CAPÍTULO II
CAPÍTULO II
Hermione Granger desceu rapidamente a escada, ansiosa para escapar do homem que a insultara. O jeito insinuante dele, embora fosse coisa nova para ela, não a enganaria nem um pouquinho. Ronald Potter era um homem e, como tal, não merecia confiança.
Na verdade, pensou Hermione, engolindo em seco, o futuro esposo dela era mais homem do que qualquer um outro que ela já tivesse visto. Era mais alto do que o pai dela, bem maior do que Zacarias Smith, que tinha sido um homem baixo e compacto, embora muito musculoso. Aquele Potter seria capaz de arremessar Smith para o alto, como uma criança faria com uma bola.
Diabo. Ao inferno com os Potter! Ao inferno com o rei! Ao inferno com todos os homens que habitavam o mundo! A vida inteira Hermione havia lutado contra eles, e agora, quando finalmente podia ter alguma coisa que pertenceria só a ela, queriam privá-la disso. Nunca conseguiriam, jurou a si mesma.
Tinha sido informada da chegada deles, claro. Por isso havia buscado o refúgio do quarto, embora soubesse que eles não seriam enxotados com facilidade. Mas em nenhum momento havia chegado a pensar na possibilidade de que o homem fosse procurá-la pessoalmente.
Outra coisa era surpreendente: seria natural ele abrir a porta com chutes, derrubá-la a machadadas, mas nunca bater. Tão de leve. Tão educadamente.
Hermione sacudiu a cabeça. Não deixaria que o desconcertante comportamento daquele Potter a impedisse de pensar direito. Obviamente o plano inicial destinado a mandá-los embora havia fracassado, mas ela ainda não se daria por vencida. Quando terminasse o que pretendia fazer com eles, de bom grado a família inteira sairia dali!
Confiante, Hermione entrou no salão, apenas para parar dois passos adiante, paralisada pelo que viu. Estavam ali mais do que cinco deles. Seis, pelo que ela contou. E todos, sem dúvida, parentes do que tinha ido ao quarto dela. Eram formidáveis cavaleiros de cabelos pretos, alguns até mais altos do que Rony. E olhavam para ela com um misto de curiosidade e repulsa. Era um tipo de olhar a que Hermione já estava acostumada, algo que a estimulava a entrar em ação.
- O que estão olhando? - ela gritou. - Saiam e levem o outro com vocês! Não haverá nenhum casamento aqui!
Então cuspiu no chão, bem diante deles, tendo a satisfação de ver seis pares de olhos se abaixarem para o local.
Mas logo depois os mesmos olhos retornaram para ela e Hermione recuou um passo. O mais alto dos Potter parecia positivamente um selvagem, e não era o único que merecia essa classificação. Um outro grandalhão estava resmungando palavrões, mas ela resolveu que não recuaria. A situação não era nova. O perigo sempre tinha sido uma presença constante na vida dela. Hermione encarou os ameaçadores cavaleiros, recusando-se a demonstrar medo. Então sentiu no braço o toque de uma mão.
Era Rony, o tal que havia tentado subjugá-la usando voz macia e palavras educadas. Sacudindo o braço, Hermione moveu-se para o lado e levou a mão ao cabo do punhal. Estava pronta para tudo, mas para surpresa dela o cavaleiro simplesmente ignorou aquela postura belicosa e indicou os outros com um gesto.
- Lady Granger, tenho a honra de lhe apresentar meu irmão mais velho, Harry, barão de Wessex.
O gigante adiantou-se. Então era aquele o Lobo de Wessex! Mais parecia um predador. Com o semblante fechado Hermione olhou para o homem que durante tanto tempo tinha sido inimigo mortal do pai dela.
Logo depois, surpreendendo-a, ele se inclinou numa reverência, embora evidentemente não fizesse isso de bom grado.
- Meus respeitos, lady Granger. - disse, com os dentes trincados.
Hermione franziu a testa. Mas que disparate era aquele? Por que todos aqueles gestos de cortesia? Intrigada ela dirigiu a Rony um olhar de espanto, mas ele parecia estar achando aquilo tudo muito certo, o que a deixou ainda mais desnorteada. Por acaso aqueles Potter eram malucos?
Hermione preparou-se para mais uma investida.
- Não quero saber quem vocês são! - gritou. - Saiam da minha casa imediatamente! Não há nada para vocês aqui, seus abutres repulsivos.
O Lobo adiantou-se, rosnando, evidentemente disposto a agredi-la. Hermione preparou-se para a luta ou para a fuga, mas até aquele gigante parecia se sentir na obrigação de dar ouvidos a Rony.
- Harry, desculpe a minha noiva, por favor. Ela não está bem disposta.
Aquelas palavras foram ditas sem que o homem alteasse a voz e Hermione olhou para ele, boquiaberta. Por acaso estava diante de um lunático? Ela os havia agredido verbalmente, e ele agia como se isso não significasse nada! Por que não demonstrava revolta? E por que os outros não a atacavam?
Hermione sentiu uma onda de pânico.
Só podia ser por causa do decreto idiota do rei que aqueles homens continuavam ali, ela pensou, enraivecida. Eles queriam as terras dela, embora fosse incompreensível os ricos e poderosos Potter demonstrarem interesse por uma propriedade tão pequena e pobre. Só havia uma explicação. Como todos os homens, queriam se apoderar do máximo possível de terras, sem pensar em mais nada.
- Já que não faz questão de conhecer meus irmãos, deve estar ansiosa para que a cerimônia se realize. - disse Rony - Chamarei o padre para que providencie isso imediatamente.
Ignorando os palavrões que ouviu como resposta, o homem estendeu a mão para ela. Então Hermione emudeceu e ficou olhando para ele. Não se lembrava da última vez em que fora tratada com cortesia, mesmo que fosse uma cortesia fingida. Depois de alguns instantes de perplexidade ela sacudiu a cabeça, recusando-se a se deixar iludir pelos gestos civilizados de Ronald Potter.
Havia muitos tipos de serpentes no mundo, inclusive algumas que ela não conhecia. Aquele homem certamente estava nessa categoria, mas não conseguiria se intrometer na vida dela. Hermione olhou para os outros e viu violência, a muito custo reprimida, e ódio, claramente exposto em alguns dos rostos.
Mas não se deixaria intimidar e ergueu a cabeça, encarando-os. Conhecia bem homens daquele tipo. Talvez fosse melhor ter que lidar com um deles e não com o mais manhoso dos irmãos.
Rony continuava parado, com a mão estendida. Hermione aproveitou aquela proximidade para examiná-lo mais atentamente. Reparou nos brilhantes cabelos castanhos, nos olhos da mesma cor, nas feições muito parecidas com as dos irmãos, embora bem mais tranqüilas.
Surpresa, ela chegou à conclusão de que estava olhando para o mais bonito do grupo. Naturalmente aqueles homens não pensariam que ela ficaria impressionada com… com a beleza de Ronald Potter. A simples idéia chegava a ser ridícula, se não fosse tão assustadora. As pessoas não a tratavam como uma mulher nem lhe atribuíam sentimentos femininos, e ela certamente não queria que os Potter fizessem isso.
- Por que você? - perguntou, olhando para Rony. Antes de responder ele sorriu, mostrando uma fileira de dentes tão brancos como ela jamais vira.
- Nós jogamos a sorte. - respondeu o homem, dando de ombros.
Ao ouvi-lo confessar com tanta naturalidade que se casaria com ela apenas por ter sido sorteado para isso, Hermione sentiu uma ponta de medo. Aquele homem era mais perigoso do que os irmãos, por mais ameaçadores que eles parecessem. E agora ela se sentia acuada, sem ter para onde escapar, enquanto ele continuava com a mão estendida.
Outra vez Hermione olhou para os formidáveis cavaleiros. Estavam ali os famosos Potter. Não podiam ser tão estúpidos quanto pareciam e não seriam enxotados com facilidade. Teimosos miseráveis.
Bem, ela podia ser igualmente teimosa. No momento, porém, só podia ganhar tempo até que surgisse alguma idéia. Depois de olhar com firmeza para cada um dos Potter, Hermione ergueu a mão e a pôs com firmeza por cima da de Rony.
Pela primeira vez em muitos anos, porém, estava com os dedos trêmulos.
Sentando-se, Rony ficou olhando enquanto a esposa se movimentava incansavelmente pelo salão. Era como observar a poção de um alquimista, prestes a mudar de cor ou a pegar fogo. Há muito tempo que a mulher não demonstrava revolta, o que o deixava intrigado.
Rony ficou tão espantado quanto apreensivo com a capitulação dela. Naturalmente tinha sido a opção mais razoável, mas aquela não parecia ser uma mulher que obedecesse à razão. A Granger havia se submetido com muita facilidade, muito subitamente, e agora ele a via como uma fera selvagem que a qualquer momento podia se voltar contra o captor.
Embora em geral fosse o mais paciente dos irmãos, Rony via-se agora rezando para que a cerimônia se realizasse antes que a mulher tivesse uma nova explosão. Infelizmente nenhum casamento podia ser oficiado sem a presença de um padre, e o padre ainda não havia chegado.
Serle tinha dito que havia um padre residente ali, encarregado de ministrar os sacramentos aos aldeãos e rezar missas na capela do castelo. Depois que o mordomo saiu à procura do religioso, Rony esforçou-se para relaxar, mas não era fácil.
Diabo. Onde podia estar o tal padre? A situação já estava complicada o suficiente sem que houvesse mais retardamentos.
Assaltado por uma sombria suspeita, Rony voltou-se vagarosamente para a noiva. Ela estava de costas para ele, olhando para fora por uma das compridas janelas. Então ele se levantou e, vagarosamente, foi se aproximando até chegar perto o suficiente para que eles pudessem conversar sem que os outros ouvissem.
Finalmente inclinou-se e cochichou ao ouvido dela a pergunta que o levara até ali.
- O que você fez com o padre?
Ao ouvir a voz dele a mulher se voltou rapidamente e levou a mão ao punhal, num gesto do qual Rony já estava farto. Bem que se sentia tentado a tomar aquela arma dela, mas não queria forçar tal confrontação. Procurando ser paciente, preferiu prestar atenção no que ela diria.
- Que história é essa, Potter? - vociferou a mulher, recuando.
- O padre. - ele repetiu. - O que foi que você fez com o santo homem?
- Não fiz nada com ele!
- Se eu descobrir que você causou algum mal a um inocente ministro de Deus só para evitar esse casamento…
- Vai fazer o quê? Mandará que seus irmãos me açoitem ou me matará, Potter? Acho melhor você não se preocupar com o santo homem, mas sim com o seu próprio destino.
Agora ela gritava, chamando a atenção de todos. Rony franziu a testa. O breve período de calma havia terminado.
Ao ver que Dino havia se levantado e avançava, Rony o deteve com um simples olhar. Depois massageou os olhos com a palma das mãos, tentando afugentar uma dor de cabeça que começava. A Granger não deixou de reparar naquele gesto.
- Está sentindo dor, Potter? - inquiriu, num tom maldoso. - Deixe que eu prepare uma poção para minorar seu sofrimento. Sou muito hábil na combinação de certas ervas.
- Aposto que é. - respondeu Rony, perguntando-se como podia ter achado bonita aquela mulher.
Agora, por trás da massa de cabelos desgrenhados, ela parecia uma bruxa pronta para envenená-lo. E tinha a coragem de se vangloriar da sua habilidade com venenos! Aquilo fez com que ele se sentisse no meio de um pesadelo.
- Isso é só o começo! - advertiu a Granger, como uma aldeã analfabeta que só conhecesse o refrão de uma única canção. - Escape enquanto é tempo, Potter.
Rony sentiu a cabeça latejar, mas recusou-se a perder o controle.
- Ouça bem, garota presunçosa. Se acha que será mais bem tratada por um dos meus irmãos, pode fazer sua escolha! - disse, indicando os outros Potter, que estavam encostados na pesada mesa.
Aquelas palavras foram pronunciadas antes que ele avaliasse o impacto que elas poderiam ter. Rony sentiu uma estranha agonia ao tentar imaginar qual seria a resposta dela. Mesmo assim obrigou-se a prosseguir.
- Prefere algum outro? - perguntou, numa voz baixa, mas intensa.
Depois olhou para os irmãos, todos belos e fortes, perguntando-se qual deles seria o ideal para a Granger.
Nicholas era jovem demais e Harry já tinha esposa.
O que dizer do despreocupado Fred, do quieto Reynold? Finalmente ele olhou para a futura esposa, desejando que ela respondesse logo e encerrasse o assunto.
Mas a mulher não demonstrou pressa, como se achasse divertido fazê-lo esperar. Depois sacudiu a cabeça e fez uma careta horrenda.
- Não, não quero nenhum deles. - declarou. - Também não quero você!
- É um sentimento mútuo! - respondeu Rony, virando as costas para ela e cruzando os braços.
Imediatamente ele se arrependeu daquela explosão infantil. Com ou sem dor de cabeça, não devia descer ao nível dela. O pai o havia criado para ser um homem honrado, um cavaleiro responsável, não um sujeitinho sem importância que brigasse por qualquer coisa.
Quando pensava na melhor forma para lidar com aquela mulher, Rony viu Serle entrando no salão. Finalmente! O otimismo desapareceu quando ele viu que o mordomo estava sozinho… e parecendo mais assustado do que nunca.
- Onde está o padre?
Serle ergueu as mãos e sacudiu a cabeça, desesperado.
- Não o encontrei em nenhum lugar, meu lorde!
Rony ouviu os murmúrios dos irmãos, mas procurou se concentrar no mordomo.
- Esse padre não sabia que tinha uma cerimônia para realizar?
- Estou certo que sim, meu lorde. Todos nós sabíamos do seu projetado casamento com a senhora, mas não tínhamos idéia de quando se daria a sua chegada. O fato é que o padre desapareceu! Um dos servos disse que ele se recolheu para jejuar e orar.
Rony achou aquilo inacreditável. O inverno estava na metade. Que tipo de idiota iria para o meio da floresta? Então ele pressionou a região entre os olhos, onde a dor parecia ter se concentrado, e procurou falar com naturalidade.
- Esse servo tem conhecimento do lugar para onde o padre foi?
Serle balançou a cabeça e recuou, como se esperasse ser castigado. Muito provavelmente era esse o tratamento que recebia quando tinha Voldemort como senhor.
Mas bastava olhar para a filha para saber do que Voldemort tinha sido capaz. Por Deus! Aquela mulher afugentava qualquer um… até mesmo um padre! E agora a cerimônia que ele queria tanto ver concluída teria que ser mais uma vez adiada, pelo menos até que o homem fosse encontrado. Rony poderia ir procurá-lo pessoalmente, claro, mas não queria deixar a Granger sozinha com os irmãos dele. Aqueles rapazes pareciam ansiosos para usar de violência e alguém poderia morrer. Mais provavelmente a futura esposa dele.
E, apesar das dúvidas que tinha acerca do futuro casamento, Rony não se preocupava apenas com a possibilidade de encontrar a noiva morta quando retornasse. O fato seria um escândalo que mancharia a reputação dos Potter. Além disso, ele estava determinado a cumprir o decreto do rei, realizando o casamento.
Sem querer pensar muito nos motivos que podia ter para tomar essa decisão, olhou para os irmãos. A primeira idéia foi pedir a Harry que comandasse as buscas, mas não tinha o direito de atribuir tarefas ao futuro suserano. Depois olhou para Dino, que provavelmente era tão capaz, além de ser mais violento que o irmão mais velho.
- Dino, será que você pode liderar um grupo de soldados para sair à procura do padre? - perguntou.
Embora em geral o segundo dos filhos de Campion se mostrasse muito disposto a comandar expedições, naquela oportunidade a resposta não foi dada de imediato. Em vez de responder, Dino dirigiu à Granger um olhar ameaçador, como se a acusasse de ter assassinado o padre e escondido o corpo.
Rony suspirou, aborrecido por estar perdendo tanto tempo. Agora os irmãos dele diziam em murmúrios o que pensavam da única mulher presente.
- Dino, junte alguns homens e vá à procura do sujeito. - disse Harry, inesperadamente acorrendo em auxílio a Rony. - Será mais rápido e mais fácil do que voltar a Wessex para trazer Aldwin.
Dizendo isso ele lançou à Granger um olhar cheio de significação. Se ela pretendia mesmo se furtar a cumprir o decreto do rei, estava avisada. Havia outros padres e as práticas a que vinha recorrendo apenas protelariam o inevitável.
- Está bem, eu irei. - resmungou Dino.
- Também irei. - dispôs-se Fred, pondo-se de pé. - Quero muito conhecer suas terras, Rony.
- Eu também. - declarou Nicholas.
Rony viu que a Granger se voltava prontamente ao ouvir aquelas palavras, mas ela não fez nenhum protesto enquanto Dino saía, seguido por Fred e pelo jovem Nicholas.
- Os outros fiquem aqui. - recomendou Harry, de olho na Granger, o que deixou Rony ressentido.
Por acaso os irmãos achavam que ele era incapaz de lidar com a mulher? Até aquele momento, havia obtido melhores resultados apenas com argumentos e bons modos do que eles conseguiriam com suas mãos pesadas e suas espadas. Por acaso pretendiam protegê-lo indefinidamente? Planejavam acompanhá-lo ao banheiro, à cama quando fosse dormir? Continuariam a tratá-lo como um idiota que precisava ser protegido da própria esposa?
Controlando-se para não dizer exatamente o que estava pensando, Rony olhou para o irmão mais velho.
- Se mais homens forem, mais rapidamente a tarefa será realizada. - argumentou, procurando falar com naturalidade.
Embora parecendo pouco à vontade, Harry sustentou o olhar dele.
- Acho que não devemos nos dividir, porque ela pode ter preparado uma armadilha.
Uma armadilha? Rony voltou-se para a Granger e viu que ela os observava com um olhar demoníaco.
- Não confia nos soldados aquartelados aqui? - perguntou, dirigindo-se outra vez a Harry.
- Atualmente não confio em ninguém, Rony, menos ainda nos homens do meu inimigo.
- Mas Voldemort está morto, a guerra dele contra você terminou há meses.
Embora muitos dos que agora serviam naquele castelo houvessem lutado contra Wessex sob as ordens de Voldemort, com a morte dele a filha havia desistido das hostilidades. E, desde então, não demonstrava interesse em combater o inimigo… mas podia estar pensando em assassinar Harry e seus irmãos ali mesmo, no salão do castelo. O pensamento não havia passado pela cabeça de Rony, mas agora ele via que era uma coisa perfeitamente possível. Tinha sido ingênuo por não ver a oportunidade de vingança que o projetado casamento oferecia à noiva.
Ah, como tinha sido idiota. Logo ele, que se achava possuidor de grandes conhecimentos. Quando olhou para os irmãos presentes, Rony viu que eles desviavam o rosto. Até mesmo Simas, que raramente se afastava do copo de vinho para pensar em algo mais sério, parecia estar ciente do risco que eles corriam.
- Dificilmente existem aqui homens em número suficiente para nos ameaçar, Rony. - apressou-se em dizer Harry. - Mesmo assim, acho melhor termos cautela.
- Sim, claro. - concordou Rony, engolindo o ressentimento.
Harry havia aprendido a ser vigilante da forma mais difícil, traído por um homem que se fazia passar por amigo. Não podia ser censurado por ser cauteloso. A recepção que eles tinham tido e o desaparecimento do padre reforçavam esse pensamento.
Outra vez Rony dirigiu a atenção para o objeto das suspeitas deles. Através do véu de cabelos, ela os fitava com um ar ameaçador. Depois de respirar fundo ele se aproximou.
- Isso é mesmo um embuste, senhora? Está pensando em derrotar Wessex?
- Não repetirei a tolice do meu pai. - respondeu a mulher, com rispidez. - Quero apenas ser deixada em paz!
- No momento não posso realizar esse seu desejo. No entanto, tão logo o padre for encontrado e nós nos casarmos, prometo que não será perturbada.
- Não se dê ao trabalho de mentir para mim, Potter. Sua falsidade me enoja!
- Bem, procure agüentar até depois da cerimônia.
Rony sorriu quando viu a reação da mulher ao que ele acabava de dizer. Ela evidentemente não havia esperado ouvir aquilo e agora fazia uma expressão quase cômica, tornando difícil acreditar nas suspeitas de Harry. Então ele se aproximou da janela e gritou para fora, embora continuando a olhar para ela.
- Apresse-se, Dino. Encontre logo o padre, porque lady Granger está ansiosa para se casar comigo.
A mesa estava sendo arrumada para o jantar e a noite começava a cair quando o grupo de buscas retornou, Nicholas vindo na frente para dar a boa notícia.
- Nós o encontramos, Rony, escondido numa caverna! - gritou o mais jovem dos Potter.
- Numa caverna? - espantou-se Rony.
Era inacreditável alguém querer deixar o calor daquelas paredes para se enfiar numa caverna em pleno inverno. Bem, os homens santos às vezes surpreendiam com suas penitências. Faziam votos que uma pessoa normal dificilmente cumpriria, como o da castidade. Rony olhou para a Granger, que estava a um canto, amuada. Naquela noite não seria difícil para ele abdicar da luxúria.
- Sim, numa caverna. - confirmou Dino. - Havia várias cavernas na rocha.
- Acho que ele escolheu aquela por causa da saliência rochosa em cima. Olhando-se de perto, parecia uma cruz.
Dino resmungou alguma coisa, obviamente intrigado com o capricho na natureza descrito por Nicholas.
- Venha cá. - disse, voltando-se para os que estavam logo atrás.
Quando ele se moveu, Rony viu que entre Fred e o nervoso Serle estava um sujeito alto usando vestes sacerdotais. Os cabelos do homem eram abundantes e brancos.
- Este é Edred. - apresentou Fred, olhando com curiosidade para o religioso.
- Muito prazer, Edred. - disse Rony, fazendo um cumprimento de cabeça. - Parece que você não escolheu uma boa hora para fazer o seu retiro espiritual, porque precisávamos muito da sua presença aqui. Quero que realize a cerimônia o mais rapidamente possível, porque o jantar está servido e nós todos estamos cansados depois da longa viagem.
- Que cerimônia, meu lorde? - perguntou o padre.
Rony teria considerado aquilo uma insolência se a expressão do homem não fosse tão serena. Talvez se tratasse de um retardado. Que outro tipo de pessoa permaneceria com Voldemort?
- O casamento. - respondeu Rony, depois de suspirar. - Lady Granger e eu vamos nos casar.
- Não. - negou-se o sacerdote, balançando a cabeça solenemente. - Isso não pode ser feito.
Fez-se um instante de espantado silêncio. Depois soou o coro de protestos, todos os Potter falando ao mesmo tempo. Reynold fez o sinal da cruz enquanto Simas soltava uma gargalhada. Rony procurou ignorar aquelas reações, achando que talvez Edred não houvesse entendido as palavras dele.
- Eu vou me casar com lady Granger e você oficiará a cerimônia. - disse, pausadamente, olhando para os pálidos olhos do religioso. - Sem dúvida você tinha conhecimento do decreto do rei determinando a realização desse casamento. Ou não tinha?
O padre permaneceu impassível.
- Não posso ligar essa mulher a nenhum homem.
Perplexo, Rony voltou-se para a Granger, que mostrava um diabólico sorriso de vitória. Pelo menos os dentes eram bons, ele pensou, antes de retornar a atenção para Edred.
- Mas por quê? - perguntou, sentindo voltar a dor de cabeça.
- Por quê? Está me perguntando por quê? - Agora a voz do religioso ressoava no salão, silenciando os Potter. - Porque ela foi gerada por Satanás, não serve para se ligar a um homem.
Rony ficou boquiaberto.
- Todas as mulheres são pecadoras de nascimento, mas essa criatura está entre as da pior espécie, é um instrumento do demônio! - prosseguiu Edred. - Não se importa com o que aconteceu ao último cavaleiro que a tomou como esposa, meu lorde? Observe com atenção as lições dos que o antecederam! Só com a intervenção do próprio Deus essa mulher se afastará do pecado.
Chocado, Rony olhou para a Granger, cuja expressão obstinada parecia confirmar as palavras do padre. Por um momento ele se perguntou se a mulher não havia instruído Edred para dizer aqueles absurdos, mas ela não parecia muito à vontade com o triunfo. E um olhar mais cuidadoso nos olhos do padre confirmou que ele estava convicto do que dizia.
Suspirando, Rony massageou as têmporas com os dedos, tomando a decisão de substituir Edred logo que possível. Mas precisava de um padre imediatamente.
- Compreendo suas reservas, mas a união foi determinada pelo próprio soberano. - ponderou.
Impaciente, Harry adiantou-se três passos.
- Como barão de Wessex e cavaleiro devidamente armado para fazer cumprir as determinações do rei Edward, ordeno que você presida imediatamente a cerimônia desse casamento.
Edred empalideceu, mas mesmo assim Rony achou que ele continuaria se recusando. Até que Harry levou a mão à espada. Quando os cinco outros Potter fizeram o mesmo gesto, o padre engoliu em seco, o amor à pele obviamente superando suas estranhas crenças.
- Pois muito bem, mas estou avisando. Esse casamento será amaldiçoado, como você também será, Ronald Potter, se resolver fornicar com a filha do demônio.
Rony perdeu a paciência. Não era de admirar a Granger ser uma pessoa tão amarga e detestável. Que menina não se tornaria uma mulher assim depois de ter sido educada por um padre como aquele? Ainda mais sendo filha de um homem que atacava o vizinho sem ser provocado?
Então ele avançou e agarrou na parte frontal do hábito de Edred, erguendo-o um palmo do chão.
- Não. Eu estou avisando. Você não dirá mais nenhuma palavra contra a minha futura esposa, ou mandarei expulsá-lo daqui. Está entendendo?
Outra vez o homem engoliu em seco antes de sacudir afirmativamente a cabeça, com os olhos muito abertos.
- Ótimo. Agora ande logo com isso.
Rony soltou-o e caminhou até onde estava a Granger, que o observava como se estivesse vendo um louco. Bem, ele nunca havia ameaçado um padre, mas não permitiria que ninguém falasse mal dela. Dentro de poucos minutos assumiria o controle daquela propriedade e providenciaria para que muita coisa mudasse ali.
Assim determinado ele chegou bem perto da noiva e respirou fundo… para ter uma enorme surpresa.
Ela era limpa. O cheiro que vinha daqueles cabelos era agradavelmente limpo e feminino, levemente temperado por uma fragrância de almíscar. Sentindo o coração acelerado, Rony ocupou-se em examinar a vasta cabeleira da noiva, que não tinham a tonalidade acastanhada que ele havia pensado antes. Na verdade os cabelos eram bem mais escuros, quase pretos. Vibrantes. E ele não conseguia desviar os olhos.
Até que ela virou o rosto para encará-lo.
- Está olhando o quê? - inquiriu, bem na hora em que Edred começava a falar.
Por um momento a fascinação de Rony desapareceu, porque a expressão dela parecia confirmar a opinião do padre.
Edred franziu a testa ao ser interrompido, mas prosseguiu. Rony olhou rapidamente para os irmãos, que pareciam apreensivos com a união que testemunhavam.
Pela primeira vez se sentiu o mais corajoso dos filhos do conde de Campion, grato também pelos vastos conhecimentos que dominava. Um simples olhar em volta daquele antigo salão, a escuridão imperando lá fora e ali dentro existindo abundância de maus presságios, tudo isso já bastava para deter o mais bravo dos homens. Inspirava pensamentos de magia negra, morte e destruição. Quando alguns dos Potter presentes fizeram o sinal da cruz, Rony soltou um suspiro.
Considerando tudo, aquilo não era um bom presságio para a noite de casamento dele.
N/A: Galera, mais um capitulo rapidinho;
Agradecimentos especiais:
JOSY CHOCOLATE: Espero que goste e continue lendo. Beijos.
(-( Duda Pirini )-) : Espero que você continue gostando e lendo. Abraços.
Carol Lee: Eu concordo com você, é um livro muito bom. Espero que continue lendo. Beijos.
Bianca: Olá garota, que bom que você esta lendo a continuação, espero que você goste tanto como gostou de Lobo Domado. Beijos.
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