CAPÍTULO XI



CAPÍTULO XI

Rony mexeu-se no assento colocado a um canto do salão, observando o irmão, que presidia a reunião do conselho de justiça do feudo. Muitas vezes havia presenciado ocasiões semelhantes em Campion, mas aquela era a primeira oportunidade que tinha para ver a atuação do irmão, surpreendendo-se com o senso de justiça que Harry demonstrava ter. Sempre vira o Lobo apenas como um guerreiro, mas a idade… ou Gina, ele pensou com um leve sorriso… estava acrescentando prudência ao que antes era só força.
Rony reparou que Hermione entrava no salão, empalidecendo ao vê-lo. Por um instante ficou tenso, achando que ela giraria o corpo e iria para longe dele. Mas Hermione não faria isso. Ultimamente vinha olhando para ele de uma forma estranha, ou pelo menos diferente da de costume, e Rony não sabia como explicar esse novo comportamento. As atitudes dele continuavam sendo as de sempre, mas várias vezes a surpreendia fitando-o, com um interesse tão intenso que o deixava com o coração acelerado. E sempre ela logo se voltava, como se estivesse embaraçada. Hermione embaraçada? Rony balançou a cabeça. Aquela mulher não se embaraçava com nada.
Mesmo assim ele não podia deixar de se lembrar da ocasião em que a encontrara vestindo apenas a camisa de baixo, vendo-a enrubescer, o rubor de uma donzela que se derramou sobre ele como uma onda de calor. Na hora ela havia parecido uma outra mulher, graciosa e adorável, com aquela enorme cabeleira molhada e brilhante, os seios firmes por baixo do fino tecido, o triângulo escurecido bem visível no alto das coxas. Rony engoliu em seco ao ver mentalmente a imagem de Hermione seminua, bela, fascinante.
Seria por isso que ultimamente ela o evitava? Porque ele a tinha visto daquele jeito? A seminudez simplesmente a aborrecia ou seria porque isso a fazia parecer mais acessível, mais humana, muito mais feminina? Esforçando-se para controlar tanto o pensamento quanto as reações do corpo, Rony aproximou-se para saudar com polidez a recém-chegada. Como ela pareceu disposta a correr para a cozinha, ele se apressou em bloquear a passagem. Vinha querendo falar com ela em particular, mas nunca surgia a oportunidade. E ele não ousaria se aproximar dela no quarto, temendo o que poderia acontecer… fosse algo sangrento ou…
- Bom dia, minha esposa. - disse Rony, num tom de voz que aos ouvidos dele pareceu alto.
Hermione respondeu com um gesto de cabeça, algo que até vinha se tornando freqüente, e ele pensou ver um enrubescimento por trás do véu de cabelos. O que havia causado aquilo? Estaria ela se lembrando do encontro no quarto de Gina, como ele ainda há pouco havia pensado? A imagem ameaçou retornar e Rony obrigou-se a concentrar a atenção no momento presente.
- Gostaria de conversar com você. - disse.
- Estou ocupada numa tarefa e não tenho tempo para conversas inúteis. - respondeu Hermione.
Dito isso ela tentou passar por ele, mas Rony a reteve pelo pulso. Raramente tocava nela, mas sentia-se ofendido pela rejeição dela, principalmente quando tinha certeza de que Hermione gostaria da notícia que receberia na conversa proposta.
Tarde demais Rony percebeu o erro que havia cometido, porque ela não toleraria ser impedida de se movimentar. Certamente explodiria numa gritaria, perturbando a importante reunião presidida por Harry e atraindo a ira do Lobo para eles. Rapidamente ele a empurrou para um canto escuro, pensando em acalmá-la de alguma forma.
Mas Hermione não disse nada. Apenas ficou olhando para ele com aqueles olhos grandes e negros, o que o deixou perplexo. Rony abriu a boca para falar, mas sentiu a pele dela macia e quente por baixo dos dedos dele, percebendo também que ela estava com a pulsação acelerada. Então sentiu uma vontade muito grande de abraçá-la, correr as mãos pelas deliciosas curvas que tinha visto desenhadas através da fina camisa de baixo.
No instante seguinte, porém, Hermione deu um puxão com o braço e livrou-se do aperto da mão dele. Depois esfregou o pulso, como se ele a houvesse machucado, mas Rony sabia que não era esse o caso.
- Você não pode dizer nada que eu queira ouvir. - ela disse, abaixando a cabeça, numa voz que não tinha a força de costume e com um olhar vacilante.
- Nem mesmo se você ficar sabendo que finalmente conseguiu o que queria? - provocou Rony.
- O quê?
Hermione ergueu a cabeça e ele viu rubor nas faces dela por entre os densos cabelos. Estaria ela se sentindo mal ou o salão havia se tornado opressivamente quente? Ele também sentia calor. Muito calor.
- Voltar para casa. - murmurou Rony, procurando fixar na conversa o pensamento, que só parecia interessado nos cabelos e na pele enrubescida da interlocutora. E ela dava a impressão de estar tão alarmada que a preocupação dele aumentou. - Você está se sentindo bem?
Em vez de dizer a ele uma série de impropérios, Hermione assentiu.
- Eu estou bem. Quando partirei? - Rony não respondeu logo, espantado por vê-la tão contida.
- Devemos ficar aqui até o fim desta semana, acho. Depois, se o tempo permitir, gostaria de iniciar a viagem de volta, embora ainda não tenha falado com meu irmão sobre o assunto.
Dito isso ele olhou para onde estava Harry e franziu a testa, achando que o Lobo não ficaria muito contente quando soubesse daquele plano. Como suserano, o irmão poderia até proibi-l o de partir.
- Iremos os dois? - perguntou Hermione, numa voz estranhamente fraca. Fraca e rouca.
- Certamente. - ele respondeu.
- Está bem.
Dito isso ela se voltou, como se estivesse ansiosa para sair da presença dele. Rony a seguiu, aborrecido com aquela fuga apressada.
- É só isso o que você tem a dizer, depois de haver me importunado e ameaçado durante semanas? Hermione!
Agora, porém, ela já estava a vários passos de distância, fingindo não ouvir os chamamentos dele. Rony não sabia o que era mais espantoso: ela não se voltar para responder com gritos ou demonstrar tão pouco entusiasmo com a notícia. Minutos antes ele havia pensado que finalmente conseguiria deixá-la contente. Mas não havia como agradar aquela mulher.
Suspirando, Rony apertou o alto do nariz, sentindo o começo de uma dor de cabeça e amaldiçoando a causa daquilo. A mulher era uma lunática. E mais idiota ainda era ele, pelo tratamento que dispensava à esposa. Mesmo assim sentia-se tentado a segui-la. Para onde ela teria ido com tanta pressa? Que tarefa podia ter arranjado? Rony ficou pensativo. Provavelmente Hermione estava planejando atear fogo ao palácio à noite, quando todos estivessem na cama.
Cama. Ao pensar no lugar onde ultimamente vinha dormindo, e com quem, Rony respirou fundo. Todas as noites se deitava ao lado da esposa, nu, e estava se tornando cada vez mais difícil conciliar o sono, principalmente depois que a vira seminua, ainda meio molhada do banho. Resmungando sozinho, Rony arrependeu-se de quando havia decidido, se deitar na cama ao lado dela. Agora aquilo não proporcionava nenhum conforto e ele se levantava com o corpo moído todas as manhãs, sempre constatando que Hermione já havia saído. Com tudo isso, sabia que dificilmente a teria como uma esposa de verdade.
Ela era uma diaba que, naquele momento mesmo, provavelmente estava planejando matá-lo. E ele devia mesmo procurá-la, só para se certificar de que nenhum mal seria feito. Aprumando o corpo, Rony olhou para a escada e marchou para lá. Talvez a esposa dele estivesse com Gina.

Quando encontrou a cunhada sozinha com o bebê, Rony sentiu um estranho desapontamento, que atribuiu ao embaraço que o dominava sempre que estava perto do recém-nascido. Certamente não era por causa da ausência da esposa. Pelo menos Gina mostrou-se contente ao vê-lo. Estava sentada numa cadeira perto da janela, costurando alguma coisa, enquanto o bebê dormia no berço ali perto. O sorriso que ela mostrou foi tão brilhante que Rony teve certeza de que era bem-vindo.
- Rony! Entre e venha sentar-se aqui perto. Ultimamente você anda tão ocupado com Harry que nem tem tido tempo para mim.
Rony sorriu, sentindo um pouco de remorso. Na verdade vinha evitando se encontrar com a cunhada para não ter que ouvir palavras de consolo por causa do casamento sem amor dele. Assim sendo, quase sempre procurava a companhia do irmão. Mas agora podia puxar outro assunto, falando a Gina sobre os planos que estava fazendo.
- Desculpe-me. Nossa estada aqui está chegando ao fim, mas prometo que na minha próxima visita reservarei mais tempo para você. - garantiu.
- Já está de partida? Tão depressa assim? - protestou Gina. — Parece que vocês acabaram de chegar. É claro que ainda não estão aqui há um mês.
- Não. - reconheceu Rony. - Mas já chegou a hora de voltarmos. Tenho muito o que fazer no feudo, se Harry me deixar voltar.
- Ele não o obrigará a ficar, embora eu saiba que ficaria muito contente se você ficasse. É o preferido dele, Rony.
Rony deu de ombros.
- Isso é só porque ele me vê com mais freqüência do que os outros irmãos. A propósito, agora que o tempo está firme, vocês deviam convidar aqueles tratantes para vir conhecer o bebê.
Gina sorriu, mostrando as covinhas do rosto.
- Aposto que eles estão loucos para pegar o sobrinho no colo.
Rony riu ao imaginar os irmãos dele, todos rudes guerreiros, tomando nos braços a frágil criança.
- Talvez não pegar no colo, mas pelo menos trazer os cumprimentos a vocês. - disse, aproximando-se do berço. - E papai deve estar ansioso para conhecer o neto.
- É, sim. - concordou Gina. - Agora já não faz tanto frio e não ficarei preocupada se ele se aventurar numa viagem tão longa.
Depois de trocar um olhar significativo, por alguns instantes eles ficaram num constrangedor silêncio. Ronyy se alegrava ao ver que alguém mais se preocupava com as necessidades do pai dele, mas ser lembrado da avançada idade do conde não era uma coisa agradável. Então ele olhou para o menino, que dormia tranqüilamente.
- Rony?
- Sim… - ele murmurou, estudando o recém-nascido e sentindo uma súbita vontade de rir.
As mães sempre achavam lindos os seus filhos, mas todo bebê daquela idade era feioso.
- É sobre Hermione.
Rony quase soltou um gemido. Tarde demais percebeu que tinha sido um erro ir até ali. Não tinha nenhuma vontade de falar com Gina sobre a esposa. Ela não compreenderia. Ninguém compreenderia.
- É que… eu queria lhe pedir que não a julgasse com muito rigor.
- Quem? - perguntou Rony, olhando para ela com surpresa.
Gina mostrou um sorriso indulgente.
- A sua esposa.
- Ah, sim…
Rony continuou olhando para o recém-nascido, sem dizer nada. Por acaso Gina gostava de Hermione?
- Acho que, por trás de toda aquela ferocidade, existe uma pessoa boa. Na verdade, às vezes ela me lembra Harry. - pilheriou Gina, o que deixou Rony ainda mais espantado.
A imprevisível e violenta Hermione não se parecia em nada com o honrado irmão dele. Harry era um cavaleiro, um barão, um homem que agia com justiça e merecia o amor da esposa. Ele até quis protestar, mas Gina prosseguiu.
- Ela se parece tanto com Harry que vê tudo em branco e preto. Infelizmente, no caso dela, a maior parte aparece em preto. Tem havido muito pouca luz na vida de Hermione, Rony.
- Mesmo assim você não pode comparar Harry com aquela criatura selvagem! - disse Rony com veemência.
- Ah, não posso, é? - rebateu Gina, embora continuasse falando com sobriedade. - Quando Harry foi encarregado de me levar de volta para a casa do meu tio, não deu a menor atenção aos meus argumentos, não acreditou quando eu disse que estava sendo levada para uma morte certa. Tratou-me como se eu fosse uma idiota, enquanto ele era todo experiência e arrogância. Não sei se você sabe, mas seu irmão nem chegou a me pedir em casamento. Apenas anunciou que seria a melhor saída para evitar uma retaliação por parte do meu tio.
Rony ficou pasmado com a franqueza dela, mas não com a história em si. Sabia muito bem que às vezes Harry agia como um déspota. E mesmo depois do casamento, não raro percebia discórdia entre o Lobo e a esposa. Embora fosse evidente que os dois se amavam, Harry parecia relutante em reconhecer isso.
Como se lesse o pensamento dele, Gina sorriu.
- Muitas vezes eu pensei em ir embora, mas acabei optando por enfrentá-lo, combater a teimosia do homem. Como o seu pai disse uma vez, eu domei o Lobo. Não foi fácil, mas valeu a pena. Seja por que motivo for, algumas pessoas acham difícil se permitir ter sensações. No caso de Hermione, não me agrada especular, mas tenho certeza de que a educação dela teve alguma responsabilidade nisso. Que tipo de vida ela podia ter tido com o pai, sem a mãe, sem ter exemplos de honra ou bondade em que se espelhar?
- É, pode ser. - admitiu Rony. - Mas nem tanto. Sua infância também foi um inferno, mas hoje você é a pessoa mais doce que eu conheço.
Outra vez as covinhas de Gina apareceram, enfeitando o riso dela.
- Obrigada, cunhadinho! Mas, como você sabe muito bem, as pessoas são diferentes. Cada um de nós tem suas características e procura sobreviver à sua maneira. Não acho que Hermione seja tão selvagem quanto nos faz acreditar, mas, como um ouriço, ela usa o exterior cheio de espinhos para afugentar os inimigos. Por acaso você já a viu atacando fisicamente uma pessoa ou um animal?
Rony coçou a cabeça, pensativo, mas antes que ele pudesse responder Gina continuou.
- Meu tio se divertia chutando os cachorros ou batendo nos servos. Até agora não vi em Hermione nada parecido com a maldade dele.
- Você está se esquecendo de que ela assassinou a sangue-frio o primeiro marido. - lembrou Rony, com secura, embora muitas vezes ele próprio não desse a devida importância ao fato.
Seria bom ter alguém para lembrá-lo disso.
Gina respirou fundo e ficou séria.
- É, eu me esqueci. - disse, como se falasse consigo própria. - Ao vê-la com você, nem pensei em Smith, o monstro. Oh, Deus! E pensar que não faz muito tempo…
- O quê? - quis saber Rony, preocupado com a reação da cunhada.
- Oh, Rony… - voltou a falar Gina, com a voz entrecortada. - Eu nem cheguei a vê-lo, mas ouvi a voz dele, voltando-se contra o próprio lorde, ameaçando e atormentando Harry por nenhum motivo além da própria ganância.
- Smith? - perguntou Rony, sentindo um arrepio ao se lembrar do homem que havia atraiçoado e torturado o irmão dele.
Gina assentiu e continuou.
- Muita coisa se disse sobre a morte dele, talvez porque Hermione já tinha a reputação que tem hoje, ou talvez porque a forma como ele morreu traga à tona um medo que todo homem procura sufocar. Prefiro não especular. Mas lhe peço que se pergunte por que uma mulher, qualquer mulher, mataria um homem na cama dela.
A resposta em que Rony imediatamente pensou foi a mesma que seria dada por qualquer um dos outros Potter: Hermione era uma bruxa sanguinária que não queria se casar. Ele abriu a boca para expressar essa opinião, mas alguma coisa no semblante de Gina o manteve calado.
- Por que Hermione matou Smith e você continua vivo? - ela perguntou, com brandura.
Como resposta Rony engoliu em seco. Pela primeira vez desde o casamento, perguntou-se o que de fato havia acontecido na noite do casamento de Hermione com Zacarias Smith. A princípio não havia se preocupado em refletir sobre o destino do predecessor. Depois, por motivos que preferia não analisar, havia decidido não pensar em Hermione com um outro homem.
Mas o cavaleiro apunhalado na noite de núpcias não tinha sido um qualquer. Tratava-se de Zacarias SMith, um homem sem honra. Como Gina havia lembrado, o desgraçado havia traído e torturado o próprio amigo e suserano. Se era capaz disso, que tratamento dispensaria a uma mulher? Rony sentiu um estranho aperto no estômago. Teria Smith machucado Hermione? Apesar de se encolher ao ter aquele pensamento, ele sabia que a Granger não sofreria em silêncio. Revidaria de imediato, como faria qualquer mulher. Seria por isso que a chamavam de assassina?
Experimentando um certo remorso, Rony suspirou. Não sabia sobre o passado de Hermione mais do que as outras pessoas. Por que não havia pensado antes nessa possibilidade? Por que não havia feito mais concessões a ela? Por que não havia ele próprio matado Smith, no calor da batalha? Se ao menos pudesse ter posto as mãos no desgraçado! Rony pigarreou.
- Ela lhe disse alguma coisa? - perguntou, meio temeroso do que poderia ouvir.
Gina balançou a cabeça, com um ar tristonho.
- Você sabe que ela não falaria. Por outro lado, parece não saber nada sobre o que pode acontecer entre um homem e uma mulher. Mostrou-se muito perturbada quando eu falei livremente sobre o assunto.
Rony sentiu-se corar intensamente. Não só não tinha o costume de falar sobre certas coisas com uma mulher, mesmo tratando-se de Gina, como também tinha a sensação de estar sendo acusado de incompetência por ainda não ter se deitado com a esposa.
Quando o silêncio entre eles começava a ficar constrangedor, o bebê chorou e Gina se levantou. Antes de pegar o filho, porém, pôs a mão no braço de Rony para confortá-lo.
- Não posso dizer que sei o que aconteceu de fato na dificil vida dela, assim como não insistirei para que você não seja rigoroso com Hermione. Só lhe peço uma coisa, para o seu próprio bem: não desista dela.

Era hora de partir. Por mais que Rony tivesse satisfação em ver Harry, Gina e o menino, tinha pouco a fazer em Wessex além de seguir obsequiosamente o irmão, enquanto o novo lar dele requeria muitas providências. O dever o chamava, mas havia também outros motivos para a partida. Apesar das atitudes gentis de Gina, ele se sentia sob pressão, colocado entre a esposa e o Lobo. O casamento havia tornado impossível uma repetição dos despreocupados dias passados antes no castelo do irmão. Além disso, ele sabia que Hermione estava infeliz.
Ou não? Ela não parecia muito entusiasmada com a notícia do regresso deles… embora nunca houvesse se mostrado feliz com nada, pensou Rony, suspirando. Logo depois, lembrando-se da conversa com Gina, resolveu repensar o que acabava de afirmar em pensamento. Seria Hermione do tipo de pessoa que sentia prazer no próprio sofrimento ou era desgostosa de verdade, e não por vontade própria? Quando ela rechaçava e até fazia pouco das gentilezas dele, Rony sempre atribuía isso à natureza rancorosa da esposa, mas agora se perguntava se os motivos por trás do comportamento de Hermione não eram mais complexos. O quê, na verdade, ele sabia sobre a esposa?
Fosse qual fosse a resposta, Rony sabia que dificilmente a ouviria dos lábios de Hermione. Esfregando os olhos ele repousou a cabeça no travesseiro, aproveitando-se da maciez da cama enquanto era possível. Não encontraria aquilo quando retomasse ao próprio feudo, que não tinha confortos de nenhum tipo. Nada mais seria fácil.
- Quando pretende partir?
Sem ter percebido que alguém entrava no quarto, Rony levou um susto quando ouviu a voz do irmão e recriminou-se pela desatenção.
- Daqui a dois dias. - respondeu. - Mas como você ficou sabendo?
- Gina me contou, e me fez jurar que não rosnaria com você, seja lá o que tenha pensado quando disse isso. - Embora parecesse um tanto arrependido da promessa feita à esposa, Harry apenas ficou olhando nos olhos do irmão. - Preferia que você ficasse.
- Eu sei.
Um som indecifrável partiu da garganta do Lobo, mas felizmente não chegava a ser um rosnado.
- Está certo, mas pelo menos deixe que eu escale alguns homens para acompanhá-lo. - Rony dispôs-se a recusar, mas o Lobo pôs a mão pesada no ombro dele, mantendo-o calado. - Sei que você quer fazer tudo sozinho, Rony. Ai, meu Deus! Eu era exatamente assim em relação a Wessex, mas sofri muito com a minha teimosia. Privei-me de bons conselhos, de companheirismo e da sua habilidade para me ajudar a fazer as contas da propriedade. - Nesse ponto ele mostrou um sorriso torto. - Não cometa o mesmo erro. Leve com você alguns dos meus cavaleiros mais confiáveis.
Embora o primeiro impulso fosse recusar, Rony pensou melhor na oferta. Não queria levar outros soldados para o feudo, afastando-se ainda mais da gente de lá, mas lembrava-se muito bem do confronto com Montgomery e sabia que sempre havia o perigo de outras traições. Como se lesse o pensamento dele, Harry voltou à carga.
- Você é muito temerário, Rony. Sempre fico angustiado quando penso que um irmão meu está no meio do antigo exército de Voldemort.
- Todos eles me juraram fidelidade. - ponderou Rony.
Harry soltou um resmungo, evidentemente dando pouca importância àquilo.
- Todos nós sabemos da rapidez com que esses compromissos podem ser desfeitos, principalmente quando a questão envolve uma herdeira… - O Lobo vacilou, como se sentisse que não devia externar suas opiniões sobre Hermione, mas sustentou o olhar de Rony. - Você precisa de alguém para proteger sua retaguarda.
Rony lembrou-se de que já ouvira a mesma coisa da esposa e quase riu. Pensou até em revelar a coincidência ao irmão, mas achou que Harry não gostaria da ironia.
- Tem mais uma coisa, Rony.
Harry desviou os olhos e Rony ficou tenso por causa do tom de voz do irmão. Só esperava que o Lobo não voltasse a falar mal de Hermione.
- O que é?
- Estive pensando no que você me disse sobre os cofres vazios do seu feudo. Simplesmente não posso acreditar nisso.
Rony relaxou, mesmo ficando intrigado com as palavras de Harry.
- Por que não?
- Voldemort tinha dinheiro, muito dinheiro, vindo principalmente da esposa, que era uma herdeira muito mais rica do que ele. Foi com isso que financiou a guerra contra mim, aumentando o exército e comprando mantimentos. Sempre tinha armas sofisticadas, usava roupas caras e até jóias. Fala-se que ele tomou as jóias da esposa e mandou transformar em anéis e outras bugigangas para si próprio. - Harry soltou um de seus resmungos, expressando o desdém que sentia por um comportamento como o que estava descrevendo. Depois continuou. - O que estou querendo dizer, Rony, é que não acredito que tudo tenha se perdido com a guerra, nem mesmo depois do pagamento do resgate pelos cavaleiros. Ele sabia da situação da propriedade e deve ter guardado alguma coisa para manter os confortos de que desfrutava caso fosse derrotado.
Rony flexionou os dedos, olhando para o irmão. Embora os argumentos de Harry fossem razoáveis, talvez houvesse algum motivo que o Lobo não quisesse confessar. Além disso, ele não sabia se devia concordar com a conclusão do irmão. Um sujeito seboso como Voldemort podia muito bem gastar tudo o que tinha na tentativa de conquistar mais terras e mais poder. Sempre tinha sido essa a ambição do cretino.
- Não posso dizer que vi muito luxo naquele feudo. - ele declarou, com secura.
- Ora, você sabe o que estou querendo dizer, Rony. - respondeu Harry, com impaciência.
- Não, não sei. - disse Rony, sentindo que também já estava com o sistema nervoso entrando em descontrole. - Talvez você deva ser um pouco mais claro.
Harry não pareceu muito à vontade, mas quando voltou a falar demonstrou determinação.
- Acho que ela escondeu o dinheiro em algum lugar.
Rony soltou uma gargalhada, um som que pareceu amargo aos ouvidos dele.
- Sim, e é possível ver isso pela forma como esbanja tudo em roupas caras e jóias. - disse, numa voz cheia de sarcasmo. Harry dirigiu a ele um olhar tão duro que Rony achou que o irmão poderia jogar alguma coisa em cima dele.
- Mas que droga, Rony. Ela não usará o dinheiro em futilidades, mas sim para pagar homens que acabarão cravando um punhal nas suas costas. Não se deixe cegar por seu deturpado senso de honra! Aquela mulher é perigosa! Tem que ser trancada em algum lugar ou mandada embora… para um convento, talvez, embora eu duvide que algum se mostrasse disposto a recebê-la. Você teria que encontrar a recheada bolsa dela para comprar a boa vontade de alguma madre superiora.
Rony procurou se concentrar nas palavras de Harry, ignorando o tom enraivecido com que elas tinham sido pronunciadas. Era mais do que evidente que o Lobo detestava Hermione, embora fosse igualmente evidente que tinha motivos para isso. No entanto, pela primeira vez na vida Rony sentia vontade de avançar contra a garganta do irmão, derrubá-lo no chão para tentar pôr um pouco de bom senso naquela cabeça de cabelos espessos, embora não tivesse certeza de que seria bem-sucedido nisso. Embora mais velho, Harry o superava em peso… e um peso composto quase exclusivamente de músculos. Mesmo assim, sentia-se tentado a…
Você está tratando com o seu suserano, lembrou -se Rony. Além disso, todos esperavam que ele raciocinasse com frieza. Era o diplomata da família, como Campion costumava dizer. Mas agora precisava de muito autocontrole para equacionar aquele problema de forma lógica.
Ele até entendia por que Harry detestava Hermione. O Lobo havia suportado o inferno nas mãos do pai dela e obviamente transferia o ódio para a filha do inimigo. Embora ela não houvesse dado andamento à guerra iniciada pelo pai, não era do tipo de mulher que conquistava admiradores. Era a antítese da doce e bondosa Gina, que parecia sempre ter um lugar no coração para todos. E Harry, como a própria Gina havia observado, em geral via tudo em branco e preto, sem perceber os meios-tons que faziam pessoas como ele, Rony, muitas vezes vacilar antes de tomar uma decisão.
Ele também ainda não tinha opinião formada sobre Hermione. Apesar do comportamento da esposa, não conseguia odiá-la. Às vezes se via admirando a firmeza de princípios dela… além de outros atributos de Hermione.
Rony engoliu em seco. Como Gina havia observado, Hermione tinha tido uma criação muito diferente da dos Potter. Quem sabia como tinha sido a educação dela? Quem podia julgá-la? Na verdade, quem poderia culpá-la se ela houvesse se apoderado da riqueza deixada pelo pai?
Mesmo assim Rony achava difícil acreditar que Hermione estava escondendo dinheiro roubado dos cofres do castelo. Não havia mais nem mantimentos. Embora ela não parecesse se importar com mais ninguém, seria difícil imaginá-la roubando a comida destinada à alimentação dos servos.
Então o quê? O que ela faria quando visse a miséria tomando conta da propriedade, as pessoas morrendo? Fugiria para Londres com a bolsa cheia de dinheiro? Rony sabia que Hermione detestava viagens e parecia se sentir mais forte no lugar onde havia nascido. Tinha uma ligação muito sólida com aquele feudo, algo que nada no mundo conseguiria superar. Pelo menos isso ela não trairia.
Ele também não conseguia imaginá-la contratando soldados para assassinar o marido. Talvez chegasse a essa conclusão por influência de outras partes do corpo que não a cabeça, mas Hermione não parecia ter o mesmo desejo de poder do pai. Afirmava desprezar praticamente tudo o que as outras pessoas em geral ambicionavam. Repetidas vezes amaldiçoava a presença dele e ameaçava matá-lo, mas usando as proprias mãos e não contratando alguém para cumprir a ameaça. E, apesar de ter tido muitas oportunidades, nunca tinha feito nada mais grave do que arranhar o rosto dele.
- Hermione não é assim. - disse Rony, com calma, ouvindo outro resmungo do Lobo. - Mas se, como você diz, o dinheiro desapareceu, então outra pessoa é responsável por isso.
Sem dar ouvidos aos argumentos do irmão, ele lamentou ter tido tanta pressa em dispensar Montgomery. O cavaleiro tinha sido muito ligado ao pai de Hermione. Talvez houvesse se apoderado de valores dos quais só Voldemort tinha notícia. Sim, o culpado podia ser Montgomery. .
Ou Serle. Subitamente o mordomo apareceu na mente de Rony, com seus olhinhos espertos e suas contas incompreensíveis. Era preciso considerar os pesados gastos contabilizados sem nenhuma explicação. Tendo livre acesso aos depósitos de suprimentos do castelo, Serle tornava-se o mais forte suspeito.
- Está certo. - disse Rony. - Levarei os cavaleiros e investigarei para descobrir um possível ladrão no meio da minha gente. - Nesse ponto ele se levantou e olhou nos olhos do irmão. - Mas levarei também minha esposa, em vez de mandá-la para algum convento.
- Rony. - Por alguns instantes os dois homens pareceram travar um duelo de determinação, a de Harry sendo mais forte, enquanto a de Rony era temperada pela paciêncla. Finalmente o Lobo se voltou, resmungando. - Escolherei dois dos meus melhores homens.
- Obrigado, Harry. - disse Rony, erguendo a mão para apertar o antebraço do irmão, que fez o mesmo com ele. Enquanto seguia Harry para fora do quarto, Rony sentiu que agora a vontade de voltar para casa estava misturada com uma desagradável sensação de desconforto. Depois da relativa paz em Wessex, só encontraria no próprio feudo discórdia e suspeitas. O retorno seria como entrar num ninho de cobras. E, embora ele procurasse não dar importância às advertências de Harry sobre Hermione, elas ficavam no ar, nublando o pensamento dele, justamente na hora em que era preciso ter clareza de raciocínio.
Rony sabia que estaria indo para um antro cheio de inimigos, mas qual seria a posição da esposa dele? Estaria entre os amigos ou se aliaria aos inimigos?


N/A: mais um capitulo pra voces, estou compensando a demora, aí pessoal se eu esqueci de mencionar alguem que comentou não me matem, estou na correria na faaculdade, mas consegui um tempo para colocar mais um capitulo hoije. Abraços a todos.
Agradecimento especial:
Maluh aluada evans potter black: Obrigado por ler. Abraços.
Bianca: Que bom que voce gostou, mais um capitulo, apenas um dia depois do anterior, agora as coisas começam a ficar mais interessantes, no proximo capitulo tem surpresa pro Rony. Beijos.
Raquel Pereira: realmente a Mione exagerou na opiniao sobre a ruiva, mas com o tempo as coisas se consertam. Beijos.
(-( Duda Pirini )-): Que bom que gostou. A Hermione vai começar a ceder em breve, talvez no próximo capitulo, mas o Rony vai dar mancada. Espero que tenha gostado desse capitulo. Beijos.


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