CAPÍTULO XII



CAPÍTULO XII

O que Hermione sentia ao deixar Wessex era muito diferente do que havia sentido ao chegar, muito diferente, na verdade, de qualquer coisa que ela houvesse imaginado. Em vez de se entusiasmar, sentia uma dor aguda enquanto eles atravessavam os portões do castelo. Mas por que aquilo? Seria sintoma de alguma doença insidiosa ou ela estava realmente possuída, como Edred costumava dizer?
Fosse o que fosse a sensação, não podia ser desapontamento, claro. Ela não havia querido voltar a partir do momento mesmo da chegada deles à toca do Lobo? E, com esse objetivo, esforçara-se para ser tão insuportável que só uma idiota como Gina toleraria a presença dela. Hermione encolheu-se quando pensou no que tinha feito, principalmente na ocasião em que havia cuspido aos pés da lady. Sentindo alguma coisa parecida com arrependimento, não soube dizer se sentia orgulho do comportamento que tinha tido. Também não sabia se queria voltar para casa. Agora o feudo dela não parecia tão convidativo quanto antes, enquanto o castelo do Lobo, embora velho e muito sujeito à entrada do vento, parecia ter calor interno, como se o sorriso de covinhas de Gina e a fortaleza do lorde tivessem um poder parecido com o do sol.
Hermione soltou um resmungo contra aqueles pensamentos tolos, mas não havia como negar que as pessoas a tratavam de uma forma diferente em Wessex. Com exceção do Lobo, ninguém parecia amedrontado ou insultado pela presença dela. Alguns se mostravam cautelosos por causa das cenas que ela criava, mas a maioria se aproximava, com simpatia. Isso porque ela era a esposa de Rony.
Ninguém seria simpático com a Granger.
Sendo algo novo para ela receber aquele tratamento, Hermione não sabia se queria deixar de tê-lo. E, enquanto continuava confusa sobre o lugar que ocupava no mundo, havia as imagens de Gina e do bebê. Antes da partida ela havia sido abraçada e beijada pela esposa do Lobo, que parecia prestes a se debulhar em lágrimas. Embora Hermione continuasse considerando a mulher uma louca, era inegável que se tratava de uma pessoa bondosa.
Em contraste com aquilo, os moradores do castelo dela, o dissimulado Serle, os carrancudos servos, o intolerante Edred e os ameaçadores remanescentes do exército de Voldemort, todos sentiam evidente aversão por ela. E as frias e nuas paredes que a cercariam eram bem diferentes das do castelo do Lobo, graças ao talento de Gina para criar tapeçarias e outros enfeites. Embora parecesse ter mais moradores, por ser bem menor, o castelo dela era como um deserto onde a morte era uma ameaça constante. Procurando engolir o nó que sentia na garganta, Hermione afastou os olhos do castelo que ia desaparecendo ao longe e fixou-os nos ombros largos diante dela.
Bem, ainda teria Rony.
Sem saber de onde vinha aquele pensamento, Hermione espantou-se com a sensação de paz que ele provocou. Só podia ser falsa segurança, claro, mas era algo que permanecia, como um pesado manto que, além de proporcionar calor, a protegesse dos demônios. Hermione franziu a testa e respirou fundo. Obviamente a longa viagem começava a afetá-la. Por que Rony a arrastava pelos campos, afinal? Quando chegasse em casa, por mais que ele insistisse, ela não arredaria pé do quarto, da cama…
A questão sobre como eles se arranjariam para dormir assaltou a mente de Hermione, deixando-a inquieta. Rony voltaria a fazer a cama no chão ou faria questão de dividir a cama com ela? E, se ele insistisse nisso, deveria ela se resignar a dormir no chão? Hermione sentia alternadamente calor e frio ao pensar nas possibilidades. Naturalmente não queria que Rony, menos ainda o enorme e nu Rony, se deitasse com ela no antigo quarto do pai, mas também não estava ansiosa para se acomodar no frio chão de pedra. E, para falar a verdade, havia se acostumado ao… calor que vinha do grande corpo dele.
Do grande e nu corpo de Rony.
Hermione sentiu um arrepio, embora estivesse soprando apenas uma brisa muito leve. A primavera logo se transformaria em verão e as colinas à volta deles de encheriam de verde e calor. Seria uma bela vista, mas não tanto quanto a que estava bem diante dela. Como se tivesse vontade própria, a atenção dela retornou ao marido, cuja beleza ultimamente a fascinava.
Se ele insistisse em dividir a cama, deveria ela se recusar? Não, porque estaria apenas negando a si própria o pequeno e inocente prazer da proximidade dele, de estar perto de um outro ser humano e de ter aquela estranha sensação de segurança que havia permitido a ela a primeira noite de sono tranqüilo depois de muitos anos.
Segura? Com um homem? Hermione quis caçoar da idéia, mas não sentiu nenhuma vontade de rir. Ronald Potter emitia calor e proporcionava segurança, enquanto outros homens esbanjavam crueldade e cobiçavam poder. Ela sabia que já era tempo de reconhecer isso, pelo menos para si mesma. Durante a longa viagem, teria oportunidade de reavaliar o marido. Desde que havia entrado na vida dela, Rony não tinha feito nada além de tratá-la com uma imerecida bondade. Talvez ela devesse começar a retribuir a isso.
Hermione respirou fundo, cheia de dúvidas. Certamente um comportamento assim poderia ser arriscado, levaria a um enfraquecimento, à vulnerabilidade que ela sempre havia procurado evitar. Ou não? Com as sombrancelhas erguidas ela continuou a olhar para as costas do marido. Poderia continuar sendo a Granger se entregasse a Rony o que ele merecia?
Era impossível saber. Não só porque ela teria que superar uma relutância inata, mas também porque não estava certa de que conseguiria adotar um novo tipo de comportamento. Há tanto tempo que vinha tratando todos com rispidez que nem sabia como era ser bondosa e gentil.
Hermione sentiu outro nó na garganta e engoliu em seco, afastando os olhos do marido e contemplando as altas árvores que iam se perder na distância. Fortes, mas flexíveis, aqueles troncos se deixavam balançar pelo vento, mas não se quebravam.
Poderia ela fazer a mesma coisa? Rony merecia que ela pelo menos fizesse esse esforço. Além de recebê-la bem, as pessoas em Wessex haviam dispensado ao marido dela um tratamento digno de um rei. Mesmo tendo lá o carinho da família e a afeição de pessoas evidentemente sinceras, ele estava deixando aquilo tudo para voltar a um lugar onde só encontraria suspeitas e traição. E Hermione sabia que tinha sido a principal instigadora dessa situação, ao incentivar os servos a se voltar contra o novo lorde, chamando-o de Santo Rony e fazendo pouco dos modos gentis dele. Agira assim por não perceber que ele apenas estava tendo o comportamento de um homem honrado… um tipo de homem que ela nem sabia existir.
Hermione ergueu a cabeça. Nunca havia recuado diante de nenhum desafio, e encararia assim a tarefa de mudar de comportamento: seria um desafio a vencer. Enquanto isso, continuaria a vigiar a retaguarda do marido. Porque, quanto mais eles se aproximavam do feudo, mais Hermione se convencia de que os verdadeiros inimigos não estavam às costas dela, mas na frente.
E o feudo em si não parecia mais um paraíso, mas sim uma negra e venenosa aranha pronta para atacá-la.

Rony emocionou-se ao começar a percorrer as terras do feudo. Embora não se esquecesse das advertências de Harry, nem do duro trabalho que teria pela frente, não podia deixar de sentir orgulho do lugar. Aquele era e continuaria sendo o feudo dele, não importavam as dificuldades. Depois olhou para a esposa e experimentou a mesma sensação de posse, o que o fez sorrir. Ninguém além da própria Hermione contestava o domínio dele sobre ela. Diferentemente de outros maridos, ele não precisava temer que algum outro homem lhe roubasse a esposa.
Procurando não rir daquele pensamento, Rony entrou no salão e no mesmo instante o bom humor dele foi substituído por uma desagradável sensação de desconforto. Talvez estivesse exagerando, mas tinha a impressão de que alguém o observava com más intenções. Rapidamente olhou em volta, procurando ver qual das pessoas presentes estaria com maus intentos, mas na verdade ninguém ali parecia feliz em vê-lo.
Por um longo momento ele ficou observando, em silêncio, intrigado com o fato de que ninguém apresentava as boas-vindas. Um pouco depois Serle adiantou-se para recebê-los e Rony pôs os olhos naquele que podia ter motivos para temê-lo. Embora o mordomo mantivesse a cabeça abaixada, como se quisesse demonstrar submissão, os olhos examinavam Rony, Hermione e a comitiva, demorando-se nos dois cavaleiros com especial interesse. Reparando naquilo, Rony fez um gesto vagaroso para os dois homens, que se afastaram do grupo.
- Perdoe a demora, meu lorde, mas não pensei que voltaria. - disse Serle.
Rony juntou as sobrancelhas, surpreso com a desculpa do mordomo.
- Eu lhe disse que voltaria depois de passar algumas semanas com meu irmão e suserano.
O homenzinho encolheu os ombros.
- Sim, mas…
- Mas o quê? - perguntou Rony, tão curioso quanto irritado.
Por acaso aquelas pessoas achavam que ele havia mentido, que abandonaria as responsabilidades que tinha com elas pelos confortos de Wessex? Ou… Rony se encolheu quando teve a insidiosa suspeita. Por acaso haviam pensado que ele morreria quando estivesse fora? Caso pensassem isso, achavam que ele seria morto por quem? Involuntariamente os olhos dele se voltaram para Hermione, que observava Serle com indisfarçado desdém.
Rony reconhecia aquela expressão, que já tinha visto muitas vezes, mas não recentemente. Então perguntou-se se o fato tinha alguma significação. Embora não concordasse com a opinião dos irmãos sobre Hermione, não devia desprezar inteiramente as advertências de Harry. Rony amaldiçoou o dilema em que se encontrava. Se havia mesmo um inimigo no castelo, ele precisaria de toda a habilidade que tinha para lidar com o fato, mas não poderia se concentrar nisso se ficasse o tempo todo questionando os motivos da esposa. Hermione era um quebra-cabeça insolúvel e seria mais fácil pegar a lua com a mão do que entendê-la.
- Perdão, meu lorde, mas… aqueles cavaleiros… - gaguejou o mordomo. - São seus homens?
Durante vários segundos Rony ficou olhando para o homenzinho antes de responder.
- Francamente, Serle, se você fazia perguntas desse tipo ao seu amo anterior, acho surpreendente ainda estar com a cabeça presa ao pescoço.
Logo depois ele ouviu um som abafado que parecia um riso feminino. Vindo de Hermione? Outra vez ela o espantava.
- Só perguntei para poder cumprir com correção minhas obrigações. - justificou-se Serle. - Precisava saber se os dois cavaleiros ficarão lá embaixo, com os outros, ou se haveria necessidade de preparar um novo alojamento para eles.
O mordomo inclinou a cabeça, como se ainda se desculpasse, e Rony se viu olhando para a brilhante calva.
- Eles ficarão no porão, como é o costume aqui. - disse, logo depois apresentando os cavaleiros, que se adiantaram quando foi dito o nome de cada um deles. - Vieram para ajudar na proteção do castelo, já que nossas defesas foram prejudicadas com a partida de Montgomery. - acrescentou Rony, erguendo a voz para que todos ouvissem.
Depois ele fez um breve discurso afirmando que tinha muita satisfação em voltar e garantindo que redobraria os esforços para promover o progresso do lugar. A eloqüente fala foi recebida por olhares vazios e expressões cautelosas, para dizer o mínimo, mas Rony não se abalou. Precisava ganhar a confiança daquela gente, que, para satisfazer as ambições de um amo brutal, havia sustentado uma longa guerra contra o feudo vizinho.
Então uma voz se fez ouvir.
- Recomendo que dêem ouvidos a um homem que tem todas as condições para minorar o peso do fardo que está sobre o ombro de vocês.
Por um momento Rony perguntou-se quem poderia estar dando aquela sugestão, mas só precisou seguir o olhar de Serle para ver que era a esposa dele quem havia falado. A esposa dele?
- E se existe alguém com a intenção de atuar contra o meu marido, saiba que não ganhará nada com isso. Para ser mais clara, afirmo que essa pessoa se arrependerá da hora em que nasceu. - declarou Hermione, com sua costumeira veemência.
Rony sentiu os pêlos da nuca se eriçarem enquanto ficava olhando estupidamente para Hermione. A estranha sensação estava de volta, fosse pela maldosa atuação de alguém ou pela espantosa ameaça da esposa dele. Ela parecia tão pequena quanto ameaçadora enquanto lançava o desafio em defesa dele. Rony não sabia se devia ficar grato pela ajuda ou ofendido pela implícita afirmação de que não estava se protegendo como devia.
A gratidão superou o outro sentimento e Rony acenou para ela, mas Hermione apenas desviou o rosto, parecendo incapaz de sustentar o olhar dele. Então ele suspirou. Quem podia saber o que se passava por trás daquele véu de cabelos? Estaria ela o exaltando publicamente por algum motivo ou simplesmente ampliava um pouco a tarefa de defender a retaguarda dele? Rony sorriu ao pensar naquilo.
Subitamente o retorno dele deixou de parecer uma coisa tão fria.
- Meu lorde.
Parando de pensar nas surpreendentes mudanças da esposa, Rony voltou-se rapidamente quando ouviu a voz de um dos cavaleiros de Harry. O homem, que se chamava Talebot, trazia uma grande jarra de cerâmica, das que se usavam para guardar mantimentos, e estava com uma expressão que deixou Rony intrigado. Enquanto Talebot se aproximava, o outro cavaleiro foi se posicionando por trás de Serle, que olhava fixamente para a jarra. Os olhos do mordomo, normalmente pequenos, pareciam dois pires, o que fez Rony saber, sem a menor dúvida, qual era a identidade do ladrão.
Serle dormia num pequeno cômodo ao lado da despensa, destinado à preparação de poções medicinais. Como ninguém mais no castelo tinha essa habilidade, menos ainda a castelã, ele havia ocupado o espaço e o mantinha fechado o tempo todo, presumivelmente por causa dos desconhecidos preparados que eram guardados ali. Mas Rony havia obtido chaves de todos os cômodos do castelo, instruindo os homens de Harry para que revistassem as coisas de Serle tão logo chegassem ao castelo. Agora só podia concluir que havia sido encontrada a prova da má conduta do homem.
- O que é, Talebot? - perguntou.
- Moedas, cuidadosamente escondidas por baixo de cera de abelha. - respondeu calmamente o cavaleiro.
- E jóias, misturadas com nozes secas.
Erguendo a mão, ele mostrou um rubi de bom tamanho.
Rony balançou a cabeça, sentindo abatimento.
- Agora entendo por que você esperava que eu não voltasse. - disse, olhando para o mordomo. - Pretendia continuar me roubando, como fazia com Voldemort?
Por alguns instantes Serle ficou tremendo, parecendo que ia chorar como uma donzela assustada. Depois voltou-se e ergueu a cabeça.
- Foi ela! - gritou, apontando para Hermione.
Um murmúrio se espalhou pelo salão, seguido por um silêncio tão pesado que Rony pôde ouvir a respiração descompassada do mordomo.
Embora tivesse visto apenas de relance a expressão de espanto da esposa, logo substituída pelo costumeiro olhar duro, aquilo foi suficiente para mostrar a ele que ela não tinha conhecimento do roubo. E era evidente que o pai dela, um homem cego pela cobiça e pela vaidade, também não havia percebido que vinha sendo roubado pelo homem de confiança, ano após ano.
Obviamente, Serle pensava que o novo lorde seria facilmente tapeado.
- Ela me obrigou a fazer isso, ordenando-me que escondesse o dinheiro no meu quarto se eu quisesse continuar vivo. Essa mulher me ameaçou, meu lorde. - gritou o homenzinho, caindo de joelhos diante de Rony. - Já deve saber como ela é. Trata-se de uma criatura demoníaca, exatamente como Edred vive dizendo! Eu temia pela minha vida, ou não teria dado ouvidos a ela. Salve-me, proteja-me dela, e juro que serei sempre seu servo fiel.
Olhando para o repulsivo homenzinho, Rony sentiu como se todas as desfeitas que a esposa dele havia suportado em Wessex e todas as duras acusações de Harry houvessem se concentrado na figura nojenta do mordomo. E ele não sabia por que não quebrava aquela cabeça calva com um soco.
- Como ousa dizer isso? - inquiriu, sentindo-se dominar por uma onda de raiva, justa e violenta.
Então sacou da espada, pensando até em fazer daquele homem um exemplo. O mordomo de olhos pequenos era a personificação de tudo o que ele mais abominava: traição, desonestidade e covardia. Depois de ter roubado de dois lordes, causando prejuízos a sua própria gente, o cretino agora tentava jogar a culpa sobre outra pessoa. Hermione! A revolta fez com que Rony erguesse a espada. No entanto, mesmo já com a arma pronta para decepar a cabeça do homem, um lampejo de razão o deteve. Matar Serle não mudaria o que as pessoas pensavam da esposa dele.
Com um trêmulo suspiro Rony abaixou a espada, mas não muito. A raiva, há tempos contida, era muito grande para ser deixada de lado ou aplacada pelo autocontrole de um estudioso. Talvez ele não pudesse mudar opiniões, mas podia impedir que outras fossem expostas tão livremente. Então girou o corpo, com a espada apontada, correndo os olhos pelos sombrios rostos que observavam a cena.
- Alguém mais tem outro cometário a fazer sobre a minha esposa? - gritou, sem obter resposta. - Porque eu estarei pronto a ouvir agora ou nunca mais! Pronunciem-se! Você, Waltheof! - bradou, dirigindo-se a um servo que mostrava uma expressão afetada. - O que tem a dizer?
- Nada, meu lorde. - respondeu o homem, recuando apressadamente. - Nada.
Ah, que patético… Rony abaixou a espada e pôs-se a circular pelo salão, olhando de frente para cada um dos rostos.
- Ótimo, porque já estou fato de ouvir comentários, calúnias e falsidades!
Rony sabia que estava falando a verdade, Embora talvez exagerasse na veemência, havia contido a raiva durante muito tempo. Na verdade, desde o dia em que fora sorteado para se casar com Hermione, ainda em Campion, quando os irmãos dele deixaram claro o que pensavam da Granger. Mas não toleraria mais isso.
- Hermione é minha esposa e não quero ouvir nenhum comentário maldoso sobre ela. - declarou Rony.
Ignorando as expressões de perplexidade da audiência, silenciosamente desafiou todos a contestá-lo, mas ninguém se pronunciou. Apaziguado, olhou novamente para o trêmulo Serle.
- Quanto a você… Não vejo serventia num homem em quem não se pode confiar, num homem que tenta jogar sobre uma mulher a culpa pelos próprios erros. Talebot, expulse-o daqui, cuidando para que ele leve apenas as roupas do corpo. Serle, considere-se banido das minhas terras e das do meu suserano.
- Não, eu tenho os meus direitos! Tenho direitos pelos anos de serviços prestados. A Granger me deve!
O homenzinho gritava a esperneava enquanto era arrastado para fora do salão, mas Rony não deu ouvidos. Pondo a espada na bainha, voltou-se para Hermione e sentiu um súbito desconforto depois de tê-la defendido com tanta veemência.
Não tinha certeza do que poderia ver no rosto dela: choque, censura… talvez zombaria. Hermione era imprevisível. Era até possível que ela se pusesse a gritar, negando tudo o que ele acabava de dizer com tanta ênfase.
Como sempre, porém, ela o surpreendeu. Através do véu de cabelos, olhava fixamente para ele. E por um momento Rony sentiu uma identificação com ela que não tinha nada a ver com o fato de que eles estavam casados. Era uma união profunda, de respeito mútuo, um vínculo que não poderia ser descrito. Vendo aquele resoluto e desprendido ar de confraternização nos olhos negros dela, Rony não podia se arrepender da explosão que tinha tido pouco antes.
Afinal de contas, ela era sua esposa.

A expulsão de Serle foi um alívio e Rony encheu-se de esperanças de recomeçar tudo, ajudado pelas jóias e pelas moedas que o mordomo vinha amealhando há muito tempo. Imediatamente providenciou o concerto de cercas e a limpeza das edículas, ordenando a semeadura de novos campos e encorajando os habitantes da aldeia a desenvolverem suas próprias produções.
As sugestões dele foram recebidas com cautelosa aquiescência e, não raro, era preciso ter muita paciência. Não eram poucos os que insistiam em fazer as coisas como elas vinham sendo feitas há anos, simplesmente pela força do hábito. Ele sempre tinha sido um homem de idéias novas e agora aproveitava a oportunidade para pô-las em prática. Futuramente mandaria aumentar e fortificar o muro externo, pensando também em ampliar a área construída do castelo. O futuro já não parecia tão sombrio como antes e, sem a presença de Montgomery e Serle, Rony esperava que os inimigos estivessem desbaratados. Estava otimista, a não ser por dois problemas menores.
Infelizmente, os esforços dele para conquistar a simpatia dos habitantes do feudo não estava tendo muito sucesso. Era frustrante precisar sempre se empenhar naquilo e às vezes ouvir murmúrios ou ver olhares furtivos. Nessas ocasiões, perguntava-se o que estariam dizendo dele. Haveria alguém empenhado em voltar as pessoas contra ele? Embora grato pela presença dos dois cavaleiros de Harry, não queria usá-los como espiões, preferindo agir sozinho. Não havia outra forma de lidar com aquela atitude das pessoas além de demonstrar ele próprio que merecia a confiança delas. O tempo mostraria os resultados.
Quanto ao outro problema… era algo que existia desde o começo, mas agora se tornava ainda mais perturbador… de uma outra forma. Por mais que trabalhasse ou se concentrasse em alguma coisa, Rony sempre acabava pensando na esposa. Alguma coisa havia mudado entre eles desde o retorno de Wessex, como se uma incômoda aliança houvesse se estabelecido. Uma aliança muito estranha, sem dúvida. Mesmo assim, em meio a tantos rostos desconfiados, ele não podia deixar de ver em Hermione uma aliada.
Rony suspirou, subitamente inquieto apesar do cansaço. Estava deitado diante da lareira vazia do quarto, segurando um livro aberto, mas sem ainda ter lido uma única palavra. Já era tarde e logo Hermione se recolheria. Agora eles dormiam juntos, mas ela sempre era a primeira a se deitar, inteiramente vestida, e ele esperava até que ela cochilasse para ocupar o lugar que lhe cabia na cama. De outra forma,. ficariam os dois acordados, atentos, e…
Rony fechou o livro, aborrecido com o rumo dos próprios pensamentos. Estivesse ele numa discussão com alguém ou envolvido em algum trabalho, por mais complicado que fosse, sempre acabava pensando em Hermione. Quando ela estava por perto, os olhos dele a seguiam, como se não se cansassem de vê-la. Nos poucos dias desde a volta de Wessex, uma nova tensão havia surgido entre eles, embora não fosse expressa em gritos ou ameaças, mas sim despertando uma paixão profunda e primitiva. Ficava no ar, como algo que estivesse prestes a explodir e tomar vida. Rony inclinou a cabeça para trás e soltou um suspiro cansado.
Estava ficando obcecado pela esposa.
Embora ela não estivesse diferente, ao menos pelo que se podia ver, ele a achava diferente. Sem querer fingir interesse pelo livro, virou a cabeça e olhou para onde ela estava, desajeitadamente remendando alguns chinelos de pano. Devia arranjar novos. Bem, no dia seguinte mesmo ele providenciaria isso. Depois a atenção de Rony se fixou na comprida trança que caía por cima de um dos seios de Hermione. Então perguntou-se como seria acompanhar com os dedos o caminho daquela trança, percorrendo o corpo dela como um rio. Aqueles cabelos estavam numa enorme confusão, mas mesmo assim ele queria… queria…
Rony respirou fundo e levantou-se, sem saber direito o que queria. Se os deixava crescer tanto, por que ela não cuidava um pouco dos cabelos? Afinal de contas, não era mais uma criancinha sem iniciativa. Se não queria pedir a ajuda de alguma serva, por que não se encarregava ela própria da tarefa? Muito intrigado, Rony atravessou o quarto e parou na frente dela.
- Você nunca escova esses cabelos? - despachou.
Talvez algum artigo do tratado de aliança deles determinasse que ela não devia se espantar com as palavras dele nem levar a mão ao punhal. Em vez disso, Hermione apenas olhou para ele. Depois ergueu a cabeça, mostrando o antes freqüente ar de rebeldia.
- Não! Eu gosto dos meus cabelos como eles estão, Potter. Se você não gosta, azar o seu!
- Bem, então deixe que eu os escove. - propôs Rony, sentindo o coração bater mais depressa.
Hermione olhou para ele, parecendo chocada, e por um longo momento aquelas palavras ficaram no ar, cheias de significados. À medida que o silêncio ia se tornando mais e mais pesado, Rony sentiu uma estranha inquietação. Irritado consigo mesmo, desejou poder retirar o pedido, mas na verdade queria muito manusear os cabelos dela.
Quando Hermione finalmente falou, foi naquele tom de voz que ele tanto detestava.
- Quer escovar meus cabelos? - inquiriu. - Ficou louco? Ficou louco, sim!
Levantando-se da cama, onde estava sentada, começou a recuar para a porta, andando de costas, como se ele houvesse mesmo enlouquecido bem diante dos olhos dela.
Talvez fosse verdade. Rony não conseguia parar de olhar para a cachoeira de cabelos que caía em torno dela, até que Hermione, depois de rogar uma praga, saiu correndo do quarto e bateu a porta.
Cheio de frustração, Rony também praguejou, embora baixinho. Hermione representava tudo que ele desprezava! Ela não havia mudado. Nem mudaria. Depois de respirar fundo ele procurou se convencer de que seria perigoso perturbar a trégua que estava em vigor entre eles, chegando a ser insensatez tocar naquela imprevisível criatura. Mesmo assim, e apesar de toda a lógica, os dedos dele ainda ansiavam por tocar nos cabelos da esposa. E outras partes do corpo dele experimentavam as mais desencontradas sensações.
Rony voltou-se para a cama. Pelo menos agora poderia dormir. Despiu-se rapidamente, deixou a vela acesa e acomodou-se por baixo das cobertas, mas a cama parecia muito fria e vazia sem Hermione. Por um longo tempo ele permaneceu acordado, tentando ouvir os passos dela enquanto se censurava.




Agradecimentos especiais:
Bianca: Realmente a Mione percebeu que a Gina não é nenhuma dondoca. E a visão dela sobre as coisas está se alterando lentamente. Beijos.
Raquel Pereira: a Gina é demais, com certeza agora a Mione tem uma opinião diferente sobre a Gina e vai começar a agir diferente, pelo menos vai se esforçar. Beijos.
Clara Eringer: A Mione já começou a ver as coisas com outros olhos, inclusive percebeu que o Rony não tem nenhum plano sórdido escondido, apenas é o jeito dele. Eu também amo a Gina, ela é demais. Espero que tenha gostado desse capitulo. Beijos.
(-( Duda Pirini )-): Ela não é tão mimada assim, foi apenas um meio que ela encontrou de se defender e de sobreviver. Mas concordo, ela ta se encontrando e já está mostrando a verdadeira face de Hermione. Beijos.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.