempo que for necessário.
- E depois? – ela quis saber, estremecendo de novo. As freiras sempre insistiram com as alunas que, uma vez tendo pecado, o caminho de uma garota se tornava frio e sombrio, e centenas de quadros horríveis e torturantes surgiam na mente de Gina. – Depois que tiver... terminado comigo, o que será de mim? Nenhum homem vai me querer como esposa...
-Isso não é verdade, e não foi o que eu disse. Não é possível que acredite que todos os homens se casam com virgens... ou queiram isso. Você é uma linda garota, Gina, muitos se sentirão atraídos por você. Tem inteligência e, dependendo de como usá-la poderá ser feliz ou não na vida.
- O senhor se casaria com uma garota que... Tivesse tido outros amantes?
- Se eu a amasse, se ela tivesse outras qualidades que eu quisesse, é claro que sim. A mentalidade com que você foi criada é muito estreita, Gina. Se os Malfoy não fossem como são, seu pai jamais teria pensado em trocar sua inocência pelo dinheiro deles, e meus planos não dariam certo. Sob muitos pontos de vista, você é um produto artificial.
- E pretende me... violentar porque...
- Não será uma violação nos termos em que está pensando. Não tenho vontade de lhe causar dor ou degradação. Ao contrario, quero que seu pai veja que veio para mim de boa vontade.
A expressão de Gina trouxe um sorriso nos lábios dele.
- Nunca! – ela protestou. – Eu não poderia! Não amo o senhor.
- Como você é criança! Mais ainda aprenderá. Nem sempre é preciso amor para encontrar prazer, Gina.
Gina fechou os olhos numa agonia muda, incapaz de entender o que estava lhe acontecendo. Podia mesmo acreditar que aquele homem frio e irônico, falando de forma tão razoável, quase despreocupada, pretendia violar seu corpo, provando-a de sua virgindade!
Viu-o lançar um olhar ao relógio.
- Já é tarde e você deve estar cansada. Por que não vai para a cama?
Ergueu os olhos para os dele, mas o conde não estava olhando para ela.
-Tenho algum trabalho para fazer. Nem pense em tentar escapar, Gina. As portas estão trancadas, a ponte erguida, e Pierre não a ajudará. Ele tinha uma devoção fanática por minha irmã. Quer algo que a ajude a dormir?
Por um momento Gina sentiu vontade de aceitar. Se ele subisse e a encontrasse dormindo, talvez... o quê? Mudasse de idéia? Dificilmente, depois de ter tido tanto trabalho para trazê-la até ali. Aquilo não fora feito com o calor do momento. A zanga dele tinha esfriado e endurecido, e ele não desistiria do que planejara.
- Não obrigada – respondeu formalmente.
(...)
u.U Demorei mas postei ;)
Comenteem ;**
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!