O Dia Seguinte
Ao abrir os olhos tudo que desejou foi poder fechá-los novamente quem sabe para nunca mais abrir. Talvez Hermione pudesse lhe preparar outro daquilo que ele bebeu na noite anterior, talvez se ele tomasse um atrás do outro não precisasse lidar com o luto quase palpável de sua família.
A cama de Harry já estava feita e Pitchi piava muito alto em sua gaiola, provavelmente com fome. Ron não conseguia lembrar se sequer a havia alimentado no dia anterior. Sabendo que não tinha escolha, ele se levantou e trocou de roupa muito devagar, imaginando que só lhe restava descer e ter outra refeição torturante com os outros.
Mas dessa vez na mesa só estavam Percy, Carlinhos, Fleur e Hermione.
- Onde estão os outros?
- Gui foi com seu papá nu Ministérie e dipos ia no Grrringotes. Eles forram justificarr as faultas.
- Harry e Gina estão nos jardins. – Hermione acrescentou antes que ele pudesse perguntar.
- Mas e mamãe? Ela está com Jorge?
Dessa vez foi Carlinhos quem respondeu. – Jorge ainda não desceu e mamãe decidiu alimentar as galinhas. Acho que ela precisava ocupar um pouco a mente.
Ron olhou para o elfo mal humorado que agora lhe servia uma porção de ovos mexidos. Percy não lhe dirigiu a palavra uma só vez, permanecia mudo desde que saíram do castelo. Ele se perguntou se o irmão sentia-se culpado pela morte de Fred, ou por ter se virado contra a família no passado ou os dois. Talvez ele se sentisse mal pelos momentos que perdera com os irmãos. Ron se sentiria.
Esses pensamentos desanuviaram quando o irmão deixou a mesa e foi se arrastando escada acima. Fleur pareceu sentir-se mais confortável agora com a ausência de Percy, porque assim que este os deixou ela se pôs a conversar com Carlinhos sobre quem iria hoje ao enterro de Tonks e Lupin.
- E então, você pretende ir? – Ron tirou Hermione de sua distração com as sobras no prato à sua frente.
- Oh, na casa dos Tonks? Sim...quer dizer, não podemos deixar de ir.Harry com certeza vai, ele ainda não conhece Teddy. – ela cutucou por um momento um resto de bacon com o garfo – É muito triste pensar que ele é só um bebê e nem teve a chance de conhecer os pais...
- Eu sei. Lupin teria sido um bom pai...Apesar de ser meio desastrada Tonks também teria sido uma boa mãe – acrescentou. – Mas ele tem sorte de ter Harry, com certeza vai ser um bom padrinho.
Ron se esforçou em sorrir para a amiga.
Como não tinha família, Remus foi enterrado naquela tarde ao lado de sua esposa na sepultura dos Tonks, a cerimônia foi simples e bem mais vazia que a de Fred. Todos os Weasley, à exceção de Jorge que ainda não saíra do quarto, compareceram assim como Harry e Hermione. Dessa vez Kingsley se fez presente, chegou atrasado e foi o primeiro a sair, ele explicou por alto que Ministério estava em um período de cassação dos mandatos daqueles que lutaram ao lado de Voldemort e que Azkaban estava passando por uma reforma para receber os novos presos.
O sol estava prestes a se pôr quando eles voltaram para a Toca,mas Harry decidiu ficar um pouco mais para conversar com Andrômeda sobre seu afilhado.
O resto da semana seguiu em ritmo lento e sem maiores acontecimentos. Vez ou outra, o Profeta Diário mandava cartas atrás de Harry. Jorge raramente descia, Molly permanecia desnorteada de forma que a casa se mantinha sob o controle de Arthur e Gui, que ficou com eles até que a segunda-feira chegou e ele teve que reassumir seu posto no Gringotes voltando com Fleur para o chalé. Ron sabia que cedo ou tarde seu irmão mais velho teria que retomar suas obrigações, só que com a partida dele ficava mais visível que em pouco tempo seriam só ele, Gina, Jorge e seus pais.
Uma hora a licença de Carlinhos acabaria e querendo ou não Percy teria que procurar recuperar seu emprego no Ministério.Harry provavelmente estaria só esperando para se mudar de vez para o Largo Grimlaud e Hermione ainda tinha que buscar os pais na Austrália.Ela ainda não comentara nada sobre esse assunto mas Ron sabia que isso a afligia, queria ter a coragem de dizer para ela que fosse atrás de seus pais mas a verdade é que não queria se afastar dela agora.
Ele queria tempo para digerir os últimos acontecimentos, desejava apenas que nada mudasse até que ele se recuperasse. Não se sentia capaz de ficar sozinho em casa parecendo forte para continuar consolando sua mãe toda vez que ela tivesse uma crise repentina de choro, ou bancar o irmão mais velho para Gina, nem queria ser a pessoa que tiraria Jorge da escuridão de seu quarto. A casa cheia lhe dava a impressão de que estavam todos na mesma situação, tentando seguir em frente.Porém se de repente todos fossem embora a pressão seria muito grande e ele não saberia por onde começar.
Não se preocupava tanto com Harry, sabia que o amigo adiaria ao máximo a sua mudança. A casa em Grimlaud Place precisaria de muitas reformas, seria trabalhoso, haveria muito no que pensar e Harry não parecia nem um pouco disposto a resolver isso agora.
Seu receio mesmo caía sobre Hermione. Desde a primeira noite de volta à toca que ele não esteve mais sozinho com ela, portanto eles não haviam conversado muito, nem foi dito nada sobre Austrália. Parecia sempre que havia a necessidade implícita de manter silêncio quando estavam todos na sala e quando conversavam sobre alguma coisa costumava ser sobre algo trivial ou do interesse de todos.
As freqüentes cartas que eles recebiam dos jornais requisitando entrevistas com “Harry e seus amigos” foram tema principal dessas conversas.
- Harry, eu acho sinceramente que você devia oferecer uma entrevista. Só assim isso vai parar! – Hermione agora sacudia um exemplar do Profeta que tinha na capa uma foto dele com a seguinte legenda ,“ Após salvar o mundo, o menino que sobreviveu foge em busca de anonimato.”
- Ah, eu já falei isso com ele...Eu te contei né? – Gina se virou para o namorado – Anteontem, o papai flagrou um fotógrafo tentando pular a cerca para o nosso terreno. Se ele não tivesse colocado logo o feitiço o sujeitinho tinha chegado aqui em casa!
- Eu sei, eu sei...eu pensei sobre o assunto. – Harry se defendeu. – E já decidi o que vou fazer.
Todos olharam para ele, Ron se ajeitou melhor na poltrona. – Não quero que o Profeta publique mais um melodrama sobre mim, portanto vou chamar Xenófilos aqui. Ele nos deve uma.
- Então o primeiro jornal a ter o depoimento do “Menino-que-sobreviveu” sobre a Guerra vai ser O Pasquim! – Ron riu só de imaginar a reação dos leitores.
- É uma boa idéia. Assim a gente garante que não vai haver nenhum absurdo na matéria publicada. – Hermione finalmente largara o jornal na mesinha de centro.
Ron a olhou por um momento. Provavelmente agora ela iria querer discutir com Harry o que ele deveria dizer para O Pasquim, aconselhar o amigo sobre o que ele deveria revelar e o que não deveria sobre as Horcruxes e o envolvimento de Dumbledore na história toda., seria mais uma tarde perdida na qual ele não ficaria a sós com Hermione para saber quando ela pretendia partir. Na verdade esse não era o único motivo pelo qual ele gostaria de ficar sozinho com a amiga, inclusive era até bom que não falassem nada sobre a viagem que em breve ela faria, assim ele ganhava mais tempo.
Hermione se virou percebendo que ele a fitava, eles se olharam por um tempo mas logo ela desviou o olhar para responder a Harry. – Não sei. Acho que nós podemos pensar melhor sobre isso depois, com mais calma. Mas concordo que é bom você já saber o que dizer quando chamar ele aqui.
Harry se afundou ao lado de Gina parecendo desanimado, provavelmente no que dependesse dele esse assunto já estaria resolvido hoje mesmo.
- Hermione está certa, você precisa de tempo para pensar exatamente o que irá contar para O Pasquim. – Gina concluiu taxativa, depois suspirou parecendo cansada: Ain, mamãe quer que eu limpe o jardim dos gnomos...você podia me ajudar né? – ela cutucou o garoto afundado no sofá.
Ainda desanimado Harry concordou e foi com a namorada para fora da casa, deixando os amigos sozinhos na sala.
Ron se aprumou mais uma vez na poltrona esperando que Hermione dissesse alguma coisa, mas a amiga parecia estar absorta em seus próprios pensamentos.
- Você acha mesmo uma boa idéia deixar aquele maluco do Lovegood entrevistar o Harry?
- Claro. Como o Harry disse, ele nos deve uma. – ela respondeu com simplicidade.
- Mas é que sei lá...o cara entregou a gente! Não confio nele.
- O coitado só fez isso porque seqüestraram a Luna, Ron.Qualquer pai faria o mesmo no lugar dele...
Houve um breve silêncio onde a garota pareceu retomar seus pensamentos enquanto Ron a fitava. Depois da noite do enterro, essa era a primeira vez em que os dois ficavam sozinhos em um mesmo cômodo e ele simplesmente não sabia o que dizer. Era tão mais fácil apenas observá-la.
Sentada na poltrona menor à sua frente com um pé em cima do assento e os braços cruzados ela parecia à milhas de distância. Seu olhar não apontava nenhuma direção, estavam perdidos em algum lugar dentro dela – parecia olhar para dentro de si, Ron pensou. Ela mordiscava o lábio inferior, hábito esse que a denunciava sempre que estava nervosa, mas que mesmo assim ele não podia deixar de achar muito charmoso.
De repente ela piscou, saindo de seu transe pessoal e se virou para Ron, flagrando-o em seu minucioso estudo sobre o silêncio dela.
- Ainda pensando em Xenófilos? – ele não conteve sua curiosidade.
- Oh, não. – ela pareceu surpresa com a pergunta. – Eu só... só estava pensando em algumas coisas que eu tenho que fazer. – ela concluiu um pouco constrangida.
-Ah. – ele temia por esse momento. Falar sobre planos e as obrigações que viriam agora era exatamente o que Ron não queria, mas era inevitável e ele sabia disso.
-Você sabe, eu tenho que começar a ver as coisas para a viagem e...
-Você pretende ir agora?! – ele a interrompeu soando mais alto do que pretendia.
-Bom, não é como se eu fosse embora amanhã, é só que eu preciso começar a planejar tudo desde já. – Hermione respondeu em tom de quem se justifica. – Afinal de contas, eu não conheço a Austrália nem sei exatamente onde encontrá-los. Preciso estudar alguns mapas das possíveis cidades em que eles possam estar. Sim porque por mais que eu os tenha direcionado para viver em Melbourne, eles podem ter resolvido viajar, ou qualquer coisa do tipo.
A garota falava agora sem respirar, daquele jeito obsessivo que ela costumava usar para explicar algo perturbador.
- Preciso me informar sobre hotéis, restaurantes, preciso também trocar dinheiro – ela continuou como quem fala consigo mesmo – Talvez eu vá de avião. Como eu nunca aparatei para tão longe antes e essa é a minha primeira viagem sozinha, eu realmente acho..
- Sozinha? – Ron ergueu as sobrancelhas. Então era isso, ela já havia decidido tudo na sua cabeça. Ela iria sozinha buscar seus pais e depois era provável que passasse um tempo com eles – longe da Toca, longe dele.
- E é por isso que eu pensei em pegar um vôo até lá Ron, não se preocupe. Com toda essa segurança voltada para os trouxas agora, é capaz de ser mais seguro do que aparatar. A volta já seria mesmo de avião por causa dos meus pais, eles não se sentiriam confortáveis com uma aparatação acompanhada. – ela concluiu como quem encerra uma questão.
Por essa resposta ficou claro para o garoto que Hermione pareceu não perceber o que realmente o incomodava. Que ela seria cuidadosa na viagem era óbvio, Ron não esperaria outra coisa vindo dela. A verdadeira ressalva dele era que essa viagem não tinha data de volta e Hermione o excluíra de seus planos com tanta facilidade que ele se sentiu sem jeito de se opor. Eles poderiam ficar meses separados e ela não parecia se preocupar muito com isso.
De repente ele se sentiu estúpido. Conjecturar coisas sobre Hermione e se imaginar com ela em situações que nunca iriam acontecer era uma sensação familiar para ele. Mas é que depois daquele beijo tudo pareceu tão possível, assim como todas as palavras que ele pensou ser capaz de dizer um dia para ela. Ele achou que depois daquele primeiro passo – ainda mais por ter sido um passo dela – seria muito mais fácil.
- Entendo. – Mentira, ele não entendia. Simplesmente não entendia porque o seu nome não aparecera uma só vez nos planos da garota, apenas respondeu qualquer coisa quando percebeu que ela esperava uma resposta.
***
Entendia? Ela duvidava disso. Ele parecia estar em outra galáxia enquanto ela contava seus planos, mas não o culpava. Hermione sabia que a morte de Fred e a depressão de todos os Weasley ainda estavam sendo digeridas por Ron, ele sempre fora emocionalmente mais instável e era natural que ele parecesse um pouco ausente depois de tudo. Não podia nem imaginar como seria perder um irmão, porque mesmo sendo filha única ela conviveu com esse medo nos últimos anos. Harry era exatamente como um irmão pra ela e ninguém esteve mais perto da morte por tanto tempo quanto ele esteve, e Ron... perdê-lo seria um dano irreparável. Ela afastou depressa o pensamento.
Mesmo compreendendo o que se passava com o rapaz ela se sentiu culpada por desejar tanto que ele pudesse ajudá-la agora. Queria poder contar para ele seus medos e inseguranças em relação à viagem que em breve faria, queria mostrar o quão assustada estava com a idéia de ir para um país estranho sozinha sem nem mesmo saber se encontraria seus pais. Desejava intensamente mostrar seus medos só para que ele a envolvesse naquele abraço tão confortável que ele tinha, ouvir as palavras dele dizendo que vai ficar tudo bem ou até mesmo presenciar algum ato de galanteio como os que ele fez durante o último verão toda vez que ela falava sobre seus pais.Mas ela não faria isso. Simplesmente não tinha coragem de alugá-lo com seus problemas agora.
- Ron, você viu sua irmã? – A senhora Weasley entrara na sala interrompendo seus pensamentos.
- Ah, ela foi desgnomizar o jardim.
- Oh, certo é que eu preciso de uma ajudinha com as roupas..
- Eu ajudo. – Hermione ficara de pé na mesma hora. Seria bom ter alguma coisa que ajudasse a tirar Ron e seus pais da cabeça.
- Ah, querida obrigada..é que tem mesmo muita coisa... – Molly continuou enquanto a garota a acompanhava deixando Ron para trás.
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N/A: É isso, esse acaba aqui. Eu queria pedir desculpas por qualquer erro no texto, acontece é que eu mesma reviso então é capaz de ter escapado alguma coisa.
E pra falar a verdade eu já troquei o nome desse capítulo, mas ainda não estou gostando. Alguma sugestão?
E comentem, pessoas!
Me deixem saber o que vocês estão achando...
Thanks ;*
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